HIDRELÉTRICAS NA AMAZÔNIA IMPACTOS AMBIENTAIS E SOCIAIS NA TOMADA DE DECISÕES SOBRE GRANDES OBRAS PHILIP M. FEARNSIDE VOL. 1 Copyright © 2015, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia Presidente da República Dilma Vana Rousseff Linhares Ministro da ciência, Tecnologia e Inovação José Aldo Rebelo Figueiredo Diretor do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia Luiz Renato de França Editora INPA Editor: Mario Cohn-Haft. Produção editorial: Rodrigo Verçosa, Shirley Ribeiro Cavalcante, Tito Fernandes. Bolsistas: Angela Hermila Lopes, Henrique Silva, Izabele Lira, Sara Oliveira, Tiago Nascimento. Ilustração Hoan Marques Capa Descrição: Ilustração baseada em fotografias da hidrelétrica de Tucuruí, localizada no rio Tocantins Ilustrador: Hoan Marques Editoração Eletrônica Rodrigo Verçosa Tiago Nascimento Tito Fernandes Ficha Catalográfica F288 Fearnside, Philip M. Hidrelétricas na Amazônia: impactos ambientais e sociais na tomada de decisões sobre grandes obras / Philip M. Fearnside. - Manaus: Editora do INPA, 2015. v. 2 : il. ISBN: 978-85-211-0143-7 (impreso), ISBN: 978-85-211-0151-2 (on-line) 1. Hidrelétricas - Amazônia. I. Título. CDD 621.312134 Av. André Araújo, 2936, Petrópolis CEP 69067-375 - Manaus - AM - Brasil Fone: +55 (92) 3643 3030 e-mail: acta@inpa.gov.br | website: http://acta.inpa.gov.br SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ............................................................................................................................................................................ 5 I. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................................................ 7 1. Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia .......................................................................................................................................................9 II. HIDRELÉTRICA DE TUCURUÍ ............................................................................................................................................. 35 2. Impactos Sociais da Barragem de Tucuruí ........................................................................................................................................................ 37 3. Impactos Ambientais da Barragem de Tucuruí: Lições ainda não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia ................53 4. Emissões de Gases de Efeito Estufa de um Reservatório Hidrelétrico (a Represa de Tucuruí) e as suas Implicações para Política Energética ......75 III. HIDRELÉTRICA DE BALBINA ............................................................................................................................................. 95 5. A Hidrelétrica de Balbina: O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia .........................................................................97 6. Estimativa da zona de deplecionamento da hidrelétrica de Balbina por técnica de sensoriamento remoto ..........................................127 IV. BARRAGENS DO RIO MADEIRA ........................................................................................................................................ 135 7. Impactos das Barragens do Rio Madeira: Lições Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia ...............................137 8. A Tomada de Decisão sobre Barragens na Amazônia: Política Vence a Incerteza na Controvérsia sobre os Sedimentos no Rio Madeira ...........153 9. As Barragens do Rio Madeira: Um Revés para a Política Ambiental no Desenvolvimento da Amazônia Brasileira .......................................167 10. Crédito para Mitigação das Mudanças Climáticas por Barragens Amazônicas: Brechas e Impactos Ilustrados pelo Projeto da Hidrelétrica de Jirau .............................................................................................................181 11. Hidrelétricas no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo: A Barragem de Santo Antônio como exemplo da necessidade de mudança................. 203 V. HIDRELÉTRICA DE BELO MONTE & BACIA DO RIO XINGU ....................................................................................... 229 12. Barragens na Amazônia: Belo Monte e o Desenvolvimento Hidrelétrico da Bacia do Rio Xingu .................................................................231 13. Belo Monte: A Ponta de Lança da Construção de Barragens na Amazônia? ...............................................................................................245 14. As Hidrelétricas de Belo Monte e Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases do Efeito Estufa ..................................................................249 15. Gases de Efeito Estufa no EIA-RIMA da Hidrelétrica de Belo Monte ......................................................................................................279 16. A Hidrelétrica de Belo Monte como Fonte de Gases de Efeito Estufa: Desafios para Midiatização da Ciência na Amazônia ....................287 17. Belo Monte: Resposta a Rogério Cezar de Cerqueira Leite ..........................................................................................................................295 Hidrelétricas na Amazônia 5 Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras APRESENTAÇÃO As decisões tomadas nos próximos anos so- facilitar um re-pensamento da forma de planejar bre desenvolvimento hidrelétrico serão entre as e licenciar grandes projetos de todos os tipos, mais influentes em determinar o futuro da po- não apenas hidrelétricas. pulação humana e do meio ambiente na região Amazônica. A maioria dos capítulos deste livro As publicações originais para os capítu- são traduções atualizadas de trabalhos original- los aqui apresentados abrangem um período de mente publicados na literatura internacional, o tempo de 25 anos (1989-2014). Isso levanta a de trabalhos na literatura brasileira. O livro co- questão de como lidar com a atualização das bre os cinco maiores hidrelétricas existentes hoje informações, especialmente onde a informação na Amazônia Legal (Tucuruí, Balbina, Samuel, atual mudaria significativamente os resultados Santo Antônio e Jirau), além de duas barragens numéricos que têm sido amplamente citados menores (Curuá-Uma e Jatapu), duas em cons- em sua forma “clássica”. Esse dilema tem sido trução (Teles Pires e Belo Monte), e outras in tratado, mantendo os valores originais e adicio- diferentes estágios de planejamento. Os capí- nando notas indicando as alterações relevantes tulos incluem discussões dos principais planos no conhecimento. Especialmente importantes para desenvolvimento hidrelétrico futuro, por são a existência de um grande pico de emissão exemplo, nas bacias dos rios Xingu, Tocantins/ de metano nos primeiros anos depois de encher Araguaia, Madeira e Tapajós. A magnitude dos planos, junto com a magnitude dos impactos um reservatório e uma sucessão de aumentos nas provocados pela construção de obras deste por- estimativas do Painel Intergovernamental sobre te, faz com que seja extremamente importante Mudança Climática (IPCC) para o impacto so- tirar todas as lições possíveis dos erros e acertos bre o aquecimento global causado por cada tone- no planejamento e construção das hidrelétricas lada de metano. Em outros casos, os eventos des- na região até agora. Estas experiências indicam de a publicação original precisam ser resumidos. a necessidade de melhoria dos sistemas de pla- Cada capítulo do livro, assim como as publica- nejamento de desenvolvimento, análise de im- ções originais, é intencionado a ser independente pactos e licenciamento de obras. Este livro re- dos outros, o que significa que alguma repetição úne as informações de uma forma acessível para de informação é necessária. Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia Hidrelétricas na Amazônia 9 Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Capítulo 1 Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia Philip M. Fearnside Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). Av. André Araújo, 2936 - CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil. E-mail: pmfearn@inpa.gov.br Tradução parcial de: Fearnside, P.M. 2014. Análisis de los principales proyectos hidro-energéticos en la región amazónica. Derecho, Ambiente y Recursos Naturales (DAR) & Centro Latinoamericano de Ecología Social (CLAES), Lima, Peru. 55 p. 10 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO da sociedade. Além dos impactos sociais e ambien- tais nos locais afetados pelos projetos, a constru- Planos para construir hidrelétricas na ção de barragens também tem efeitos perniciosos Amazônia prevêem dezenas de grandes barragens em processos democráticos, com implicações de e mais de uma centena de pequenas barragens. longo alcance em todos os países da Amazônia. A Brasil, Peru e Bolívia são os países mais afeta- tomada de decisões sobre barragens precisa ser re- dos, mas também existem planos para o Equador, formada para evitar desenvolver opções que resulta Colômbia, Venezuela, Guiana e Suriname. A to- em injustiça social, destruição do meio ambiente mada de decisões no Brasil é fundamental para es- e benefícios locais mínimos. Mais importante é tas tendências, não só devido ao grande número de um debate democrático sobre o uso de energia, se- barragens planejadas na Amazônia brasileira, mas guido de uma avaliação equilibrada dos impactos também porque o Brasil é o financiador e cons- e benefícios de várias energias alternativas. O li- trutor de muitas das barragens em países vizinhos. cenciamento de barragens atualmente tem vários Impactos das barragens incluem efeitos sobre os problemas que impedem que esta ferramenta evi- povos indígenas, como a perda de peixes e de ou- te problemas graves na execução de projetos, bem tros recursos dos rios. Impactos do reassentamento como deixa esse processo sem o importante papel de pessoas urbanas e rurais representam uma con- de fornecer uma fonte de informação para as de- centração do custo humano desta forma de desen- cisões sobre a construção ou não de barragens es- volvimento. Isto também é verdade em relação aos pecíficas. Normas para barragens e outros projetos impactos sobre os moradores a jusante, que per- foram feitas pela Comissão Mundial de Barragens dem a subsistência baseada na pesca e agricultura (WCD) e outros organismos. Em vez de uma falta na várzea. Impactos dos reservatórios sobre a saúde de regras, a violação das regras existentes é a causa incluem a proliferação de insetos e a metilação de de muitos dos problemas associados com barra- mercúrio (transformação deste metal na sua forma gens. Recomendações incluem abordar a questão tóxica). A perda de vegetação pode ocorrer não só subjacente de como a eletricidade é usada, uma por causa da inundação direta, mas também pelo mudança na ênfase do desenvolvimento de ener- desmatamento por residentes deslocados pelo re- gias alternativas, a conservação de eletricidade, a servatório e por imigrantes e investidores atraídos avaliação e a discussão democrática dos custos e para a área (inclusive pela construção de estradas benefícios ambientais e sociais antes das decisões até os locais das barragens), e o agronegócio viabi- reais, os esforços para minimizar a pressão política lizado pelas hidrovias associadas às barragens. As sobre os órgãos ambientais, mecanismos para rea- barragens emitem gases de efeito estufa; o dióxido lizar estudos de impacto ambiental sem que sejam de carbono é emitido pela decomposição de ár- financiados pelos proponentes dos projetos, o fim vores mortas por inundação e o óxido nitroso, e, do crédito de carbono para barragens, o respeito especialmente, o metano são emitidos pela água pela legislação ambiental, garantias constitucionais nos reservatórios e da água que passa através das e, finalmente, a tomada de decisões que dá valor a turbinas e vertedouros. O crédito de carbono para impactos humanos, em vez de ganhos financeiros. barragens sob o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), do Protocolo de Quioto, já repre- senta uma importante fonte adicional de impacto BARRAGENS EXISTENTES E PLANEJADAS sobre o aquecimento global porque quase todas as Amazônia Andina (Peru, Bolívia, Equador e barragens que ganham crédito seriam construídas Colômbia) do mesmo modo sem este subsídio, o que significa que os países que compram o crédito podem emitir O acordo Brasil-Peru de 2010 inclui cinco gases sem existir uma mudança real para neutra- barragens na Amazônia peruana que serão finan- lizar o impacto das emissões. A maneira em que ciadas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento as emissões de barragens são comparadas com as Econômico e Social (BNDES), do Brasil, em gran- de combustíveis fósseis muitas vezes distorce os de parte para a exportação de energia elétrica para o resultados, particularmente para o valor do tempo. Brasil: Inambari, Mainique, Paquitzapango, Tambo O impacto das barragens é muito pior, em relação 40 e Tambo 60 (ver: Finer & Jenkins, 2012a,b). aos combustíveis fósseis, se os cálculos são feitos Mais de uma dúzia de barragens brasileiras adi- de uma forma que representa melhor os interesses cionais estão planejadas para a Amazônia peruana Desenvolvimento 11 Hidrelétrico na Amazônia (Dourojeanni, 2009; FSP, 2011a; International 2012). Financiamento do BNDES para barragens Rivers, 2011a) (Figura 1). As autoridades do setor também está previsto no Equador. elétrico culpam as normas ambientais pelos frequen- Finer e Jenkins (2012a,b) publicaram uma extensa tes atrasos na construção de barragens no Brasil, em- revisão das barragens planejadas na bacia amazônica bora o Ministério de Minas e Energia (MME) Brasil dos países andinos. Uma tabela complementar “onli- negue veementemente que o Peru seja um “alvo” da ne” oferece informações sobre 48 barragens planejadas ELETROBRÁS e BNDES devido à suaves restri- e a existência de 151 barragens com ≥2 MW de ca- ções sociais e ambientais no licenciamento de proje- pacidade instalada (disponível em: http://www.edito- tos; no entanto, a aprovação mais rápida dos projetos rialmanager.com/pone/download.aspx?id=2756637 no Peru é admitida como um fator-chave (Wiziack, & guid = 7304e246-f213-4aae-8bf4-0df889734272 Figura 1. Barragens planejadas na região amazônica do Peru (fonte: International Rivers, 2011). 12 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras & esquema = 1). Das barragens planejadas (Figura 2), 79 estão no Peru, 60 no Equador, 10 na Bolívia e 2 na Colômbia. Das 17 barragens classificadas como “muito grandes” (≥1000 MW), 10 estão no Peru, 5 no Equador e 2 na Bolívia. A maior parte das barragens planejadas está localizada em montanhas no sopé dos Andes, entretanto, 21 das barragens estão abaixo de 400 metros acima do nível do mar, onde o clima e a vegetação são tropicais e onde um menor relevo to- pográfico dá origem a grandes reservatórios. Um sis- tema de classificação foi aplicado para categorizar as barragens planejadas como de impacto “alto”, “médio” ou “baixo”, baseado no potencial para desmatamento (por exemplo, devido à necessidade de novas estra- das), inundação de floresta (implicando na emissão de gases de efeito estufa) e fragmentação do rio (bloque- ando as migrações dos peixes). O impacto ecológico de 71 (47%) das barragens planejadas foi classificado como alto, 51 (34%) como médio e 29 (19%) como baixo. Mais informações estão disponíveis em um mapa interativo online mantido pela International Rivers, a Fundação proteger e ECOA, que fornecem informações sobre 146 barragens ao longo dos países amazônicos (http://dams-info.org/en). Figura 2. Barragens de vários tamanhos de existentes e planejadas na Amazônia Andina (fonte: Finer & Jenkins, 2012a). Uma das mais controversas é a barragem de Inambari, no Peru. Por um lado, em 14 de junho de 2011 foi anunciado o cancelamento pelo go- verno peruano devido à forte oposição popular foi revelada pelas autoridades elétricas brasileiras (International Rivers, 2011b), mas ainda conti- a extensão plena dos planos para desenvolvimento nua nos planos brasileiros. O Plano de Expansão hidrelétrico na Amazônia, quando o Plano 2010 Energética 2012-2021 informa que o projeto foi liberado em 1987 (depois que já havia vazado Inambari “está na fase mais avançada [dos planos para o domínio público) (Brasil, ELETROBRÁS, no Peru], embora o início da construção esteja sem 1987). O plano provocou muitas críticas, e desde previsão” (Brasil, MME, 2012, p. 66). então as autoridades elétricas apenas liberam planos O Ministério de Minas e Energia brasileiro es- para curtos intervalos de anos, não sobre o total dos timou o potencial hidrelétrico dos países vizinhos, aproveitamentos planejados. visando à exportação de excedentes para o Brasil. A escala de desenvolvimento hidrelétrico plane- Calculou-se o potencial de capacidade instalada de jada para a Amazônia é tremenda. O “Plano 2010” 180.000 MW no Peru, 20,3 mil MW na Bolívia listou 79 barragens na Amazônia, independente das e 8.000 MW na Guiana Francesa (Brasil, MME, datas projetadas para construção das obras (Figura 2012, p. 66-67). 3). Embora as dificuldades financeiras do Brasil tenham forçado, repetidamente, o adiamento dos Amazônia brasileira planos para construção das barragens, a escala pla- nejada, independente da data de conclusão de cada A Amazônia brasileira tem um grande poten- represa, permanece essencialmente inalterada, re- cial para geração hidrelétrica, graças às quantidades presentando uma consideração importante para o enormes de água que passam pela região e às que- futuro. As represas inundariam 10 milhões de hecta- das topográficas significativas nos afluentes do Rio res, ou aproximadamente 2% da região da Amazônia Amazonas, quando esses descem a partir do Escudo Legal e aproximadamente 3% da porção brasileira Brasileiro (na parte sul da região) ou do Escudo da floresta amazônica. Inundar esta área provoca- Guianenses (no lado norte). Apenas uma única vez ria perturbação de florestas em áreas maiores que Desenvolvimento 13 Hidrelétrico na Amazônia os reservatórios em si. Os habitats aquáticos seriam são favoráveis para desenvolvimento hidrelétrico: ao alterados drasticamente. O impacto sobre povos in- longo dos trechos medianos e superiores dos afluen- dígenas também seria grande, sendo que uma das tes que começam no planalto central brasileiro e se- partes da Amazônia com maior concentração desses guem ao norte para encontrar com o rio Amazonas: povos se encontra na faixa da maioria dos locais que o Xingu, Tocantins, Araguaia, Tapajós e outros. Figura 3. Barragens listadas no “Plano 2010” (Brasil, ELETROBRÁS, 1987). Contornos dos reservatórios redesenhados do CIMI et al. (1986) e Sevá (1990), que usou os mapas de Brasil, ELETROBRÁS(1986) e Brasil, ELETRONORTE (1985); ver: Fearnside (1995). Barragens: 1. São Gabriel (2.000 MW); 2. Santa Isabel-Uaupés/Negro: (2.000 MW); 3. Caracaraí-Mucajaí (1.000 MW); 4. Maracá (500 MW); 5. Surumu (100 MW); 6. Bacarão (200 MW); 7. Santo Antônio [Cotingo] (200 MW); 8. Endimari (200 MW); 9. Madeira/Caripiana (3800 MW); 10. Samuel (200 MW); 11. Tabajara-JP-3 (400 MW); 12. Jaru-JP-16 (300 MW); 13. Ji-Paraná-JP-28 (100 MW); 14. Preto RV-6 (300 MW); 15. Muiraquitã RV-27 (200 MW); 16. Roosevelt RV-38 (100 MW); 17. Vila do Carmo AN-26 (700 MW); 18. Jacaretinga AN-18 (200 MW); 19. Aripuanã AN-26 (300 MW); 20. Umiris SR-6 (100 MW); 21. Itaituba (13.000 MW) 22. Barra São Manuel (6.000 MW); 23. Santo Augusto (2.000 MW); 24. Barra do Madeira [Juruena] (1000 MW); 25. Barra do Apiacás (2000 MW); 26. Talama [Novo Horizonte] (1.000 MW); 27. Curuá-Una (100 MW); 28. Belo Monte [Cararaô] (8.400 MW) 29. Babaquara (6.300 MW); 30. Ipixuna (2.300 MW); 31. Kokraimoro (1.900 MW); 32. Jarina (600 MW); 33. Iriri (900 MW); 34. Balbina (250 MW); 35. Fumaça (100 MW); 36. Onça (300 MW); 37. Katuema (300 MW); 38. Nhamundá/Mapuera (200 MW); 39. Cachoeira Porteira (1.400 MW); 40. Tajá (300 MW); 41. María José (200 MW); 42. Treze Quedas (200 MW); 43. Carona (300 MW); 44. Carapanã (600 MW); 150 Mel (500 MW); 46. Armazém (400 MW); 47. Paciência (300 MW); 48. Curuá (100 MW); 49. Maecuru (100 MW); 50. Paru III (200 MW); 51. Paru II (200 MW); 52. Paru I (100 MW); 53. Jari IV (300 MW); 54. Jari III (500 MW); 55. Jari II (200 MW); 56. Jari I (100 MW); 57. F. Gomes (100 MW); 58. Paredão (200 MW); 59. Caldeirão (200 MW); 60. Arrependido (200 MW); 61. Santo Antônio [Araguari] (100 MW); 62. Tucuruí (6.600 MW); 63. Marabá (3.900 MW); 64. Santo Antônio [Tocantins] (1.400 MW); 65. Carolina (1.200 MW); 66. Lajeado (800 MW); 67. Ipueiras (500 MW); 68. São Félix (1.200 MW); 69. Sono II (200 MW); 70. Sono I (100 MW); 71. Balsas I (100 MW); 72. Itacaiúnas II (200 MW); 73. Itacaiúnas I (100 MW); 74. Santa Isabel (Araguaia) (2200 MW); 75. Barra do Caiapó (200 MW); 76. Torixoréu (200 MW); 77. Barra do Peixe (300 MW); 78. Couto de Magalhães (200 MW); 79. Noidori (100 W). 14 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras A construção de represas hidrelétricas na (definidas como > 30 MW no Brasil) na região da Amazônia brasileira causa impactos sociais e am- Amazônia Legal brasileira até 2020 (Brasil, MME, bientais significativos, como também é o caso em 2011, p. 285). Várias pequenas barragens incluídas outras partes do mundo (WCD, 2000). O proces- no plano 2011-2020 foram adiadas até depois de so de tomada de decisão para iniciar projetos novos 2021 no plano 2012-2021, mas duas grandes bar- tende a subestimar em muito estes impactos, e tam- ragens, Simão Alba (3.509 MW) e Salto Augusto bém superestima sistematicamente os benefícios das Baixo (1.464 MW), ambas no do rio Juruena, fo- represas (Fearnside, 1989, 2005a). Também são su- ram aceleradas para ser concluídas até 2021 (Brasil, bestimados sistematicamente os custos financeiros MME, 2012). As barragens a serem concluídas de construção das barragens. Além da disparidade no período 2012-2021 na Amazônia Legal bra- na magnitude dos custos e benefícios, há também sileira somam 17: Santo Antônio em 2012, Jirau grandes desigualdades em termos de quem paga os em 2013, Santo Antônio do Jari em 2014, Belo custos e quem desfruta dos benefícios. Populações Monte, Colíder, Ferreira Gomes e Teles Pires, em locais frequentemente recebem os principais im- 2015, Sinop, Cachoeira Caldeirão, São Manoel em pactos, enquanto as recompensas beneficiam, em 2017, Ribero Gonçalves e São Luiz do Tapajós em grande parte, centros urbanos e, no caso da maior 2018, Jatobá em 2019, Água Lima e Bem Querer represa (Tucuruí), outros países (Fearnside, 1999, até 2020 e Simao Alba, Marabá e Salto Baixo de 2001). Das represas planejadas, as mais controversas Augusto em 2021 (Brasil, MME, 2012, p. 77-78). são as projetadas no Rio Xingu, começando com a As 13 barragens existentes (aqueles com seus re- barragem de Belo Monte. servatórios cheios até 01 de março de 2013) são mostradas na Tabela 1. Na Tabela 2 estão listadas O Plano Decenal de Expansão Energética 38 barragens na fase de planejamento ou constru- 2011-2020 previa 30 novas “grandes barragens” ção mencionada nos planos recentes. As barragens Tabela 1. Barragens existentes* na Amazônia Legal brasileira. Capacidade No. na Ano Área do reservatório Nome Estado Rio Instalada 2 coordenadas ReferênciasFig. 4 enchido (km ) (MW) 78 [298 MW 23 (para os 78 MW 00°54’24” N; 1 1975 Coaracy-Nunes Amapá Araguari até 2016] iniciais) 51°15’31” O 78 (para os 40 MW 02°49’11.49” S; 2 1977 Curuá-Una Pará Curuá-Una 100 Fearnside, 2005a iniciais) 54°17’59.64” O 03°49’54” S; Fearnside, 1999, 3 1984 Tucuruí Pará Tocantins 8.370 2.850 49°38’48” O 2001 01°55’02” S; Fearnside, 1989; 4 1987 Balbina Amazonas Uatumã 250 2.996 59°28’25” O Feitosa et al., 2007 Mato 14°52’16” S; 5 1987 Manso Manso 212 427 Grosso 55°47’08” O 08°45’1” S; 6 1988 Samuel Rondônia Jamari 210 560 Fearnside, 2005b 63°27’20” O Lajeado (Luis 09º45’26” S; Agostinho et al., 7 1999 Tocantins Tocantins 800 630 Eduardo Magalhães) 48º22’17” O 2007 12°15’02” S; 8 2006 Peixe Angical Tocantins Tocantins 452 294 48°22’54” O Mato 10°09’37’ S; Brasil, MME, 9 2011 Dardanelos Aripuanã 261 0.24 Grosso 59°26’55’’O 2006a, p. 69 Santo Antônio 3.150 até 08°48’04,0” S; Brasil, MME, 10 2011 Rondônia Madeira 350 (Madeira) 2015 63°56’59,8” O 2006a, p. 70 11°58’51” S; Brasil, MME, 11 2011 Rondon II Rondônia Comemoração 73.5 23 60°41’56” O 2010b, p. 54 Maranhão/ 06º 35’11” S; 12 2012 Estreito (Tocantins) Tocantins 1.087 744,68 Brazil, MME, 2011 Tocantins 47º27’27” O 3.750 até 09o15’17.96” S; 13 2013 Jirau Rondônia Madeira 361.6 2015 64o38’40.13” O *Barragens com > 30 MW de capacidade instalada com os seus reservatórios enchidos até 01 de marco de 2013. Desenvolvimento 15 Hidrelétrico na Amazônia existentes e planejadas listadas nas Tabelas 1 e 2 desses locais adicionais que não foram menciona- são apresentadas no mapa na Figura 4. Existem dos, como o Paredão em Roraima e o Machadinho muitas outras barragens inventariadas (e.g., Brasil, em Rondônia. No Estado do Amazonas existe um ANA, s/d [C. 2006], p. 51-56), tais como as 62 barragens adicionais que foram incluídas no Plano interesse recente nos rios Aripuanã e Roosevelt, nos 2010, mas que ainda não aparecem nos planos de- locais Sumauma, Prainha, Inferninho, e Cachoeira cenais de expansão de energia (ver a legenda da Galinha (e.g., Farias, 2012). Preparações já estão em Figura 3). Já há preparações em curso em alguns andamento em Prainha. Tabela 2. Barragens planejadas ou em construção na Amazônia Legal brasileira (> 30 MW). Área do Ano No. na Capacidade Nome Estado Rio reservatório Situação previsto de Coordenadas Referências Fig. 4 Instalada (MW) (km2) conclusão 15°20’53” S; Brasil, MME, 14 Água Limpa Mato Grosso Das Mortes 320 17,9 Planejado 2020 53°25’49” O 2012, p. 82 Babaquara Oficialmente 03°18’00” S; 15 Pará Xingu 6.300 6.140 Fearnside, 2006a [Altamira] não mencionado 52°12’30” O Em 03°6’57” S; 16 Belo Monte Pará Xingu 11.233 516 2015 construção 51°47’45” O Brasil, MME, 01°52’40” N; 2012, p. 83; 17 Bem Querer Roraima Rio Branco 709 559,1 Planejado 2020 61°01’57” O Brasil, MME, 2010a Cachoeira 00°51,2’00” N; Brasil, MME, 18 Amapá Araguari 219 48 Planejado 2017 Caldeirão 51°12’00” O 2012, p. 77 05°05’05” S; 19 Cachoeira do Caí Pará Jamanxim 802 420 Planejado 2020 56°28’05” O Cachoeira dos 05°54’59” S; 20 Pará Jamanxim 528 117 Planejado Patos 55°45’36” O 12°59’22” S; Brasil, MME, 21 Cachoeirão Mato Grosso Juruena 64 2,6 Planejado 58°57’29” O 2007, p. 149 Oficialmente 06°30’08” S; 22 Chacorão Pará Tapajós 3.336 616 não mencionado 58°18’53” O Em 10° 59’ 5.9” S; 23 Colíder Mato Grosso Teles Pires 342 171,7 2015 Brasil, MME, construção 55° 45’ 57.6” O 2007, p. 148 Mato Grosso/ 18° 12’35” S; Brasil, ANA , s/d 24 Couto Magalhães Araguaia 150 900 Planejado Goiás 53° 31’06” O (C. 2006), p. 54 00°51´20.126” Licença N; 25 Ferreira Gomes Amapá Araguari 100 17,72 2015 preliminar 51°11´41.071” O 09°12’23” S; Brasil, MME, 26 Foz do Apiacás Mato Grosso Apiacás 230 89,6 Planejado 2016 57°05’11” O 2012, p. 82 11°15’11” S; Brasil, MME, 27 Ipueiras Tocantins Tocantins 480 933,5 Planejado 48°28’53” O 2012, p. 82 05°38’48 S; 28 Jamanxim Pará Jamanxim 881 75 Planejado 2020 55°52’38” O 06°15’49” S; 29 Jardim de Ouro Pará Jamanxim 227 426 Planejado 55°45’53” O 05°11’48” S; 30 Jatobá Pará Tapajós 2.336 646 Planejado 2019 56°55’11” O 13°24’05” S; Brasil, MME, 31 Juruena Mato Grosso Juruena 46 1,9 Planejado 59°00’27” O 2009, p. 109 05°19’ S; Brasil, ANA , s/d 32 Marabá Pará Tocantins 2.160 1.115,4 Planejado 2021 49°04 O (C. 2006), p. 52 13°34’35” S; Brasil, MME, 33 Magessi Mato Grosso Teles Pires 53 Planejado 55°15’54” O, 2007, p. 149 Sono/ 09°58’25” S; Brasil, MME, 34 Novo Acordo Tocantins 160 Planejado Tocantins 47°38’23” O 2009, p. 104 Ribeiro Maranhão / 35 Paranaíba 113 238 Planejado 2018 07 °34’31”S; Brasil, MME, Gonçalves Piauí 45°19’02” O 2012, p. 83 Salto Augusto 08°53’6.3” S; Brasil, MME, 36 Baixo [JRN- Mato Grosso Juruena 1.464 107 Planejado 2021 58°33’30.1” O 2012, p. 77 234b] 16 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Tabela 2. Continuação Área do Ano No. na Capacidade Nome Estado Rio reservatório Situação previsto de Coordenadas Referências Fig. 4 Instalada (MW) (km2) conclusão Santa Isabel 06° 08’ 00” S; Brasil, ANA , s/d 37 Pará Araguaia 1.080 236 Planejado (Araguaia) 48° 20’ 00” O (C. 2006), p. 56 Santo Antonio Licença 00°39’ S; Brasil, MME, 38 Pará/Amapá Jari 167 31,7 2014 do Jari preliminar 52°31’ O 2007, p. 148 São Luiz do 04°34’10” S; 39 Pará Tapajós 6.133 722 Planejado 2018 Tapajós 56°47’06” O 09°11’29”S; Brasil, MME, 40 São Manoel Mato Grosso Teles Pires 746 53 Planejado 2017 057°02’60” O 2012, p. 83 Tocantins/ Em 12°48’45” S; Brasil, ANA , s/d 41 São Salvador Tocantins 243,2 99,65 Goiás construção 48°15’29” O (C. 2006), p. 55 Licença 05°41’52” S; Brasil, MME, 42 Serra Quebrada Maranhão Tocantins 1.328 420 2020 preliminar 47°29’11” O 2012, p. 83 Simão Alba 08°13’33.5” S; Brasil, MME, 43 Mato Grosso Juruena 3.509 > 1.000 Planejado 2021 [JRN-117a] 58°19’23.9” O 2012, p. 77 Brasil, MME, Licença 11°16’10” S; 2012, p. 83; 44 Sinop Mato Grosso Teles Pires 461 329.6 2016 preliminar 55°27’07” O Brasil, MME, 2010b, pp. 44-45 08°54’15” S; Brasil, MME, 45 Tabajara Rondônia Ji-Paraná 350 Planejado 62°10’21” O 2009, p. 104 Brasil, MME, 46 Teles Pires Em 09° 20’ 35” S; 2007, p. 148;Mato Grosso Teles Pires 1.820 151,8 2015 construção 56° 46’ 35” O, Brasil, MME, 2010b, pp. 46-47 Tocantins 16°47’10” S; Brasil, MME, 47 Tocantins Tocantins 480 700 Planejado [Renascer] 47°56’31” O 2007, p. 149 Licença 15°14’05” S; Brasil, ANA , s/d 48 Toricoejo Mato Grosso Das Mortes 76 48 preliminar 53°06’57” O (C. 2006), p. 56 Mato Grosso/ Licencia 16°16’59” S; Brasil, MME, 49 Torixoréu Araguaia 408 900 Goiás preliminar 52°37’00” O 2007, p. 148 08°10’59” S; Brasil, MME, 50 Tupirantins Tocantins Tocantins 620 370 Planejado 48°10’00” O 2012, p. 83 Maranhão / Licença 07°14’08” S; Brasil, MME, 51 Uruçuí Paranaíba 164 279 Piauí preliminar 44°34’01” O 2012, p. 83 Obs.: Mais 62 outras represas estão listadas no Plano 2010 que ainda não aparecem nos Planos Decenais de Expansão Energética (PDEs) (ver: Legenda da Figura 3) IMPACTOS DE BARRAGENS A primeira represa planejada (Belo Monte), pro- vavelmente iniciará um movimento em cadeia de Impactos sobre os povos indígenas eventos que conduziria à construção de pelo menos As hidrelétricas existentes e planejadas afetam algumas das outras represas descritas em documen- algumas das partes da Amazônia que concentram tos sobre os planos, inclusive no Plano 2010. O lo- as maiores populações de povos indígenas. A bar- cal físico da hidrelétrica proposta de Belo Monte é ragem de Tucuruí no Rio de Tocantins inundou um sonho para construtores de barragens, com uma parte de três reservas indígenas (Parakanã, Pucuruí queda de 94 m e uma vazão média de 8.600 m3/s. e Montanha) e sua linha de transmissão cortou ou- O problema em aproveitar isto é institucional: as tras quatro (Mãe Maria, Trocará, Krikati e Cana autoridades elétricas do Brasil podem declarar que Brava). A Área Indígena Trocará, habitada pelos apenas a primeira represa seria construída, mas es- Asuriní do Tocantins, está situada a 24 km a jusan- sas declarações não terão qualquer efeito para evitar te da represa, portanto sofrendo os efeitos da po- a construção das outras represas quando o tempo luição da água e perda de recursos pesqueiros que delas chegar ao cronograma de construção. A his- afetam todos os residentes a jusante da barragem. tória de promessas quebradas (para usar um eufe- No caso da hidrelétrica de Balbina, foi inundada mismo) nos casos Balbina e Tucurui-II representam parte da reserva Waimiri-Atroari. Mais dramáti- exemplos diretamente paralelos (documentado em ca é a previsão de impactos sobre povos indígenas Fearnside, 2006a). Em 2006, o plano de expansão caso que sejam construídas represas no rio Xingu. energética 2006-2015 incluiu Belo Monte com a sua Desenvolvimento 17 Hidrelétrico na Amazônia Figura 4. Barragens existentes (reservatório cheio até 01 de março de 2013) e barragens planejadas ou em construção na região da Amazônia Legal brasileira. Os números das barragens existentes (indicadas com círculos) correspondem aos números listados na Tabela 1 e os números das barragens planejadas e em construção (indicadas por triângulos) correspondem aos números na Tabela 2. capacidade instalada reduzida de 11.183 MW para locais. No caso de Tucuruí foram deslocadas 23.871 5.500 MW (Brasil, MME, 2006b). Embora não in- pessoas. Trinta anos depois, muitos ainda não rece- cluído no texto do plano de 2006, o anúncio da ca- beram qualquer compensação (Xingu Vivo, 2012). pacidade reduzida (de 5.500 MW) de Belo Monte Problemas de restabelecimento levaram o Tribunal em outubro de 2003 indicou que isto presume que Internacional das Águas a condenar o governo bra- apenas a Belo Monte seria construída, sem regulação sileiro pelos impactos de Tucuruí na sua sessão de da vazão do rio Xingu a montante. Mas o plano de 1991 em Amsterdã. Embora o Tribunal tenha ape- expansão 2008-2017 (Brasil, MME, 2009) colocou nas autoridade moral, a condenação trouxe atenção uma capacidade planejada para Belo Monte no nível mundial à existência de um padrão subjacente de original de 11 mil MW, levantando dúvidas sobre problemas sociais e ambientais causados por este declarações de que barragens a montante não seriam empreendimento que pretende ser um modelo. A planejadas. A configuração final de Belo Monte foi barragem de Marabá, no rio Tocantins a montan- aumentada para 11.233 MW, o que seria ainda mais te de Tucuruí, foi planejada para ser concluída em inexplicável sem as barragens a montante. 2016 (Brasil, MME, 2009, p. 38); aproximadamente 40.000 pessoas seriam deslocadas, segundo fontes não-governamentais. Impactos de reassentamento Planos para a maioria dos rios da Amazônia bra- O deslocamento de população da área de re- sileira abrangem, essencialmente, todos os rios leste servatório pode ser um impacto severo em alguns do rio Madeira, consistem na construção de cadeias 18 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras de barragens que se desenvolvem ao longo de cada ano depois do fechamento. Dados sobre os peixes rio em uma série contínua de barragens (Figura 3). até 2006 para o reservatório de Tucuruí e cidades ao Desde praticamente toda a população tradicional longo de partes do Rio sem barragens mostram que da Amazônia, ou seja, os povos indígenas e os ha- a quantidade de peixes no reservatório nunca subs- bitantes ribeirinhos vivendo ao longo dos rios e são tituío as perdas na pesca do rio Tocantins como um totalmente dependentes de peixes e outros recursos todo (Cintra, 2009). dos rios para sua subsistência, estes planos essencial- mente envolvem a expulsão de toda esta população. Impactos na saúde Este impacto cumulativo dos planos ultrapassa em muito o impacto de qualquer barragem individual. Insetos O impacto social da expulsão de pessoas que vive- ram por gerações em um determinado lugar e cujas Impactos sobre a saúde causados por represas habilidades, tais como a pesca, não os torna adequa- hidrelétricas são significativos. dos para outros contextos. O dano é muito maior do A malária é endêmica às áreas onde estão sendo que no caso de deslocamento de populações urbanas construídas as represas, assim conduzindo ao au- ou as populações de colonos recém-chegados. mento da incidência quando populações humanas migram para essas áreas. Reservatórios provêm cria- Residentes a jusante douros para mosquitos Anopheles, assim mantendo ou aumentando a população dos vetores para essa Quando uma represa é construída, os residentes doença nas áreas circunvizinhas (Tadei et al., 1983). a jusante, ao longo do rio, sofrem impactos severos. Enquanto o reservatório está enchendo, o trecho No caso de Tucuruí, um impacto dramático abaixo da represa frequentemente seca completa- foi uma “praga” de mosquitos do gênero Mansonia. mente, assim negando aos residentes ribeirinhos o Esses mosquitos não transmitem malária, mas po- acesso à água e à pesca. No caso da hidrelétrica de dem transmitir várias arboviroses. Também podem Balbina, os primeiros 45 km a jusante ficaram secos ser vetores de filaria, o verme parasitário que causa durante a fase de enchimento. Depois que a represa elefantíase. Embora esta doença ocorra em países vi- encheu, a água liberada pelos vertedouros e turbinas zinhos, tais como o Suriname, ainda não se espalhou era praticamente destituída de oxigênio, provocando para a Amazônia brasileira. Depois de encher o re- mortandade de peixes no rio a jusante, ao longo de servatório de Tucuruí, populações de Mansonia ex- uma distância significativa abaixo da represa. A falta plodiram ao longo da costa ocidental do lago. Esses de oxigênio, também, inibe o reestabelecimento das mosquitos picam de noite e de dia, a intensidade das populações de peixe. A perda praticamente total de picadas sendo medida em até 600 picadas/hora em peixes por falta de oxigênio se estendeu para 145 iscas humanas expostas (Tadei et al., 1991). km em Balbina, enquanto em Tucuruí por 60 km, Mercúrio na estação seca no lado ocidental do rio. A migração bloqueada reduz os estoques de peixes ao longo de A metilação de mercúrio representa uma gran- todo o trecho entre estas represas e as confluências de preocupação para o desenvolvimento de centrais dos afluentes com o rio Amazonas: 200 km no caso hidrelétricas na Amazônia. Mercúrio destina-se de Balbina e 500 km no caso de Tucuruí. biologicamente, e aumenta a concentração de uma No segundo ano após o fechamento da bar- ordem de magnitude, com cada etapa da cadeia ali- ragem de Tucuruí as capturas de peixe foram mentar. Os seres humanos tendem a ocupar a últi- três vezes menores do que nos níveis pré-represa ma posição, e pode-se esperar que eles tenham os (Odinetz-Collart, 1987). Os peixes capturados por níveis mais altos de mercúrio. É provável que as altas unidade de esforço de pesca, por exemplo, medido concentrações que foram encontradas no solo e na em kg por viagem ou pescador, caiu em aproxima- vegetação na Amazônia foram deposição de fundo damente 60%, enquanto o número de pescadores acumulado durante milhões de anos, e não das con- também caiu dramaticamente. Além de declínios tribuições antropogênicas recentes da mineração de em capturas de peixe, diminuíram também colheitas ouro (Roulet et al., 1996; Silva-Forsberg et al., 1999). de camarão de água doce: a produção local no bai- A metilação está ocorrendo em reservatórios, xo Tocantins caiu em 66%, começando no segundo como indicado por altos níveis de mercúrio em peixes Desenvolvimento 19 Hidrelétrico na Amazônia e em cabelos humanos em Tucuruí. Em uma amos- é o desmatamento pela população que migra para tra de 230 peixes retirados do reservatório (Leino & a área por sua própria iniciativa. No caso da barra- Lodeius, 1995), 92% dos 101 peixes predadores ob- gem de Tucuruí, além do desmatamento em áreas de tiveram níveis de Hg mais altos do que o limite de reassentamento, parte da população mudou-se uma segurança de 0,5 mg Hg por kg de peso fresco usado segunda vez devido a uma praga de mosquitos, dan- no Brasil. O tucunaré (Cichla ocellaris e C. temensis), do origem à formação de um dos maiores focos de um peixe predatório que compõe mais da metade da desmatamento na Amazônia no local onde eles fi- captura comercial em Tucuruí, está contaminado com nalmente se estabeleceram (Fearnside, 1999, 2001). níveis altos, calculados, em média, em 1,1 mg Hg por kg, ou seja, mais do dobro do limite de segurança de A barragem de Belo Monte, hoje em constru- 0,5 mg Hg por kg de peso fresco. ção no rio Xingu, atraiu uma grande população na área de Altamira, Pará (Barreto et al., 2011). Esta O teor médio de Hg encontrado no cabelo das área tornou-se um dos dois pontos de maior des- pessoas que pescam no reservatório de Tucuruí matamento em 2010 e 2011; o outro é a área em era 65 mg por kg de cabelo estudado por Leino e torno das barragens de Santo Antônio e Jirau, que Lodenius (1995), um valor muitas vezes mais alto estão em construção no rio Madeira, em Rondônia do que os níveis encontrados em áreas de mineração (Angelo & Magalhães, 2011; Hayashi et al., 2011; de ouro. Por exemplo, em minas de ouro próximas Escada et al., 2013). de Carajás, as concentrações de Hg em cabelo va- riaram de 0,25 a 15,7 mg por kg de cabelo estudado Talvez o mais controverso dos projetos de na- por Fernandes et al. (1990). Dados do rio Tapajós vegação é aquele associado às barragens de Santo indicaram sintomas mensuráveis, tais como a redu- Antônio e Jirau, no rio Madeira (por exemplo, ção do campo visual, entre residentes ribeirinhos IIRSA, 2007; Killeen, 2007). Essas barragens se- cujos níveis de Hg no cabelo eram substancialmente riam parte da Hidrovia Rio Madeira e permitiriam mais baixos do que, ambos, os níveis encontrados em a implementação de mais de 4.000 km de hidro- Tucuruí e o limiar de 50 mg por kg que é reconheci- vias na Bolívia. As estimativas preliminares para a do atualmente como o padrão. As concentrações de quantidade de grãos (principalmente soja) a serem Hg em cabelo humano em Tucuruí já são mais que transportados indicam um total de 28 milhões de o dobro daquelas encontradas para causar dano fetal, toneladas por ano de Mato Grosso e 24 milhões de resultando em retardamento psicomotor. toneladas por ano de Bolívia (PCE et al., 2002, p. 6.4). Poderia ser exagerada a quantidade de soja que Perda de vegetação é prevista para a Bolívia, sendo que o zoneamento boliviano (Zonisig et al., 1997, citado por Vera-Diaz Entre os muitos impactos causados pela cons- et al., 2007) indica baixo potencial agrícola em gran- trução de hidrelétricas em regiões tropicais, um de parte da área onde os estudos brasileiros dizem deles é o estimulo ao desmatamento. Isto é devido que há 8 milhões de hectares de solos adequados parcialmente às estradas que são construídas para (PCE et al., 2002, p. 6.4). Se há 8 milhões de hec- dar acesso a cada barragem. As estradas são bem tares de terra adequada na Bolívia, e esta área for conhecidas como um dos motores mais poderosos transformada em soja, os impactos de hidrelétricos do desmatamento (por exemplo, Fearnside, 2002a; e navegação devem incluir a perda de áreas de ecos- Laurance et al., 2002; Soares-Filho et al., 2004). Um sistemas naturais, que representa um total mais de exemplo é a usina de Balbina, onde a terra ao longo 150 vezes maior que a superfície dos reservatórios. da estrada construída para ligar a barragem à rodovia Embora não mencionado no relatório, deve-se notar BR-174 (Manaus-Boa Vista) veio a ser rapidamen- que muitos produtores de soja na Amazônia bolivia- te invadida por posseiros (Fearnside, 1989), e, mais na hoje são brasileiros, e é provável que grande parte tarde, parte da área foi convertido em um projeto de da expansão da soja na área adicional que seria aber- assentamento do Instituto Nacional de Colonização ta à navegação seria também feita por brasileiros. e Reforma Agrária (INCRA) (Massoca, 2010). A discussão sobre os benefícios das barragens está Barragens construídas em áreas com um núme- em escopo internacional (integração da América do ro considerável de pessoas resultam em uma popu- Sul e transporte da soja de Bolívia), mas a discus- lação deslocada que desmata nas áreas oficiais de as- são dos impactos é limitada ao Brasil nos relatórios sentamento ou em outros lugares. Adicionado a isto subsequentes, incluindo o estudo de viabilidade 20 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras (PCE et al., 2005, Vol. 2, p. II-83) e o EIA-RIMA de hidrovias que permitem tráfego de barcaças em (FURNAS et al., 2005a,b). rios que eram anteriormente não navegáveis. A ex- A Avaliação Estratégica Ambiental (AAE) pansão da soja está intimamente relacionada com o para barragens no rio Madeira refere-se ao cresci- custo de transporte, levando ao desmatamento pela mento “inexorável” como uma característica da área conversão direta de floresta em soja e pela conversão da Bolívia a qual a hidrovia proporcionaria acesso de pastagens em soja, deslocando assim, as áreas de (ARCADIS Tetraplan et al., 2005). O estudo de produção animal para a floresta em outras partes da viabilidade destacou a “inexorabilidade da integra- Amazônia. Esses impactos são ignorados quase na ção física da América do Sul” e a “inexorabilidade do sua totalidade em licenças ambientais de barragens, avanço da ocupação” (PCE et al., 2005, Vol. 2, p. II- bem como em projetos para obtenção de créditos de 85). Os relatórios implicam que os impactos ambien- carbono da energia hidrelétrica. tais são inevitáveis em todo caso, mesmo sem novas plantações de soja que seriam estimuladas no interior. Gases de efeito estufa No entanto, a AAE do projeto Rio Madeira men- Embora hidrelétricas sejam, muitas vezes, apre- cionou que a expansão agrícola (i.e., soja) estimu- sentadas como “energia verde”, que significa uma lada pela hidrovia resultará em perda de vegetação fonte de energia sem emissões de gases de efeito natural na Bolívia (ARCADIS Tetraplan et al., 2005, estufa, barragens, na verdade, emitem quantidades p. 169-170). Além de impactos na biodiversidade, a consideráveis de gases (por exemplo, Fearnside, possibilidade de afetar o regime hidrológico do rio 2012a; Gunkel, 2009). A quantidade de emissão Madeira é mencionada como um problema a qual o varia consideravelmente dependendo da localização desmatamento iria contribuir. A contramedida pro- geográfica, idade da barragem, entradas externas de posta era “ação integrada entre Brasil e Bolívia, que é nutrientes e de carbono e as características do reser- necessária para permitir a regulamentação ambiental vatório, tais como a vazão, o tempo de reposição da e territorial, que visa controlar a ocupação da terra e água, a área, a profundidade, as flutuações do nível manter a integridade das áreas protegidas”. Embora da água e a localização das turbinas e vertedouros. estas medidas sejam desejáveis para ajudar a reduzir Barragens em áreas tropicais emitem mais metano mesmo a perda ainda mais áreas, mas não compensa- que barragens em áreas temperadas e boreais (ver riam o impacto da hidrovia em estimular a conversão revisão de Barros et al., 2011; Matthews et al., 2005). de uma grande área de ecossistemas naturais em soja Bastviken et al. (2011) estimativaram que os reser- (por exemplo, Vera Dias et al., 2007). vatórios cobrem 500.000 km2 em todo o mundo Embora as áreas ao lado das barragens de Santo e emitem anualmente 20 milhões de toneladas de Antônio e Jirau foram reservadas para a possível fu- metano (CH4). Isso equivale a 136 milhões de to- tura construção de eclusas, o Ministério de Minas e neladas de carbono equivalente a CO2 se calculado Energia (MME) deixou claro que nenhuma deci- usando o potencial de aquecimento global potencial são foi tomada sobre a construção de eclusas (Brasil, (GWP) de metano de 25 a partir do quarto relató- MME, 2006b). A pergunta chave é se atrasar a de- rio do IPCC (Forster et al., 2007), ou 185 milhões cisão sobre as eclusas absolve os proponentes da de toneladas de carbono equivalente a CO2 se cal- barragem de qualquer responsabilidade de conside- culado usando o valor mais recente de 34 (Shindell rar os impactos da hidrovia nos estudos de impacto et al., 2009). No entanto, estes números incluem ambiental. O contraste é evidente entre o entusiasmo apenas as emissões das superfícies dos reservató- para as vantagens da hidrovia na hora de descrever rios de ebulição (bolhas) e difusão, não as emissões os benefícios das barragens e a falta de inclusão dos produzidas quando água rica em metano (sob pres- impactos da expansão da soja quando se fala sobre os são) da camada mais profunda na coluna de água custos ambientais das barragens. passa através das turbinas e dos vertedouros, o que pode mais do que dobrar o total (p. ex., Abril et al., Em suma, hidrelétricas amazônicas causam per- 2005; Fearnside, 2008, 2009a; Kemenes et al., 2008). da de vegetação não só pela inundação direta, mas No entanto, a quantidade de informação necessá- também por causa do desmatamento estimulado ria para estimativas confiáveis destas emissões para pela atração e o deslocamento da população e a aber- cada barragem dificulta, atualmente, uma estimati- tura de estradas até os canteiros de obras das bar- va global. Algum detalhe justifica-se para explicar a ragens. As barragens também permitem a abertura natureza do problema, tendo em conta os esforços Desenvolvimento 21 Hidrelétrico na Amazônia significativos da indústria de energia hidrelétrica absorção desde os Andes até o Oceano Atlântico, para retratar as barragens como tendo emissões mí- um padrão que tem sido atribuído a um gradien- nimas (ver: Fearnside, 2007, 2012a). te correspondente na fertilidade do solo (Malhi et al., 2006). Em 2010, o Brasil assinou um acordo Dióxido de carbono (CO2) com Peru para permitir que a empresa de energia As barragens emitem gases de efeito estufa em do governo brasileiro (ELETROBRÁS) construís- várias formas ao longo da vida destes projetos. Em se os primeiros cinco entre mais de uma dúzia de primeiro lugar, há as emissões da construção da bar- barragens planejadas na parte amazônica do Peru, e ragem devido ao cimento, aço e combustível utilizado. o atual presidente do Peru reafirmou o compromisso Estas emissões são superiores as de uma instalação com o Pacto (FSP, 2011b). equivalente para gerar a mesma quantidade de ele- As emissões do desmatamento podem ser subs- tricidade a partir de combustíveis fósseis ou de fontes tanciais, como resultado de deslocamentos de popu- alternativas como eólica e solar. As emissões da cons- lações e a estimulação do desmatamento nos arre- trução da barragem também ocorrerem vários anos dores de novas barragens e suas estradas de acesso, antes do início da produção de electricidade, que não como já mencionado. Emissões deslocadas podem é o caso para outras fontes. Sendo que o tempo tem ocorrer não só devido à perda do uso da terra, mas um grande valor para efeitos do aquecimento glo- também pela perda do uso da água, por exemplo, bal, esta diferença de tempo é adicionada ao impacto para substituir o peixe que foi produzido anterior- das barragens em relação à maioria das outras fontes mente pelo rio. Esta é uma preocupação para as (Fearnside, 1997). Emissões de construção foram es- barragens em construção no rio Madeira no Brasil timadas para o Brasil em 0,98 milhões de toneladas (Fearnside, 2009b). de carbono equivalente de CO2 para a represa de Belo Outra importante fonte de emissões é o carbono Monte e 0,78 milhões de toneladas para a represa de liberado a partir da decomposição das árvores mortas Babaquara/Altamira, se calculado sem ponderação pela inundação. Árvores geralmente permanecem no por tempo (Fearnside, 2009a). reservatório, onde parte delas se projetam acima da Quando uma paisagem terrestre é inundada por água e se decompõem na presença de oxigênio, libe- um reservatório, emissões e remoções pela paisagem rando o carbono como CO2. Árvores adicionais são pré-barragem devem ser deduzidas dos fluxos cor- afetadas na floresta próxima da margem, incluindo a respondente de gases do reservatório a fim de avaliar floresta, nas ilhas formadas no reservatório, devido à o impacto líquido da barragem. Em áreas de floresta ascensão do lençol freático. Esta adição é maior em tropical, o balanço de carbono da vegetação é um reservatórios com um extenso litoral e muitas ilhas, fator crítico. Na década de 1990, muitos acreditavam como é o caso da barragem de Balbina (Feitosa et que a Amazônia era um ótimo receptor de carbono al., 2007). A liberação de carbono pela morte das atmosférico, o que aumentaria o impacto líquido so- árvores começa quando o reservatório estiver cheio bre o aquecimento global da conversão de florestas inicialmente (antes de qualquer geração de eletrici- para outros usos, incluindo reservatórios. No entan- dade), fazendo com que a maior parte das emissões to, posteriormente, a correção de alguns problemas seja produzida nos primeiros anos de vida do reser- em técnicas de medição reduziram as estimativas de vatório. Devido ao valor do tempo, isso causa um absorção da floresta em mais do que cinco vezes, e já substancial impacto inicial na geração hidrelétrica, não mais se acredita que a vegetação seja, em média, em comparação com a geração a partir de combus- um sumidor importante de carbono (e.g., Araujo et tíveis fósseis, sendo que combustíveis fósseis lançam al., 2002; Fearnside, 2000; Kruijt et al., 2004). a grande maioria do seu CO2 na mesma hora que a eletricidade é produzida (Fearnside, 1997). De 1990 A quantidade de absorção de carbono varia subs- (o ano padrão dos inventários iniciais das emissões tancialmente entre diferentes locais na Amazônia de gases de efeito estufa, nos termos da Convenção (Ometto et al., 2005). As maiores taxas de absor- do Clima), a edição anual da repartição das par- ção foram estimadas por medições do crescimento tes das árvores que se projetam para fora da água das árvores no Peru e Equador (Phillips et al., 1998, (sem contar a mortalidade na margem) foi esti- 2004); Infelizmente, não há nenhuma torre nestes mada em 6,4 milhões de toneladas de carbono em locais para fornecer medições de correlação de vór- Balbina (Fearnside, 1995), 1,1 milhões de tonela- tices comparáveis às medidas no Brasil. As taxas de das em Samuel (Fearnside, 2005a) e 2,5 milhões de 22 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras toneladas em Tucuruí (Fearnside, 2002b). A represa de folhas e madeira morta. Uma parte disto é con- de Babaquara/Altamira, “não oficialmente” previs- vertida em carbono do solo orgânico, e outra parte ta para a construção, a montante de Belo Monte, é exportada diretamente ainda em forma de necro- junto com Belo Monte, é susceptível de se tornar massa. Quantidades substanciais de serapilheira não a “campeã” destas emissões de decomposição sobre decompostas são transportadas pela água pluvial a água, com uma média estimada em 9,6 milhões para córregos durante chuvas pesadas (Monteiro, de toneladas de carbono anualmente derivada de 2005). Uma parte deste carbono termina arma- árvores inundadas, mais 0,07 milhões toneladas de zenada em sedimentos no fundo do reservatório. emissões da margem durante os primeiros dez anos Este armazenamento de sedimentos acaba sendo (Fearnside, 2009a, 2011a). um benefício de carbono de barragens (por exem- A água do reservatório também emite dióxido plo, Gagnon, 2002). No entanto, uma contabilidade de carbono, através de bolhas (ebulição) ou difu- completa exigiria a dedução da parcela de carbono são (emanação) em toda a superfície do reservató- que, sem a barragem, teria sido transportado pelo rio rio pela água liberada através das turbinas e verte- e depositado em sedimentos marinhos. Uma parte douros. Este CO2 se origina de fontes diferentes, e teria deixado a água do rio a jusante: a água no rio é importante evitar a dupla contagem do carbono. Amazonas é conhecida como um importante emis- Uma parte é a decomposição de árvores submersas sor de CO2 (Richey et al., 2002). inicialmente presentes no reservatório, seja como Outras fontes de carbono renováveis incluem CO2 produzido diretamente quando a biomassa das a fotossíntese do fitoplâncton, assim como as algas árvores se decompõe na camada superficial da água, e macrófitas (plantas aquáticas) no próprio reser- que contém oxigênio, ou indiretamente se a biomas- vatório. Também é uma fonte renovável de plantas sa decompõe em camadas profundas onde há pouca herbáceas que crescem na zona de deplecionamento ou nenhuma concentração de oxigênio. O carbono é (drawdown zone). Esta é uma área pantanosa que é liberado como metano e, mais tarde, uma parte disso exposta ao redor da borda do reservatório sempre é transformada em CO2 por bactérias nas camadas que a água é retirada para geração de energia durante superficiais. Acredita-se que esta via de emissão, com a estação seca. Pequenas plantas herbáceas, como er- o carbono na biomassa das árvores sendo transfor- vas, crescem rapidamente nesta área quando o nível mado em metano dissolvido, e mais tarde em CO da água desce. A área de deplecionamento pode ser 2 dissolvido, seja a principal fonte de CO na água em enorme: 659,6 km2 em Balbina (Feitosa et al., 2007) 2 Balbina (Kemenes et al., 2011). e 3.580 km2 no reservatório “não-oficialmente” pla- Dióxido de carbono também é liberado a partir nejado de Babaquara/Altamira (Fearnside, 2009a, do carbono do solo alagado. Assim como no caso 2011a). Quando a água sobe de novo, as plantas das árvores, é uma fonte fixa que eventualmente se morrem e, em seguida, se decompõem rapidamen- esgotará. A questão também é maior nos primeiros te, porque possuem um tecido vegetal macio (em anos. Na barragem de Petit Saut, na Guiana contraste com a madeira, que contém lignina e se Francesa, pesquisadores acreditam que o carbono do decompõe muito lentamente sob a água). Quando o solo é a principal fonte de CO e de metano produ- oxigênio está presente na água, este carbono é lan-2 zido no pulso emissão inicial depois da inundação çado na forma de CO2, mas no caso de plantas que (Tremblay et al., s/d [C. 2005]). estão enraizadas no fundo, grande parte da decom-posição ocorrerá na parte inferior do reservatório Emissões de CO2 na água incluem o carbono em água sem oxigênio, produzindo metano. Assim lançado a partir de fontes renováveis, além do car- como funciona também com o metano proveniente bono de fontes fixas, tais como árvores e carbono de outras fontes, parte do metano pode ser oxida- do solo. O carbono também entra no reservatório da em CO2 por bactérias antes de atingir a super- na forma de carbono orgânico dissolvido (a partir fície. O resto será lançado como metano a partir de de lixiviação) e de sedimentos da erosão do solo uma zona de deplecionamento que representa uma em toda a bacia hidrográfica a montante do reser- verdadeira “fábrica de metano” que continuamente vatório. Este carbono está constantemente sendo converte o CO2 atmosférico em metano (CH4), que removido da atmosfera pela fotossíntese realizada é um componente muito mais poderoso em cau- pela vegetação. O carbono incorporado à vegetação sar o aquecimento global por cada tonelada de gás é depois depositado no chão da floresta na forma (Fearnside, 2008). Desenvolvimento 23 Hidrelétrico na Amazônia O CO2 na água que provém de fontes renová- de 100 anos equivalente a 298 toneladas de gás de veis, como a serapilheira da floresta, fitoplâncton, CO2 (Forster et al., 2007). Reservas amazônicas, por- algas, macrófitas (vegetação aquática) e a vegetação tanto, emitem 2,26 Mg ha-1 ano-1 de carbono equiva- na zona de deplecionamento, deve ser distinguido lente a CO -1 -12, contra 0,74 Mg ha ano emitido pela do CO2 proveniente de fontes fixas, como árvo- floresta, deixando uma emissão líquida de 1,52 Mg res inundadas e carbono do solo. A parte de fon- ha-1 ano-1 de carbono equivalente a CO2. Para um tes fixas representa uma contribuição líquida para o reservatório de 3.000 km2, como Balbina, isso repre- aquecimento global. No entanto, o CO2 das fontes senta quase 500 mil toneladas de carbono equivalente renováveis não representa uma contribuição para o a CO2 por ano. As medições das emissões de N2O aquecimento global porque a mesma quantidade de no reservatório de Petit Saut, na Guiana Francesa, CO2 que foi removido da atmosfera pela fotossínte- e no reservatório de Fortuna, no Panamá, indicam se simplesmente retorna para a atmosfera da mesma emissões de aproximadamente duas vezes as dos so- forma (CO2) após um período de meses ou anos. los sob florestas tropicais (Guerin et al., 2008). As Parte do mesmo carbono é contabilizada duas vezes emissões dos solos da floresta variam consideravel- quando a biomassa das árvores mortas é quantifi- mente entre localidades, o que indica a importância cada como uma emissão de “desmatamento”, calcu- de medidas específicas para estimar as emissões pré- lada baseada na diferença entre a biomassa da flo- -represa. Diferente de CO2 e CH4, quase a totalidade resta e a biomassa da área alagada, como no caso das emissões de N2O de barragens ocorre através da da metodologia do IPCC (Duchemin et al., 2006; superfície do reservatório, e não pela desgaseificação IPCC, 1997) utilizada pelo Brasil nos inventários de jusante da barragem (Guerin et al., 2008). O in- sob o Convenção do Clima (Brasil, MCT, 2004, tervalo de transmissão é grande: considerando apenas 2010). Cálculos do impacto de reservatórios que as emissões da superfície do reservatório, a proporção quantificam todo este CO2 como sendo um impacto dos efeitos do aquecimento global de N2O represen- no aquecimento global (por exemplo, Saint Louis ta entre 29 e 31% da emissão total do CO2, CH4 e et al., 2002; dos Santos et al., 2008; Kemenes et al., N2O das superfícies de quatro reservatórios em áre- 2011) sobrestimam esta parte da emissão. Deve ser as de floresta tropical: Tucuruí, Samuel, Petit Saut e uma prioridade as pesquisas necessárias para melhor Fortuna (Guerin et al., 2008). Emissões de N2O são quantificar as fontes de carbono das quais são deri- muito mais baixas em reservatórios que não estão lo- vadas as emissões de CO2 em reservatórios. Até que calizados em áreas de floresta tropical. essas informações estejam disponíveis, este autor es- colheu contabilizar apenas o metano, e não o CO2, Metano (CH4) no caso das emissões da superfície do reservatório e da água que passa através das turbinas e vertedou- A emissão de metano é uma importante contri- ros (por exemplo, Fearnside, 2002b, 2005b, 2009a, buição das barragens hidrelétricas ao aquecimento 2011a). Dióxido de carbono só é contado a partir global. Metano (CH4) é formado quando a matéria da decomposição das árvores mortas que se decom- orgânica se decompõe sem o oxigênio estar presente, põem acima da água. por exemplo, no fundo de um reservatório. A água em um reservatório é estratificada em duas camadas: Óxido nitroso (N O) uma camada de superfície (epilímnio) onde a água 2 está mais quente e está em contato com o ar, e uma Óxido nitroso (N2O) é outro gás de efeito estufa camada inferior (hipolímnio) que fica abaixo de um com uma contribuição dos reservatórios. Superfícies limite divisório (a termoclina). A água abaixo deste de represas amazônicas emitem uma média de 7,6 kg divisório é muito mais fria. Se expressa em termos N O km-2 dia- 1 (Lima et al., 2002), ou 27,6 kg ha-12 do conteúdo de oxigênio dissolvido, a delimitação, ano-1. O solo da floresta tropical emite 8,7 kg ha-1 que ocorre em aproximadamente na mesma profun- ano-1 (Verchot et al., 1999, p. 37). Portanto, os reser- didade de 2 a 10 m, e é conhecido como a “oxicli- vatórios emitem três vezes mais do que as florestas na”. Água abaixo da termoclina (ou a oxiclina) não que substituem. Tendo em conta o valor para o po- se mistura com a água de superfície, exceto durante tencial de aquecimento global de óxido nitroso adota- eventos ocasionais cuja estratificação é quebrada e a do pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças água do fundo sobe para a superfície, matando mui- Climáticas (IPCC) no seu quarto relatório, cada to- tos peixes. Na Amazônia, isso acontece durante o nelada de N2O tem um impacto durante um período fenômeno das “friagens”, que são uma característica 24 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras climática na parte ocidental, mas não na parte orien- Esta é a principal explicação, por exemplo, porque o tal da Amazônia. Balbina situa-se aproximadamente grupo de pesquisa montado por FURNAS foi capaz na extremidade leste deste fenômeno e foi afetada de afirmar que as hidrelétricas são “100 vezes” me- por mortes de peixes durante as friagens. Em condi- lhores do que os combustíveis fósseis em termos de ções normais, a água fria na parte inferior é separada aquecimento global (Garcia, 2007). Na verdade, as abaixo da termoclina e o oxigênio dissolvido na água medições de fluxo começaram em distâncias abaixo desaparece rapidamente através da oxidação de uma da barragem que variaram de 50 m nas barragens de parte de folhas e outra matéria orgânica no fundo Estreito, Furnas e Peixoto (dos Santos et al., 2009, p. do reservatório. Após isso, essencialmente toda a de- 835; Ometto et al., 2011) a 500 m nas represas de composição deve terminar no CH4 em vez de CO2. Serra da Mesa e Xingó (da Silva et al., 2007). A única Altas concentrações do gás podem ser dissolvidas na maneira de estimar a liberação sem esses desvios im- água do fundo do reservatório, porque a água é fria. portantes é de baseá-la na diferença entre a concen- Lagos naturais e áreas úmidas, incluindo a vár- tração de CH4 na água acima e abaixo da barragem zea (área de inundação anual em rios amazônicos de (por exemplo, Fearnside, 2002b; Fearnside & Pueyo, água branca) e o pantanal (zonas húmidas na bacia 2012; Kemenes et al., 2007). do rio Paraná), são importantes fontes globais de As estimativas da magnitude do impacto de metano (Devol et al., 1990; Hamilton et al., 1995; barragens amazônicas no aquecimento global têm Melack et al., 2004; Wassmann & Martius, 1997). variado enormemente. A maioria das pessoas que Uma usina hidrelétrica, no entanto, é uma fonte tomam ciência de diferentes estimativas através da substancialmente maior de CH4 por hectare de água imprensa não têm nenhuma informação sobre como devido a uma diferença crucial: a água que sai do re- as medições subjacentes foram feitas e o que está servatório é extraída do fundo, em vez da superfície. incluído ou omitido de estimativas. É essencial ana- Lagos naturais e reservatórios emitem CH4 através lisar os estudos originais por todos os lados do deba- de bolhas e difusão da superfície, mas no caso de te. Informações sobre o amplo debate, considerando uma represa existe uma fonte adicional de CH4 da ambos os lados, sobre as emissões de gases de efei- água passando através das turbinas e vertedouros. to estufa estão disponíveis na seção “Controvérsias Eles tiram água de abaixo da termoclina, onde ela amazônicas” do site http://philip.inpa.gov.br . está saturada com metano. O reservatório é como uma banheira, onde a tampa é retirada do ralo e a Uma breve revisão das razões para os resulta- água drena do fundo, em vez de transbordar da parte dos muito díspares é necessária. Em primeiro lugar, superior, como no caso de um lago. Como a água a omissão das emissões oriundas da água que passa que sai das turbinas vem da camada aprisionada através das turbinas e vertedouros é uma razão que abaixo do termoclina e está com alta concentração deveria ser óbvia. Essa omissão tem sido uma carac- de metano, a diferença com a pequena concentração terística de longa data das estimativas oficiais brasi- no ár é muito grande e boa parte do metano é rapi- leiras, como destacado no memorável debate sobre damente liberada para a atmosfera logo abaixo das este assunto na revista Climatic Change (ver: Rosa turbinas. Ao longo de um tempo maior, o aqueci- et al., 2004, 2006; Fearnside, 2004, 2006b). A omis- mento gradual da água que flui a jusante no rio abai- são do mesmo se aplica para as emissões de gases de xo da barragem produzirá uma redução adicional na efeito estufa estimadas para barragens na primeira solubilidade, e, portanto, um aumento na liberação comunicação nacional do Brasil sob a Convenção de de gás (Princípio de Le Chatalier). Clima (Brasil, MCT, 2004; Rosa et al., 2002), com resultados mais de dez vezes inferiores às estimativas Para o gás dissolvido na água que flui a jusante, desse autor para barragens como Tucuruí e Samuel abaixo de uma represa, a liberação para a atmosfera é (Fearnside, 2002b, 2005a). A omissão das turbinas e rápida o suficiente para que a maior parte do CH4 es- vertedouros foi a principal explicação. O importante cape de ser convertida em CO2 por bactérias na água. papel desempenhado pelas emissões de água lan- Na verdade, a emissão é de forma imediata na saída çadas por turbinas é aparente a partir de medições das turbinas ou mesmo dentro das próprias turbinas. diretas feitas acima e abaixo de barragens em Petit Esta é a razão por que a medição da vazão de gás da Saut, na Guiana Francesa (Abril et al., 2005; Delmas superfície da água no rio abaixo da barragem não é et al., 2004; Galy-Lacaux et al., 1997, 1999; Guérin suficiente para medir o impacto das emissões de água et al., 2006) e em Balbina, no Brasil (Kemenes et al., que passa pelas turbinas, pois escapa muito da emissão. 2007, 2008, 2011). Desenvolvimento 25 Hidrelétrico na Amazônia No primeiro inventário brasileiro de gases de firme. O solo sob floresta de terra firme é normal- efeito estufa, as emissões de energia hidrelétrica fo- mente considerado como um sumidouro de metano, ram calculadas para nove de 223 barragens no País, ao invés de uma fonte (Keller et al., 1991; Potter et mas os resultados foram confinados a uma caixa de al., 1996). Uma estimativa irrealisticamente alta para texto e não foram incluídas na contagem das emis- a emissão pré-barragem leva a uma subestimação do sões nacionais (Brasil, MCT, 2004, p. 152-153). No impacto líquido. No caso do EIA de Belo Monte, segundo inventário nacional (Brasil, MCT, 2010), as 48 mg CH4 m-2 dia- 1 são subtraídas das 70,7 mg as emissões de hidrelétricas foram completamente CH m-24 dia-1 estimadas no EIA para a emissão do omitidas. No entanto, embora o impacto da libera- reservatório (o que é subestimado por várias razões, ção de CO2 das árvores mortas por reservatório seja incluindo a utilização como metade da estimativa uma importante omissão de muitas discussões sobre um conjunto de medidas no reservatório de Xingó, o papel das barragens no aquecimento global, no localizado na zona semiárida da região nordeste, caso do segundo inventário nacional, a liberação de onde as emissões seriam muito menores em uma CO2 da perda de biomassa na conversão de florestas barragem amazônica), deixando apenas 70,7-48,0 = em “zonas úmidas” foi incluída como forma de mu- 22,7 mg CH m-24 dia-1 como emissão líquida. dança de uso da terra. Outra fonte de baixas estimativas para as emis- Exagero da emissão de pré-represa é outra ma- sões das hidrelétricas no Brasil é uma correção da neira que as emissões líquidas de barragens podem lei potência matematicamente errada que foi aplica- ser subestimadas. Como já mencionado, as zonas da repetidamente nos cálculos oficiais das emissões úmidas naturais são importantes fontes de metano, e de ebulição e difusão das superfícies de reservató- isso tem sido usado para afirmar que a terra inundada rios brasileiros. Isso vem de uma tese de doutorado por uma represa teria emitido grandes quantidades (dos Santos, 2000), que é a base de um relatório ofi- de metano de qualquer forma, mesmo se a barragem cial da ELETROBRÁS (Brasil, ELETROBRÁS, não fosse construída. Por exemplo, a Associação 2000). O relatório calcula e tabula as emissões para Internacional de Hidrelétricas (IHA, sigla em in- todas as 223 grandes barragens no Brasil naquela glês) considera as emissões de usinas hidrelétricas época, com uma área total de superfície de água de como sendo uma questão de “soma zero”, porque 32.975 km2, que é uma área maior do que a Bélgica. não excederiam as emissões pré-represa (Gagnon, A correção errada continua a ser aplicada (por 2002). No Estudo de Impacto Ambiental (EIA) exemplo, dos Santos et al., 2008). Esses ajustes da para a barragem de Belo Monte, foi presumida que ELETROBRÁS reduzem as estimativas de emis- a área a ser inundada poderia emitir 48 mg CH4 m-2 são para as superfícies dos reservatórios em 76% em dia-1 antes da criação do reservatório, com base em comparação com a média simples dos valores de dois conjuntos de medições da emissão da superfície medição no mesmo estudo (ver: Pueyo & Fearnside, do rio e do solo em locais próximo à margem do rio 2011). O problema é que as bolhas da superfície (Brasil, ELETROBRÁS, 2009, Apêndice 7.1.3-1; de reservatórios geralmente ocorrem em episódios ver: Fearnside, 2011a). A maioria das medições das esporádicos, com intenso borbulhamento durante emissões do solo na época das chuvas foram em so- um curto período, seguido por longos períodos com los encharcados, recentemente expostos pela queda poucas bolhas. Assim, o número de amostras é inevi- sazonal do nível de água (Brasil, ELETROBRÁS, tavelmente insuficiente para representar esses even- 2009 Apêndice 7.1.3-1, p. 72), resultando em sua tos relativamente pouco frequentes, e uma correção alta emissão de CH4 e influenciando fortemente na pela lei de potência pode ser aplicada aos dados de média utilizada por toda a superfície da terra a ser medição. No entanto, eventos que são raros, porém inundada por Belo Monte. No entanto, hidrelétricas de alto impacto, aumentam levemente a média real geralmente são construídas em locais com solos bem das emissões, ao invés de reduzi-la. Na verdade, há drenados, sendo que locais com corredeiras e cacho- pelo menos cinco graves erros matemáticos no cál- eiras são escolhidos em vez de zonas úmidas planas. culo da ELETROBRÁS, incluindo uma inversão Isso ocorre porque a topografia íngreme resulta em do sinal de positivo para negativo. Observe, entre- maior produção de eletricidade. O solo sazonalmen- tanto, que a subestimação dos erros na aplicação da te inundado pelo rio não pode ser generalizado para correção da lei de potência não se aplica só ao me- a área do reservatório, pois na Amazônia os reserva- tano, mas também às bolhas de CO2, que nem sem- tórios geralmente ficam em áreas de floresta de terra pre é uma contribuição líquida para o aquecimento 26 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras global. A aplicação correta da lei de potência resulta para converter toneladas de metano em toneladas em estimativas das emissões de metano superficial de CO2 equivalente. Os valores para essa conversão 345% maiores do que as estimativas relatadas pela aumentaram em sucessivas estimativas do Painel ELETROBRÁS (ver: Pueyo & Fearnside, 2011). Intergovernamental sobre Mudança Climática Metodologia de amostragem inadequada é outra (IPCC) e em publicações desde o último relatório maneira que pode levar a valores para emissão que do IPCC em 2007. Conversões baseiam-se no hori- são várias vezes menores do que deveriam ser. Como zonte de tempo de 100 anos, adotado pelo protocolo já mencionado, estimar as emissões das turbinas e de Quioto. O relatório intercalar do IPCC em 1994 vertedouros baseando-se apenas em medições de flu- estimou um valor de 11 para o GWP do metano, ou xo na superfície da água a jusante de uma barragem seja, o lançamento de uma tonelada de metano teria está destinado a perder a maior parte das emissões, o mesmo impacto sobre o aquecimento global, como resultando em grandes subestimativas do impacto o lançamento de 11 toneladas de CO2 (Albritton et total. Este é um importante fator para as baixas es- al., 1995). Isto aumentou para 21 no segundo re- timativas feitas por FURNAS e ELETROBRÁS. latório de avaliação em 1995, usada pelo Protocolo Mesmo para estimativas baseadas em concentração de Quioto (Schimel et al., 1996). Em 2001 o valor (incluindo as minhas) têm subestimado as emissões foi aumentado para 23 no terceiro relatório de ava- devido à metodologia de amostragem utilizada para liação (Ramaswamy et al., 2001) e depois para 25 obter a água junto ao fundo do reservatório. O mé- no quarto relatório de avaliação em 2007 (Forster et todo quase universal é a garrafa Ruttner, que é um al., 2007). Desde então, um trabalho publicado na tubo com “portas” que se abrem em cada extremi- revista Science que inclui efeitos indiretos que não dade. Tubo é submergido através de um cabo com eram considerados no quarto relatório de avalia- duas portas, em seguida, as portas são fechadas e a ção tem o valor estimado em 34, com o intervalo garrafa é puxada para a superfície. Então, a água para de incerteza que se estende até um valor de mais análise química é removida. O problema é que os de 40 (Shindell et al., 2009). Em comparação com gases dissolvidos na água formam bolhas quando a o valor de 21, adotado pelo Protocolo de Quioto pressão diminui dentro da garrafa Ruttner enquanto para o período 2008-2012, o valor de 34 representa é puxada para a superfície. O gás vaza em torno de um aumento de 62%, ou um tremendo aumento no portas (que não são hermeticamente seladas), mas impacto da energia hidrelétrica. Para hidrelétricas, em qualquer caso este sempre seria perdido quando emissão de metano representa o maior impacto, en- a água fosse extraída na superfície (com uma serin- quanto que, no caso dos combustíveis fósseis, quase ga) para a determinação do “espaço de cabeça” (head toda a emissão está na forma de CO2. Cabe lembrar space) do volume de gás e produtos químicos de que estes valores para o impacto de metano são ba- análise. Esse problema já foi abordado recentemen- seados em um horizonte de tempo de 100 anos, sem te por Kemenes et al. (2011). Alexandre Kemenes desconto pelo valor do tempo, como foi adotado na inventou uma “garrafa Kemenes”, que recolhe a água regulamentação do Protocolo de Quioto. No entan- em uma seringa que é submergida até a profundi- to, o impacto relativo de metano sobe em muito se a dade necessária. A seringa tem um mecanismo de atenção for focada nas próximas décadas: o valor do mola que puxa a água para a amostra, e as bolhas de quarto relatório do IPCC sobe de 25 para 72 se for gás que emergem são capturadas e medidas quando considerado 20 anos no lugar de 100. Sendo que o a amostra é recolhida na superfície. Uma compara- aquecimento global precisa ser controlado nessa es- ção dos dois métodos de amostragem indica que a cala de tempo mais curta se for para evitar consequ- concentração média de metano para uma amostra ências desastrosas, esses valores mais altos devem ser colhida a 30 m de profundidade é 116% superior considerados na tomada de decisões, o que pesaria se for medida com a garrafa Kemenes, dobrando a fortamente contra as hidrelétricas. quantidade de metano estimada na água que passa através das turbinas em Balbina. A diferença seria Comparações entre barragens ainda maior para barragens com turbinas em pro- e combustíveis fósseis fundidades maiores, como no caso de Tucuruí. O valor do tempo é crucial para comparar o im- Outro fator importante que afeta o impacto pacto sobre o aquecimento global de hidroeletrici- calculado de hidrelétricas é o potencial de aque- dade e combustíveis fósseis ou outras fontes de ener- cimento global (GWP) do metano. Este é o fator gia. Energia hidrelétrica tem uma enorme emissão Desenvolvimento 27 Hidrelétrico na Amazônia nos primeiros anos devido à morte de árvores, à de- O comportamento normal em negócios não é composição subaquática do carbono do solo e das consistente com investimentos nessa escala se as folhas de vegetação original e a explosão de plantas barragens, na verdade, estariam perdendo dinhei- aquáticas (macrófitas) devido à maior fertilidade de ro na ausência de um financiamento adicional do água. Nos anos seguintes, esta emissão será reduzida MDL. A ideia de que essas barragens são abnegadas para um nível inferior e será mantida por tempo in- contribuições para os esforços internacionais para determinado a partir de fontes renováveis, tais como conter o aquecimento global ultrapassam os limites a inundação anual da vegetação macia na zona de da credibilidade. Quando os créditos de carbono são deplecionamento. O enorme pico de emissões nos concedidos para projetos, como represas, que iriam primeiros anos cria uma “dívida” que será paga len- para frente de qualquer forma na ausência dos cré- tamente na medida em que a geração de energia ditos de carbono, os países que compram os créditos da usina substitui a geração de energia a partir de estão autorizados a emitir essa quantidade de carbo- combustíveis fósseis nos anos subsequentes. O tem- no para a atmosfera sem qualquer emissão equiva- po decorrido pode ser substancial. Por exemplo, no lente realmente ter sido evitada. O resultado é uma caso de Belo Monte junto com a primeira barragem emissão de mais gases de efeito estufa na atmosfera a montante (Babaquara/Altamira), o tempo neces- e um desperdício dos fundos escassos que o mundo sário para saldar a dívida da questão inicial é esti- está atualmente disposto a dedicar à luta contra o mado em 41 anos (Fearnside, 2009a, 2011a). Este aquecimento global. número subestima o impacto real que cálculo usa o valor de 21 do Protocolo de Quioto como o GWP O controle do aquecimento global exigirá uma do metano e porque usa as concentrações de metano correta contabilização das emissões líquidas ao re- medidas com as tradicionais garrafas Ruttner. Um dor do mundo: qualquer emissão que é excluída ou período de 41 anos tem uma importância enorme subestimada implica que os acordos de mitigação, para a Amazônia, onde a floresta está ameaçada por projetados para conter o aumento da temperatura alterações climáticas projetadas nesta escala de tem- dentro de um limite especificado (como o limite po (por exemplo, Fearnside, 2009c). Uma fonte de de 2 °C convencionada, atualmente, na Convenção energia que demora 41 anos ou mais para zerar a do Clima) simplesmente não impedirão que siga o dívida de carbono não pode ser considerada “energia aumento da temperatura. A Amazônia é um dos verde” em termos de aquecimento global. lugares que se espera sofrer as consequências mais Gases de efeito estufa emitidos diretamente por graves, se nós falharmos nesta responsabilidade. hidrelétricas não são a única maneira em que as bar- ragens aumentam o aquecimento global. Créditos AGRADECIMENTOS de carbono são concedidos para hidrelétricas pelo Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), Este documento foi preparado para o no âmbito do Protocolo de Quioto, que se baseiam “Painel Internacional de Meio Ambiente e em presunções de que (1) as barragens não seriam Energia: Um Diagnóstico dos Principais Projetos construídas sem o financiamento do MDL e (2) Hidroenergéticos”, Bogotá, Colômbia, 15-16 de abril ao longo da duração de 7 a 10 anos dos projetos de de 2013 (Fearnside, 2014). Porções desta discussão são carbono, as barragens hidrelétricas teriam emissões adaptações de Fearnside, 2011b, 2012d, s/d. Agradeço mínimas em comparação com a eletricidade gera- ao International Rivers por permitir a publicação das da por combustíveis fósseis, que supostamente seria Figuras 1 e ao Matt Finer e Clinton Jenkins pela deslocada. Estes pressupostos são falsos, especial- Figura 2. O Marcelo Augusto dos Santos preparou a mente no caso de barragens tropicais, tais como as Figuras 4. As pesquisas do autor são financiadas pelo previstas na Amazônia. No caso das barragens de Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico Teles Pires, Jirau e Santo Antônio, todas já estavam e Tecnológico (CNPq) (proc. 304020/2010-9; em construção quando foram solicitados créditos 573810/2008-7) e a Fundação de Amparo à Pesquisa de carbono. Estes casos servem como exemplos do Estado do Amazonas (FAPEAM) (proc. 708565). concretos, indicando a necessidade de reforma das Agradeço ao Paulo Mauricio Lima de Alencastro normas do MDL, eliminando o crédito para hi- Graça pelos comentários. Esta é uma tradução de drelétricas (Fearnside, 2012b,c, 2013). Fearnside (2014). 28 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras LITERATURA CITADA No. 1329-R-FIN-PLD-15-01. ANA, Brasília, DF, Brasil. 56 p. Disponível em: http://central2.to.gov.br/arquivo/31/933 Abril, G., F. Guérin, S. Richard, R. Delmas, C. Galy-Lacaux, P. Gosse, A. Tremblay, L. Varfalvy, M.A. dos Santos & B. Brasil, ELETROBRÁS (Centrais Elétricas Brasileiras S/A). Matvienko. 2005. Carbon dioxide and methane emissions 1986. Plano de Recuperação Setorial. Ministério das Minas and the carbon budget of a 10-years old tropical reservoir e Energia, Centrais Elétricas do Brasil (ELETROBRÁS), (Petit-Saut, French Guiana). Global Biogeochemical Cycles 19: Brasília, DF, Brasil. GB 4007, doi: 10.1029/2005GB002457 Brasil, ELETROBRÁS (Centrais Elétricas Brasileiras S/A). 1987. Agostinho, A.A., E.E. Marques, C.S. Agostinho, D.A. de Plano 2010: Relatório Geral. 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Social impacts of Brazil’s Tucuruí Dam. Environmental Management 24(4): 483-495. Doi: 10.1007/s002679900248 38 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO INTRODUÇÃO: A HIDRELÉTRICA DE TUCURUI A hidrelétrica de Tucuruí, criada em 1984 no Estado do Pará, continua sendo uma fonte de con- A hidrelétrica de Tucuruí, que bloqueou o rio trovérsia. A maioria dos benefícios da energia vão Tocantins em 1974, inundou 2.430 km2 incluindo para empresas de alumínio, onde apenas um mon- parte da Área Indígena Parakanã (Fig. 1). O reser- tante de emprego minúsculo é gerado. Apresentado vatório está localizado no Pará central, entre 3o43’ freqüentemente por autoridades como um modelo e 5o15’Sul e 49o12’ e 50000’Oeste. A casa de força para o desenvolvimento hidrelétrico devido à quan- tem 4.000 megawatts (MW) de capacidade insta- tidade substancial de energia que gera, os impactos lada na sua fase inicial (Tucuruí-I), que aumentaria sociais e ambientais do projeto são igualmente subs- para 8.000 MW em uma segunda fase planejada tanciais. O exame do caso de Tucuruí revela uma sobre-estimativa sistemática dos benefícios e uma (Tucuruí-II). O Brasil tem planos ambiciosos para sub-estimativa dos impactos pelas autoridades. A o desenvolvimento hidrelétrico na Amazônia, e a Tucuruí oferece muitas lições ainda não aprendidas experiência com Tucuruí contém muitas lições que para o desenvolvimento hidrelétrico na Amazônia. precisam ser aprendidas caso o País queira tomar decisões sábias sobre esses desenvolvimentos. Palavras-Chave: Barragens, Tucuruí, Reservatórios, Reassentamento, Mansonia, Mercúrio, Hidrelétricas, Sempre houve indicações de que Tucuruí não Amazônia é a maravilha descrita pela ELETRONORTE, a Figura 1. O reservatório de Tucuruí e a Amazônia Legal oriental com os locais mencionados no texto. Impactos Socias 39 da Hidrelétrica de Tucuruí companhia elétrica no norte do Brasil. Antes da cons- desta obra, portanto, precisam ser considerados na trução da barragem, o Banco Mundial foi sondado avaliação das propostas para Tucuruí-II. para o financiamento, mais recusou (R.J.A. Goodland, Tucuruí-II foi apresentado pela comunicação pessoal, 1986). Os residentes ao longo ELETRONORTE até recentemente como uma das margens do reservatório têm uma longa série de mera continuação do projeto de construção já em reclamações, e acamparam durante dois anos na en- andamento antes de entrar em vigor em 23 de janei- trada da sede da ELETRONORTE para reivindicar ro de 1986, a exigência de um Relatório de Impactos locais alternativos de re-assentamento. A economia sobre o Meio Ambiente (RIMA). Em 1998, pre- das vilas a jusante da barragem foi destruída, criando, parações para elaboração de um RIMA foram ini- entre e a população do baixo rio Tocantins, uma hos- ciadas (Andrea Figureido, afirmação pública, 25 tilidade quase unânime contra a ELETRONORTE. de maio de 1998). No entanto, em 14 de junho de Em 1991, uma Comissão Parlamentar de Inquérito 1998, o Presidente da República liberou as verbas (CPI) na Assembléia Legislativa do Estado do Pará para construção de Tucuruí-II (Indriunas, 1998), investigou os problemas causados pela barragem e obviamente antes de completar o RIMA. endossou uma longa lista de reclamações. Por últi- mo, o Tribunal Internacional das Águas condenou o Como é normal no Brasil até hoje, os impactos governo brasileiro pelos impactos de Tucuruí, na sua de barragens a montante não seriam considerados sessão de 1991 em Amsterdã (Internacional Water no RIMA a ser preparado para Tucuruí-II. Cada Tribunal, 1991). Embora o Tribunal tenha apenas uma das barragens rio acima seria obrigada a ter o autoridade moral, a condenação foi foco de atenção seu próprio RIMA antes de ser construída. No en- mundial sobre a existência de um padrão subjacente tanto, estas barragens são, de fato, conseqüências de de problemas sociais e ambientais causados por este uma decisão que está sendo tomada sobre Tucuruí- empreendimento (Informe Jurídica, 1992). II sem um RIMA destes impactos a montante. É necessária a exigência de avaliações de impactos A área de 2.430 km2 referente a Tucuruí diz res- para assegurar que as conseqüências das decisões peito ao reservatório no nível de Tucuruí-I, 72 m aci- iniciais estejam plenamente incluídas, como no caso ma do nível médio do mar. Se o projeto de Tucuruí- de deslanchar o desenvolvimento de uma bacia hi- II for implementado, o nível da água seria levantado drográfica pela decisão inicial sobre construção de para 74 m acima do nível do mar, segundo o plano uma barragem na parte mais baixa de uma cadeia original. Elevar o nível da água para 74 m aumen- de barragens. O exemplo mais dramático é o caso taria a área inundada em 205 km2, resultando em do rio Xingu, onde grandes áreas de terra indígena uma área de 2.635 km2 (Brasil, ELETRONORTE, seriam inundadas por barragens que se tornariam 1989a, p. 243). A ELETRONORTE tem reco- “necessárias” pela estrutura inicial (a proposta bar- nhecido, segundo informações informais, de que ragem de Belo Monte, antes denominada Kararaô) aumento do nível d’água acima do nível atual de 72 que aparece ser altamente atraente se visto isolada- m seria politicamente inviável, devido aos efeitos so- mente (Fearnside, 1989). bre deslocamentos de populações, e a empresa está planejando operar a configuração de Tucuruí-II sem IMPACTOS SOCIAIS aumentar o nível da água ( John Denys Cadman, comunicação pessoal, 1996). A menor quantidade População deslocada de água armazenada no reservatório de Tucuruí, em comparação ao plano original para Tucuruí-II, pre- A ELETRONORTE originalmente não in- sumivelmente seria compensada pela maior regula- cluiu nenhum estudo dos impactos sociais na sua ção do fluxo do rio por mais barragens a montante. avaliação da barragem (Brasil, ELETRONORTE, 1974). Em 1977, dois meses após o início da cons- Independente de se inundar mais área pelo trução, um único consultor (Robert Goodland) foi reservatório de Tucuruí propriamente dito, o pro- contratado para preparar uma “avaliação ambien- jeto Tucuruí-II exigiria regularizar a vazão do rio tal”. Ele fez sua avaliação baseada em apenas um Tocantins com a construção da barragem de Santa mês (julho de 1977) de visita de campo (Goodland, Isabel no baixo rio Araguaia, primeiro afluente 1978, p. 1). Os termos de referência especificamente importante acima de Tucuruí (Paulo Edgar Dias excluíam qualquer possibilidade de modificar deci- Almeida, comunicação pessoal, 1991). Os impactos sões de engenharia, tal como o nível da água. O 40 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras relatório aponta (p. 39) que de um a dois terços Em total, 3.700 pessoas reassentadas pela das famílias deslocadas não teriam nenhum direi- ELETRONORTE tiveram que ser re-alocadas to à compensação por falta de títulos de terra ou para novas áreas quando os seus primeiros locais equivalente aceitável. O lado superior desta faixa, de re-assentamento foram inundados pelo reser- de fato, se mostrou ser o caso (Magalhães, 1990). vatório (Magalhães, 1990, p. 111). Isto foi resul- O relatório de Goodland enfatizou os planos da tante de erros grosseiros no mapa topográfico da ELETRONORTE para um levantamento da po- área a ser inundada, com algumas áreas mapeadas pulação atingida (i.e., Brasil, ELETRONORTE como sendo a mais de 76 m acima do mar (o limite s/d [1979]) e fez um cálculo grosseiro que aproxi- para re-assentamento) sendo, na realidade, abaixa madamente 15 mil pessoas teriam que ser desloca- da cota de 72 m. Erros topográficos ocorrem em das (Goodland, 1978, p. 38-39). ambas as direções, com algumas áreas sendo ines- O programa de re-assentamento para residentes peradamente inundadas e outras inesperadamente da área de inundação gerou grandes problemas so- deixadas acima do nível da água. Tensões adicio- ciais (de Castro, 1989; Magalhães, 1990; Mougeot, nais surgiram quando uma parte da população que tinha sido removida pela ELETRONORTE vol- 1987, 1990). Estimativas preliminares indicaram tou espontaneamente para a faixa entre as cotas de que 9.500 pessoas em 13 povoados seriam desloca- 72 e 76 m. O limite superior para re-assentamento das (ELETRONORTE, s/d [1979]; ver também foi originalmente estabelecido em 86 m, e subse- Monosowski, 1990, p. 39). As deficiências dos qüentemente reduzido até 76 m (em parte, com estudos feitos antes do enchimento do reservató- base em informações topográficas melhoradas) de- rio têm sido revisadas por Mougeot (1987, 1990) pois que a maioria dos residentes já tinha sido des- e Teixeira (1996, p. 198-200). Estimativas feitas locado; o movimento de volta para a faixa entre 76 após o enchimento indicam 3.350 famílias (17.319 e 86 m criou muitas injustiças, especialmente para pessoas) (Monosowski, 1990, p. 32). Estimativas os numerosos residentes originais que não tinham oficiais do número de pessoas subseqüentemen- a titulação legal às suas terras (Mougeot, 1986, p. te aumentaram até 23.871 pessoas (World Rivers 405). Alguns dos assentados, cujas terras foram Review, 1991, p. 12; dos Santos & do Nascimento, apenas parcialmente inundadas, nas partes da mar- 1995; Teixeira, 1996, p. 198, baseado em Brasil, gem onde o nível da água se elevou até pontos mais ELETROBRÁS, 1987). A ELETRONORTE altos do que esperados, escolheram ficar no lugar (1984, citado por Magalhães, 1990, p. 106) tam- apesar de ter suas áreas de terra diminuídas (obser- bém calculou que 32.871 pessoas foram desloca- vação pessoal, 1991). das, além da população indígena. Em 1985, um ano após o fechamento da barragem, 1.500 famí- Um dos problemas básicos na atuação da lias continuaram sem assentamento (Comissão ELETRONORTE em lidar com a população des- Interministerial, 1985, citado por Teixeira, 1996, p. locada era que a companhia limitou a sua assistên- 225). Até fevereiro de 1988, 2.539 famílias rurais cia ao pagamento em espécie, na maioria dos casos. e 1.433 famílias urbanas tinham sido re-locadas O objetivo da ELETRONORTE em se livrar de (Brasil, ELETRONORTE, 1989a, p. 437). responsabilidades legais subseqüentes pode ter sido realizado, mas o resultado social foi que a maioria Vários segmentos da população afetada foram da população deslocada foi reduzida à indigência, e excluídos das estimativas da ELETRONORTE efetivamente tinha que se virar por conta própria. dos programas de re-assentamento baseado nestas Os valores de indenização eram pequenos, e o pa- estimativas (Teixeira, 1996, p. 199). Um fator que gamento foi sujeito a demoras repetidas (que, no levou à sub-estimativa foi consideração de apenas contexto de correção monetária inadequada para pessoas cujas residências estavam localizadas den- a inflação no Brasil naquela época, implicava em tro da área de inundação, excluindo a população perdas substanciais de valor). Mais importante é o que morava adjacente a esta área e usava a várzea fato que, independente do valor monetário pago, o sazonalmente inundada para a sua subsistência. dinheiro evapora rapidamente nas mãos de pessoas Outro fator foi o de ignorar todo o crescimento inexperientes em lidar com finanças, deixando a populacional, inclusive a imigração, ao longo do maioria das famílias sem nada poucos meses depois. período de cinco anos (1980-1984) entre o levan- Em março de 1985, três meses depois de assumir o tamento e o enchimento do reservatório. cargo como o primeiro presidente civil desde 1964, Impactos Socias 41 da Hidrelétrica de Tucuruí José Sarney visitou Tucuruí e autorizou a criação 1995a, 1997), mas uma lista da Agência Nacional de uma comissão interministerial para lidar com de Energia Elétrica (ANEEL) da situação dos os problemas de re-assentamentos que tinham se planos em julho de 2002 indica 46 barragens, in- tornando, naquela altura, politicamente explosivos. cluindo pequenos aproveitamentos (IDB, 2002) A comissão reconheceu os problemas resultantes (Tabela 1). Mougeot (1987, p. 97) estimou que da restrição das ações da ELETRONORTE à in- todas as barragens na bacia Tocantins/Araguaia denização em dinheiro (Comissão Interministerial, deslocariam 85.673 pessoas. Esta estimativa foi 1985, citado por Magalhães, 1990, p. 108). baseada na presunção que a população destas áreas As relações entre a população deslocada e a vai permanecer constante nos seus níveis de 1985; ELETRONORTE se deterioraram na década como Mougeot (1987, p. 97) reconhece, estes va- que seguiu o fechamento da barragem. Estes pro- lores serão “ultrapassados em muitas vezes até a blemas têm sido apropriadamente descritos como data que todos os prováveis reservatórios seriam tendo “já assumido características Kafkanianas, fa- formados”. Um dos primeiros seria o reservató- zendo com que as partes diretamente envolvidas rio Santa Isabel no baixo rio Araguaia, que iria perdessem todas as suas esperanças de resolução do deslocar uma população que provavelmente seria conflito” (Schönenberg, 1994, p. 36). “bem maior que a estimativa de 1980 de 60.000” (Mougeot, 1990, p. 98). A população afetada por Tucuruí não é limi- tada às pessoas reassentadas da área de inunda- ção, mas também incluem outras que são atraídas à área por causa das suas estradas, mercados, e oportunidades de emprego fora da agricultura. A ELETRONORTE classifica migrantes deste tipo como sendo fora da sua responsabilidade. No en- tanto, a atração desta população é uma conseqüên- cia previsível da construção de uma barragem. As pessoas deslocadas têm experimentado problemas adicionais, e têm provocado desmatamento adicio- nal e outros impactos. Um exemplo deste fato foi decorrente de uma praga de mosquitos do gênero Mansonia que levou grande parte da população que tinha sido reassentada pela ELETRONORTE na área de assentamento Gleba Parakanã a mudar-se para uma área (Rio Gelado), localizada em uma estrada construída por madeireiros de mogno, li- gando a rodovia Transamazônica com a cidade de Tucumã. Em abril de 1993, depois que um grupo de pessoas deslocadas tinha acampado na entrada da sede da ELETRONORTE durante dois anos, a empresa concordou em fornecer alguma infra-es- trutura no local em Rio Gelado. Até 1993, apenas 103 das 1.500 famílias a serem assentadas em Rio Gelado tinham recebidas títulos da terra (Teixeira, 1996, p. 227). Tensões entre os que chegaram da Gleba Parakanã e outros reclamantes em Rio Gelado, sobretudo os madeireiros, forçando o líder do grupo da Gleba Parakanã a fugir da área e mo- rar na clandestinidade no período 1996-1999. Planos para construção de hidrelétricas a montante de Tucuruí incluem 26 barragens (Figura 2) (ver Junk & de Mello, 1987; Fearnside, Figura 2. Desenvolvimento hidrelétrico na bacia Tocantins/Araguaia. 42 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Tabela 1. Situação de Hidrelétricas existentes e planejadas na Bacia do Rio Tocantins(a) Código da ANEEL Aproveitamento hidrelétrico Potência (MW) Situação em julho de 2002 CURSO PRINCIPAL DO RIO TOCANTINS 130 Serra da Mesa 1.275 Em operação 140 Cana Brava 450 Em operação 190a São Salvador 280 Licitada 2o sem. 2001 190b Peixe Angical 452 Licitada 1o sem. 2001 220 Ipueiras 600 A licitar em 2003 230 Lajeado [Magalães] 850 Em operação 290 Tupiraatins 820 A licitar 2o sem. 2002-320 Estreito 1.087 Leilão em julho de 2002 330 Serra Quebrada 1.328 A licitar 2o sem. 2002 400 Marabá 2.070 A licitar em 2003 430 Tucuruí I & II Tucuruí I em operação AFLUENTES MENORES DO TOCANTINS A MONTANTE DE SERRA DA MESA 10 Quintal Inventário 20 Maranhão 125 Inventário 30 Porteiras 2 Inventário 40 Jaraguá Inventário 50 Volta do Deserto 33 Inventário 60 Ceres 130 Inventário 70 Mutum 16 Inventário 80 Jenipapo 18 Inventário 90 Buriti Queimado 137 Inventário 100 Moquém 29 Inventário 110 Mirador 140 A licitar em 2003 120 Colinas 28 Inventário BACIA DO PARANÃ 150 São Domingos 12 Em operação 160 Foz do Bezerra 300 Viabilidade 170 São Domingos 200 Inventário 180 Palma 79 Inventário BACIA DO SONO 240 Soninho I e II 20 Inventário 245 Arara 30 Inventário 250 Jalapão 54 Inventário 255 Cachoeira da Velha 81 Inventário 260 Brejão 75 Inventário 265 Novo Acordo 160 A licitar em 2003 270 Isamu Ikeda 26,8 Em operação 275 Rio Sono 168 Inventário 280 Perdida 1 24 Inventário 285 Perdida 2 48 Inventário BACIA DO ITACAIÚNAS 410 Itacaiúnas 1 135 Inventário 420 Itacaiúnas 2 182,6 Inventário CURSO PRINCIPAL DO RIO ARAGUAIA 340 Couto Magalhães 220 Licitada 2o sem. 2001 350 Barra do Peixe 450 Viabilidade 360 Torixoréu 408 A licitar em 2003 370 Barra do Caiapó 220 Inventário 390a Araguanã 960 A licitar em 2003 390b Santa Isabel 2.200 Licitada 2o sem. 2001 BACIA DO RIO DAS MORTES 380 Foz do Noidore 129 Projeto Básico (a) Fonte: Dados da ANEEL em IDB (2002). Impactos Socias 43 da Hidrelétrica de Tucuruí Residentes a jusante distantes, primeiro os portugueses e depois os “sulis- tas” (pessoas de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Os residentes do baixo rio Tocantins têm so- outros locais vistos por Amazônidas como parte do frido uma desagregação severa como resultado da “sul” do País). É claro, Tucuruí é visto como sendo barragem. O fechamento da barragem alterou ra- basicamente obra de sulistas. dicalmente o ambiente aquático tanto acima como abaixo da barragem (Fearnside, 1995b). O trecho Povos Indígenas do rio Tocantins afetado por Tucuruí (500 km abai- xo da barragem e 170 km acima) sustentava uma O impacto sobre povos indígenas é um dos as- indústria de pesca abundante que forneceu tanto pectos mais polêmicos de Tucuruí, assim como é renda monetária como a maior parte da proteína o caso para outras barragens existentes e propos- animal para os ribeirinhos. Antes do fechamento da tas na Amazônia. Tucuruí inundou parte de três barragem, o consumo de peixe era, em média, 49 kg/ áreas indígenas (Parakanã, Pucurui e Montanha), pessoa/ano (de Merona, 1985). e as suas linhas de transmissão cortaram quatro No ano seguinte ao fechamento da barragem, a outras áreas (Mãe Maria, Trocará, Krikati e Cana captura de peixes no baixo Tocantins permaneceu Brava) (Comissão Pró-Índio de São Paulo, 1991, aproximadamente em níveis pré-barragem, já que os p. 64). Além disso, a mudança do percurso da ro- peixes migratórios presos no pé da barragem foram dovia Transamazônica para acompanhar a margem facilmente capturados pelos pescadores. No ano se- ocidental do reservatório cortou a Área Indígena guinte (1986), no entanto, a captura total era três ve- Parakanã, que foi truncada para ocupar apenas um zes menor (Brasil, INPA/ELETRONORTE, 1987; lado da rodovia. A terra entre a rodovia e o reser- Leite & Bittencourt, 1991). A captura de peixes vatório foi usado para uma área de re-assentamen- por unidade de esforço, medido ou em kg/viagem to (Gleba Parakanã), assim negando a tribo acesso ou em kg/pescador, caiu em aproximadamente 60%, ao reservatório. A invasão da reserva por caçado- enquanto o número de pescadores também caiu dra- res não-indígenas foi facilitada por esta localização. maticamente. Além das quedas em captura de pei- A Área Indígena Trocará, onde vivem os índios xes, as colheitas de camarões de água doce também Asurini do Tocantins, fica 24 km a jusante da barra- diminuíram: a produção local no baixo Tocantins gem e portanto sofreu os efeitos da poluição da água não mudou dos seus níveis no primeiro ano após e da perda de recursos pesqueiros que afetam todos o fechamento da barragem (1985), mas caíram em os residentes a jusante de Tucuruí. 66% no ano seguinte (Odinetz-Collart, 1987). A Da área submersa por Tucuruí, 36% pertenciam água passando através das turbinas é especialmente aos índios Parakanã (Comissão Pró-Índio de São pobre em oxigênio durante a época seca. Esta água Paulo, 1991, p. 74). Entre 1971 e 1977, a tribo foi não mistura com o fluxo do vertedouro ao longo de deslocada cinco vezes pela FUNAI. Em 1978 (três aproximadamente 60 km a jusante da barragem, re- anos depois do início da construção em 1975), um duzindo as populações de peixes ao longo da mar- programa de assistência chamado “Projeto Parakanã” gem ocidental desse trecho (Hino et al., 1987 citado foi montado pela FUNAI e ELETRONORTE por Monosowski, 1990, p. 31). para efetuar a transferência da tribo para fora da área de inundação, mas o programa foi abandonado em Cametá é um dos assentamentos não-indígenas 1979. A primeira parte da tribo mudou-se em 1981, mais antigos na região amazônica, e tem sido um deslocando-se por iniciativa própria em vez de espe- município independente desde 1635 (Heinsdijk, rar a assistência governamental. Em 1982 o restan- 1958, p. 48). A base econômica de Cametá foi te da tribo Parakanã foi transferido de helicóptero dizimada pelos efeitos de Tucuruí sobre o baixo até a aldeia nova (Marudjewara), construída pela Tocantins (ver Dwyer, 1990, p. 48-63). Como estes ELETRONORTE. A malária e outras doenças impactos foram resultados de uma ação proposital contribuíram para um aumento da mortalidade na por parte do governo nacional, os faz com que eles tribo após a mudança (Comissão Pró-Índio de São sejam vistos de forma diferenciada de impactos do Paulo, 1991, p. 75). Em 1987 a ELETRONORTE mesmo nível sofridos, por exemplo, devido a algum e a FUNAI começaram o “Programa Parakanã” que desastre natural. A diferença tem as suas raízes na incluiu a construção de uma estrada vincinal de 12 história da região amazônica, que durante séculos km para dar acesso a uma das aldeias (Paranati) a tem sido explorada para o benefício de potências partir da rodovia Transamazônica, a compra de 44 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras uma camionete e a construção de um armazém em enchimento, apareceu nas coletas pós-enchimento. cada uma das duas aldeias deslocadas por causa de Espécies presentes tanto antes como depois do en- Tucuruí. Atividades posteriores incluíam serviços chimento para as quais não foi observado nenhuma de saúde, educação primária, extensão agrícola, e tendência clara de mudança aparente na abundância ajuda na patrulha às fronteiras da reserva (Comissão são: A. oswaldi, A. argyritarsis, A. mediopunctatus, A. Pró-Índio de São Paulo, 1991, p. 76). evansae, A. intermedius e A. rangeli (Tadei et al., 1991). Os índios Krikati receberam um caminhão, um O grande aumento da população humana na área trator, implementos agrícolas e algumas cabeças resultante da presença da hidrelétrica, junto com a de gado como compensação pelo corte da linha de presença continua de uma gama ampla de vetores de transmissão pela sua reserva (Comissão Pró-Índio malária, é uma fórmula certa para impactos severos de São Paulo, 1991, p. 69). Os índios Guarajara (da dessa doença, sobre a saúde. reserva Cana Brava) receberam Cr$ 160 milhões em 1979-80 [aproximadamente US$ 6,4 milhões] Praga de Mosquitos Mansonia (Comissão Pró-Índio de São Paulo, 1991, p. 72). Os Asurini do Tocantins a jusante da barragem nunca Após o enchimento do reservatório, populações foram incluídos nos planos da ELETRONORTE de mosquitos do gênero Mansonia têm explodido ao para mitigação e não receberam nenhuma assistên- longo da margem ocidental do lago. Os mosquitos cia adicional ou compensação pelos impactos sofri- que têm se tornado uma “praga” são, na maioria, M. dos (Comissão Pró-Índio de São Paulo, 1991, p. 78). titilians, mas também incluem M. pseudotilians, M. indubitans e M. humeralis, que picam tanto à noite A tribo Gavião-Parkatejê estava no caminho da como de dia (Tadei et al., 1991). O grande núme- linha de transmissão para São Luís, que corta uma ro destes insetos torna a vida intolerável nas áreas faixa de 19 km de comprimento através da reserva onde estão concentrados, e causaram uma significa- Mãe Maria. Em abril de 1980 a tribo recebeu Cr$ tiva saída de residentes para locais mais agradáveis. 40 milhões [aproximadamente US$ 1,6 milhões] A explosão de mosquitos era uma conseqüência (Comissão Pró-Índio de São Paulo, 1991, p. 68). O previsível das macrófitas aquáticas no reservatório, valor da compensação pago neste e em outros casos que, acredita-se, fornece criadouros para estes mos- é de importância muito menor do que o fato que quitos em toda Amazônia. Os ventos predominan- a compensação foi em espécie ao invés de ser em tes concentram as macrofitas, tais como a água-pé forma de terra. O dinheiro pago, assim como na (Eichhornia crassipes), alface-da-água (Pistia spp.) e maioria dos pagamentos de compensação em espé- Salvinia spp., a longo da margem esquerda. A explo- cie para povos indígenas, tem pouca utilidade. Este são inicial de macrófitas (especialmente a Salvinia serve apenas para as companhias elétricas ficarem livres para construir barragens e linhas de transmis- auriculata), que cobriu grande parte da superfície do são, porque a falta de experiência das tribos em lidar reservatório no primeiro ano, se retraiu até seu nível com o dinheiro faz com que seja quase inevitável atual na medida em que o pulso inicial de nutrientes que as verbas sejam usadas para fins que não assegu- se esgotou. O nível atual de infestações por ma- ram o bem estar contínuo das tribos. crófitas, e, portanto, o atual nível de infestação de mosquitos, parece ser estável. Saúde Mosquitos do gênero Mansonia não transmitem a malária, mas transmitem vários tipos de arbovírus Malária (Brasil, ELETRONORTE, 1989b), além de poder Os mosquitos do gênero Anopheles, que trans- transmitir a elefantíase, que é causada por um verme mitem a malária, estão presentes em toda a área de parasítico. Embora a doença ocorra em países vizi- Tucuruí (Tadei et al., 1983). A. darlingi, o vetor prin- nhos, tal como o Suriname, não tem se espalhado cipal da malária na Amazônia, diminuiu em abun- na Amazônia brasileira. A razão porque a doença dância, embora o mosquito e a doença permaneçam não se espalhou é desconhecida, já que os mosqui- (Tadei et al., 1991). Anopheles nunez-tovari, a espécie tos Mansonia ocorrem em toda a Amazônia (W.P. anofelina mais comum antes do enchimento do reser- Tadei, comunicação pessoal, 1991). vatório, aprentaram uma redução na sua população, A praga de mosquitos Mansonia afeta severa- assim como A. triannulatus e A. albitarsis. Anopheles mente a área de re-assentamento de Gleba Parakanã. braziliensis, que não tinha sido encontrado antes do A um grau menor ela também afeta as aldeias para Impactos Socias 45 da Hidrelétrica de Tucuruí as quais os índios Parakanã têm sido deslocados As concentrações de mercúrio total em plan- (aproximadamente 30 km ao oeste do reservatório). tas na floresta perto de Tucuruí têm sido registra- das muito mais altas que no Canadá onde a con- Mercúrio taminação de mercúrio é bem estabelecida (Marc Lucotte, comunicação pessoal, 1993). O mes- A metilização do mercúrio (Hg) representa mo fenômeno tem sido demonstrado na Guiana uma grande preocupação para o desenvolvimento Francesa (Roulet & Lucotte, 1995). É provável hidrelétrico na Amazônia. O mercúrio é concen- que as altas concentrações no solo e na vegeta- trado biologicamente em uma ordem de grandeza ção na Amazônia têm se acumulado lentamente a a cada passo que sobe na cadeia alimentar. Os partir da deposição lenta ao longo de milhões de seres humanos tendem a ocupar a posição de topo anos, em vez de se originar de entradas antropo- e espera-se que abriguem as concentrações mais gênicas recentes (Roulet et al., 1996). altas de mercúrio. O passo chave levando à contaminação mercurial Cerca de 50 a 70 t de mercúrio são lançados de populações humanas é a metilização de mercú- anualmente no meio ambiente na forma de aerossóis rio metálico. Grandes entradas de mercúrio metá- atmosféricos quando os garimpeiros Amazônicos lico, por exemplo, da garimpagem de ouro, não são amalgamam o seu ouro (Pfeiffer & de Lacerda, necessárias para que os níveis de contaminação mer- 1988, p. 329). É provável que uma parte disto curial cheguem a ser um risco para a saúde humana. seja transportada até reservatórios de hidrelétricas. Os níveis existentes de Hg nos solos e na vegetação Estima-se que o garimpo de Serra Pelada tenha li- (principalmente de fontes vulcânicas, e transporte à berado 360 t de Hg no meio ambiente entre 1980 distância a partir de centros industriais) são suficien- e 1986 (Porvari, 1995, p. 110). O ouro em Serra tes para ter conseqüências severas em ambientes que Pelada se esgotou no final da década de 1980, mas facilitem a metilização. Diferenças químicas na água há garimpos ativos em vários locais na bacia hidro- entre rios Amazônicos são muito mais importantes gráfica de Tocantins, inclusive no rio das Mortes e do que a presença da atividade garimpeira em expli- na bacia do alto Araguaia. car as diferenças na contaminação por mercúrio nos ribeirinhos (Silva-Forsberg et al., 1999). O transporte aéreo de mercúrio por mais de mil km tem sido constatado no Canadá, onde o aumento A metilização está ocorrendo em reservatórios, de fontes industriais nos Estados Unidos logo após como é indicado pelos altos níveis de mercúrio a Segunda Guerra Mundial ficou registrada nos nos peixes (Porvari, 1995) e nos cabelos humanos sedimentos na área da baía de Hudson, no extre- (Leino & Lodenius, 1995) em Tucuruí. Em uma mo norte do Canadá (Marc Lucotte, comunicação amostra de 230 peixes tirados do reservatório, 92% pessoal, 1993). A contaminação por mercúrio nos dos 101 peixes predatórios tinham níveis de Hg reservatórios no norte do Canadá é bem conhecida mais altos que o limite de segurança de 0,5 mg/kg (Bodaly et al., 1984). Os índios Cree, que comem de peso fresco (Leino & Lodenius, 1995, p. 109). peixes dos reservatórios, sofrem de conseqüências O tucunaré (Cichla ocellaris e C. temensis), um pei-xe predatório que compõe mais da metade da cap- severas de saúde. tura comercial em Tucuruí, está contaminado, em As concentrações de mercúrio nos sedimentos e média, a 1,1 mg/kg fresco, mais que o dobro do na água nos rios Itacaiúnas e Paraupebas (perto de limite de segurança. Para ficar dentro das taxas de Carajás e Serra Pelada) são mais altas que aquelas no consumo recomendadas, uma pessoa teria que co- rio Madeira, que tem se tornado notório por conta- mer, no máximo, uma refeição de tucunaré por se- minação mercurial (Fernandes et al., 1990). Já que mana (Marc Lucotte, comunicação pessoal, 1993). os peixes podem migrar, é possível que a contamina- Muitos residentes das margens de Tucuruí comem ção venha das áreas de garimpagem e isto é enfatiza- peixe todos os dias, assim como fazem muitas pes- do pelas autoridades da ELETRONORTE (Paulo soas em Belém onde grande parte da coleta de pei- Edgar Dias Almeida, comunicação pessoal, 1991). xes de Tucuruí é comercializada. No entanto, a probabilidade da migração de peixes A média de Hg nos cabelos de pessoas que pes- explicar o fenômeno, em um número substancial de cam no reservatório era 65 mg/kg de cabelo (Leino espécies, é pequena. & Lodenius, 1995, p. 121), um valor muitas vezes 46 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras mais alto que os valores em áreas de garimpagem. A doença de Chagas representa um problema Por exemplo, em garimpos perto de Carajás, con- em potencial para a saúde, já que os barbeiros da centrações de Hg nos cabelos humanos variam de família Reduviidae que transmitem a doença ocor- 0,25 a 15,7 mg/kg de cabelos (Fernandes et al., rem na área. O parasita (Trypanosoma cruzi) tem 1990). Dados do rio Tapajós têm indicado sinto- sido encontrada na área em três espécies de bar- mas mensuráveis, tal como redução de campo visual, beiros, Panstrongylus geniculatus, Rhonius pictipes entre os ribeirinhos que têm níveis de Hg nos seus e Lutzomaia anduzei (Arias et al., 1981, p. 7-10). cabelos bastante menores que ambos os níveis en- Em geral, o fator mais estreitamente associado com contrados em Tucuruí e o limite máximo de 50 mg/ surtos da doença de Chagas é a pobreza: casas com kg atualmente reconhecido como padrão (Lebel et paredes de barro e tetos de folha de palmeira são al., 1996). As concentrações de Hg nos cabelos hu- especialmente aptas para abrigar os vetores. A pre- manos em Tucuruí já são mais que o dobro do que valência de pobreza na área é evidente. aquelas constadas como causadoras de danos ao feto, resultando em retardamento psicomotor (Leino & Distorção Econômica Lodenius, 1995, p. 124). O Brasil tem se comprometido em fornecer ele- As conseqüências sobre a saúde humana podem tricidade bastante subsidiada às empresas estran- ser devastadoras, e ainda não são entendidas pela geiras de alumínio em Barcarena (PA) e São Luís maioria das pessoas da Amazônia. O mercúrio se (MA). Este fato distorce toda a economia energé- concentra no organismo ao longo da vida de uma tica brasileira. ALBRÁS, (o consórcio que benefi- pessoa, e não é removido por processos naturais de cia o alumínio em Barcarena) sozinha recebeu US$ limpeza. Cozinhar o peixe não altera os níveis de 395,5 milhões em subsídios do governo brasileiro toxicidade do metilmercúrio. O surgimento de sin- no período de janeiro de 1985 a maio de 1994, e tomas severos, incluindo morte em casos severos, em 1993 o total pago a este consórcio era US$ 97,9 pode ocorrer com bastante rapidez depois de anos milhões (Conselho Nacional da Amazônia Legal, de saúde aparente. Em Minamata, Japão, pescado- 1994, p. 41). Quase dois terços da energia gerada res saudáveis caíram doentes e morriam após uma pela hidrelétrica de Tucuruí é fornecida a tarifas semana do começo dos sintomas. O mercúrio é altamente subsidiadas à indústria de alumínio em concentrado no feto: uma mãe saudável pode dar luz Barcarena e São Luís. A capacidade instalada de a uma criança deformada (Harada, 1976). O perío- 4.000 MW gera 2.059 MW (18,03 TWh) anual- do antes de aparecer os sintomas é muito longo. Em mente (Brasil, ELETRONORTE, s/d [1992], p. Minamata, a companhia química Chisso começou 3); o uso de energia em 1985 para fabricação de a lançar resíduos de mercúrio na baía de Minamata alumínio era 630 MW em Barcarena e 625 MW em 1932, mas foi apenas em 1956 (24 anos depois) em São Luís (Gitlitz, 1993). A expansão da ca- que o primeiro caso de contaminação foi reconheci- pacidade da usina em Barcarena (CVRD, 1997) do. Muitas pessoas na Amazônia hoje estão comen- implica num consumo energético de 677 MW até do peixe sem sentir nenhum efeito negativo, levando 1996. Presumindo perdas em transmissão de 2,5% elas à conclusão errônea de que elas estão escapando (ver Fearnside, 1997), 65% da produção disponível das conseqüências do envenenamento por mercúrio. de energia é usado para alumínio. Outros Riscos em Potencial para a Saúde O Brasil perde quantias astronômicas com o subsídio dado à indústria de alumínio. A raiz do A esquistossomose poderia potencialmente afe- problema é a Portaria no. 1654 do Ministério das tar a área. Os caramujos planórbidos (Biomphalaria Minas e Energia, datado 13 de agosto de 1979 sp.) que servem como vetores para o parasita ocor- (Diário Oficial, 16 de agosto de 1979), que concede rem na área (de Mello, 1985). Felizmente, estes eletricidade durante 20 anos a uma tarifa ligada ao ainda não estão afetados pelo parasita helmíntico preço internacional de alumínio. O custo da ener- Schistosoma mansoni. A doença está largamente es- gia usada no beneficiamento não pode ultrapassar palhada no nordeste brasileiro e em Minas Gerais, 20% do preço internacional do produto. Quando o fazendo com que seja provável que o parasita chegue alumínio é barato, como é o caso hoje, as empresas até Tucuruí um dia ( Junk & de Mello, 1987). pagam quase nada. Impactos Socias 47 da Hidrelétrica de Tucuruí As financiadoras internacionais de barragens no países como o Brasil, enquanto eles continuam a Brasil, tal como o Banco Mundial, estão essencial- desfrutar os benefícios na forma de alumínio barato. mente canalizando dinheiro para o Japão em vez de ao Brasil. As verbas constroem barragens para su- Subsídios para novos projetos foram revogados prir energia às cidades brasileiras que poderiam ter em agosto de 1985, mas continuam para projetos sido abastecidas a partir de barragens existentes, tal existentes; os contratos de ALBRÁS e ALUMAR como Tucuruí, mas que não abastecem as zonas ur- vão até 2004 (Lobo, 1989). Em março de 1990, logo banas porque o governo brasileiro está efetivamente após a posse do então Presidente Fernando Collor de doando a energia de Tucuruí ao Japão na forma de Mello, cortes profundos nos subsídios foram anun- barras de alumínio subsidiado. ciados, com o objetivo de eliminar todos os subsí-dios governamentais da economia brasileira. Logo Toda a economia brasileira tem sido destorcida após, no entanto, exceções começaram a aparecer. A pelas concessões negociadas como parte do acordo exceção mais importante era o beneficiamento de para permitir a construção de Tucuruí. Até 1991, alumínio, para qual a continuação dos subsídios foi as duas usinas de alumínio que recebem energia de garantida. O subsídio para alumínio escapou por Tucuruí estavam usando 5% de toda a energia elé- pouco ser abolido pelo Congresso Nacional em abril trica do Brasil (Pinto, 1991a). A percentagem do de 1990 (Gazeta Mercantil, 07 de abril de 1990). consumo de energia representada pelas “indústrias intensivas de energia”, das quais o alumínio é a mais A energia gerada por Tucuruí faz pouco para me- importante, mas que também incluem aço, ferro lhorar a vida daqueles que moram na área: um fato ligas, cloro, e celulose, aumentou de 33% do uso dramatizado pelas linhas de alta tensão passando por industrial de energia em 1975 para 41% em 1987 cima de barracas iluminados apenas por lamparinas. (Lobo, 1989). O subsídio pesado das tarifas elétri- A maior parte da energia de Tucuruí fornece energia cas no Brasil explica o crescimento, especialmente subsidiada para usinas multinacionais em Barcarena no setor de exportações. Os produtos de exportação (ALBRÁS-ALUNORTE do Nippon Amazon brasileiros tinham um conteúdo energético médio Aluminum Co. Ltda. de NAAC, um consórcio de de 674,9 kwh/US$ 1.000 exportado em 1975, au- 33 firmas japonesas) e em São Luís (ALUMAR, da mentando para aproximadamente 1.000 kwh/US$ empresa norteamericana Alcoa e a empresa britâni- 1000 em 1989 (Lobo, 1989). Em 1985, o Brasil co- ca e holandesa Billiton). A Companhia Vale do Rio brava dos fabricantes de alumínio US$ 0,010/kwh, Doce (CVRD) mantém 51% e 61% em ALBRÁS e enquanto o Japão cobrava US$ 0,069 (Lobo, 1989). ALUNORTE, respectivamente (CVRD, 1983). A energia é vendida às companhias de alumínio às ta- Em uma escala global, o subsídio da energia para rifas entre um terço e a metade do custo de geração: alumínio permite um desperdiço no uso deste me- de acordo com Aureliano Chaves, então Ministro tal. O alumínio é usado, por exemplo, para latas de das Minas e Energia, a energia é gerada por Tucuruí refrigerantes e cerveja; mesmo se forem recicladas a um custo de US$ 38/MWh estava sendo vendida várias vezes, estas acabam no lixo. Uma lata de alu- por US$ 10,5-16,5/MWh (Silva, 1991). De acordo mínio sem reciclagem usa 7.000 unidades termais com o Departamento Nacional das Águas e Energia britânicas (BTUs) de energia, uma lata reciclada usa Elétrica (DNAEE), o custo de geração é de US$ 50/ 2.500 BTU por uso, enquanto uma garrafa de vi- MWh em Tucuruí, comparado à média brasileira dro reaproveitada 10 vezes consome uma média de de US$ 20/MWh (Monosowski, 1990). A energia 500 BTU por uso (Young, 1991, p. 24). Se o custo vendida para ALBRÁS em 1989 foi paga a menos verdadeiro do alumínio fosse cobrado pelo produto, da sexta parte da tarifa paga pelos consumidores inclusive o custo de construir barragens hidrelétricas residenciais no Brasil (Brasil, ELETRONORTE, e as compensações pelos seus impactos ambientais 1989b). Em 1990 a ALBRÁS pagou 22 mils (mi- e sociais, o alumínio seria muito mais caro e seria lésimos de dólar)/kWh e ALUMAR pagou 26 mils, usado apenas para finalidades que não têm nenhum enquanto um consumidor residencial pagou 64 mils, substituto. Os principais países consumidores de três vezes mais que ALBRÁS (Jornal do Brasil, 17 de alumínio não estão mais construindo grandes barra- abril de 1990). A diferença entre a tarifa cobrada às gens, tendo descoberto que os custos financeiros, so- usinas de alumínio e o custo de geração é subsidiado ciais e ambientais de barragens são pesados demais. pela população brasileira através dos seus impostos e Eles preferem mais exportar estes impactos para das suas contas de luz. 48 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras BENEFÍCIOS DE TUCURUÍ A construção de Tucuruí custou um total de US$ 8 bilhões, quando se inclui os juros sobre a dívida, de Geração de energia acordo com os cálculos de Lúcio Flávio Pinto (1991b). A geração de energia é, normalmente, a fonte Considerando a percentagem da energia usada para alumínio, somente a hidrelétrica de Tucuruí, que é primária de benefícios sociais de barragens hidrelé- apenas uma parte da infra-estrutura fornecida pelo tricas, já que as quantidades de emprego e bens pro- governo brasileiro, custou US$ 2,7 milhões por em- duzidos geralmente são proporcionais à eletricidade prego gerado. gerada. A Tucuruí-I tem uma capacidade instalada de 4.000 MW (12 geradores de 330 MW cada e dois Impactos sociais na tomada de decisões de 20 MW). Nenhuma hidrelétrica produz tanto energia quanto a sua capacidade instalada, já que a Os impactos sociais tiveram um papel mínimo vazão dos rios Amazônicos varia seguindo um ci- na tomada de decisão inicial de construir a barra- clo anual, e inevitavelmente fica insuficiente durante gem. Esta decisão foi principalmente baseada em uma parte do ano para acionar todas as turbinas da seus benefícios financeiros para atores distantes, so- hidrelétrica. A potência firme, ou seja, aquela sobre bretudo no Japão e na França, e para os beneficiários que se pode contar com um alto grau de certeza, é brasileiros dos contratos de construção (ver Teixeira, 2.115 MW (Monosowski, 1990). 1996; Pinto, 1991a,b). Já que Tucuruí foi plane- jada e construída durante o regime militar, é tam- Tucuruí-II duplicaria a capacidade instalada de bém, pouco surpreendente que pouca importância 4.000 MW para 8.000 MW, mas isto não significa foi dada aos efeitos negativos sobre residentes locais que a produção de energia seria duplicada. A ener- na Amazônia. No entanto, desde aquela época, exi- gia adicional seria gerada apenas durante a estação gências têm sido implementadas para um Relatório de alta vazão, já que, durante uma boa parte do ano dos Impactos sobre o Meio Ambiente (RIMA), a geração é limitada pela vazão insuficiente no rio um Estudo dos Impactos Ambientais (EIA) e uma Tocantins. Barragens adicionais fornecendo arma- audiência pública. Estes cobrem impactos sociais, zenamento e regulagem da vazão a montante de assim como os ambientais. Poderia se esperar que Tucuruí aumentariam a geração de Tucuruí-II, mas esses avanços levariam a um processo de tomada não alterariam a sua função como um fornecedor de de decisões em que os benefícios e custos, incluin- eletricidade adicional apenas durante os períodos de do benefícios e custos sociais, dos projetos propos- pico de vazão. Planos ambiciosos para barragens tos seriam estimados de uma maneira completa e adicionais na bacia do Tocantins/Araguaia ilustram objetiva, e seriam publicamente debatidos antes se a necessidade para uma consideração dos impactos tomar decisões sobre projetos de desenvolvimento de projetos relacionados. tais como hidrelétricas. No entanto, a experiên- cia recente com estas medidas de proteção no caso Empregos de barragens Amazônicas indica a facilidade com que os seus efeitos protetores podem ser empata- As perdas financeiras representam apenas uma dos quando interesses políticos fazem a aprovação parte do impacto do subsídio às indústrias de alumí- dos projetos uma prioridade política (Fearnside & nio. A quantidade de empregos criada pelo beneficia- Barbosa, 1996a,b). O fortalecimento destes proce- mento de alumínio é mínima: são 1.200 empregos em dimentos deve ser uma alta prioridade para se evitar Barcarena e 750 em São Luís. Em 1986 a ALBRÁS os piores impactos do desenvolvimento. A avaliação usou 49,5% de toda a eletricidade consumida no Pará de propostas de desenvolvimento futuro pode ser (Brasil, ELETRONORTE, 1987, p. Amazonas-32 melhorada se as lições forem aprendidas a partir das & Pará-12). A vila operária em Barcarena, incluindo experiências passadas tal como no caso de Tucuruí. dependentes, comerciantes, etc., tem uma população No Brasil, as exigências para avaliação de im- de apenas 5.000 pessoas; esta vila consome mais ener- pactos de hidrelétricas e outros projetos de desen- gia do que Belém, Santarém e todas as demais cida- volvimento são vagas com respeito aos impactos so- des do Pará juntas. Praticamente qualquer outro uso ciais. Estes ditames seguem a Lei no. 6.938 de 31 da eletricidade traria maiores benefícios ao Brasil (ver de agosto de 1981 e o Decreto no. 8.835 de 10 de Fearnside, 1989). junho de 1983, que criam o Conselho Nacional do Impactos Socias 49 da Hidrelétrica de Tucuruí Meio Ambiente (CONAMA), e a regulamentação CONCLUSÕES desta lei em 21 de janeiro de 1986 (Resolução de CONAMA 001/86). A ELETRONORTE sempre Os custos sociais da hidrelétrica de Tucuruí fo- se aproveita da linguagem vaga para interpretar uma ram, e continuam a ser, pesados. Estes incluem o inclusão mínima de aspectos sociais (Sigaud, 1990, deslocamento da população na área de inundação e p. 100; ver também Teixeira, 1996, p. 118-120). Em a sua realocação subseqüente devido a uma praga de 1986 (i.e., depois que o sistema político brasileiro ter mosquitos Mansonia, o desaparecimento da pesca- se tornado mais democrático), a ELETROBRÁS ria que sustentava, tradicionalmente, a população a produziu um conjunto de diretrizes para estudos de jusante da barragem, os efeitos sobre a saúde devido impactos que incluía algumas exigências a mais para à malária e a contaminação por mercúrio, e o des- avaliações sociais (Brasil, ELETROBRÁS, 1986). locamento e perturbações de grupos indígenas. O alto custo financeiro e a quantidade minguada de Um problema fundamental é que o EIA e o emprego produzido por Tucuruí, que fornece prin- RIMA são produzidos por empresas de consultoria cipalmente energia para beneficiamento de alumí- que dependem completamente do proponente do nio, causam distorções econômicas com impactos projeto, neste caso a ELETRONORTE. O pro- sociais de grande alcance, inclusive o custo de opor- ponente prepara os termos de referência, escolhe tunidade de não ter usado os recursos financeiros e a empresa vencedora, e paga pelos serviços. Além naturais da nação de modo mais benéfico para os disto, a parcela final do pagamento não é liberada residentes locais. No caso de Tucuruí, as autorida- até que o documento passe através de uma série des sistematicamente subestimaram os impactos e de versões nos quais o proponente pode pedir mu- sobre-estimaram os benefícios. Apesar de muitas danças no conteúdo do relatório (ver Fearnside & mudanças desde a construção de Tucuruí em 1984, Barbosa, 1996b). As empresas são, portanto, induzi- os procedimentos de tomada de decisões ainda pre- das a produzir relatórios que indicam um mínimo de cisam de reformas substanciais para que os impactos impactos, tanto por meio de pressões diretas como sociais, assim como os efeitos ambientais e outros, em função do seu interesse em ser escolhido para sejam plenamente considerados nas tomadas de contratos futuros de consultoria. decisões sobre projetos de desenvolvimento, e para Rosa et al. (1987) propuseram uma redefini- que, quando projetos forem considerados dignos de ção do “potencial” das hidrelétricas da Amazônia implementação, os impactos que eles provocam se- que eliminaria locais da lista em casos onde os im- jam mitigados com justiça. pactos sociais claramente seriam excessivamente grandes. Atualmente, os cálculos oficiais indicam AGRADECIMENTOS um potencial total de 97.800 MW, que se plena- mente aproveitados, inundaria 100.000 km2 (Brasil, Agradeço às seguintes pessoas pelas discussões ELETROBRÁS, 1987, p. 150). Isto representaria sobre Tucuruí: Lúcia Andrade e Leonide dos Santos 2% da Amazônia Legal, ou em torno de 3% da área (Comissão Pró-Índio de São Paulo); Deputada florestada. Assim como locais em potencial para Aída Maria Silva (Assembléia Legislativa, Belém); implantação de hidrelétricas são eliminados da lista J. Revilla Cardenas, E.G. Ferreira, R. Leite, J.A.S.N. quando fatores de engenharia, tais como a topogra- de Mello e W.P. Tadei (INPA); J. Carvalho (Projeto fia e vazão, são inapropriados, locais com limitações Parakanã, Tucuruí); E. Monosowski (Monosowski sociais e ambientais poderiam ser eliminados logo Consultants); agradeço aos funcionários de no início do processo decisório, antes que as pressões ELETRONORTE e Camargo Corrêa em Tucuruí para a construção das barragens se tornassem tão pela paciência com as minhas perguntas, e os fun- forte que os projetos tornar-se-iam “irreversíveis”. cionários de INPA em Tucuruí e o Sindicato dos Atualmente, os cálculos do potencial hidrelétrico Trabalhadores Rurais de Tucuruí pelo apoio logístico incluem a presunção de que todos os locais identi- e pelas informações. Os colonos da Gleba Parakanã ficados pelos critérios físicos serão aproveitados. O merecem agradecimento especial pelo tempo e hos- caso mais grave é a produção estimada da hidrelétri- pitalidade durante a minha visita. Bruce Forsberg ca de Belo Monte, um cálculo que, aparentemente, e Marc Lucotte forneceram informações valio- conta com a regulação da vazão do rio Xingu por sas sobre contaminação por mercúrio. P.L.M.A. barragens a montante que teriam impactos sociais Graça, N. Hamada e S.V. Wilson e dois referees desastrosos (Fearnside, 1996). comentaram o manuscrito. O texto foi atualizado 50 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras de Fearnside (1999a). Agradeço a Springer-Verlag setembro a 20 de dezembro/1989. ELETRONORTE, Brasília, New York, editora da revista Environmental DF. 32 p. + anexos. Management, pela permissão de publicar esta tradu- Brasil, INPA/ELETRONORTE. 1987. Estudos de Ecologia e ção. Uma versão anterior deste trabalho foi apresen- Controle Ambiental na Região da UHE Tucurui: Relatório tada no “Simpósio sobre Ecologia de Reservatórios: Setorial, Segmento: Ictiofauna, Relatório Semestral, julho- Estrutura, Função e Aspectos Sociais”, Instituto dezembro/87. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia de Biociências, Universidade Estadual Paulista (INPA), Manaus, AM. (UNESP), Botucatu-SP, 25-28/05/98 (Fearnside, Brasil, ELETRONORTE. s/d. [1979]. Estudo das Condições 1999b). Agradeço ao Pew Scholars Program in Sócio-Económicas da Área de Influência do Reservatório da UHE Conservation and the Environment, o Conselho de Tucuruí-PA. BASEVI Construções e Topografia, S.A. & ELETRONORTE, Brasília, DF. 3 vols. Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq AI 350230/97-98) e o Instituto Brasi l , ELETRONORTE. s/d. [1992]) . Ambiente Desenvolvimento Tucuruí. ELETRONORTE, Brasília, Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA PPI DF. 32 p. 5-3150) pelo apoio financeiro. Comissão Interministerial. 1985. Relatório e Dossiê: Anexos à CIT 001/85 encaminhado aos Ministros de Estado da Justiça, LITERATURA CITADA das Minas e Energia, e da Reforma e do Desenvolvimento Agrária. Brasília, DF. Arias, J.R., R.A. de Freitas, R.D. Naiff & M. Naiff. 1981. Comissão Pró-Índio de São Paulo. 1991. 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Hidrelétricas na Amazônia 53 Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Capítulo 3 Impactos Ambientais da Barragem de Tucuruí: Lições Ainda Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia Philip M. Fearnside Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) Av. André Araújo, 2936 - CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil. E-mail: pmfearn@inpa.gov.br Tradução de: Fearnside, P.M. 2001. Environmental impacts of Brazil’s Tucuruí Dam: Unlearned lessons for hydroelectric develop- ment in Amazonia. Environmental Management 27(3): 377-396. Doi: 10.1007/s002670010156 54 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO INTRODUÇÃO: A HIDRELÉTRICA DE TUCURUÍ A hidrelétrica de Tucuruí oferece valiosas lições para melhorar a tomada de decisões sobre grandes O trabalho atual revisará impactos ambientais obras públicas na Amazônia e em outros lugares. da barragem de Tucuruí, as medidas mitigatórias Junto com os impactos sociais, que foram revisados que foram ou não tomadas, a maneira com que os em outro trabalho, os custos ambientais do proje- estudos ambientais foram levados a cabo e divulga- to são significativos. Custos monetários incluem os dos, e o papel que estas considerações tiveram (ou custos de construção e de manutenção, e os custos não) no processo de tomada de decisões. Dado os de oportunidade dos recursos naturais (tais como planos ambiciosos para desenvolvimento hidrelé- madeira) e do dinheiro investido pelo governo bra- trico na Amazônia, muito uso poderia ser feito das sileiro. Custos ambientais incluem a perda de flo- lições de Tucuruí, a barragem mais poderosa da resta, que provoca tanto a perda de ecossistemas Amazônia (Figura 1). naturais como a emissão de gases de efeito estufa. Ecossistemas aquáticos são fortemente afetados pelo bloqueio de migração de peixes e pela criação de ambientes anóxicos. A decomposição da vege- tação deixada no reservatório cria água anóxica e também produz metano e fornece condições para a metilização do mercúrio. Os desfolhantes foram considerados por remover a floresta na área de sub- mersão, mas os planos foram abortados no meio de uma controvérsia pública. Outra controvérsia cercou impactos de desfolhantes para suprir a rebrota ao longo da linha de transmissão. Medidas mitigatórias incluíram o salvamento arqueológico e de fauna e a criação de um “banco de germoplasmo” em uma ilha no reservatório. A tomada de decisões no caso de Figura 1. A Barragem de Tucuruí. Tucuruí era praticamente sem nenhuma influência de estudos ambientais, que foram realizados simul- taneamente com a construção da obra. A barragem É pretendido que o presente trabalho sirva antecede a exigência, de 1986, a uma avaliação de como complemento a um trabalho companheiro impacto ambiental. Apesar das limitações, os resul- sobre os impactos sociais de Tucuruí (Fearnside, tados das pesquisas fornecem valiosas informações 1999). O trabalho companheiro cobre impactos so- para represas futuras. O uso extenso para as relações bre populações indígenas, reassentamento de popu- públicas do esforço de pesquisa e das medidas miti- lação deslocada, perda de peixes e de outros recursos gatórias, tais como o salvamento da fauna, era evi- para residentes a jusante, e problemas de saúde, tais dente. A tomada de decisões foi estreitamente ligada como a malária, uma praga de mosquitos do gênero à influência de empresas de construção, o exército, Mansonia, e a acumulação de mercúrio nos peixes no e interesses financeiros estrangeiros no projeto da reservatório e nas pessoas que os comem. Também construção e do uso da energia elétrica resultante explica como a indústria de alumínio subsidiada que (a maioria da qual é usada para beneficiamento de consome dois-terços da energia de Tucuruí destorce alumínio). Custos sociais e ambientais não recebe- a economia energética brasileira inteira e conduz a ram praticamente nenhuma consideração quando altos impactos na medida em que outras barragens foram tomadas as decisões, um resultado facilitado (tais como Balbina) são construídas para fornecer por uma cortina de sigílo que cerca muitos aspectos energia as cidades que poderiam ter sido abasteci- do projeto. Apesar de melhorias no sistema brasilei- das pela Tucuruí, caso a produção de Tucuruí não ro de avaliação de impacto ambiental desde a época tivesse estado anteriormente comprometida para em que o reservatório de Tucuruí foi enchido em suprir as usinas de alumínio em Barcarena e São 1984, muitas características essenciais do sistema de Luís. A geração de emprego é mínima na indústria tomada de decisões permanecem inalteradas. de alumínio. Impactos Ambientais da Barragem de Tucuruí: 55 Lições Ainda Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia A Amazônia brasileira atualmente tem quatro de energia (Figura 2). A área de 758.000 km2 da ba- barragens hidrelétricas consideradas “grandes” (> 10 cia hidrográfica a montante do local da barragem megawatts [MW] de capacidade instalada): Curuá- fornece um fluxo médio anual calculada em 11.107 Una, Pará (72 km2, 40 MW, completado em 1977), m3/s (variação: 6.068-18.884 m3/s), com uma que- Tucuruí, Pará (2.430 km2, para 4.490 MW, com- da vertical de 60,8 m ao nível normal operacio- pletado em 1984 e aumentado para 8.379 MW e nal de 72 m acima do nível médio do mar (Brasil, 2.850 km2 entre 1998 e 2010), Balbina, Amazonas ELETRONORTE, 1989, p. 46, 51, 64). Isto con- (2.360 km2 para 250 MW, completado em 1987), e trasta com a situação em Balbina, onde uma bacia Samuel, Rondônia (540 km2, 217 MW, completa- hidrográfica pequena e topografia plana resulta do em 1988). Um total de 79 represas é planejado, em um reservatório de tamanho semelhante ao de totalizando 100.000 km2 (Brasil, Eletrobrás, 1987, Tucuruí, mas com uma represa que gera muito me- p. 150; veja Fearnside, 1995a), ou aproximadamente nos energia. Enquanto a experiência de Balbina tam- 3% da floresta amazônica brasileira. bém contém muitas lições para o desenvolvimento hidrelétrico futuro no Brasil (Fearnside, 1989a), Tucuruí foi construída no rio Tocantins, no funcionários da ELETRONORTE freqüentemen- Estado do Pará, em um local propício para geração te descartam essas como irrelevantes, com base na Figura 2. A: A Amazônia Legal com locais mencionados no texto, B: o Tucuruí Dam área, C: mais baixo fim do reservatório, inclusive o braço de Caraipé. 56 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras crença de que a Balbina está tão carregada, com a barragem com a usina de 4.000 MW (Tucuruí-I), falhas óbvias que é uma aberração que nunca será ou US$2.000/kW esperado de capacidade instala- repetida devido a melhorias subsequentes na consi- da. O custo de Tucuruí-II foi de US$1,25 bilhões deração do meio ambiente na tomada de decisões.(1) (Indriunas, 1998). Tucuruí, diferente de Balbina, sempre foi defendida pela ELETRONORTE como um exemplo de de- Custos de manutenção senvolvimento hidrelétrico na Amazônia. Uma segunda fase do projeto de Tucuruí, co- A água no reservatório de Tucuruí tem um nhecido como Tucuruí-II, iniciou construção em tempo de residência médio de 51 dias (Brasil, 1998 (Consórcio Brasiliana, 2000, Tomo II, p. 318). ELETRONORTE, 1988,p. 124), porém, as extre- Esta é uma das prioridades mais esperadas no pro- midades do reservatório têm tempo de residência grama “Avança Brasil” do governo federal (http:// mais longos que a média. O braço de Caraipé do www.a.brasil.gov.br). Tucuruí-II elevou a capacidade reservatório é alimentado por um fluxo pequeno e instalada para 8.370 MW e foi completado em 2010. é conectado ao corpo principal do reservatório por uma foz estreita (Figura 2c, Figura 3). Este braço de 27.000 ha do reservatório tem um tempo de repo- CUSTOS MONETÁRIOS DE TUCURUÍ sição de sete anos ( J. Revilla Cardenas, comunica- ção pessoal, 1991). Uma parte do fundo do braço de Custos de construção Caraipé foi terraplanada antes do enchimento em Estimativas oficiais do custo de Tucuruí-I subi- um esforço para minimizar a decomposição da bio- ram de US$2,6 bilhões para US$5,1 bilhões na medi- massa. O tempo de reposição longo com a vegeta- da em que a barragem e seus planos evoluíram, princi- ção decompondo na represa resulta na produção de palmente como resultado de demoras e mudanças no ácidos que podem causar corrosão das turbinas (veja desenho e nos materiais (Brasil, ELETRONORTE, Fearnside, 1989a). 1989,p. 423). Estas estimativas são expressadas em O chefe do departamento de engenheiria civil dólares em 1986 e incluem juros pagos durante o pe- da ELETRONORTE em Tucuruí afirmou que ne- ríodo de construção (mas não depois disso). Lúcio nhuma corrosão das turbinas aconteceu, e que ne- Flávio Pinto calculou um custo (a partir de 1991) de nhuma turbina foi afastada ou substituída (Paulo US$8 bilhões (incluindo os juros sobre a dívida) para Edgar Dias Almeida, comunicação pessoal, 1991). Figura 3. O braço de Caraipé do reservatório que tem um tempo de reposição de sete anos, assim levando a pessíma qualidade de água com a decomposição da vegetação. Impactos Ambientais da Barragem de Tucuruí: 57 Lições Ainda Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia Houve alguma cavitação da turbina, embora isto é Dinheiro gasto na hidrelétrica também tem um descrito como um evento normal e que foi conser- custo de oportunidade. Se verbas governamentais não tado soldando com prata. Turbinas não são o único tivessem sido gastos em Tucuruí, elas poderiam ter equipamento pelo qual a água ácida do reservatório sido usadas para saúde, educação, ou investimento em tem que passar, e algumas das outras peças do equi- atividades produtivas que criam mais emprego para a pamento sofreram corrosão. Tubos pequenos (5-8 população local, do que faz o alumínio fundindo com cm de diâmetro) às vezes foram bloqueados por de- a energia da usina. O mesmo custo de oportunida- pósitos de cálcio causados por reação da água com o de que aplica ao dinheiro, também aplica ao uso da cimento. Os depósitos são tirados pelas equipes de energia da hidrelétrica: praticamente qualquer uso de manutenção do departamento de engenheira civil. energia diferente do beneficiamento de alumínio ge- raria muito mais benefício para a população brasileira Outro problema que tem sido relatado é interfe- (veja Fearnside, 1999). rência de troncos afundados e rolantes, assim afetando as estruturas auxiliares e a navegação (Monosowski, Apesar de recomendações que 85% da vege- 1990,p. 32). Nenhuma informação está disponível tação sejam removidos da área a ser inundada, a sobre a severidade ou duração deste problema. ELETRONORTE adotou um plano para desma-tar apenas 30% (A Província do Pará, 15 de junho de 1982; Monosowski, 1986). Exploração seletiva Custos de oportunidade de essências madeireiras de valor comercial recebeu Parte do custo da decisão para construir Tucuruí prioridade mais alta, embora isto foi levado a cabo não é o dinheiro gasto na construção, mas o que po- em apenas uma pequena parte da área, sendo um deria ter sido feito com a terra, mão-de-obra e di- resultado combinado de vários problemas. Valiosas nheiro dedicados ao projeto. Uma perda óbvia é os espécies estavam presentes a densidades mais baixas 13-14 × 106 m3 de madeira que eram submergidos que originalmente previsto: a estimativa inicial de 20 × 106 m3 (Brasil Florestal, 1979) caiu, por degraus, a 11 (Monosowski, 1990, p. 32). Uma porção modesta × 106 m3 e depois para 6 × 106 m3 (Pereira, 1982). A desta madeira foi recuperada por exploração das CAPEMI (Caixa de Pecúlio dos Militares), o fundo partes submergidas dos troncos de espécies valiosas de pensão militar que segurou a concessão de explo- usando uma motoserra subaquática (por exemplo, ração madeireira, era completamente sem experiência Brasil, ELETRONORTE, 1992). com operações de exploração madeireira; entre outros Madeira não é o único valor da floresta perdido problemas, equipamento encomendado em um con- com a inundação. Usos não-madeireiros da floresta trato de US$100 milhões com uma empresa francesa também têm valor. Castanha do Pará (Bertholletia (Maison Lazard Frères) foi inapropriado e o contrato excelsa) era comum na área de submersão. Ainda não foi cancelado (Pereira, 1982). O curto prazo dispo- são explorados comercialmente muitos produtos de nível antes de encher o reservatório contribuíu para floresta de não-madeiras; os usos de muitos produ- tornar inviáveis os planos para exploração madeireira, tos potencialmente importantes nem mesmo são mas os cinco anos que decorreram entre a seleção de conhecidos ainda. Perda de floresta implica tanto na CAPEMI em 1979 (Jornal do Brasil, 10 de julho de perda do estoque de usos potenciais como na perda 1979) e a conclusão da barragem deveria ter permiti- do valor da biodiversidade, independente de cálcu- do a remoção de muito mais madeira (no entanto, o cronograma original para construção visava comple- los utilitários. Nossa habilidade pouca desenvolvida tar a barragem antes de 1982). Depois de começar a para colocar um valor na perda da floresta tropical operação de exploração madeireira, a CAPEMI con- não diminui a realidade destas perdas, embora as ex- vidou o Projeto Jari a se juntar no empreendimento. clui efetivamente de consideração em quase toda to- O Jari enviou seus gerentes de serraria, que ficavam mada de decisões sobre projetos que conduzem para chocados pela incompetência técnica do pessoal da destruição da floresta. CAPEMI e optaram de não se unirem ao esquema Outros recursos na área de submersão também (engenheiros da serraria do projeto Jari, comunicação estão perdidos, inclusive minerais. A área continha pessoal, 1983). alguns diamantes que estavam sendo explorados A CAPEMI faliu em 1983, no meio de um antes de encher o reservatório ( Junk & de Mello, escândalo financeiro (A Crítica, 04 de fevereiro de 1987,p. 371). 1983), depois de desmatar apenas 0,5% da área de 58 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras submersão e apenas 10% da área que foi contratada excedendo em muito as áreas calculadas na ocasião para ser cortada (Barham & Caufield, 1984). Uma em que são tomadas as decisões sobre a construção área adicional adjacente à represa foi desmatada pela da barragem. O estudo de viabilidade de Tucuruí-I ELETRONORTE. Presumindo que toda esta “área calculou a área de reservatório em apenas 1.630 km2 crítica” de 100 km2 realmente foi cortada, o total des- (Brasil, ELETRONORTE, 1974, p. 1-6). A área é matado seria 5% do reservatório (veja Monosowski, de 2.247 km2, medida de LANDSAT (Fearnside, 1986). A ELETRONORTE também afirmou ter 1995a), é 38% maior. O planejando de barragens hi- desmatado 330 km2 (Brasil, ELETRONORTE, drelétricas passa por uma sucessão de fases, denomi- 1992) e 400 km2 (Brasil, ELETRONORTE, 1985, nas “inventário” (completado em 1975 para a bacia folha de errata que corrige p. 9). do Tocantins-Araguaia), “viabilidade” (completado Também foi esperado remover madeira para em dezembro de 1974), “projeto básico” (comple- carvão vegetal, além de madeira para serraria. tado em junho de 1975), e “projeto executivo”. Era Inicialmente, era esperado que 11 × 106 m3 de madei- esperado que Tucuruí tivesse um nível normal de ra para carvão fosse extraídos antes do enchimento da operação de 70 m acima do nível do mar nas pri- represa (Brasil Florestal, 1979). Praticamente nenhu- meiras duas fases de desenho, mas isso foi elevado ma madeira foi extraída. Cinco anos depois de encher para 72 m nas duas fases finais. A área aumentou de o reservatório, quatro grandes serrarias e uma usina 1.630 km2 nas primeiras duas fases para 2.160 km2 de ferro gusa em Marabá concordaram em colher os no projeto básica e 2.430 km2 no projeto executiva 6 × 106 m3 aproveitáveis de madeira comercial que (Brasil, ELETRONORTE, 1989, p. 25). Além da foram calculados a estarem presentes no reservatório área diretamente inundada pelo reservatório, calcu- (Chiaretti, 1990). A madeira seria usada para carvão la-se que as 1.800 ilhas ao nível de água de 72 m para fabrição de ferro gusa. Aparentemente, muito totalizam 3.500 km2 (Brasil, ELETRONORTE, pouco disto foi colhido de fato. 1988, Seção 2.1, p. 1). As áreas dadas acima referem ao reservatório CUSTOS AMBIENTAIS ao nível de Tucuruí-I, 72 m acima do nível do mar. O plano original para Tucuruí-II pedido a elevação Perda de floresta do nível de água até 74 m acima do nível do mar (Brasil, ELETRONORTE, 1989, p. 25). A área Perda de ecossistemas naturais. A área da superfície aumentaria de 2.430 km2 para 2.635 km2 à cota de de água do reservatório, no nível de água de 72 m 2 74 m (Brasil, ELETRONORTE, 1989, p. 243). acima do nível do mar, era oficialmente 2.430 km Mapas topográficos preparados para calcular as áre- (Brasil, ELETRONORTE, s/d [1987], p. 24-25). as que seriam inundadas durante a fase inicial eram Mensurações de imagens de LANDSAT de 1989 2 muito incertos, e várias áreas foram inundadas por indicam 2.247 km de água (Fearnside, 1995a). As Tucuruí-I que foram indicadas como estando abai- estimativas do mesmo estudo para a área do lei- 2 xo a marca de 72 m (forçando um número signifi-to fluvial no reservatório indicam 321 km , base- cativo de agricultores a serem assentados de novo ado em um comprimento de reservatório de 170 ou a permanecerem com parte das suas terras de- km ( Juras, 1988) e uma largura média de 1.891 baixo d’água). No caso da represa atual (Tucuruí-I), m, medida de imagens em escala 1:250.000 de ra- o efeito líquido de erros no mapa topográfico era dar aerotransportado de visão lateral (SLAR) pro- de aumentar o tamanho do reservatório em mais de duzidas pelo projeto RADAMBRASIL (Brasil, Projeto RADAMBRASIL, 1981). O desmata- 300 km 2, embora algumas áreas que eram espera- mento prévio, feito pelos agricultores e pecuaristas das a serem submergidas permaneceram acima da na área de submersão, totalizou 143 km2 (Brasil, lâmina d’água. Funcionários da ELETRONORTE ELETRONORTE, 1992, p. 21). A floresta perdida reconheceram que aumentar a água acima do nível pela inundação ou pela quantia pequena de desmata- atual de 72 m seria politicamente imprático, devi- mento feita pela ELETRONORTE antes de encher do ao desalojamento de população, e afirmam que era, então, 2.247 - 321 - 143 = 1.783 km2. estão planejando operar Tucuruí-II sem aumentar mais o nível de água ( John Denys Cadman, comu- A sucessão de estimativas da área do reservató- nicação pessoal, 1996) (Obs.: afiliações de todos os rio de Tucuruí representa um padrão infeliz em re- indivíduos citados estão apresentados no Apêndice). presas amazônicas, com áreas realmente inundadas O volume menor de armazenamento de água no Impactos Ambientais da Barragem de Tucuruí: 59 Lições Ainda Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia reservatório de Tucuruí presumivelmente seria com- área de assentamento ao longo de estradas construi- pensado por maior regulamento do fluxo do rio por das por cortadores de mógno que unem a rodovia represas a montante. Transamazônica com a cidade de Tucumã. Disto deveria se lembrar que Balbina já deixou Emissões de gases de efeito estufa. Um dos impac- um precedente infeliz da ELETRONORTE en- tos de represas hidrelétricas na Amazônia, é emissão cher os reservatórios até níveis acima daqueles que de gases de efeito estufa, tais como o gás carbôni- foram previamente anunciados nos planos operacio- co (CO2) e o metano (CH4). A energia hidrelétri- nais. A Balbina seria operada a uma cota de 46 m ca é frequentemente promovida pelas autoridades acima do nível do mar (Brasil, ELETRONORTE, governamentais como sendo uma “fonte limpa” de 1987; Neumann, 1987), mas a ELETRONORTE, energia, em contraste com combustíveis fósseis (por ao invés disso, encheu a represa diretamente até a exemplo, de Souza, 1996). Embora as contribui- marca de 50 m, e até mesmo alcançou 50,2 m antes ções de combustíveis fósseis para o efeito estufa são das comportas serem abertas (Fearnside, 1989a). bem conhecidas, as hidrelétricas não estão livres de Independente disso mais área é inundada em impacto. A relação impacto/beneficio, varia tremen- Tucuruí própriamente dito, o esquema de Tucuruí- damente entre represas, de acordo com a produção II requereria regular o fluxo do rio Tocantins, cons- de energia delas: Tucuruí tem um saldo muito mais truindo a hidrelétrica de Santa Isabel no rio Araguaia, favorável do que, por exemplo, Balbina (Fearnside, o primeiro grande tributário a montante de Tucuruí 1995a, 1996; Rosa et al., 1996a). Tucuruí-I tem 1,63 (Paulo Edgar Dias Almeida, comunicação pessoal, Watts (W) de capacidade instalada por m 2 de su- 1991). Os impactos disto não foram considerados na perfície de reservatório, enqanto a densidade ener- proposta de Tucuruí-II. gética média para o potencial hidrelétrico inteiro da região amazônica (i.e., a lista do Plano 2010) foi A Tucuruí-II foi inicialmente apresentada pela calculada pela Eletrobrás em apenas 1 W/m2 (Rosa ELETRONORTE como sendo uma mera conti- et al., 1996b, p. 6). A cifra equivalente para os 5.537 nuação de um projeto de construção em andamento km2 de superfície de água nas quatro grandes re- desde antes de 23 de janeiro de 1986, quando entrou presas existentes (cuja capacidade instalada totaliza em vigor a exigência de um Relatório de Impacto so- 4.490 MW) é 0,81 W/m2, ou somente a metade da bre o Meio Ambiente (RIMA). No dia 15 de junho densidade energética de Tucuruí. de 1998, durante uma visita a Tucuruí, o Presidente Fernando Henrique Cardoso assinou a ordem que Emissões de gases de efeito estufa do reservató- liberou verbas para Tucuruí-II (Indriunas, 1998), rio de Tucuruí, foram calculadas durante um único sem um estudo de impacto ambiental. Apenas 21 ano (1990) (Fearnside, 1995a). Essa análise estava dias antes da ordem ser assinada, uma represen- subsequentemente estendida de um único ano para tante do Departamento de Meio Ambiente, da computar a quantia e o momento de liberação de ELETRONORTE, declarou publicamente que um emissões ao longo de um período de 100 anos, que estudo ambiental estava em andamento, mas ainda poderia ser comparado, então, com as emissões que não completado (Andréa Figueiredo, declaração pú- seriam produzidas gerando a mesma quantia de ener- blica, 25 de maio de 1998). gia a partir de combustíveis fósseis (Fearnside, 1997). Fatores considerados, incluíram o estoque inicial e a A perda de floresta causada pela Tucuruí não é distribuição do carbono, taxas e caminhos de decom- limitada à área inundada. Desmatamento também posição (conduzindo ao gás carbônico e ao metano), é feito por pessoas retiradas da área de submersão, e perdas de energia em linhas de transmissão. Fatores junto com outras pessoas que vão à área por cau- não consideradas incluiram a degradação da flores- sa de suas estradas, mercado e oportunidades de ta nas ilhas e nas margens do reservatório, fontes de emprego não agrícola (Schmink & Wood, 1992). óxido nitroso em zonas de deplacionamento e linhas Muito da margem do reservatório já foi desmatado. de transmissão, caminhos de emissão de metano adi- O desmatamento por pessoas deslocadas foi maior cional para liberação de árvores em pé, a passagen de que teria sido na ausência de Tucuruí porque uma água pelas turbinas, etc. Também não foram incluídas praga de mosquitos do gênro Mansonia causou mui- as emissões da fase de construção, nem as emissões tos problemas à população que tinha sido assenta- do desmatamento feito por pessoas deslocadas pelo da na Gleba Parakanã a se mudar para uma nova projeto (nem as pessoas atraídas pelo mesmo). 60 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Geração de energia hidrelétrica produz um gran- de metano nos primeiros anos depois de encher, se- de pulso de emissão de gás carbônico nos primeiros guido por um declínio (Duchemin et al., 2000). anos depois de encher o reservatório, enquanto a ge- Uma estimativa revisada das emissões de ração térmica produz um fluxo constante de gases Tucuruí (Fearnside, 2002) usa dados de emissão de em proporção à energia gerada. A molécula média metano informados por Rosa et al. (1996b,c, 1997) de gás carbônico na carga atmosférica contribuída e áreas cobertas de macrófitas baseadas em imagens por Tucuruí entra na atmosfera 15 anos mais cedo de LANDSAT de 1988 interpretadas por Novo & que a molécula média na carga comparável que seria Tundisi (1994). A área de macrófitas é maior nos produzida pela geração a partir de combustível fóssil primeiros anos de formação do reservatório, contri- (Fearnside, 1997). Isto significa que, considerando buindo para um grande pulso de emissões de meta- um horizonte de tempo de 100 anos, uma tonelada no durante estes anos e para um impacto aumenta- de CO2 emitida por Tucuruí tem mais impacto so- do da geração hidrelétrica relativo aos combustíveis bre o efeito estufa do que uma tonelada emitida por fósseis, quando é aplicado uma taxa de desconto aos combustível fóssil, tanto com, como sem a aplicação impactos das emissões. de uma taxa de desconto sobre os gases de efeito estufa. Se uma taxa de desconto for aplicada, então o Uma área grande do fundo de reservatório fica impacto relativo da opção hidrelétrica é aumentado. exposta sazonalmente (Figura 4). Considerando o Com zero desconto, a Tucuruí é 4,5 vezes melhor nível mínimo operacional de 58 m acima do nível que a geração de combustível fóssil (consideran- do mar para Tucuruí-I (Brasil, ELETRONORTE, do apenas o reservatório, como explicado acima). 1989, p. 64), esta área ocupa 858 km 2 (Fearnside, A baixas taxas de desconto anuais (1-2%), a atra- 1995a, p. 13). Quando inundada, a área de deple- tividade de Tucuruí, embora menos que seria sem cionamento tem condições ideais para geração de descontar, ainda é 3-4 vezes melhor que a geração metano, assim como também para metilação de usando combustível fóssil. Se a taxa de desconto al- mercúrio no solo. No reservatório de Samuel, por 2 cançar 15% ao ano, a situação é invertida, e a gera- exemplo, áreas como estas liberaram 15,3 g C/m / ção de combustível fóssil fica mais atraente de uma ano em forma de CH4 por ebulição, dependendo da 2 perspectiva de efeito estufa. Ainda não foi decidido época de inundação, comparado com 7,2 g C/m / se uma taxa de desconto maior que zero (ou qual- ano entre árvores mortas em pé em áreas permanen- 2 quer meio alternativo de ponderação por preferência temente inundadas e apenas 0,00027 g C/m /ano na temporal) será adotado na mitigação do efeito estufa calha principal (Rosa et al., 1996c, p. 150). sob o Protocolo de Kyoto, da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Uma decisão é provável no futuro próximo. A maioria do impacto de efeito estufa nos cálculos anteriores vem do CO2 liberado pela de- composição aérea de madeira: em 1990, o CO2 contribuiu com 83% e o CH4 com 17%, se for con- siderado o potencial de aquecimento global de 21 para CH4 para o impacto de uma tonelada des- te gás relativo a uma tonelada de CO2, usado pelo Painel Intergovernmental sobre Mudança de Clima (IPCC) (Schimel et al., 1996, p. 121). Na análise anterior, foi presumido que as emissões de meta- no seriam relativamente constantes ao longo do horizonte de tempo, e os valores estavam baseados em dados publicados sobre lagos de várzea (veja Fearnside, 1995a, p. 15). Estudos recentes em outros Figura 4. Deplecionamento anual expõe grandes áreas. Inundação sazonal fornece condições ideais para geração de metano, assim como também reservatórios indicam um grande pico em emissões para metilização de mercúrio no solo. Impactos Ambientais da Barragem de Tucuruí: 61 Lições Ainda Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia Podem ser calculadas as emissões aproximadas das turbinas, totalizando 0,6501. Considerando um por ebulição de CH4 em Tucuruí, presumindo que a potencial de aquecimento global de 21, isto é equi- área coberta pelas macrófitas ao longo do ciclo anu- valente a 13,7 × 106 t de gás de CO2 ou 3,7 × 106 t al segue as suposições de Novo & Tundisi (1994). de carbono equivalente a CO2. Foram calculadas as Foram calculadas estas emissões em 1990, como se- emissões de CO2 em 1990 em 9,45 × 106 t de gás de gue para cada hábitat (em 103 t de gás): calha do CO2, ou 2,6 × 106 t de carbono. A contribuição de rio: 0,002, outra água aberta sem árvores: 3,8, áre- metano representou 59% do impacto total de gases as de árvores em pé: 2,1, e áreas de macrófitas: 2,0 de efeito estufa de 6,3 × 106 t de carbono equivalen- (Fearnside, 2002). te a CO2 em 1990. Isto muda significativamente as São presumidas que as emissões de difusão se- estimativas anteriores para o ano 1990 (Fearnside, jam 50 mg CH4/m2/dia, baseado em uma comu- 1995) nas quais o CO2 contribuiu com 83% e o CH4 nicação pessoal por Evlyn Moraes Novo para E. com 17%. A estimativa revisada indica emissões mais Duchemin (Duchemin et al., 2000) para a emissão baixas de metano do próprio reservatório (principal- por este caminho. Em Tucuruí, quando o reservató- mente devido a valores mais baixos para emissão por rio tinha 10 anos; este valor é idêntico a uma medida m2 de macrófitas). No entanto, a estimativa revisada em Curuá-Una à idade 21 anos (Duchemin et al., indica emissões totais de carbono equivalente a CO2 2000). A emissão de difusão soma 39,9 × 103 t CH . que é o dobro da estimativa anterior quando metano 4 da água turbinada é incluído. Informações recentemente disponíveis permi- tem que sejam calculadas as emissões de metano liberado da água que saí das turbinas, assim aumen- Sedimentação tando substancialmente o grau de confiança das es- A sedimentação representa um problema em timativas das emissões. Também aumenta a emissão potencial a longo prazo para operação da represa, total deste gás, comparado com estimativas anterio- com implicações para decisões de desenvolvimen- res das emissões (Fearnside, 1995, 1997) que inclui- to hidrelétrico na bacia Tocantins-Araguaia e para ram metano da decomposição da floresta submergi- os impactos dessas decisões. ELETRONORTE da para a qual as suposições usadas agora parecem (1988, p. 126-127, 1989, p. 55) calculou que levaria terem sidos conservadoras. Baseado na quantidade pelo menos 400 anos para sedimentos junto à bar- de água necessária para gerar os 18,03 TWh de ragem, alcançarem o nível de 23 m acima do nível eletricidade que Tucuruí produziu em 1991 (Brasil, do mar, onde eles começariam a causar abrasão das ELETRONORTE, 1992, p. 3), e uma concentra- turbinas. Isto estava baseado na carga média de sedi- ção de metano de 6 mg/litro a 30 m de profundida- mento no alto rio Tocantins de 89 mg/litro (437.332 de (Rosa et al., 1997, p. 43), pode ser calculada que t/dia) e 77 mg/litro no rio Araguaia (188.945 t/dia) a quantidade de metano exportada do reservatório que ocuparia um volume de 332,0 × 106 m3/ano. Os pelas turbinas em 1991 era 0,673 × 106 t. dados sobre sedimentos são de 1975 (na cidade de O destino do metano na água que passa pelas Tucuruí), 1979 (em Jacundá e Itupiranga) e 1982 (em turbinas pode ser calculado baseado em dados da Itupiranga), ou seja, antes de qualquer desmatamen- barragem de Petit Saut, na Guiana francesa (Galy- to significativo na bacia (Brasil, ELETRONORTE, Lacaux et al., 1997). Baseado nestes dados, a libera- 1988, p. 126). Atualmente a situação é completa- ção em 1991 da água turbinada totalizou 0,602 ×106 mente diferente, com uma porção significativa já t CH (0,586 × 106 t nas turbinas e 0,016 × 106 t no desmatada e a área sendo destacada como o foco de 4 rio a jusante). O total de metano liberado da água desmatamento mais importante da Amazônia (cf. turbinada é 13 vezes maior que a liberação total da Brasil, INPE, 1999). ebulição e difusão no próprio reservatório. O desmatamento pode aumentar a taxa de ero- Em resumo, as emissões de metano em Tucuruí são do solo por uma ordem de grandeza na escala de em 1990 (presumido para ser iguais as emissões da roças agrícolas individuais (Fearnside, 1980, 1989b). superfície do reservatório em 1988 e às emissões da Embora não podem ser extrapoladas taxas de erosão água turbinada em 1991) era como segue, em 106 t diretamente de roças individuais para bacias hidro- CH4: 0,0078 de ebulição, 0,0399 de difusão, e 0,6024 gráficas, o aumento é suficiente para fazer com que 62 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras a sedimentação seja uma preocupação significante. Nenhuma escada de peixe foi construída em Um aumento de um fator de dez na taxa de ero- Tucuruí. Esta possibilidade foi considerada breve- são reduziria a vida útil da represa de 400 para 40 mente quando a barragem estava em construção, anos. Sedimentação começa nas partes superiores mas foi descartada, tanto devido ao custo como por de um reservatório, onde o volume ocupado reduz o causa de incerteza sobre a sua efetividade potencial. armazenamento vivo do reservatório muito antes da A diversidade de espécies de peixes na repre- acumulação de sedimento perto da barragem chegar sa diminuiu drasticamente, com as comunidades até as tomadas d’água das turbinas. Perda de arma- sendo dominadas por algumas espécies (Leite & zenamento vivo reduz a geração de energia durante Bittencourt, 1991). As mudanças em abundância de períodos de fluxo baixo. Como ELETRONORTE espécies de peixes resultaram em uma alteração ra- (1989, p. 55) menciona, os cálculos de sedimenta- dical da abundância relativa de peixes nos diferentes ção não incluem os efeitos de represas adicionais a níveis tróficos. Enquanto os consumidores primários montante que aumentariam a vida de Tucuruí, cap- tinham sido muito abundantes, a população de pre- turando sedimentos antes que eles chegassem ao dadores explodiu imediatamente depois do fecha- reservatório de Tucuruí. No entanto, transferir uma mento: no primeiro ano, piranhas (Serrasalmus, spp) parte do impacto de erosão para represas a montante representaram 40-70% dos peixes capturados em não resolve o problema: as capacidades de armaze- redes experimentais do INPA (Leite & Bittencourt, namento e as vidas úteis das represas a montante 1991). O domínio de predadores foi mantido du- também seriam reduzidas por estes sedimentos, rante os primeiros três anos, embora alguns consu- portanto resultando em perda de geração de energia midores primários e secundários conseguirem se re- em ambos as represas a montante e em Tucuruí. O cuperar parcialmente. A biomassa de peixes presente papel de represas a montante na redução da sedi- flutuou de forma extrema nos primeiros três anos (o mentação em Tucuruí acrescenta à motivação para período para o qual dados de monitoramento estão construir essas represas, os impactos ambientais e disponíveis): em janeiro de 1986 a biomassa de pei- sociais das quais seriam, portanto, em parte atribuí- xes tinha aumentado até um nível mais alto que ní- veis à Tucuruí. vel presente antes do fechamento, seguido por uma queda abruta no terceiro ano. Isto provavelmente Ecossistemas aquáticos foi devido aos peixes predatórios, que compôse- ram muito da biomassa, sofrerem fome por falta de Ao construir a barragem de Tucuruí, foram ra- presa, mas conclusões são complicadas pelo fato do dicalmente alterados os ambientes aquáticos tanto aumento da transparência da água fazer com que as acima como abaixo da barragem. Antes de fechar a redes experimentais sejam mais visíveis aos peixes barragem, o rio Tocantins sustentava uma alta diver- (Leite & Bittencourt, 1991). sidade de peixes. O Instituto Nacional de Pesquisas A pesca comercial foi proibida no reservatório da Amazônia (INPA) identificou mais de 350 espé- até o fim de 1985. Durante 1986 a captura comer- cies de peixes em Tucuruí; esta alta diversidade posa? cial aumentou rapidamente, ao mesmo tempo que problemas diferentes que os problemas em outros a biomassa de peixes presente no reservatório es- locais tropicais onde represas grandes tem sido cons- tava diminuindo (como indicado por redes experi- truídas, tais como em represas africanas onde tipica- mentais) (Leite & Bittencourt, 1991). O predador mente apenas 80 espécies, aproximadamente, estão tucunaré (Cichla ocellaris e C. temensis) representou presentes (Leite & Bittencourt, 1991). mais de 50% da captura comercial em 1986. Em A qualidade da água no reservatório é um gran- 1987 a captura por unidade de esforço começou de problema. Por causa da vegetação que decompõe a diminuir. Declínios acentuados em capturas de na represa, tanto de restos da floresta deixados em tucunaré também aconteceram em outros reserva- pé quando foi enchido o lago como de macrófitas tórios, tais como a Balbina. que proliferaram na superfície, a água fica ácida e Baseado na fertilidade da água e dados sobre anôxica (Garzon, 1984). Isto torna a água inadequa- produção primária e secundária em águas natu- da para muitas espécies de peixes. rais na Amazônia, Junk & de Mello (1987, p. 377) Impactos Ambientais da Barragem de Tucuruí: 63 Lições Ainda Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia calcularam que Tucuruí deveria produzir aproxima- vazios” (Brasil, ELETRONORTE, s/d [c. 1984], p. damente 40 kg/ha/ano de peixe, e concluiram que 3). Os consultores acrescentaram que “não houve “consequentemente, a contribuição dos reserva- desertificação ou devastação de espécies vegetais” tórios amazônicos ao abastecimento da população (Brasil, ELETRONORTE, s/d [c. 1984], p. 2). As com proteína será somente de importância local”. herbicidas achadas ([(3,5,6-tricloro-2-poridinol) A produção pesqueira no reservatório tem se mos- oxo] ácido acetico [Triclopir], acido 2,4-diclorofe- trado ser modesto de fato, embora foi o bastante noxoacetico [2,4-D] e pentaclorofenol [Tordon-101 para fornecer algum peixe para Belém. A produção BR]) estavam sendo injetadas nos troncos de casta- pesqueira a jusante de Tucuruí foi dizimada pela nheiras aneladas, em lugar de estarem sendo pulveri- represa devido ambos à má qualidade da água que zadas de aviões. Um mês depois de inundar o reser- atravessa as turbinas e ao bloqueio da migração de vatório, a ELETRONORTE contratou consultores peixes (Carvalho & de Merona, 1986; Odinetz- adicionais para amostrar e analisar água decima do Collart, 1987; veja Fearnside, 1999). (2) a jusante da local onde tinha sido o acampamento da CAPEMI. represa, em Cametá, colheita de camarão de água Nenhuma herbicida foi achada na água analisada, doce caiu de 179 t em 1981 para 62 t em 1988, en- embora isto não possa ser levado como prova que quanto desembarques de peixe caíram de 4.726 em barris não existiam no fundo do reservatório. 1985 para 831 em 1987 (Odinetz-Collart, 1993, p. A questão de herbicidas era um dos assuntos 161-163). A história oficial de ELETRONORTE mais polêmicos sobre Tucuruí na época quando o sobre Tucuruí descreve o efeito sobre peixes assim: enchimento do reservatório se aproximava. Uma re- “Do acompanhamento dos efeitos ocasionados pelo portagem até alegou que tinham sido mortos 7.000 represamento do rio Tocantins sobre a ictiofauna, pessoas em um teste genocidal de venenos, leva- concluíu-se que a montante a situação é satisfatória do a cabo em nome do Pentágono (a sede militar nos dois primeiros anos de operação da usina [1985- dos E.U.A., perto de Washington, DC) na área a 1986].... A jusante as condições eram um pouco ser inundada por Tucuruí (Perez, 1985). Jornais em menos satisfatórias...” (Brasil, ELETRONORTE, Belém alegaram que Agente Laranja (o desfolhante 1989, p. 436). usado pelo exército dos E.U.A. no Vietnã) poderia descer o rio Tocantins e poderia contaminar Belém Desfolhantes (O Liberal, 03 de abril de 1984). Logo após o reser- O uso de desfolhante foi uma fonte de contro- vatório ter começado a encher, um ensaio publica- vérsia persistente em torno de Tucuruí. A CAPEMI do em um jornal de Belém repreendeu os críticos foi acusada de “usar desfolhante secretamente para e insinuou que estes exageros sobre herbicidas in- desmatar a floresta” (Barham & Caufield, 1984). A validaram todas as preocupações ambientais relativo CAPEMI armazenou barris de desfolhante segun- à Tucuruí (Bemerguy, 1984).A ELETRONORTE do notícias para uso nesta tarefa, que eram, depois, reproduziu o ensaio amplamente em folhetos, carta- escondidos na floresta perto do acampamento da zes e outras publicidades. companhia e depois inundados pelo reservatório. A Uma segunda controvérsia envolvendo her- CAPEMI negou estas alegações, assim como tam- bicidas, era uma proposta de pesquisa traçada em bém fez a ELETRONORTE (por exemplo, Brazil, 1982 pelo gabinete do diretor do Instituto Nacional ELETRONORTE, s/d [1984]). O mais perto que de Pesquisas da Amazônia (INPA), a pedido da este autor pôde chegar a confirmar esta história era ELETRONORTE, para um teste de herbicidas uma pessoa na vila de Tucuruí que declarou enfa- (Tordon-101 e Tordon-155 que contêm 2,4-D e ticamente que, em ocasiões separadas, dois traba- 2,4,5-T [ácido (2,4,5-trichlorofenoxi) acetico], res- lhadores que tinham trabalhado para CAPEMI lhe pectivamente), visando avaliar a utilidade potencial havia falado que eles tinham ajudado a esconder delas para desmatar a floresta com pulverização aérea barris de veneno na floresta antes de uma inspeção. na área de submersão. Foi denunciada a existência Em junho de 1983, uma inspeção da área do acam- da proposta à imprensa por Paulo Nogueira Neto, pamento feita por ELETRONORTE e consultores chefe da Secretaria Especial do Meio Ambiente acompanhantes encontrou 373 barris, “quase todos (SEMA, depois fundida com outros órgãos para 64 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras formar o IBAMA: Instituto Brasileiro do Meio raramente atendida). Em março de 1982, o dono Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) de uma fazenda (Fazenda Ipê), situado na linha de (Caufield, 1983, p. 64; Sun, 1982). O teste de herbi- transmissão entre Tailândia e Goianésia, pediu in- cide proposto não prosseguiu como resultado de um denização da ELETRONORTE para seis cabeças clamor público (Sun, 1982). O Ministro do Interior, de gado que ele alegou que tinha sido envenenadas Mário Andreazza, ordenou a ELETRONORTE de por herbicidas. A ELETRONORTE contratou não proceder com os seus planos para usar herbici- consultores para analisar amostras de capim, solo des (Sun, 1982). Embora o Brasil não era ainda uma e água em açudes, assim como também o sangue, democracia em 1982, Andreazza estava preparando ossos e fezes de animais selecionados. Nenhuma para lançar a candidatura presidencial dele para o toxina foi encontrada, e os consultores diagnostica- colegio eleitoral de 1984. A controvérsia sobre des- ram uma vaca com sintomas semelhantes sofren- folhantes representa um dos poucos exemplos onde do de infestação de lombriga e deficiências agudas a opinião pública teve uma influência perceptível de fósforo e de zinco (Brasil, ELETRONORTE, sobre a tomada de decisões com relação à Tucuruí. s/d [c. 1983]). No laboratório (em Jaboticabal, São Um dos reflexos da controvérsia sobre herbici- Paulo) foram alimentadas doses altas de Tordon a das, ilustra um problema fundamental com o siste- uma amostra de ratos, coelhos e gado sem resul- ma de empresas de consultorias em relação a proble- tar em morte. As doses letais à qual 50% morrem mas ambientais. Uma empresa consultora (Structure (LD50) para camondongos, ratos e coelhos são S.A.) foi contratada para estudar a questão de remo- 3,75, 1,5 e 2,0 g/kg de peso corporal, respectiva- ção de biomassa florestal, e recomendou que pelo mente (Merck Index, 1983, p. 7.287). menos 85% da biomassa sejam removidos antes de O incidente de envenenamento na linha de encher o reservatório. O principal especialista para transmissão em 1982 foi alegado ter levado as vi- a empresa (Samuel Murgel Blanco) foi despedido das de vítimas humanas, assim como também de quando ele enviou uma carta ao governo confirman- gado. Dois cemitérios novos em “Inocêncio” (Vila do a oposição dele ao uso de desfolhantes na floresta Bom Jesus) e “Jutuba” foram estabelecidos apres- na área do reservatório (Barros, 1982). sadamente para acomodar os mortos ao longo do Uma terceira controvérsia envolvendo herbici- trecho de 92 km da rodovia BR-150 entre Tailândia das era o uso desses na manutenção da linha de e Goianésia, de acordo com uma delegação da transmissão livre de vegetação lenhosa. Em 1984, Ordem de Advogados do Brasil (OAB) que visitou a ELETRONORTE contratou uma companhia a área dois anos depois (OAB, 1984). O presiden- (Consórcio ENGEVIX/Cetenco), um subcontra- te da ELETRONORTE e o Ministro das Minas tante (AGROMAX) de que usou Tordon-101 BR, e Energia negaram que qualquer morte tivesse sido Tordon-155 e BANVEL-450 para matar plan- resultado da pulverização por herbicida (O Liberal, tas dicotiledonas abaixo da linha de transmissão 07 de fevereiro de 1984). (Brasil, ELETRONORTE, s/d [1984]). Embora Tordon-101 BR (a principal herbicida usada) fre- qüentemente está chamado Agente Laranja, é im- MEDIDAS MITIGATÓRIAS portante lembrar que a substância química borrifi- Salvamento arqueológico cada no Vietnã nas operações militares dos E.U.A. tinha níveis mais altos de contaminação com dio- Como parte dos esforços da ELETRONORTE xina do que o Tordon comercial. Dioxina é um dos para mitigar os impactos de Tucuruí, foram iden- venenos mais mortíferos para seres humanos, cau- tificados 24 locais arqueológicos na área de sub- sando deformidades de nascimento entre outros ti- mersão. A ELETRONORTE colecionou 27.369 pos de dano. Enquanto Tordon for freqüentemente peças cerâmicas e 4.446 peças líticas, que foram usado em pastagens amazônicas sem causar mor- depositadas no Museu Paraense Emílio Goeldi, tes humanas em larga escala, é tóxico a humanos em Belém. Uma amostra de carvão de um dos lo- e invariavelmente é vendido no Brasil com adver- cais foi datada como sendo de 70-1000 DC (Brasil, tências para precaução em linguagem firme (mas ELETRONORTE, 1985, p. 28). Impactos Ambientais da Barragem de Tucuruí: 65 Lições Ainda Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia Salvamento da fauna TOMADA DE DECISÕES A ELETRONORTE colecionou 284.000 Avaliação de impacto ambiental animais, principalmente mamíferos e répteis, na operação de salvamento de fauna conhecida como A barragem foi construída antes de 23 de ja- “Operação Curupira”. Esta operação volumosa teve neiro de 1986, quando o Conselho Nacional do mais de 600 participantes diretos, dezenas de bar- Meio Ambiente (CONAMA) estabeleceu a sua cos, além de helicópteros, rádios, e instalações para Resolução no. 001 para operacionalizar a Lei Federal no. 6.938 de 31 de agosto de 1981, exigin- a triagem e quarentena dos animais colecionados. do Relatórios de Impacto sobre o Meio Ambiente Gribel (1993) comparou o número e biomassa de (RIMAs). A compilação de informações ambien- mamíferos colecionados com os encontrados em tais disponíveis (Goodland, 1978) foi encomendado estudos de florestas amazônicas em outros locais, pela ELETRONORTE. O Banco Mundial recu- e concluiu que apenas uma porcentagem pequena sou financiar a construção da barragem por causa dos mamíferos que foram capturados. Até mesmo os de preocupações ambientais (Robert J.A. Goodland, que foram capturados e soltos não foram poupados comunicação pessoal, 1986). Uma série mais deta- durante muito tempo. Um problema é o estado es- lhada de relatórios foi compilada pelo INPA (sob tressado e debilitado dos animais na hora da soltura. contrato da ELETRONORTE) durante o período Outro problema é que, mudando os animais de lugar quando a barragem estava em construção (Brasil, faz com que eles entram em competição com popu- INPA/ELETRONORTE, 1982, 1984). Até mes- lações de animais já presentes na área de soltura. No mo o estudo anterior (Goodland, 1978) somente foi caso de Tucuruí, o prolongamento adicional de vida realizado em uma visita de campo de um mês, em dos animais salvos pela Operação Curupira em 1984 dezembro de 1976, depois que a construção estives- era mais efêmero ainda: um relatório de pesquisa de se em andamento: a construção começou em 24 de campo de 1986 pela ELETRONORTE indica que novembro de 1975, e o rio foi desviado em 06 de todas as reservas criadas para receber a fauna salva outubro de 1976. tinham sido invadidos por madeireiros e caçadores A abrangência de ambos os estudos ambientais (Monosowski, 1990, p. 33). era muito estreita, sendo limitado aos efeitos ime- A razão principal para a operação de salvamen- diatos da represa. O foco era sobre os problemas to de fauna parece ser o seu papel em relações pú- ambientais que poderiam afetar o funcionando da blicas. A operação foi destacada em cobertura de usina, ao invés de tentar proteger o meio ambien- mídia da represa na televisão e em anúncios ilus- te e a população humana contra os impactos que a trados em revistas. barragem poderia causar. Nenhum estudo foi feito sobre a infra-estrutura associada, tais como estradas de acesso e linhas de transmissão. Banco de germoplasmo Muitos dos assuntos estudados somente foram Criação de um banco de germoplasmo tam- incluídos na última hora, sob a pressão da opinião bém foi considerada uma medida mitigatória. pública. Por exemplo, estudos para avaliar a possi- Este projeto, levado a cabo pelo INPA, espécimes bilidade de salinização do estuário e da água for- foram plantados de espécies de árvore diferentes necida à Belém do rio Guamá foram feitos apenas coletadas na área de submersão em 28 parcelas algumas semanas antes de terminar a construção da de 2,4 ha em uma ilha no reservatório perto da barragem. A ELETRONORTE empreendeu os es- barragem. Somente uma pequena parte de uma tudos sob forte pressão da opinião pública, que es- parcela recebeu alguma manutenção. A sede da tava bastante preocupada com o fechamento do rio área serviu principalmente como um ponto de Tocantins no período antes da época de água baixa piquenique para funcionários de alto-nível da em Belém (Monosowski, 1990, p. 31). ELETRONORTE lotados em Tucuruí, e como Os estudos de impacto nunca consideraram uma parada para recepção de visitas que eram a opção “sem projeto” (Monosowski, 1990, p. 30). mostradas atividades ambientais na área. Este procedimento garante que o efeito dos estudos 66 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras foi limitado a ajudar na implantação de planos que Hidrelétrica de Altamira (Babaquara) era listada foram decididos sem consideração de impactos am- no plano decenal para conclusão em 2013 (Brasil, bientais e sociais. Eletrobrás, 1998, p. 148). Um aspecto infeliz dos estudos ambientais em Tucuruí é a restrição dos estudos à consideração da O papel da pesquisa fase inicial de um plano de desenvolvimento que te- O papel da pesquisa no planejamento, autori- ria muitos impactos além os que resultam apenas do zação e execução de grandes projetos de engenha- primeiro passo. Neste caso, a Tucuruí-I seria seguida ria, tais como barragens hidrelétricas, é um assunto pela Tucuruí-II, e então por uma cadeia de outras crítico que se teem para evoluir procedimentos de represas na bacia Tocantins-Araguaia. O problema tomada de decisão que conseguem previnir as ma- de projetos que isoladamente podem ser benéficos, ladventuras que agora caracterizam o processo de mas que deslancham uma cadeia de desastres em um desenvolvimento na Amazônia. O enfoque de rela- esquema de desenvolvimento a nível de bacia, é um ções públicas de muitas atividades relacionadas ao padrão comum no desenvolvimento hidrelétrico. O meio ambiente, tais como o esforço altamente divul- caso mais dramático é o rio Xingu, onde tem sido gada de salvamento da vida selvagem, é uma ques- proposto uma barragem (Belo Monte, antigamente tão de intensa controvérsia. Pesquisa é usada para chamado de Kararaô), mas que faria uma série de propósitos semelhantes: por exemplo, durante uma represas a montante atraentes para regular o fluxo demonstração pública em Belém contra o fecha- do rio e assim aumentar a produção energêtica da mento da barragem de Tucuruí, folhetos (Figura 5) primeira barragem. As barragens a montante, inclu- foram soltas por helicóptero para tranqüilizar os lei- sive a Usina Hidrelétrica de Altamira, de 6.140 km2 tores que a pesquisa do INPA na área garantiu que (antigamente chamada de Babaquara), inundariam não haveria nenhum problema ambiental (Brasil, áreas grandes de terra indígena e teriam impactos ELETRONORTE, s/d [1984]). A mesma alega- ambientais muito mais severos que a primeira re- ção foi feita em um documento enviado ao governo presa na série (Santos & de Andrade, 1990). A municipal de Cametá, a jusante da represa (Brasil, Figura 5. Folhetos soltos por helicóptero pela ELETRONORTE, alegando que a hidrelétrica Tucuruí não teria praticamente nenhum impacto negativo. Impactos Ambientais da Barragem de Tucuruí: 67 Lições Ainda Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia ELETRONORTE, 1984). Nenhum endosso desse são trazidos para lidar com a tarefa desagradável de tipo foi feito pelo INPA, nem pelos pesquisadores minimizar desgraças ambientais, ao invés de serem individuais envolvidos no estudo. A publicação de considerados como fontes de informações básicas resultados pelos pesquisadores estava sujeito à apro- para tomar as decisões iniciais. Esta abordagem de vação da ELETRONORTE, de acordo com as con- “pistoleiro” a ecologia é improvável que seja eficaz dições do contrato de financiamento das pesquisas. em assegurar um desenvolvimento sustentável e pre- É essencial que tanto os estudos como a dissemina- servar a qualidade ambiental. ção subsequente dos seus resultados sejam livres de interferência de qualquer fonte. Deveria ser mencionado que a pesquisa levado a cabo sob contratos da ELETRONORTE como par- Um caso específico é a proibição pela te dos estudos ambientais em Tucuruí, assim como ELETRONORTE de divulgação de informação no em outras represas amazônicas, era extremamente Terceiro Congresso Brasileiro de Limnologia, reali- ineficiente como fonte de conhecimento científico zado em Porto Alegre em 1990 (Zero Hora, 27 de publicado. A ênfase estava em fornecer listas extensas julho de 1990). A ELETRONORTE não permitiu de espécies e mensurações, ao invés de de responder que os pesquisadores por ela financiados falassem a perguntas científicas específicas. Pesquisa orientada dos resultados dos seus trabalhos sobre impactos por hipóteses estava praticamente ausente. Fornecer ambientais de Tucuruí, de acordo com declarações a massa de dados necessária para os relatórios era um no congresso por Evlyn Moraes Novo, pesquisadora objetivo muito mais importante que produzir estu- sênior do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais dos publicados na literatura científica. Além disso, o (INPE), que trabalha com a interpretação de ima- estímulo financeiro de diárias oferecidas a participan- gens de satélite da área. tes de instituições de pesquisa em expedições cole- Limitações sobre o fluxo de informação cien- cionando amostras contribuíu para manter números tífica reduziram consideravelmente os benefícios grandes de pessoas ocupadas nesta atividade durante que a experiência a Tucuruí poderia ter na melhora períodos estendidos (especialmente pessoal de apoio do planejamento de desenvolvimentos hidrelétri- técnico, para quem as diárias representavam uma cos em outros lugares. Por exemplo, em 1981 este porção significante das suas rendas).(3) É claro que o autor conheceu uma das pessoas responsáveis pe- estímulo de diárias somente se aplicava às expedições los estudos ambientais na hidrelétrica de Guri, na para coletar no campo, não à análise subsequente do Venezuela, e inocentemente convidou os venezue- material e dos dados e à publicação dos resultados. lanos a visitar o INPA para aprender mais sobre as O legado disto ainda pode ser visto depois de filas pesquisas de Tucuruí que estavam em andamento de estantes com vidros de amostras não analisadas na na época. Quando uma delegação da Venezuela coleção de peixes do INPA. apareceu no INPA alguns meses depois, eles ti- Apesar das ineficiências do programa de pes- veram que partir praticamente de mãos vazias por quisa em Tucuruí, a pesquisa é fundamental para causa das restrições da ELETRONORTE sobre diagnosticar impactos ambientais potenciais e me- divulgação das informações. lhorar a tomada de decisões. Em comparação com A conexão de pesquisa científica com os projetos a grande maioria dos locais na Amazônia brasilei- de desenvolvimento está encorajando, mas não é su- ra, o programa de pesquisa em Tucuruí resultou em ficiente e não entra no processo de tomada de deci- uma das maiores concentrações de conhecimento sões na hora adequada para afetar a estrutura básica sobre biodiversidade; infelizmente, muito pouca ou a existência dos projetos em questão. Os eventos ligação existiu entre os resultados de pesquisa e as em Tucuruí oferecem um bom exemplo. Ecólogos ações mitigatórias (Rosa et al., 1996d). A constru- quase nunca são consultados antes da tomada de ção da barragem de Tucuruí simultaneamente com decisões para implantar grandes projetos como este. os estudos ambientais garantiu que o efeito máximo Apenas são pedidas depois informações sobre as- que os resultados poderiam ter, seria sugerir modi- suntos ambientais, com a intenção limitada de su- ficações secundárias em procedimentos de operação, gerir maneiras de minimizar os danos ambientais uma vez que a barragem já era um fato consumado causados pelas obras que já são executadas. Ecólogos (veja Fearnside, 1985). Pesquisa baninda para um 68 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras papel meramente simbólico é uma tradição infeliz Parte da explicação vem da rentabilidade extra- no planejamento de desenvolvimento amazônico ordinariamente alta de administrar subcontratos as- (Fearnside, 1986). sociados a projetos de construção. Lúcio Flávio Pinto (1991a, Bloco 12, p. 2--Bloco 13, p. 1) declarou com A influência das empresas de construção referência à Tucuruí: Em depoimento à comissão parlamentar de “A taxa de lucro dele [Sebastião Camargo] era de inquérito (CPI) sobre hidrelétricas na Assembléia quinhentos milhões de dólares e isto representa qua- Legislativa do Estado do Pará em abril de 1991, se 10% do custo total da obra, não incluído sos juros Lúcio Flávio Pinto (1991, Bloco 6, p. 1) descreveu a depois da construção, isto porque, ele tinha uma taxa situação como segue: de administração sobre cada coisa que administra-va na obra. Era muito comum quem chegasse em “A política de construção hidrelétrica e a po- Tucuruí, por exemplo, de noite, encontravam turmas lítica energética no Brasil é uma subsidiária das cuidando de um jardim. Se um jardineiro ganhava empreiteiras; quem decide são as empreiteiras. No um salário mínimo, a Camargo Corrêa ganhava 2,9 caso de Tucuruí, por exemplo, há um escândalo. vezes que ganhava o jardineiro. Se ela construisse Primeiro, no início da obra, que é muito comum uma casa, ganhou 2,9 vezes o valor da casa. Se ela em barragens, entra o empreiteiro secundário. O pagava o salário do professor ela ganhava duas vezes empreiteiro secundário era a Camargo Corrêa; pre- o salário do professor. Por isso o salário de um pro- para a infraestrutura para o empreiteiro principal fessor na obra, o anual, correspondia as vezes à verba entrar, mas quando entra o empreiteiro secundá- do orçamento do Município da Educação. rio numa barragem, no Brasil, já se sabe, automa- Desde a conclusão da barragem de Tucuruí ticamente, que ele vai ser o empreiteiro principal em 1984 até o final de 1991 (sete anos), Camargo porque quando ele [o empreiteiro secundário] faz a Corrêa manteve um vasto estacionamento cheio de obra inicial ele investe tanto, além do valor do con- maquinaria inativa de terraplanagem. Isto ficava si- trato, que nenhuma empreiteira, mesmo querendo tuado imediatamente adjacente à barragem, e assim furar aquele esquema de acerto que se tornou pú- era prontamente aparente a todas as visitas. Muito blico com a [revelação] do escândalo da [Ferrovia] do equipamento pesado estava quebrado e inserví- Norte-Sul, ele não faz porque não tem condições. vel. A ELETRONORTE estava pagando aluguel O outro já investiu além do que deveria investir por na maquinaria estacionada durante todo deste perí- conta dos recursos do governo. Então, a Camargo odo, de acordo com funcionários na barragem.” Corrêa, de empreiteira secundária, se tornou ime- Uma fonte adicional de retorno financeiro é diatamente a empreiteira principal.”(4) uma usina de sílica metálica localizada perto da Lúcio Flávio Pinto (1991a, Bloco 12, p. 2) apon- cidade de Tucuruí, com uma produção anual de tou a associação entre o contrato de Tucuruí e a ascen- 32.000 t (Brasil, ELETRONORTE, 1988, Vol. 1, p. são à condição de bilionário de Sebastião Camargo (o 25). A usina é um cliente “preferencial” da hidrelé- principal dono da empresa de construção Camargo trica (Seva, 1990, p. 23). Desde setembro de 1988, Corrêa). A revista Forbes atribui o aumento acentu- Camargo Corrêa Metais S.A. usou energia da hi- ado no número de bilionários na América Latina a drelétrica à taxas subsidiadas (Corrente Contínua, uma “onda extraordinária de energia capitalista” na- março de 1989, p. 11). As taxas subsidiadas de quela região (Folha de São Paulo, 07 de julho de 1992). Camargo Corrêa durarão até 2018 (Lobo, 1989). No caso do Brasil, no entanto, provavelmente não Uma maneira em que as empreiteiras de cons- é uma coincidência que três dos cinco bilionários trução influenciam nos desenvolvimentos, de no País em 1992 eram donos de grandes empresas modo que pode não estar nos melhores interesses de construção que contratavam para óbras públi- do país, é o esparramando do desenvolvimento em cas na Amazônia: Sebastião Camargo (Hidrelétrica muitas bacias hidrográficas. Porque o sistema atual de Tucuruí), Andrade Gutierrez (Hidrelétrica de faz com que seja provável que a empresa que ad- Balbina) e Antônio Emírio de Morais (Grupo quire o contrato para a primeira barragem em um Votorantim: Ferrovia Norte-Sul). determinado rio também adquirirá os contratos Impactos Ambientais da Barragem de Tucuruí: 69 Lições Ainda Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia para barragens futuros no mesmo rio, a competição A influência de interesses estrangeiros (que necessariamente não toma a forma de lances mais baixas nas licitações) é feroz para os contra- Tucuruí foi construído especificamente para tos iniciais. Cada empresa de construção gostaria fornecer energia as usinas de alumínio de ALBRÁS de apostar sua reivindicação para tantas bacias hi- e ALUMAR (Pinto, 1991a). Lúcio Flávio Pinto drográficas quanto possível, ao invés de desenvol- (1991a, Bloco 2, p. 4, também veja 1991b, p. 144) ver uma bacia completamente antes de se proceder apresentou o seguinte depoimento à CPI: para a próxima. Às vezes o comportamento das “[A] decisão de construir Tucuruí, não foi empresas de construção é comparada a cachorros adotada no Brasil; em verdade, ela foi adotada em machos que urinam em objetos para marcar os seus Tóquio, numa negociação que na época o Ministro territórios. Esta pode ser uma estratégia ruim para das Minas e Energia, Shigiaki Ueki, condiziu com o desenvolvimento hidrelétrico do país, já que os um grupo de empresas do Governo Japonês. Foi de- custos com a transmissão e construção são maiores cidido em Tóquio porque, o consórcio japonês, re- quando as barragens estão espalhadas, a vantagem solveu implantar a 40 km de Belém, em Barcarena, de uma represa que regula o fluxo de água para a o que, na época era a maior fábrica de alumínio no próxima está perdida, e os impactos biológicos au- mundo.” mentam com o bloqueio da migração de peixes em Parte da influência estrangeira veio da França, mais rios. e a forma que isto levou é um assunto sobre o qual somente as suposições mais indiretas são possíveis. A influência do Exército Uma vez mais, a melhor fonte de informação é o de- A escolha da CAPEMI para fazer a exploração poimento de Lúcio Flávio Pinto à CPI em Belém. As informações que vêm de Lúcio Flávio Pinto madeireira é uma de várias maneiras em que os de- devem ser levadas seriamente, já que ele tem uma senvolvimentos em Tucuruí foram associados com o reputação de ter informações corretas sobre assun- Serviço Nacional de Informações (SNI), uma agên- tos dessa natureza. Sua apresentação como parte do cia de espionagem interna muito temida que manteve depoimento a uma audiência parlamentária acres- dossiês sobre milhares de brasileiros durante a ditadu- centa mais ainda à sua credibilidade. No livro dele, ra militar que governou o país de 1964 a 1985. Lúcio Amazônia: A Fronteira dos Caos, Pinto (1991b, p. Flávio Pinto (1991a, Bloco 12, p. 1-2) descreveu a rela- 143) descreve os eventos assim: ção como segue no seu depoimento para a CPI: “Há casos dramáticos, como o da usina de Tucuruí, “Então o que fez é que foi criada uma empresa a maior obra pública na história da Amazônia, uma [CAPEMI] que foi criada três meses antes da li- das maiores da história do Brasil. Lá o endividamen- citação [pela concessão de exploração madeireira]-- to foi de 70%, e não por acaso quem negociou esse falo da CAPEMI Agropecuária—empresa ligada ao empréstimo foi na época o embaixador do Brasil SNI [Serviço Nacional de Informações], isso porque na França [Antônio] Delfim Netto [posteriormen- o chefe do SNI queria ser Presidente da República, te Ministro de Planejamento, enquanto a barragem que era o General [Octávio de] Medeiros. Então o estava em construção; também um dos amigos mais aproveitamento da madeira foi um negócio para ge- íntimos de Sebastião Camargo (Marques 1994)], rar receita para a campanha do General Medeiros. vivendo um exílio dourado na época do General O homem que era o gerente do projeto não sabia di- [Ernesto] Geisel [ditador do Brasil, 1973-1979]. ferenciar um pé de alface de um pé de Ipê [Tabebuia Então ele negociou, e quem melhor contou como foi spp]... A CAPEMI gastou muito mais dinheiro essa negociação foi um jornalista aliado do então em- comprando [do que ganhou da madeira]. Ali foi baixador, Alexandre von Baumgarten, que escreveu uma negociata feita para desviar dinheiro ...o es- uma novela porque não teve coragem para escrever quema foi tão ruim que acabou ruindo rapidamente coisa real, como ensaio. Escreveu uma novela chama- ...deixando um buraco [financeiro] que foi coberto da ‘Yellow Cake’ (Bolo Amarelo), onde conta como pelo governo brasileiro através do BNCC [Banco foi a comissão, como foi que se negociouo o emprés- Nacional de Crédito Cooperativo].” timo para Tucuruí em Paris.” 70 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Alexandre von Baumgarten, que ficou famo- Brasil, cujo orçamento é de bilhões de dólares, não so em associação com o caso CAPEMI (de’Carli, tinha recursos para fotocópias (Frederico Magalhães 1985), foi assassinado, e o General Newton Cruz Gomes, declaração pública, 07 de novembro de 1989). [ex-chefe do Serviço Nacional de Informações] foi processado como mandante do assassinato que O sigílio e a evolução contínua dos planos ofe- matou este jornalista.(5) Von Baumgarten (1983), recem meios ideais de evitar qualquer interrogatório. em um romance publicado depois da morte dele, Quando planos vêm a luz e são questionados, as au- “dá nomes fictícios a fatos reais que ele presenciava, toridades sempre podem alegar que o plano mudou. pois ele tinha contacto muito grande com os órgãos de segurança do governo, ele diz que este embaixa- CONCLUSÕES: AS LIÇÕES DE TUCURUÍ dor recebia propina para negociar a dívida” (Pinto, 1991a, Bloco 5, p. 2). O contraste entre os benefícios potenciais de Tucuruí e os reais benefícios para o Brasil quase não A metade das turbinas foi comprado de Neyrpic, poderia ser maior. Examinar os impactos específicos de Grenoble, e de Creusot-Loire, de Le Creusot, deste ou de qualquer outra represa é insuficiente para França. A outra metade foi feita na Mecânica Pesada a tomada de decisões a menos que a pergunta sobre Ltda., em Taubaté, São Paulo, uma subsidiária bra- para quem provêm os benefícios seja respondida sa- sileira do mesmo grupo francês. Os francêses finan- tisfatoriamente. Infelizmente, isto não aconteceu no ciaram estes por “supply credits”, ou empréstimos caso de Tucuruí, que beneficia principalmente com- de provisão que levam a exigência de que os equi- panhias multinacionais de alumínio. A Tucuruí tem pamentos sejam comprados dos fornecedores fran- impactos severos, inclusive perda de floresta, deslo- ceses, e aos preços estipulados por eles. Até 1991, camento de povos indígenas e residentes ribeirinhos a dívida com os franceses totalizou US$3 bilhões, na área de submersão, eliminação da pesca a jusante, formação de criadoros para uma praga de mosqui- e nada desse valor tinha sido pago (Pinto, 1991a, tos, e metilização de mercúrio, com consequências Bloco 5, p. 2-3). potenciais de saúde pública, sérias para a população As denúncias de Lúcio Flávio Pinto de cor- local e para consumidores de peixe em centros urba- rupção entre alguns dos homens mais poderosos nos como Belém. no Brasil, e uma ligação para um dos assassinatos O processo de tomada de decisões para desen- políticos mais notórios do País, permanecem sem volvimento hidrelétrico é pervertido em várias ma- provas. No entanto, elas também nunca foram in- neiras, com o resultado que os impactos ambientais vestigadas corretamente. e humanos de represas têm muito pouco peso nas atuais decisões para implantar os projetos. A influ- O papel de discussão pública ência de empresas de construção e de financiadores estrangeiros e provedores de equipamentos contri- Um dos maiores impedimentos para discussão bua à consideração mínima dada aos impactos am- pública informada de Tucuruí foi a política de sigílio bientais e sociais dos projetos. A cortina de sigílo que aplica a muitas das informações relacionadas às que a ELETRONORTE manteve sobre muitos barragens hidrelétricas no Brasil. Até mesmo o vo- aspectos do projeto de Tucuruí, impediu o enten- lumoso Plano 2010 (Brasil, Eletrobrás, 1987) para dimento de seus impactos. A associação de Tucuruí desde o seu começo com um mundo sombrio de expansão hidrelétrica no Brasil, somente foi tornado militares e de agências de segurança, reforçou este público em dezembro de 1987, depois que já havido aspecto do projeto. A necessidade para discussão vasado para o domínio público. Este plano indica que pública completamente informada dos planos hi- 10 milhões de hectares (100.000 km2) seriam inunda- drelétricos ambiciosos anunciados para a Amazônia, dos se todas as represas planejadas forem construídas é urgente. Infelizmente, muitas das lições de Tucuruí (p. 150). Os planos evoluíram subsequentemente,e ainda não foram aprendidas. com os Planos 2015 e 2020. Este autor teve a oportu- nidade rara de questionar o presidente da Eletrobrás publicamente uma vez sobre por quê cópias destes NOTAS documentos não podiam ser fornecidas, resultando (1) Embora o presidente da ELETRONORTE em uma explicação notável: a autoridade elétrica do quando Balbina foi construída (Miguel Nunes) Impactos Ambientais da Barragem de Tucuruí: 71 Lições Ainda Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia depois admitiu que “A Balbina é um pecado” (A para assegurar o silêncio dele sobre a explosão de Crítica, 18 de março de 1989), o próximo presidente bomba no Riocentro que tinha acontecido no ano do orgão (Antônio Muniz) endossa a barragem. anterior (Contreiras, 1999). A possibilidade de (2) Deve notar que na barragem de Petit Saut, um motivo contribuindo de Tucuruí é surgerída na Guiana francesa (completado em 1994), um di- por Pinto (1991a, Bloco 5, p. 2). que subaquático foi construído paralelo à represa 60 m a montante, como medida para imobilizar a me- APÊNDICE: AFILIAÇÕES DE PESSOAS tade inferior da coluna d’água e puxar apenas água CITADAS de superfície, relativamente bem oxigenada, nas entradas de turbina. A tomada d’água das turbinas Indivíduos mencionadas e afiliações na hora das em Tucuruí está a 26,5 m acima do nível do mar, declarações citadas: ou a um terço da altura da coluna d’água (72 - 3 = Paulo Edgar Dias Almeida: Departamento de 69 m) (Brasil, ELETRONORTE, 1989, p. 154); a Engenheiria Civil, ELETRONORTE, Petit Saut tem sua tomada d’água no fundo, como Tucuruí, Pará. em Balbina. De acordo com simulações feitas an- tes da construção de Petit Saut, o dique resulta em John Denys Cadman: Consultor para qualidade de água suficientemente alta para manter ELETRONORTE e Eletrobrás, Brasília, DF. peixes a jusante (Sissakian & Desmoulins, 1991). Andréa Figueiredo: Departamento do Meio Medidas deste tipo não estão sendo consideradas Ambiente, ELETRONORTE, Brasília, DF. para represas planejadas na Amazônia brasileira. Frederico Magalhães Gomes: Eletrobrás, Rio de Janeiro, RJ. (3) Por exemplo, entre 11 fevereiro e 31 de agosto de 1984, pesquisadores do Museu Paraense Robert J.A. Goodland: Unidade do Meio Ambiente, Emílio Goeldi (MPEG) e os seus assistentes pas- Banco Mundial, Washington, DC. saram 2.161 dias-pessoa no campo em Tucuruí, Evlyn Moraes Novo: Instituto Nacional de Pesquisas com diárias da ELETRONORTE (Brasil, INPA, Espaçiais (INPE), São José dos Campos, SP. MPEG & ELETRONORTE, 1984, p. 9). Equipes adicionais estavam presentes do INPA, Instituto AGRADECIMENTOS Evandro Chagas (IEC), Instituto Butantã (IB) e Universidade Federal do Pará (UFPa). Agradeço às seguintes pessoas pelas valio- (4) Contrato DT-TUC-009/75 para a enseca- sas discussões sobre Tucuruí: Lúcia Andrade e deira da primeira fase, estradas permanentes, pista de Leonide dos Santos (Comissão Pró-Índio de São pouso e terraplanagem para a vila residencial e o can- Paulo); Deputada Aída Maria Silva (Assembléia teiro de obras foi assinado 21 de novembro de 1975. Legislativa, Belém); J. Revilla Cardenas, E.G. O contrato principal para construir a barragem (DT- Ferreira, R. Leite, J.A.S.N. de Mello, e W.P. Tadei, TUC-015/1976) foi assinado em 24 de janeiro 1977 (INPA); J.P. Carvalho (Projeto Parakanã, Tucuruí); (Brasil, ELETRONORTE, 1989, p. 24). E. Monosowski (Consultores Monosowski). Agradeço aos funcionários de ELETRONORTE, (5) O processo judicial contra General Cruz Camargo Corrêa e INPA em Tucuruí pela pa- foi arquivado em 1993 com base no depoimento ciência com as minhas perguntas, e o Sindicato de uma testemunha (a esposa de um agente do de Trabalhadores Rurais de Tucuruí pela ajuda lo- SNI) que veio 10 anos depois do fato, para afirmar gística e pelas informações. Os colonos da Gleba que ela tinha visto o general em Brasília no mo- Parakanã merecem agradecimento especial pelo mento preciso (07:30 h, 02 de outubro de 1982) seu tempo e acolhida calorosa durante a minha vi- quando a outra testemunha o tinha visto no Rio sita. Uma parte da discussão sobre impactos aquá- de Janeiro perto da doca, onde von Baumgarten ticos é traduzida de Fearnside (1995b), e o texto estava embarcando na viagem de pesca na qual ele foi atualizada de Fearnside (2001). R.I. Barbosa, foi assassinado (Briguglio, 1994, p. 21). A tes- E. Eve, P.M.L.A. Graça, S.V. Wilson e dois revi- temunha no Rio manteve a versão dele até a sua sores fizeram comentários sobre o manuscrito. O própria morte em um assassinato aparentemente Programa Pew em Conservação e Meio Ambiente, sem conexão ao caso (Amazonas em Tempo, 22 de o Conselho Nacional de Desenvolvimento junho de 1996). Geralmente, acredita-se que a Científico e Tecnológico (CNPq AI 350230/97-98) razão para o assassinato de von Baumgarten era e o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia 72 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras (INPA PPIs 5-3150 & 1-3160) forneceram apoio Brasil, ELETRONORTE. s/d. [c.1983]. Histórico. Centrais financeiro. Elétricas do Norte do Brasil S.A. (ELETRONORTE), Brasília, DF. 28 p. Brasil, ELETRONORTE. s/d. [c.1984]. Impacto ecotoxicológico LITERATURA CITADA em Tucuruí. Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A. Amazonas em Tempo [Manaus]. 22 de junho de 1996. “Irmã de (ELETRONORTE), Brasília, DF. 3 p. 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Hidrelétricas na Amazônia 75 Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Capítulo 4 Emissões de Gases de Efeito Estufa de um Reservatório Hidrelétrico (a Represa de Tucuruí) e suas Implicações para Política Energética Philip M. Fearnside Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia-INPA Av. André Araújo, 2936 - CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil. E-mail pmfearn@inpa.gov.br Tradução de: Fearnside, P.M. 2002. Greenhouse gas emissions from a hydroelectric reservoir (Brazil’s Tucuruí Dam) and the energy policy implications. Water, Air and Soil Pollution 133(1-4): 69-96. doi: 10.1023/A:1012971715668 76 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO existentes e do que a média das represas planejadas na Amazônia brasileira. Emissões de gases de efeito estufa de represas são frequentemente retratadas pela indústria hi- Tucuruí serve como um local de prova para os drelétrica como sendo inexistentes, e, geralmente, planos do País para desenvolvimento hidrelétrico tem sido ignoradas em cálculos globais das emissões na Amazônia. A possibilidade de reivindicar crédi- das mudanças de uso da terra. A represa de Tucuruí to de carbono para represas hidrelétricas planejadas apresenta um exemplo importante para debates so- surge frequentemente em discussões no Brasil so- bre política de desenvolvimento amazônico e como bre o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, do Protocolo de Kyoto. Emissões de gases de efeito es- avaliar a influência sobre o efeito estufa das diferen- tufa não podem ser ignoradas em discussões desse tes opções de energia. Tucuruí é melhor, do ponto tipo. Os impactos sociais e ambientais causados por de vista de densidade energética e, consequente- muitas represas são até mesmo mais importantes mente, das emissões de gases de efeito estufa por que as contribuições ao efeito estufa, e tem levado unidade de eletricidade, do que a média para repre- a estes projetos serem questionados como formas sas existentes na Amazônia. Também é melhor do de “desenvolvimento limpo” (Fearnside, 2001a). A que a média para as represas planejadas que, se todas represa de Tucuruí oferece um exemplo excelente fossem construídas, inundariam 3% da floresta na destes problemas (Fearnside, 1999, 2001b). Amazônia brasileira. A emissão de gases de efeito estufa de Tucuruí em 1990 é equivalente a 7,0-10,1 O presente trabalho calcula emissões de gases de × 106 toneladas de carbono equivalente a CO , uma efeito estufa para Tucuruí para 1990, o ano base para 2 quantia substancialmente maior que a emissão de inventários nacionais de emissões de gases de efeito combustível fóssil da cidade de São Paulo. Emissões estufa sob a Convenção Quadro das Nações Unidas precisam ser pesadas corretamente em decisões so- sobre Mudança de Clima (UN-FCCC). A estimativa inclui emissões de várias fontes de emissão que foram bre construção de barragens. Embora espera-se que ignoradas em estimativas anteriores para reservató- muitas hidrelétricas propostas na Amazônia tenham rios amazônicos, tais como a liberação de metano pela balanços positivos em comparação com combustí- água que passa pelo vertedouro e pelas turbinas. veis fósseis, emissões significativas indicadas pelo atual estudo reduzem os benefícios atribuídos às re- presas planejadas. O RESERVATÓRIO DE TUCURUÍ Palavras-Chave: Amazônia, Florestas tropicais, Gás A represa de Tucuruí foi finalizada em 1984 no carbônico, Gás de efeito estufa, Hidrelétricas, Metano, Rio Tocantins, um afluente do rio Amazonas lo- Política de energia, Represas, Reservatórios calizado no Estado do Pará (Figura 1). A área do reservatório era oficialmente 2.430 km2 ao nível INTRODUÇÃO operacional normal de 72 m acima do nível médio do mar. Medidas pelo satélite LANDSAT estima- Hidrelétricas são frequentemente promovidas ram a área em 2.247 km2 em junho de 1989 (INPE, pelas autoridades governamentais como uma fonte veja Fearnside, 1995, p. 13) e 2.800 km2 em julho “limpa” de energia, em contraste com termoelétricas de 1996 (de Lima et al., 2000). A usina na primei- (por exemplo, Souza, 1996). Embora a contribui- ra fase (Tucuruí-I) tinha 3.960 MW de capacidade ção da queima de combustíveis fósseis para o efeito instalada. Uma segunda fase (Tucuruí-II) era para estufa seja bem conhecida, hidrelétricas não estão dobrar a capacidade instalada para 8.085 MW até livres de impactos. Represas hidrelétricas em áreas 2002 (Brasil, Programa Avança Brasil, 1999), mas de florestas tropicais emitem gases de efeito estufa, chegou a 8.370 MW em 2010 com um reservatório 2 tais como gás carbônico (CO2) e metano (CH4). A de 2.850 km . razão impacto/benefício varia muito entre diferen- A represa de Tucuruí foi objeto de um dos 10 es- tes represas, dependendo da produção de energia. tudos focais da Comissão Mundial sobre Barragens, Tucuruí, a represa examinada neste trabalho, tem especialmente para a avaliação das emissões de gás um saldo mais favorável do que a média das represas de efeito estufa por desenvolvimento hidrelétrico Emissões de Gases de Efeito Estufa de um 77 Reservatório Hidrelétrico (a Represa de Tucuruí) e suas Implicações para Política Energética projetando-se fora d’água, com a exceção de pe- quenas áreas desmatadas perto das barragens. Uma parte significativa da biomassa fica projetada acima da superfície de água e se decompõe aerobicamente. Esta fonte de emissão tem sido ignorada na maio- ria das discussões do impacto de desenvolvimento hidrelétrico sobre o efeito estufa. Parâmetros para cálculos de emissões acima d’água para o reservató- rio de Tucuruí são apresentados na Tabela 1. Emissões da superfície do reservatório Vários estudos recentes em reservatórios indicam que as emissões de metano apresentam um grande pico nos primeiros anos depois do enchimento, se- Figura 1. Locais mencionados no texto. guido por um declínio. Com um ano de idade, o reservatório de Petit-Saut, na Guiana francesa, libe- rou 1.300 mg CH4/m2/dia da superfície d’água (530 (WCD, 2000). Tucuruí tem o maior reservatório na de ebulição e 770 de difusão) (Galy-Lacaux et al., Amazônia brasileira depois de Balbina (que é fre- 1997). O reservatório de Curuá-Una, com 21 anos quentemente descartada por autoridades elétricas, de idade, liberou 66 mg CH 24/m /dia (16 de difusão como atípico, devido à sua baixa densidade energéti- e 50 de ebulição) (Duchemin et al., 2000). O Lago ca). Balbina tem emissões muito altas devido ao seu de Gatun, no Panamá, com 84 anos de idade liberou enorme reservatório em comparação com a capaci- 412 mg CH4/m2/dia (12 de difusão e 400 de ebuli- dade geradora que poderia ser instalada neste local ção) (Keller & Stallard, 1994). Medidas de emissões com topografia plana e de baixa vazão (Fearnside, de metano específicas para Tucuruí indicam grandes 1995, 1996a; Rosa et al., 1996a). Tucuruí-I (a con- variações espaciais e temporais (Tabela 2). figuração atual de Tucuruí) tem 1,63 watts (W) de Há grandes controvérsias sobe a metodologia capacidade instalada por m2 de superfície de reser- usada para calcular emissões de gases por reserva- vatório, considerando que as Centrais Elétricas do tórios. Um funil invertido usado pela Universidade Brasil (ELETROBRÁS) calcularam a densidade Federal de São Carlos só mede emissões de ebulição energética média para todo o potencial hidrelé- (por exemplo, Rosa et al., 1996b,c, 1997a). Câmaras trico da região amazônica como apenas 1 W/m2 de difusão usadas pelo INPE (Lima & Novo, 1999; (Rosa et al., 1996b, p. 6). Isto se refere à lista com- Lima et al., 2000) e por estudos realizados pela pleta de represas planejadas no Plano 2010, inde- Universidade de Quebec em Montreal em outros pendente da data planejada de construção (Brasil, reservatórios amazônicos (Duchemin et al., 2000) ELETROBRÁS, 1987; veja Fearnside, 1995). A captura bolhas e emissões de difusão. No entanto, cifra equivalente para os 5.537 km2 de superfície de estas câmaras são menos eficientes que os funis para água nas quatro represas grandes existentes em 2002 calcular o componente ebulitivo porque as câmaras (cuja capacidade instalada totaliza 4.490 MW) era fazem coletam uma série de medidas em períodos de 0,81 W/m2, ou apenas a metade da densidade breves (tipicamente de 15 minutos cada) que podem energética de Tucuruí-I. perder os estouros esporádicos de atividade ebulitiva (Keller & Stallard, 1994). Recentemente um estudo EMISSÕES DO RESERVATÓRIO em Tucuruí (idade 14-15 anos) pela Universidade Federal de São Carlos com funis e câmaras de difu- Emissões de decomposição acima da superfí- são indicou que a ebulição contribui apenas 6-16% cie d’água das emissões totais de superfície de 14,6-205,3 mg CH4/m2/dia (Matvienko et al., 2000). No reser- Quando florestas tropicais são inundadas vatório de Curuá-Una (idade 21 anos), Duchemin por reservatórios, as árvores permanecem em pé, et al. (2000) medidiram a ebulição e a difusão e 78 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Tabela 1. Parâmetros para emissão pela biomassa acima da água no reservatório de Tucuruí Parâmetro Valor Unidades Fonte Fração de biomassa acima do solo 0,759 Fearnside (1997b, pág. 37) Profundidade média na zona de água de superfície 1 metro Suposição, baseado em perda de madeira comercial Taxa de decomposição de folhas na zona -0,5 fração ano-1 Suposição, nota que o ressecamento sazonal aumenta a taxa sazonalmente inundada (Polunin, 1984, pág. 129) Presumido, mesmo que floresta derrubada (Fearnside, Taxa de decomposição acima da água (anos 0-4) -0,1680 fração ano-1 1996b, pág. 611) -1 Assumido mesmo como floresta derrubada (Fearnside, Taxa de decomposição acima da água (anos 5-7) -0,1841 fração ano 1996b, pág. 611) Assumido mesmo como floresta derrubada (Fearnside, Taxa de decomposição acima da água (anos 8-10) -0,0848 fração ano-1 1996b, pág. 611) -1 Assumido mesmo como floresta derrubada (Fearnside, Taxa de decomposição acima da água (>10 anos) -0,0987 fração ano 1996b, pág. 611) Conteúdo de carbono da madeira 0,50 Fearnside et al. (1993) Taxa de queda de madeira da zona acima da água 0,1155 fração ano-1 Suposição: vida média = 6 anos Biomassa total média de floresta em Tucuruí 519 tha-1 Revilla Cardenas et al. (1982) Usa 58,0 m acima do nível de mar como o mínimo nível Profundidade de água média no nível mínimo 9,7 metro normal de operação (Brasil, ELETRONORTE, 1989, pág. 64) Biomassa inicial presente: folhas 8,8 t ha-1 Calculado da biomassa total e de Fearnside (1995, pág. 12) Biomassa inicial presente: madeira acima da água 291,0 t ha-1 Calculado da biomassa total e de Fearnside (1995, pág. 12) Biomassa inicial presente: subterrânea 125,1 t ha-1 Calculado da biomassa total e de Fearnside (1995, pág. 12) kg de CH4 ha-1 Liberação de metano através de térmitas 0,687 Martius et al. (1996, pág. 527) ano-1 constataram que a ebulição representou 32-81% das média ocupada por macrófitas durante o ciclo anu- emissões totais de superfície de 37,5-80,2 mg CH4/ al era 286,4 km 2, ou 13,1% da área média de 2.188 m2/dia. Em Petit-Saut (idade 1 ano), Galy-Lacaux km2 do reservatório que pode ser computado para o et al. (1997) acharam uma contribuição ebulitiva de mesmo ano. Em Tucuruí, macrófitas explodiram no 59% em uma emissão de superfície total de 1.300 mg primeiro ano depois do enchimento e depois mor- CH /m2/dia. No Panamá, em enseadas na margem reram quando o nível de nutrientes na água abai-4 do Lago Gatun (idade 84 anos), a ebulição contri- xar. Em 1986 (dois anos depois de fechar) a área buiu com 97% dos 400 mg CH /m2/dia de emissão de macrófitas foi calculada em 620 km 2 (Brasil, 4 média da superfície (Keller & Stallard, 1994). Dado ELETRONORTE, 1988a, p. 94), ou aproximada- a falta de qualquer proporcionalidade consistente mente 26% da área do reservatório quando cheio. entre ebulição e difusão, apenas as estimativas que Um estudo feito por Lima et al. (2000) para junho- incluem ambos a ebulição e a difusão foram usadas -agosto (período de nível de águas altas) mostra no atual estudo (Tabela 2). que a cobertura de macrófitas diminuiu de 39% em 1986 para 11% em 1994, o que parece ser um nível A área coberta por macrófitas (principalmen- estável. A cobertura teria sido 21% em 1988, que te vegetação flutuante como a aguapé, Eichhornia corresponde ao cenário na Tabela 3. Crescimento crassipes) é um determinante essencial do fluxo de explosivo inicial seguido por declínio também metano. No período de águas altas (14 de agosto de foi o padrão para macrófitas em outros reservató- 1988), Novo & Tundisi (1994, p. 149) reportaram rios tropicais, tais como Brokopondo no Suriname que 21% do reservatório de Tucuruí estava coberto (Leentvaar, 1966), Guri na Venezuela (Vilarrubia & por macrófitas a partir de imagens de LANDSAT. Cova, 1993) e Balbina (Fearnside, 1989; Walker et Baseado nos dados e suposições de Novo & Tundisi al., 1999), Curuá-Una ( Junk et al., 1981) e Samuel (1994) para o período de alto nivel d’água, e nas pre- (Bohdan Matvienko, declaração pública, 24 de feve- sunções destes autores para o resto do ano, a área reiro de 2000) no Brasil. Emissões de Gases de Efeito Estufa de um 79 Reservatório Hidrelétrico (a Represa de Tucuruí) e suas Implicações para Política Energética Tabela 2. Dados disponíveis sobre emissões da superfície do Reservatório Tucuruí em hábitats diferentes Estação Estação Emissão (Mg CH / Desvio Hábitat Data (nível de (fluxo de Tipo de emissão 42 n Fonte m /dia) média padrão água) água) DIVISÕES DE HÁBITAT USADAS NO CÁLCULO mai. de 1996 Alto Alto Ebulição+difusão 12 (a) agosto de 1996 Alto Baixo Ebulição+difusão 33,5 (a) Água dez. de 1996 Baixo Baixo Ebulição+difusão 65 (a) aberta ago. de 1997(b) Alto Baixo Ebulição+difusão 86,5 (c) Média: fluxo de água alto 12,0 1 Média: fluxo de água baixo 61,7 26,6 3 mai. de 1996 Alto Alto Ebulição+difusão 73 (a) ago. de 1996 Alto Baixo Ebulição+difusão 63 (a) Áreas de macrófitas dez. de 1996 Baixo Baixo Ebulição+difusão 72 (a) Média: fluxo de água alto 73 1 Média: fluxo de água baixo 67,5 6,4 2 maio de 1996 Alto Alto Ebulição+difusão 56,4 (a) ago. de 1996 Alto Baixo Ebulição+difusão 59 (a) Árvores dez. de 1996 Baixo Baixo Ebulição+difusão 960 (a) mortas em pé ago. de 1997 Alto Baixo Ebulição+difusão 74,8 (d) Média: fluxo de água alto 56,4 1 Média: fluxo de água baixo 364,6 515,7 1 OUTRAS MEDIDAS mar. de 1989 Alto Alto Ebulição 0 (e) set. de 1993(f) Baixo Baixo Ebulição 0,018 (g) Água mar. de 1993(h) Alto Alto Ebulição 14,2 (g) aberta set. de 1993(h) Baixo Baixo Ebulição 3,3 (g) Áreas de set. de 1993 Baixo Baixo Ebulição 19,0 (g) macrófitas Árvores mar. de 1993 Alto Alto Ebulição 3,3 (g) mortas em pé set. de 1993 Baixo Baixo Ebulição 24,8 (g) fev.–mar. de Baixo Alto Ebulição+difusão 5,6 (i) 1993 Média set. de 1993 Baixo Baixo Ebulição+difusão 15,8 (i) ponderada, calculada 1998(j) ? Ebulição 13,1 (k) para o (j) reservatório 1998 ? Difusão 192,2 (k) inteiro 1999(j) ? Ebulição 2,4 (k) 1999(j) ? Difusão 12,2 (k) (a) E.M.L.M. Novo, comunicação pessoal, 1999. (b) Água aberta: tributário = < 10 m de profundidade. (c) de Lima et al., 2000. (d) de Lima & Novo, 1999. (e) Rosa et al., 1996b,c, 1997a. (f) Água aberta: canal. (g) Rosa et al., 1997a, p. 48. (h) Água aberta: angra protegida. (i) Matvienko & Tundisi, 1996, p. 10. (j) Mês não especificado. (k) Matvienko et al., 2000. 80 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Tabela 3. Áreas calculadas de hábitats no Reservatório de Tucuruí em 1988 Tempo de Área de Água sem Área exposta de Área permanentemente Água sem árvores Área de Macrófitas Vazão média Volume Mês 3 3 (a) residência 9 3 macrófitas macrófitas deplecionamento inundada com árvores ou macrófitas (10 m /s) (10 m ) em % da em % da (dias)(b) (km2)(c) (km2) (km2) emergentes (km2) (km2) área total área de água Jan 15,3 37 48,9 151,6 1.879,8 398,0 396,8 1.483,0 6,2 7,5 Fev. 20,8 27 48,5 151,6 1.879,8 398,0 396,8 1.483,0 6,2 7,5 Mar. 24,3 23 48,3 252,7 1.924,0 252,7 396,8 1.527,2 10,4 11,6 Abr 23,8 24 49,4 252,7 1.924,0 252,7 396,8 1.527,2 10,4 11,6 Mai 15,3 37 48,9 505,4 1.924,0 0,0 396,8 1.527,2 20,8 20,8 Jun 7,7 74 49,2 505,4 1.924,0 0,0 396,8 1.527,2 20,8 20,8 Jul 4,5 126 49,0 505,4 1.924,0 0,0 396,8 1.527,2 20,8 20,8 Ago 3,2 177 48,9 505,4 1.924,0 0,0 396,8 1.527,2 20,8 20,8 Set 2,4 236 48,9 151,6 1.879,8 398,0 396,8 1.483,0 6,2 7,5 Out 2,7 210 49,0 151,6 1.879,8 398,0 396,8 1.483,0 6,2 7,5 Nov 4,6 123 49,0 151,6 1.879,8 398,0(d) 396,8 1.483,0 6,2 7,5 Dez 8,8 64 48,7 151,6 1.879,8 398,0 396,8 1.483,0 6,2 7,5 Média 11,1 96,5 48,9 286,4 1.901,9 241,1 396,8 1.505,1 11,8 13,1 (a) Brasil, ELETRONORTE (1989, p. 51). (b) Brasil, ELETRONORTE (1988, p. 87). (c) Em 1989 o máximo de macrófitas ocorreu em julho, quando o nível do reservatório era 72 m acima do nível do mar, e o mínimo ocorreu em novembro, quando nível do reservatório era 68 m acima do nível do mar (Novo & Tundisi, 1994, p. 150). São interpolados os meses intercalados baseado nas suposições de Novo & Tundisi (1994). (d) Novo & Tundisi (1994, p. 149); Fearnside (1995, p. 13) usou 858 km2, baseado em volumes de água. Em sete estudos em lagos de várzea, áreas com geração de metano, como também para metilação macrófitas tiveram 3,25 vezes mais emissões de CH4 de mercúrio do solo. No reservatório de Samuel, que água aberta (veja Fearnside, 1995, p. 15). Na por exemplo, essas áreas liberaram 15,3 g C/m2/ UHE Tucuruí em setembro de 1992, uma área com ano como CH4 por ebulição dependendo da época macrófitas apresentou 1.056 vezes mais emissão de inundada, comparado com 7,2 g C/m2/ano liberado CH4 por ebulição que água aberta no canal do rio, 0,8 entre árvores mortas em pé em áreas permanente- vezes a emissão de água aberta com árvores em pé, e mente inundadas e apenas 0,00027 g C/m2/ano no 5,8 vezes a emissão de 1992 em água aberta em uma canal principal (Rosa et al., 1996c, p. 150). enseada sem árvores em pé (Rosa et al., 1996c, p. 150). Baseado em informações sobre áreas de hábitat As maiores áreas de macrófitas nos primeiros anos de e taxas de emissão (Tabelas 2 e 3), pode-se calcu- um reservatório contribuem para um maior pulso de lar emissões aproximadas por ebulição e difusão de emissões de metano durante estes anos. CH4 de Tucuruí (Tabela 4). Isto presume que a área Uma grande área do fundo do reservatório fica coberta por macrófitas ao longo do ciclo anual segue exposta sazonalmente. Considerando a cota de 58 m as suposições de Novo & Tundisi (1994, p. 150), que de nível mínimo operacional de Tucuruí-I (Brasil, é a área máxima de macrófitas (505,4 km2) aplica-se ELETRONORTE, 1989, p. 64), esta área ocupa a quatro meses (presumidos para ser maio-agosto), 858 km2 (Fearnside, 1995, p. 13), enquanto se for enquanto dois meses (presumidos para ser março e considerado o rebaixamento apenas até a cota de abril) a área é 50% do máximo e é substituída pela 68 m em agosto de 1988 (antes que todas as tur- água aberta (25%) e área de rebaixamento exposto binas estivessem operacionais), a área ocupava 397 (25%), e durante seis meses (presumidos para ser km2 (Novo & Tundisi, 1994). Quando inundada, a setembro-fevereiro) a área de macrófitas é 30% do área de rebaixamento oferece condições ideais para máximo e é substituída pela água aberta (15%) e Emissões de Gases de Efeito Estufa de um 81 Reservatório Hidrelétrico (a Represa de Tucuruí) e suas Implicações para Política Energética Tabela 4. Fontes de metano da superfície do Reservatório de Tucuruí Emissão Média de área (km2) Emissão (t CH ) Área na época Parte (mg de CH /m2/dia) 4 Área média 4 de água alta 2 média da 2 (km ) (km ) área (%) Período Período Período de Período de Fluxo alto Baixo fluxo Total de fluxo de fluxo fluxo alto baixo-fluxo (jan-mai) (jun-dez) alto(a) (a) 365 dias baixo 151 dias 214 dias Água aberta Sem árvores 1.545,5 1.505,1 68,8 1.509,5 1.502,0 12,0 61,7 14.055 19.819 33.873 nem macrófitas Área de árvores 407,4 396,8 18,1 396,8 396,8 56,4 364,6 21.844 30.958 52.802 em pé Total de água 1.952,9 1.901,9 86,9 1.906,3 1.898,7 50.777 86.675 aberta Áreas de 294,1 286,4 13,1 262,8 303,2 73,0 67,5 2.679 4.380 7.059 macrófitas Reservatório 2.247,0 2.188,3 100,0 2.169,1 2.202,0 38.578 55.157 93.734 inteiro Emissão média 114,3 117,8 117,1 (a) Tabela 2. área de rebaixamento exposto (15%). O ano é divi- por Rosa et al., 1997a, p. 43). Estudos na represa dido em duas estações com base na vazão máxima: de Petit-Saut por Galy-Lacaux et al. (1999, p. 508) um período de fluxo baixo (janeiro-maio) e um perí- mostram que as concentrações de CH4 oscilam em odo de fluxo alto (junho-dezembro). O ano também uma base sazonal em um padrão que corresponde ao pode ser dividido com base do nível de água (baixo equilíbrio entre o influxo de água e a vazão da saída = setembro-fevereiro, alto = março-agosto) ou com do reservatório. A amplitude da oscilação é tal que a base na chuva (seco = julho-novembro, chuvoso = concentração máxima é, pelo menos, 50% mais alta dezembro-junho). que o mínimo em cada ciclo anual. O único perfil disponível para concentrações de CH4 na água em Emissões das turbinas Tucuruí é de março de 1989, que é durante o perí- odo de fluxo alto de água quando a série temporal a Em 1991 Tucuruí produziu 18,03 TWh de ele- Petit-Saut (Galy-Lacaux et al., 1999) indica que as tricidade (Brasil, ELETRONORTE, 1992, p. 3), concentrações de CH4 estão no mínimo. Se a mag- ou 2.058 MW. Era esperado que a produção anual nitude relativa da oscilação sazonal em concentração da represa fosse 2.476 MW antes de 1991 (Brasil, de CH4 a Petit-Saut se aplica a Tucuruí, a concen- ELETRONORTE, 1989, p. 58), ou 20,3% mais tração de 30 m de profundidade deveria variar (pelo do que foi produzido de fato. Se a produção tives- menos) entre 6 e 9 mg CH4/litro, com um valor mé- se sido mais alta, as emissões de CH da água que dio de 7,5 mg CH4/litro (Figura 2). 4 passa pelas turbinas também teriam sido proporcio- Isto pode ser considerado uma estimativa con- nalmente mais altas. Cada turbina tem uma capa- servadora da concentração na água que passa pelas cidade nominal de 350 MW e um fator de carga turbinas, já que a concentração de CH aumenta na de 95% (i.e., 332,5 MW de produção efetiva), e usa 4medida em que aumenta a profundidade, e a toma- 575 m3/s de água (Brasil, ELETRONORTE, 1989, da d’água está com profundidade de 35,4 m quan- p. 17). Cada turbina, então, usa 18,1 × 109 m3/ano do o reservatório estiver ao nível operacional na cota de água, e 18,3 MW é gerado por 109 m3 de água. de 72 m (Brasil, ELETRONORTE, 1989, p. 157). Um total de 112,2 × 109 m3 de água atravessaram as Baseado em uma média anual de concentração de turbinas em 1991, a concentração de metano a 30 metano de 7,5 mg CH4/litro ao nível das turbinas, m de profundidade, era 6 mg CH4/litro em mar- pode-se calcular que a quantia de CH4 exportada do ço de 1989 (dados inéditos de J.G. Tundisi citados reservatório pelas turbinas em 1991 teria sido 0,842 × 82 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Nível operacional normal 0 10 Média anual ajustada Nível do vertedouro 20 Observado, março de 1989 30 Nível das turbinas 40 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Concentração de metano (mg/litro) Figura 2. Perfil de concentração de metano em Tucuruí. Observações de março de 1989 são de medidas feitas por J.G. Tundisi, citadas por Rosa et al. (1997a, p. 43). Valores ajustados da média anual são calculados da forma descrita no texto, baseado em variações sazonais proporcionais em Petit-Saut (Galy-Lacaux et al., 1997, 1999). 106 toneladas (t). Porém, a oscilação sazonal age para criar uma cachoeira artificial e fornecer água com reduzir a quantia de CH4 exportada, em relação a este mais oxigênio para o rio a jusante. O dispositivo foi valor, porque a geração de energia é maior durante o completado em fevereiro de 1995 (Gosse, 1999). período de fluxo alto, quando a concentração de CH Um subproduto não intencional disto é a liberação 4 na água for menor. Um ajuste para este efeito é cal- de metano adicional, uma parte do qual teria sido culado na Tabela 5, assim reduzindo a exportação de oxidada até o CO2 por atividade bacteriana no rio CH 1991 em 6,7% para 0,785 × 106 t. ou no oceano (40 km a jusante) se a cachoeira arti-4 ficial não existisse. No caso de Tucuruí, no entanto, O destino do CH4 da água que passa pe- pode-se presumir que a maioria do CH na água las turbinas pode ser calculado baseado em dados 4também é liberada quando a água atravessar as da Hidrelétrica de Petit-Saut (Galy-Lacaux et al., turbinas por causa da queda súbita de pressão. Por 1997). Três medidas somadas a Petit-Saut, uma exemplo, em Balbina, amostras de água tiradas do média de 87,1% do metano era imediatamente libe- fundo do reservatório (29 m de profundidade má- rada como gás quando a água emergiu das turbinas. xima) espumam com bolhas de CH4 e CO2 quando Do metano restante, 18,4% eram liberados no rio a trazidas à superfície (Bohdan Matvienko, declara- jusante e 81,6% foram oxidados para CO2 nos pri- ção pública, 24 de fevereiro de 2000). meiros 40 km abaixo da barragem. Baseado nestes dados, a liberação em 1991 da passagem de água pe- Os dados de Petit-Saut não permitem a sepa- las turbinas em Tucuruí totalizou 0,702 × 106 t CH ração da quantia liberada imediatamente quando 4 (0,684 × 106 t às turbinas e 0,019 × 106 t no rio). a água emerge das turbinas daquela que é liberada na cachoeira artificial. Galy-Lacaux et al. (1997, Uma diferença significante entre Tucuruí e p. 479) calcularam a liberação destes dois pontos Petit-Saut é um dispositivo de areação construído juntos a partir das concentrações de CH4 na co- 300 m a jusante da barragem de Petit-Saut. Quando luna d’água anterior a represa e na água debaixo a operação da hidrelétrica começou em junho de da cachoeira artificial. Das três medidas pareadas 1994, quase todos os peixes morreram a jusante da informadas por Galy-Lacaux et al. (1997, p. 497), barragem, motivando assim a suspensão da gera- a concentração média de CH4 cai de 8,11 mg/litro ção enquanto um dispositivo (uma barragem de 4 para 0,77 mg/litro, ou 90,5%. A quantia média li- m de altura com dois degraus) foi construído para berada nas turbinas e na cachoeira somaram 98,2 t Profundidade (m) Emissões de Gases de Efeito Estufa de um 83 Reservatório Hidrelétrico (a Represa de Tucuruí) e suas Implicações para Política Energética Tabela 5. Cálculo de exportação de metano pelas turbinas de Tucuruí em 1991(a) Fluxo pelas Cota da água(c) Correção para Profundidade da entrada Concentração corrigida de CH4 exportado Mês Turbinas(b) (m sobre o nível oscilação sazonal das turbinas CH4 na água liberada pelas através das turbinas (109 m3) do mar) (%)(d) (m debaixo da superfície) turbinas(e) (mg CH4/litro) (10 6 t) Jan 10,9 67,5 -17 30,9 6,2 0,0676 Fev 12,4 67,5 -33 30,9 5,0 0,0622 Mar 12,4 69,3 -50 32,7 3,8 0,0464 Abr 12,4 69,3 -33 32,7 5,0 0,0622 Mai 12,4 72,0 -17 35,4 6,2 0,0770 Jun 9,4 72,0 0 35,4 7,5 0,0702 Jul 9,4 72,0 17 35,4 8,8 0,0821 Ago 6,3 72,0 33 35,4 10,0 0,0632 Set 4,8 67,5 50 30,9 11,3 0,0542 Out 4,8 67,5 33 30,9 10,0 0,0481 Nov 9,4 67,5 17 30,9 8,8 0,0821 Dez 9,4 67,5 0 30,9 7,5 0,0702 Média 9,5 69,3 0 32,7 7,5 0,0655 Total 113,8 0,7854 (a) Baseado na geração de energia em 1991 e nas mudanças no armazenamento e na evaporação (de água e áreas de macrófitas) em 1988. (b) Alocado entre os meses somando ou subtraindo mensalmente da média das médias em unidades de uma turbina, para manter positivo o fluxo do vertedouro, dentro das restrições de capacidade das turbinas e o total anual de geração de eletricidade. (c) Baseado em áreas (Tabela III), interpoladas em intervalos de 10 m (Brasil, ELETRONORTE, 1989, Fig. MT-TUC-05). (d) Divergência de porcentagem da média anual baseado em amplidão aproximada de oscilações em Petit-Saut de Galy-Lacaux et al. (1999). (e) Corrigido para profundidade do vertedouro com ajuste para concentração média anual de CH4 à profundidade das turbinas (Figura 2) e para oscilações sazonais em concentração de CH4. Por exemplo, a média anual da concentração de CH4 para >30 m de profundidade é 7,5 mg CH4/litro e em janeiro a concentração corrigida (-17%) é 6,2 mg CH4/litro. CH4/dia (89,9% do CH4 exportado pelas turbinas, Emissões do vertedouro ou 97,7% das emissões totais de 100,5 t CH4/dia de água turbinada). Toda a liberação no rio acon- Uma grande fonte adicional de emissões de tece nos primeiros 20-30 km abaixo da barragem; CH4 em Tucuruí é da água liberada pelo vertedouro. Esta água não é tirada da superfície, mas vem da a média das três medidas desta liberação era 2,3 t cota de 52 m (Brasil, ELETRONORTE, 1989, p. CH4/dia, que representa 2,1% do CH4 exportado 146). Quando o reservatório está na cota operacio- pelas turbinas, ou 2,3% das emissões totais de água nal normal de 72 m, na fase Tucuruí-I, a água libera- turbinada. Se a cachoeira artificial não existisse, a da do vertedouro vinha de uma profundidade de 20 quantia liberada no rio provavelmente seria mais m. A água saí em uma lâmina debaixo de uma série alto que os 11,0 t/dia medidos no caso de Petit- de 23 comportas de aço quando elas são elevadas; Saut (21,0% do CH que entra no rio abaixo da normalmente, esta é uma lâmina fina do fundo do 4 barragem) por causa da concentração mais alta de vão do vertedouro, embora estas portas gigantescas CH que entraria no rio neste momento. Com isto, (cada com 21 m de altura e pesando 220 t) podem 4 torna-se possível calcular estimativas mínimas e ser girados para cima para permitir a passagem de máximas para a emissão de CH da água que passa grandes inundações. Com a exceção de tais eventos 4 pelas turbinas em Tucuruí. Considerando as por- de inundação, a tirada é, então, na crista do verte-douro na cota de 52 m. Em cada vertedouro, a água centagens liberadas como 21,0%-89,9%, baseado desce uma calha por 30 m, onde é lançada no ar por nos resultados de Petit-Saut, a liberação das turbi- um salto tipo esqui e mergulha mais 28 m até uma nas em Tucuruí em 1990 era de 0,165-0,702 × 106 t bacia de dissipação forrada de concreto armado. A CH4. O total de metano liberado da água que passa grande pluma branca de neblina formada quando pelas turbinas em Tucuruí era 2-8 vezes a liberação estão abertos todos os 23 vertedouros, cada um com total de ebulição e difusão no próprio reservatório. 20 m de largura, é, indubitavelmente, a vista mais 84 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras espetacular e frequentemente fotografada na barra- a profundidade da entrada do vertedouro diminui re- gem. A perfeição e a natureza instantânea da aera- lativo à superfície da água, presumivelmente com uma ção faz com que seja uma suposição segura de que redução correspondente na concentração de CH4 ao todo o CH4 dissolvido na água é liberado imediata- nível do vertedouro. Estes dois efeitos reduzem a mente à atmosfera. exportação calculada de CH4 pelo vertedouro para Emissões do vertedouro seriam muito grandes 0,535 × 106 t (Tabela 6), uma diminuição de 40,1%. se o reservatório fosse mantido sempre no seu nível Um efeito para qual não foi feito uma correção, é a d’água cheio. Considerando a vazão média a longo variação na espessura da lâmina d’água que atravessa prazo de 11.107 m3/s (Brasil, ELETRONORTE, o vertedouro: embora normalmente apenas uma fen- 1989, p. 17), ou 350,5 × 109 m3/ano, e a concentração da estreita é aberta, durante inundações maiores, as de CH4, ajustada de acordo com a época de 3,75 mg comportas podem ser elevadas mais alto, permitindo CH4/litro a 20 m de profundidade, o vertedouro teria assim escapar água mais próximo da superfície (com emitido 0,893 × 106 t CH4 em 1990, equivalente a 5,1 conteúdo de CH mais baixo). × 106 t de C equivalente a CO2. Porém, vários fatores 4 reduzem a emissão anual de água liberada pelo verte- Perda de fontes e sumidouros em floresta viva douro. Um fator é o ciclo sazonal na concentração de CH4, a maior liberação do vertedouro que é durante o Quando a floresta tropical é inundada e, conse- período de fluxo alto quando a concentração de CH quentemente, morta, são perdidas as fontes e sumi-4 é mais baixa. Outro fator é o efeito do rebaixamento douros naturais na floresta de gases de efeito estufa. do nível d’água: na medida em que o nível da água cai, Isto inclui a perda de uma absorção anual de carbono Tabela 6. Cálculo de exportação de metano pelo vertedouro em 1991(a) Média anual de Concentração Influxo Evaporação Mudança de Fluxo do Profundidade do vertedouro concentração de CH corrigida de CH CH4 exportado 4 4 Mês (109 m3)(b) (109 m3)(c) armazenamento vertedouro através do (109 m3)(d) (109 m3)(e) (m debaixo da na profundidade do na água liberada superfície)(f) vertedouro pelo vertedouro vertedouro 6 (mg CH4/litro) (g) (mg CH (h) (10 t) 4/litro) Jan 41,0 0,26 0,2 29,7 15,5 2,6 2,2 0,0648 Fev 55,8 0,26 -0,4 43,5 15,5 2,6 1,8 0,0767 Mar 65,1 0,28 -0,2 52,7 17,3 3,1 1,5 0,0813 Abr 63,8 0,28 1,0 50,1 17,3 3,1 2,1 0,1035 Mai 41,0 0,31 -0,4 28,7 20,0 3,7 3,1 0,0894 Jun 20,6 0,31 0,2 10,8 20,0 3,7 3,7 0,0403 Jul 12,1 0,31 -0,2 2,5 20,0 3,7 4,4 0,0111 Ago 8,4 0,31 -1,2 2,9 20,0 3,7 5,0 0,0145 Set 6,3 0,26 -0,1 1,3 15,5 2,6 3,9 0,0050 Out 7,1 0,26 0,6 1,5 15,5 2,6 3,5 0,0052 Nov 12,3 0,26 0,5 2,2 15,5 2,6 3,1 0,0067 Dez 23,6 0,26 -0,1 14,1 15,5 2,6 2,6 0,0370 Média 29,7 0,28 0,0 20,0 17,3 3,1 3,1 0,0446 Total 357,0 3,39 0,0 239,8 0,5353 (a) Baseado na geração de energia em 1991 e em mudança de armazenamento e evaporação (de água e áreas de macrófitas em 1988). (b) Baseado em vazão em longo prazo (Tabela 3). (c) Evaporação sem macrófitas é 1.548 mm/ano (Brasil, ELETRONORTE, 1989, p. 47); é presumido que a evapotranspiração de áreas de macrófitas é duas vezes esta taxa. (d) baseado em volumes de armazenamento (Tabela 3). (e) Calculado por diferença do influxo e evaporação + turbinas (da Tabela 5) + mudança de armazenamento. (f) Baseado em níveis de água da Tabela 5. (g) Figura 2, usando valores pela profundidade do vertedouro com ajuste para oscilações sazonais em concentração de CH4. (h) Ajustado com correção para oscilações sazonais em concentrações de CH4 da Tabela 5. Emissões de Gases de Efeito Estufa de um 85 Reservatório Hidrelétrico (a Represa de Tucuruí) e suas Implicações para Política Energética pela floresta em pé. Estudos que usam técnicas de cor- Tucuruí) emite uma quantidade calculada em 8,68 relação de remanço indicam que as florestas amazô- kg de N2O/ha/ano (Verchot et al., 1999, p. 37), equi- nicas intactas têm uma absorção líquida de carbono valente a 0,73 t C/ha/ano equivalente a CO2 que atualmente (por exemplo, Grace et al., 1995; Mahli considera o potencial de efeito estufa de 100 anos et al., 1998). Embora este efeito não possa ser per- de 310 adotado pelo Protocolo de Kyoto para N2O. 2 manente, já que, a longo prazo, os estoques de C na Os 1.926 km de florestas inundadas por Tucuruí floresta não podem continuar crescendo, a absorção (Fearnside, 1995, p. 11), então, emitiram anualmen- efetuada constitui uma adição ao impacto de ma- te como N2O, 0,117 × 10 6 t de C equivalente a CO2 tar grandes áreas de floresta por inundações. Outras antes de serem inundados. A área inundada por Tucuruí, como a maioria das represas hidrelétricas, perdas incluem um pequeno sumidouro de metano não era um pantano antes de ser inundada, mas era no solo da floresta tropical e uma fonte de meta- uma área de correntezas no rio que teve topografia no muito pequena de térmitas de floresta. Por outro acidentada o bastante para manter os solos bem dre- lado, uma fonte de óxido nitroso (N2O) de emissões nados. A emissão pré-reservatório não era, então, a são eliminadas pela inundação. Solos sob as florestas grande fonte de CH4 ou de N2O que às vezes tem amazônicas em Paragominas (onde a distribuição sido sugerido. É calculado o efeito líquido de perdas sazonal de precipitação é semelhante à aquela em de fontes e sumidouros em floresta viva na Tabela 7. Tabela 7. Emissões líquidas das perdas de fontes e sumidouros na floresta viva Fluxo por hectare Emissão em Equivalente de Tucuruí Fonte do Item Gás carbono (t/ha de (106 t de C valor de fluxo (t de gás/ha/ C equivalente a equivalente a por hectare ano) CO /ano) CO2/ano) 2 Perda de absorção de carbono de CO2 pela floresta em pé 1,2 0,3 0,06 Tian et al.(1998) (b) Perda de emissão de N2O do solo de floresta -0,0087 -0,734 -0,14 Verchot et al. (1999, p. 37). Perda de absorção de CH4 do solo de floresta 0,0005 0,00015 0,000028 Keller et al. (1986). Perda de emissão de CH4 de térmitas de loresta -0,014 -0,104 -0,020 Fearnside (1996b). Total -0,52 -0,10 (a) Considerando área de floresta perdida como sendo 1.926 km2 (Fearnside, 1995, p. 11). Potenciais de aquecimento global de 100 anos do Segundo Relatório de Avaliação do IPCC são usados: CO2=1, CH4=21, N2O=310 (Schimel et al., 1996). Valores negativos representam emissão reduzida à atmosfera quando a floresta for perdida. (b) Baseado na média modelada para 1980-1994. Impacto sobre o efeito estufa das emissões C. Ajuste para perda da fonte de N2O do solo sob em 1990 floresta diminui a emissão em 1-2%. A contribuição de metano representou 64-75% do impacto total de Em resumo, as principais fontes de emissões gás de efeito estufa em 1990 de 7,0-10,1 × 106 t de de metano em Tucuruí em 1990 eram as seguintes C equivalente a CO (Tabela 8). Como explicado na quantidades de CH4 em 106 t: 0,0937 de ebulição 2 Tabela 8 (nota 1), as emissões em 1990 são calculadas e difusão, 0,1649-0,7025 das turbinas, e 0,5353 do a partir de parâmetros que se refiram aos anos para os vertedouro (Tabela 8). Pequenas contribuições adi- quais as informações estão disponíveis. cionais foram feitas pelos cupins na decomposição acima d’água, pela perda do sumidouro em solos sob floresta, e, por outro lado, pela perda do pequeno flu- DISCUSSÃO xo dos cupins na floresta. A emissão de CH4 somou Incerteza 0,79-1,33 × 106 t de gás; considerando um potencial de aquecimento global de 21 (Schimel et al., 1996, p. A confiança da atual estimativa é muito sensível 121), é equivalente a 4,5-7,6 × 106 t de C equivalente ao valor de dois parâmetros: as concentrações de CH4 a CO2. Foram calculadas emissões de CO2 em 1990 no transcurso de água pelo vertedouro e pelas turbi- de 9,68 × 106 t de gás de CO2, ou 2,64 × 106 t de nas. Aqui um conjunto de valores é usado, medido 86 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Tabela 8. Emissões de gases de efeito estufa de tucuruí em 1990(a) Fluxo C equivalente a CO (106 t C)(b) Contribuição relativa (%) Gás Fonte de emissão (106 t de gás) 2 Cenário alto Cenário baixo Cenário alto Cenário baixo Cenário alto Cenário baixo Ebulição + difusão 0,0937 0,0937 0,537 0,537 5% 8% Decomposição acima da água (c) 0,0005 0,0005 0,003 0,003 0,03% 0,04% Perda de sumidouros no solo da floresta 0,0001 0,0001 0,001 0,001 0,01% 0,01% CH4 Perda de térmitas da floresta -0,0027 -0,0027 -0,015 -0,015 -0,15% -0,22% Turbinas 0,7025 0,1649 4,023 0,945 40% 13% Vertedouro 0,5353 0,5353 3,066 3,066 30% 44% CH4 total 1,3294 0,7919 7,61 4,54 75% 64% Decomposição acima da água 9,34 9,3400 2,55 2,55 25% 36% Decomposição abaixo da água 0,11 0,1100 0,03 0,03 0,30% 0,43% CO2 Perda de absorção da floresta 0,23 0,2300 0,06 0,06 1% 1% CO2 total 9,68 9,68 2,64 2,64 26% 38% N2O Perda de fontes no solo da floresta -0,00167 -0,00167 -0,14 -0,14 -1% -2% Total 10,11 7,03 100% 100% (a) Componentes são de anos diferentes: áreas de hábitat e níveis de água de 1988, emissão por unidade de área por ebulição e difusão de 1996-1997, fluxos de água das turbinas e vertedouro de 1991, conteúdo de CH4 na água de 1989, emissões de decomposição de 1990. (b) Potencial de aquecimento global de CH4 = 21; N2O = 310 (Schimel et al., 1996). (c) Fearnside (1995), baseado em decomposição acima do solo em floresta derrubada para agricultura e pecuária (Martius et al., 1996). em Tucuruí em março de 1989 por José G. Tundisi Emissões de ebulição são maiores em áreas mais (citado por Rosa et al., 1997a, p. 43). Estes valores rasas porque há menos distância vertical, ao longo são ajustados para oscilações sazonais baseado na série de que as bolhas de CH4, que são liberadas dos se- de medidas feitas em Petit-Saut (Galy-Lacaux et al., dimentos, podem ser oxidadas antes de alcançar a 1999). A existência de oscilações sazonais indica a superfície. Também, a pressão hidrostática nos sedi- importância de ter uma série de medidas para cap- mentos é menor, assim conduzindo a maior liberação turar esta fonte de variação. A maioria do esforço de de bolhas deste ambiente supersaturado. Além disso, pesquisa tem visado a quantificação das emissões de taxas de metanogênese são sensíveis à temperatura, gases de efeito estufa de represas hidrelétricas, inclu- e os sedimentos mais frios a profundidades maiores sive Tucuruí, tem sido dedicado a medidas de fluxos produziriam menos CH4 que sedimentos em áreas no próprio reservatório. Porém, os cálculos no atual rasas. No Lago Gatun, por exemplo, ao longo de um trabalho mostram claramente que os maiores ganhos gradiente de profundidade de 0,5 a 10 m, a taxa de na redução das incertezas na estimativa global seriam ebulição diminuiu por um fator de 10, dos quais um na melhoria das informações sobre as concentrações fator de 2,3-3,9 poderia ser explicado por diferenças de CH na água que entra nas turbinas e no vertedou- de temperatura e de pressão (Keller & Stallard, 1994, 4 ro, e o destino do CH no rio a jusante da barragem. p. 8.315). O efeito adicional significativo da profundi-4 dade pode ser devido a maiores contribuições de car- Fluxos de metano da superfície do reservatório, bono terrestre nas áreas rasas próximas à beira do lago particularmente por ebulição, também estão sujeitos a (Keller & Stallard, 1994). Com o passar do tempo, ciclos. Em uma base sazonal, as emissões por unidade além do efeito da profundidade sobre as variações na de área são mais altas em qualquer local no reserva- emissão, este fator mostra também a grande variação tório quando o nível de água está baixo. Podem ser espacial que existe em diferentes partes da superfície esperados que os rebaixamentos frequentes no nível de um reservatório e o cuidado necessário para obter d’água no gerenciamento do reservatório resultassem amostras representativas e interpretar estes resultados em maior liberação de CH4 por ebulição. É provável usando uma ponderação apropriada pela área de cada que as grandes liberações que acontecem quando os hábitat e categoria de profundidade. A divisão em três níveis de água caem não sejam descobertas por meio zonas usada no atual trabalho é o nível máximo de de medidas feitas nas breves “campanhas” que atual- detalhamento que os dados atuais permitem, mas a mente formam a fonte dos dados disponíveis. medida em que mais dados ficam disponíveis, uma Emissões de Gases de Efeito Estufa de um 87 Reservatório Hidrelétrico (a Represa de Tucuruí) e suas Implicações para Política Energética desagregação melhor de classes de profundidade e de turbinas seja uma escolha mais apropriada que a hábitat poderia aumentar a confiança das estimativas. média para a coluna d’água. Em uma base diurna, emissões são mais altas du- A atual estimativa de emissões de Tucuruí é rante o dia que à noite, devido à maior força do vento conservadora por várias razões. A estimativa ignora e da ação de ondas (Duchemin et al., 2000; Keller & “eventos incomuns”, como tempestades, que resul- Stallard, 1994). Maiores fluxos de ebulição à tarde em tam em emissões muito mais altas do que as que nor- Tucuruí também podem ser devido a um ciclo diur- malmente ocorrem. Estes eventos foram constatados no em pressão atmosférica para o que é equivalente a como responsáveis por uma porção significativa das uma flutuação no nível de água de 18 cm, em termos emissões anuais em reservatórios no norte do Canadá de pressão hidrostática sobre o fundo do lago (Lima (Duchemin et al., 1995). Tempestades podem causar & Novo, 1999). Considerando que muitas das me- contribuições grandes de matéria orgânica da bacia, didas publicadas não especificam se são baseadas em tais como folhas, ramos e outros detritos; elas também monitoramento ao longo de um ciclo de 24 horas, podem criar seichas que trazem o oxiclínio à superfície, esta é uma fonte de incerteza adicional. assim permitindo a liberação de água funda saturada O estudo de Galy-Lacaux et al. (1999), a Petit- de metano (Donald D. Adams, declaração pública, 24 Saut, indica que as concentrações de CH de fevereiro de 2000). 4 diminuem com o passar do tempo, caindo de 14 a 10 mg/litro O uso de dados de diferentes anos para produ- nos primeiros quatro anos de represamento (o perío- zir uma estimativa aproximada para 1990 aumenta a do de medida em Petit-Saut), e espera-se diminuir até incerteza. Alguns dos efeitos, resultam em sobrees- 0,3 mg/litro à idade de 20 anos, baseado em níveis de timativa da emissão de 1990. Por exemplo, usar as CH4 presentes em uma represa comparável na Costa áreas de macrófitas de 1988, o conteúdo de CH4 na do Marfim. A concentração projetada a Petit-Saut água de 1989, as profundidades das turbinas e dos seis anos depois do represamento (a idade do reserva- vertedouros de 1988 e o fluxo de água turbinada de tório para a atual estimativa para Tucuruí) era 4 mg/ 1991. Outros fatores subestimam a emissão de 1990, litro. No entanto, Galy-Lacaux et al. (1999) usaram como a ebulição e a difusão por unidade de área de uma concentração de CH4 média ao longo de todo o 1996-1997 e o fluxo de água vertida de 1991. perfil vertical da coluna d’água em uma estação locali- A atual estimativa não inclui emissões do des- zada perto da barragem como a estimativa da concen- matamento feito pela população que foi retirada do tração na passagem da água pelas turbinas. Petit-Saut local do reservatório. Também não foram incluídas difere de Tucuruí de alguns modos significantes que estimativas das emissões significativas da constru- afetam a escolha de um valor de CH4. O reservató- ção da represa, que seriam necessárias para uma aná- rio de Tucuruí é aproximadamente duas vezes mais lise da cadeia completa (análise do ciclo de vida). profundo que a represa de Petit-Saut, com o ponto Impactos futuros também incluiriam emissões das central das entradas para as turbinas sendo localiza- represas a montante planejadas para regular o fluxo do a uma profundidade de 35,4 m (i.e., mais fundo do rio Tocantins. que a profundidade total de 34 m do reservatório de Petit-Saut). Além disso, Petit-Saut tem uma estrutura Comparação com estimativas anteriores especial construída para minimizar a descarga de água anóxica (que também é mais rica em metano). Este é Emissões de gases de efeito estufa do reser- um dique subaquático construído paralelo e 60 m a vatório de Tucuruí durante um único ano (1990) montante da barragem com a finalidade de imobili- foram calculadas (Fearnside, 1995). Essa análise zar a metade mais baixa da coluna d’água e somente foi subsequentemente estendida de um único ano, puxar água da superfície, relativamente bem oxige- para computar a quantia e a distribuição temporal nada, nas tomadas d’água das turbinas (Sissakian & das emissões ao longo de um período de 100 anos Desmoulins, 1991). Tucuruí não tem nenhuma es- que poderia ser comparado então com as emissões trutura desse tipo, assim fazendo com que o valor que seriam produzidas gerando a mesma quantia de medido da concentração de CH4 num ponto tão energia a partir de combustíveis fósseis (Fearnside, próximo quanto possível ao nível das entradas das 1997a). Fatores considerados incluíram o estoque 88 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras inicial e a distribuição de carbono, as taxas e os ca- 1997a) que incluíram o CH4 de decomposição de flo- minhos de decomposição (conduzindo para libera- resta submersa, na qual as suposições adotadas ago- ção de CO2 e CH4), e as perdas de energia nas linhas ra parecem ser conservadoras. A produção de CH4 de transmissão. Fatores não considerados incluíram calculada baseados em suposições sobre taxas e cami- a degradação da floresta nas ilhas e nas margens do nhos de decomposição foi substituída por estimativas reservatório, fontes de óxido nitroso em zonas de de- mais seguras baseado em medidas de concentração de plecionamento e linhas de transmissão, além de ca- CH4 na água que foi liberada pelas turbinas e pelo minhos adicionais de emissão de metano através das vertedouro. Isto altera as estimativas anteriores signi- árvores em pé, passagem de água pelas turbinas, etc. ficativamente para o ano 1990 (Fearnside, 1995), nas Também não foram incluídas emissões na fase de quais o CO2 contribuiu com 83% e o CH4 com 17%. construção, nem as emissões do desmatamento feito A estimativa revisada indica emissões mais baixas de por pessoas deslocadas (ou atraídas) pelo projeto. metano do reservatório (principalmente devido a va- 2 Cálculos anteriores presumiram que apenas 10% lores mais baixos para emissão de macrófitas por m ). da superfície de água estava coberta por macrófitas São comparados os resultados do atual estudo (Fearnside, 1997a). O percentual médio usado no com os de estudos anteriores na Tabela 9. Estudos cálculo da área atual é de 13,1% (Tabela 3). Porém, variam amplamente, não só nos seus resultados fi- a emissão das áreas de macrófita é muito mais baixa nais, mas também na abrangência da cobertura de- no cálculo atual (72 mg CH4/m2/dia na época de les com respeito às fontes de emissões. Estimativas nível alto de água e 68 mg CH 24/m /dia na época que produzem resultados finais muito baixos igno- de nível baixo) que os 174,7 mg CH /m24 /dia usados ram emissões de CH4 da passagem de água pelas em cálculos anteriores (Fearnside, 1995, 1997a). Isto turbinas e pelo vertedouro e as emissões de CO2 provavelmente indica que o cálculo atual é conser- de decomposição de biomassa acima da água. vador, já que o anterior, embora baseado em dados Principalmente devido à inclusão de emissões das de lagos de várzea em vez de se basear em dados de turbinas e do vertedouro, os cálculos no atual estudo Tucuruí, estava fundamentado em muito mais ob- mais que duplicam a estimativa anterior deste autor servações (por exemplo, Bartlett et al., 1990; Devol para emissões em 1990 (Fearnside, 1995) de 3,1 × et al., 1990; Wassmann & Thein, 1996). 106 t de C equivalente a CO2 (considerando o valor A maioria do impacto de efeito estufa nos cál- de 21 para o potencial de aquecimento global para 6 culos anteriores (Fearnside, 1995) foi derivado do CH4) para 8,6 × 10 t de C equivalente a CO2, sendo CO2 liberado por decomposição da madeira acima isto o ponto central da faixa de variação de 7,0-10,1 6 da água: em 1990, o CO contribuiu com 83% e o × 10 t de C equivalente a CO2 que é o resultado 2 CH4 com 17% do impacto, considerando o potencial da incerteza sobre a porcentagem de CH4 liberada de aquecimento global de 21 atualmente usado para da água turbinada. Acredita-se que a conclusão de CH4, para representar o impacto de uma tonelada que há uma emissão significativa é bastante robusta, deste gás relativo a uma tonelada de CO da forma apesar da incerteza ser alta e mal quantificada. Os 2 adotada na época pelo Painel Intergovernamental de resultados deste trabalho indicam emissões de uma Mudanças Climáticas (IPCC) (Schimel et al., 1996, a duas ordens de grandeza maiores do que os es- p. 121). Na análise anterior, foi presumido que as tudos de emissões da superfície do reservatório que emissões de metano seriam relativamente constan- atualmente formam a base da política brasileira so- tes ao longo do horizonte de tempo, em vez de ter bre o efeito estufa e represas hidrelétricas (Tabela 9). um pico inicial seguido por um declínio até um pla- tô mais baixo. Distribuição temporal das emissões A inclusão de emissões substanciais de CH4 na Uma pergunta fundamental para o futuro será se a água liberada pelas turbinas e pelo vertedouro, que concentração de CH4 na água diminuirá até um platô não foram incluídas em estimativas anteriores, au- de nível muito baixo (por exemplo, como os 0,32 mg/ mentam a confiança do cálculo atual. Estas fontes litro encontrados por Galy-Lacaux et al. (1999) em aumentam a emissão total de CH4, comparado à es- um reservatório africano de 20 anos de idade). Um timativas anteriores das emissões (Fearnside, 1995, fator que determina isto, será a importância relativa Emissões de Gases de Efeito Estufa de um 89 Reservatório Hidrelétrico (a Represa de Tucuruí) e suas Implicações para Política Energética Tabela 9. Comparação com outras estimativas de emissões de gás de efeito estufa de Tucuruí Fluxo de CH por Emissão anual líquida 4 C equivalente Método para Ano de Fatores 6 Autor (a) área de unidade (10 t de gás) a CO estimativa emissão incluídos 2 (mg/m2 de CH4/dia) CO2 CH4 N O (10 6 t C/ano) de CH 2 4 Este estudo: Cenário baixo 1990 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 9,7 0,79 -0,00167 7,0 (b) Este estudo: Cenário alto 1990 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 9,7 1,33 -0,00167 10,1 (b) Fearnside, 1995. 1990 (1, 2, 3), 4 9,5 0,09 -- 3,1 (c) Rosa & Schaffer, 1995. 1990 (1, 2, 3) -- 0,52 -- 3,0 (c,d) Novo & Tundisi, 1994. 1988 1, 2 96 -- 0,085 -- 0,49 (b) Rosa et al., 1996c, 1997b. 1993 1 15 -- 0,013 -- 0,07 (b,e) Matvienko et al., 2000. 1998-99 1, 2 112 --(f) 0,099 -- 0,57 (b,e) Matvienko & Tundisi, 1997. Set 1993 1, 2 15 --(f) 0,013 -- 0,08 (b,e) (a) Fatores: 1 = ebulição da superfície, 2 = difusão da superfície, 3 = turbinas, 4 = decomposição acima da água, 5 = CH4 do solo da floresta, 6 = N2O do solo da floresta, 7 = térmitas de floresta; parênteses () = implicitamente incluído. (b) Baseado em dados de fluxo. (c) Baseado em suposições relativo às taxas de decomposição e fração emitidas como CH4. (d) Emissão de CH4 calculada para 1990 a partir das suposições de Rosa & Schaffer (1995, p. 155) como média de dois cenários, e convertida em C equivalente a CO2 usando o potencial de aquecimento global de 100 anos do IPCC de 21 (Schimel et al., 1996). (e) Emissões do reservatório calculadas a partir de informações por m2 usando um valor de 2.430 km2 para a área. (f) CO2 medido de ebulição, mas não pode ser considerado uma emissão líquida porque uma grande parte dela é derivado de carbono contribuído pela bacia e pela produção primária no reservatório. de fontes diferentes do carbono que é convertido em emissão da decomposição da biomassa acima da água metano. A decomposição rápida de partes macias das teria diminuído ao longo dos anos a medida em que plantas da floresta original é provavelmente completa este estoque de carbono desaparecesse, e a cobertura em todos os reservatórios até a idade de seis anos, mas de macrófitas reduzisse de 21% até o platô de 11% no contribuições de carbono degradável continuam en- período de águas altas. trar a partir da bacia hidrográfica na forma de carbono Maior flutuação no nível de água (com mais tur- orgânico dissolvido e detritos orgânicos trazidos pela binas instaladas) também conduz a maiores emis- água. Carbono degradável também é gerado dentro sões. Quando o nível de água no reservatório dimi- do reservatório por produção primária, especialmente nui, a vegetação cresce rapidamente na terra exposta. através de macrófitas, usando nutrientes providos para Esta biomassa verde e macia decompõe rapidamen- o reservatório do influxo. Em um reservatório como te quando, subsequentemente, o nível d’água sobe e Tucuruí, com amplo desmatamento e, por consequ- inunda a área de deplecionamento, liberando me- ência, afetado pela erosão do solo na bacia a mon- tano sob as condições anóxicas que prevalecem no tante da represa, estas contribuições de nutrientes e fundo. Em virtude destas áreas serem relativamente de carbono orgânico podem ser esperadas a continuar rasas, uma porção significativa das bolhas que se for- em longo prazo em níveis altos. A cobertura de ma- mam pode alcançar a superfície, antes que o meta- crófitas diminuiu no reservatório ao longo do período no possa ser oxidado na coluna d’água. A vegetação 1986-1994, mas parece ter estabilizado no nível de verde foi considerada em zonas de deplecionamento cobertura que foi observado em 1994, quando estas inundadas uma fonte significante de metano por plantas cobriram 11% da superfície de água durante o ebulição em Balbina (Bohdan Matvienko, declara- período de águas altas (Lima et al., 2000). ção pública, 24 de fevereiro de 2000). Emissões de Tucuruí hoje diferem das emissões em 1990. Um fator importante que aumenta as emis- Preferência temporal e escolhas de energia sões é que os dados de 1991 para geração de energia Em 1990, o Brasil emitiu anualmente 53 × 106 usados na estimativa para 1990 se referem a um pe- t de carbono de combustíveis fósseis (La Rovere, ríodo antes que todas as turbinas tenham sido ins- 1996). A emissão de 7,0-10,1 × 106 de t de C equi- taladas na fase Tucuruí-I da usina. Por outro lado, a valente a CO2 de Tucuruí em 1990 representou, 90 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras portanto, 13-19% da emissão de combustível fóssil, desconto deveriam ser tomadas para melhor repre- na época, da população brasileira de 170 milhões de sentar os interesses da sociedade. Se horizontes tem- pessoas. A emissão de Tucuruí é 1,3-1,9 vezes maior porais longos são aplicados sem descontar (ou aplicar do que aquele proveniente do combustível fóssil outras formas de ajuste por preferência temporal) queimado pela população de 17 milhões da cidade dentro do horizonte de tempo, o resultado seria dar de São Paulo (10% da população do Brasil). pouco valor para adiar o efeito estufa. Embora ainda A madeira acima da água que produziu 25-36% não se tenha chegado a nenhum acordo sobre estes da emissão de Tucuruí em 1990 desaparecerá com o assuntos nas negociações internacionais, este autor passar do tempo. A emissão de metano, que compõe tem defendido o uso de um horizonte de tempo de o resto do impacto da represa sobre o efeito estufa, 100 anos, junto com uma taxa anual de desconto de diminuirá até um platô mais baixo, mas uma parte cerca de 1%, ou seu equivalente sob um sistema al- mal quantificada disto continuará como uma fon- ternativo de ponderação por preferência temporal te permanente. Uma fonte de emissão do tamanho (Fearnside, 2002a,b; Fearnside et al., 2000). [No en- da cidade de São Paulo pode, então, ser permanente. tanto, veja Capítulo 34 para argumentos a favor de Estes impactos consideram os potenciais de aqueci- um horizonte de 20 anos.] mento global de 100 anos sem desconto (atualmente Quando o efeito estufa é adiado, os impactos (in- usado pelo Protocolo de Kyoto). Caso seja aplicada clusive impactos sobre a vida humana e outros impac- uma taxa de desconto ou outro mecanismo de ponde- tos não-monetários) que teriam acontecido no decor- ração por preferência temporal, o impacto relativo de rer da demora, representam benefícios à sociedade. A represas hidrelétricas poderia ser o dobro ou mais do tradução deste valor social para as ferramentas de to- que os impactos calculados aqui (Fearnside, 1997a). mada de decisão é feita através do horizonte de tem- po e a aplicação de uma taxa de desconto, e resulta em A geração de energia hidrelétrica produziu pul- dar um peso maior aos impactos em curto prazo, tais sos grandes de CO2 e emissões de CH4 nos primeiros como o pico de emissões da construção da barragem anos depois de encher o reservatório, enquanto a ge- e dos primeiros anos de represamento, e aos gases de ração térmica produz um fluxo constante de gases em vida curta, tais como o metano produzido por reser- proporção a energia gerado. A análise da distribui- vatórios. A escolha de um horizonte de tempo de 100 ção temporal das emissões (Fearnside, 1997a) indica anos seria consistente com muitas análises do ciclo que a molécula de CO2 média na carga atmosférica de vida de represas e com os potenciais de aqueci- contribuída por Tucuruí entra na atmosfera 15 anos mento global atualmente adotados em um adendo ao mais cedo que a molécula média na carga comparável Protocolo de Kyoto (Decisão 2/CP.3) para o primeiro produzida pela geração a partir de combustível fós- período de compromisso do Protocolo (2008-2012). sil. Isto significa que, considerando um horizonte de É esperado que uma decisão para o primeiro perío- tempo de 100 anos, uma tonelada de CO2 emitida do de compromisso seja tomada em futuro próximo. por Tucuruí tem mais impacto sobre o efeito estu- Independente da decisão, os impactos humanos cada fa que uma tonelada emitida por combustível fóssil, vez mais inevitáveis e a natureza duradoura do efeito aplicando-se ou não uma taxa de desconto sobre os estufa significam que as negociações internacionais gases de efeito estufa. Se usar uma taxa de desconto continuarão por muitos anos além do primeiro pe- maior que zero, então o impacto relativo da opção hi- ríodo de compromisso. Este autor acredita que esse drelétrica é aumentado. processo tenderá a dar um peso maior ao tempo do Decisões sobre a escala de tempo ao longo da que é dado atualmente, e por conseguinte, levará ao qual são avaliadas as represas e os seus impactos sobre aumento no impacto atribuído às emissões das repre- o efeito estufa, e na ponderação temporal (por exem- sas hidrelétricas quando comparado aos impactos de plo, aplicando uma taxa de desconto) ao longo desse muitas outras alternativas de energia. horizonte de tempo, terão influência dramática nas escolhas entre opções de desenvolvimento energético. V. CONCLUSÕES Eles também influenciarão a avaliação da contribui- ção mundial ao efeito estufa feita por reservatórios. Represas hidrelétricas em áreas de florestas tro- Decisões sobre horizontes de tempo e sobre taxas de picais produzem emissões significativas de gases de Emissões de Gases de Efeito Estufa de um 91 Reservatório Hidrelétrico (a Represa de Tucuruí) e suas Implicações para Política Energética efeito estufa. Embora a incerteza sobre a quantia de Brasil, ELETRONORTE. 1989. Usina Hidrelétrica Tucuruí: emissão seja alta, a magnitude das emissões envolvidas Memória Técnica, Diretoria Técnica (DT), Departamento de é suficiente para que afete os níveis globais de gases de Projetos (TPR), Projeto Memória, Centrais Elétricas do Norte do Brasil (ELETRONORTE), Brasília, DF. 681 p. efeito estufa. Isto demonstra a necessidade de com- parações cuidadosas de opções de energia hidrelétrica Brasil, ELETRONORTE. 1992. Ambiente, Desenvolvimento, e outras como uma parte do processo de tomada de Tucuruí , Centrais Elétr icas do Norte do Brasi l (ELETRONORTE), Brasília, DF. 32 p. decisões. Tucuruí, com um impacto em 1990 sobre o efeito estufa maior do que o combustível fóssil quei- Brasil, Programa Avança Brasil. 1999. http://www.abrasil.gov. mado pela cidade de São Paulo, fornece uma lem- br.http://www.abrasil.gov.br. brança da escala potencial das emissões das dezenas Devol, A.H., Richey, J.H., Forsberg, B.R. & Martinelli, L.A. 1990. de reservatórios que estão planejados para construção Seasonal dynamics in methane emissions from the Amazon River floodplain to the troposphere. Journal of Geophysical na Amazônia nas próximas décadas. Research (Atmospheres) 95(D10): 16.417-16.426. Duchemin, E., Lucotte, M., Canuel, R. & Chamberland, A. AGRADECIMENTOS 1995. Production of the greenhouse gases CH4 and CO2 by hydroelectric reservoirs of the boreal region. Global O Conselho Nacional de Desenvolvimento BioGeochemical Cycles 9(4): 529-540. 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Esta é uma tradução Fearnside as sources of ‘greenhouse’ gases. Environmental Conservation (2002c). Agradeço a John J. Magnuson pelos comen- 22(1): 7-19. tários e a Paulo Maurício Lima de Alencastro Graça, Fearnside, P.M. 1996a. Hydroelectric dams in Brazilian Amazonia: Ruth Ferreira e Marinete Moura Souza pela correção Response to Rosa, Schaeffer & dos Santos. Environmental Conservation 23(2): 105-108. do português. Fearnside, P.M. 1996b. Amazonia and global warming: Annual balance of greenhouse gas emissions from land-use change in LITERATURA CITADA Brazil’s Amazon region. p. 606-617. In: J. Levine (ed.) Biomass Burning and Global Change, Volume 2: Biomass Burning in South Bartlett, K.B., Crill, P.M., Bonassi, J.A., Richey, J.E. & Harriss, America, Southeast Asia and Temperate and Boreal Ecosystems R.C. 1990. Methane flux from the Amazon River floodplain: and the Oil Fires of Kuwait, MIT Press, Cambridge, MA, Emissions during rising water. 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A Hidrelétrica de Balbina: O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia. Instituto de Antropologia Meio-Ambiente (IAMÁ), São Paulo, SP. 63 p. 98 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO INTRODUÇÃO A Hidrelétrica de Balbina, no Estado do A Hidrelétrica de Balbina Amazonas, inundou 2.360 km2 [atual área 2.996 km2, veja Capítulo 6] de floresta tropical para ge- Balbina é uma hidrelétrica construída no rio Uatumã no centro da região amazônica, para for- rar, em média, apenas 112,2 MW de eletricidade. A necer energia a Manaus, (Figura 1). A barragem topografia plana e o tamanho diminuto da bacia hi- fornece um exemplo de falta de planejamento ra- drográfica fazem com que a produção de energia seja cional do desenvolvimento na Amazônia brasileira pequena. A vegetação permanece para decompor-se e ilustra problemas ambientais que ocorrerão ou- na represa, o que torna a água ácida e anóxica, pro- tras vezes se o País continuar realizando os atuais picionando a corrosão das turbinas futuramente. A planos para uma expansão maciça de desenvolvi- represa, muito rasa, contém 1.500 ilhas [atual conta: mento hidrelétrico na região. O presente trabalho 3.300 ilhas; veja Capítulo 6] e inúmeras baías com procura identificar alguns dos equívocos realizados águas paradas onde o tempo que cada gota da água em Balbina e as lições que possam ser aprendidas a fica no lago será ainda mais longo do que a média: partir dos mesmos. mais que um ano. Balbina foi construída para for- A decisão inicial de construir Balbina é difícil de necer eletricidade a Manaus, uma cidade que cres- se justificar em termos técnicos. Mais preocupante ceu tanto durante a construção da barragem que ou- é a força implacável que o projeto adquiriu quando tras alternativas para fornecimento de energia já são se tornou “irreversível” e que permaneceu até a sua necessárias. Subsídios do governo explicam o seu conclusão. O projeto, que foi consagrado como “no- crescimento explosivo, inclusive as tarifas unificadas tória barragem de Balbina” no relatório do Banco nacionalmente para a eletricidade. Fontes alternati- Mundial avaliando o pedido para financiamento vos de energia para Manaus incluem o fornecimento (ver Environmental Policy Institute, 1987), conse- de eletricidade, a partir das barragens mais distantes, guiu desviar dos controles ambientais tanto nos ní- de petróleo e gás natural, em campos recentemente veis estaduais e nacionais no Brasil como dentro do descobertos. Entre outros impactos de Balbina, o Banco Mundial. uso potencial da floresta está totalmente comprome- Balbina é um dos projetos conhecidos no Brasil tido. Aproximadamente um terço dos sobreviventes como “obras faraônicas” (e.g., Veja, 20 de maio de da tribo indígena Waimiri-Atroari foram desaloja- 1987). Assim como as pirâmides do antigo Egito, dos. A barragem foi fechado em 01 de outubro de estas macióas obras públicas exigem esforãos de 1987, e a geração de energia começou em fevereiro uma sociedade inteira para se completar, apesar de de 1989. O exemplo de Balbina nos fornece várias não trazerem praticamente nenhum retorno eco-nômico. Mesmo que as estruturas sejam simples- diretrizes de como o processo decisório pode ser mente construídas e abandonadas, elas servem a melhorado no Brasil e nas agências internacionais interesses a curto prazo dos envolvidos, desde as que contribuíram, direta ou indiretamente, para o firmas que recebem contratos de construção até de projeto. As análises de impacto ambiental precisam políticos que querem para os seus distritos, empre- ser completadas antes da tomada de decisões glo- gos e facilidades comerciais gerados pelos projetos bais sobre a implementação dos projetos. O sistema durante a fase de construção. atual de avaliação de impactos ambientais, no Brasil, assim como em muitos outros países, tem uma in- O Plano 2010 fluência indesejável sobre a política científica, além de não enfrentar as causas subjacentes aos processos Represas para geração de energia hidrelétrica de desenvolvimento perniciosas ao meio ambiente, estão tomando uma parcela cada vez maior da flo-resta amazônica. O potencial para expansão dos im- como também de não ser capaz de sustar projetos pactos do setor elétrico é grande: a ELETROBRÁS “irreversíveis” como a Balbina. publicou o “Plano 2010” que propõe a construção Palavras-Chave: Hidrelétricas, Represas, Barragens, de barragens na Amazônia até o ano 2010. Como Impactos ambientais, Impactos sociais, Energia, Tomada é comum em propostas para grandes projetos de de decisões desenvolvimento na Amazônia, os planos têm sido A Hidrelétrica de Balbina: 99 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia Figura 1. a.) Localização da área de Manaus. b.) A área de Manaus com o reservatório de Balbina. c.) Parte do reservatório de Balbina, mostrando algumas das 3.300 ilhas e muitas baías de água parada onde a qualidade da água vai ser ruim e as macrófitas abundantes.2 100 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras apresentados ao público através de uma série de ba- 1988).1 A lista completa de projetos idealizadas lões de ensaio, sendo constantemente modificados para a Amazônia (independente da data previs- frente às críticas, porem permanecendo o mesmo na ta de construção) totaliza 79 barragens (Brasil, sua forma estrutural (ver Fearnside, 1986a). Uma ELETRONORTE, 1985a: 25-26). versão inicial do plano previa 68 barragens novas na Amazônia (Brasil, ELETROBRÁS, 1986a; ver As 79 represas inundariam aproximadamente 2 também CIMI, 1986). Uma versão subsequen- 100.000km (Brasil, ELETROBRÁS, 1987: 150), te lista 18 destas para construção até 2010 (Brasil, uma área que parece pequena, no contexto da região, ELETROBRÁS, 1987: 152-155). Nenhuma das mas que provocaria perturbações da floresta em duas listas inclui as três barragens em construção áreas muito maiores. Os habitats aquáticos seriam, na região na época, aparentemente considerando é claro, drasticamente alterados. A maioria dos lo- estas (inclusive a Balbina) como fatos consuma- cais favoráveis para o desenvolvimento hidrelétrico dos. Algumas das mais controvertidas barragens está situada ao longo dos trechos altos e médios dos futuras têm sido, desde então, transferidas do plano rios Xingú, Tocantins, Araguaia, e Tapajós (Figura “2010” para o plano “2020”, a ser lançado em 1991 2). Esta região tem uma das maiores concentrações ( José Antônio Muniz Lopes, declaração pública, de povos indígenas na Amazônia. Figura 2. Brasil, indicando os locais mencionados no texto.3 A Hidrelétrica de Balbina: 101 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia A decisão de construir Balbina de que o novo governador (Gilberto Mestrinho) en- dossou o projeto por razões sentimentais oriundos Existem diversas teorias para explicar porque do fato que, por coincidência, o nome da sua mãe é Balbina foi iniciada e porque sua construção conti- Balbina (ela é homenageada pela clínica de meter- nuou depois que a sua insensatez se tornar evidente. nidade “Balbina Mestrinho” do governo estadual em A decisão foi tomada no momento em que o preço Manaus). do petróleo estava no seu pico mais alto e quando a tecnologia de transmissão de energia a longa dis- Outra teoria popular sustenta que Balbina foi tância não era tão bem desenvolvida como é agora. construída para facilitar a extração de minérios da Estes fatos, acrescidos das subestimativas grosseiras área, especialmente a cassiterita (estanho) (Garcia, do crescimento da população e da demanda da ener- 1985). A mina de Pitinga, situada na parte supe- gia em Manaus, são as explicações oficiais para a de- rior da bacia hidrográfica de Balbina e na bacia cisão inicial, que a ELETRONORTE admite não adjacente do rio Alalaú, é cotada como sendo a teria sido justificável se os acontecimentos da última maior jazida no mundo de cassiterita de alto grau década tivessem sido conhecidos de antemão (Lopes, de pureza. Algumas ocorrências de estanho têm 1986). No entanto, mesmo com as informações sido identificadas na área de inundação, porém a disponíveis na época (Brasil, ELETRONORTE/ ELETRONORTE insiste que essas não são explo- MONASA/ ENGE-RIO, 1976), Balbina é ques- ráveis economicamente (Cel. Willy Antônio Pereira, tionável como decisão técnica. comunicação pessoal, 1987; Junk & de Mello, 1987). Um levantamento de parte da área de inundação de Quando o estudo da viabilidade foi realizado Balbina no rio Pitinga indicou algumas ocorrências, em 1975-1976, as restrições sobre comunicações mas não grandes jazidas (Viega Júnior et al., 1983: públicas significavam que o governo militar bra- Vol. I-b, p. 458-462, Vol. II Anexo IIIc). O preço sileiro tinha pouca razão para se preocupar com o do estanho, no entanto, se encontrou num dos seus questionamento das suas decisões. Funcionários da índices mais baixos da história: US$ 7,40/kg em ELETRONORTE têm afirmado, em caráter não novembro de 1988, contra o preço anterior de US$ oficial, que eles receberam diretamente do Planalto a 17,60/kg. Não se dispunha de informações sobre ordem para construir Balbina: não se tratava de uma quanto o preço teria que subir para que as jazidas proposta desenvolvida em base técnica e submetida de Balbina se tornassem economicamente atraentes. à hierarquia para aprovação. O governo queria dar A presença da represa também alteraria o cálculo uma grande obra ao Estado do Amazonas. O local econômico, já que o minério poderia ser extraído do alternativo mais próximo com potencial substancial- fundo por dragas montadas em balsas. Esta possibi- mente melhor (Cachoeira Porteira) fica no Estado lidade até tem sido levantada pelo representante em do Pará. Manaus do Departamento Nacional de Produção Quando o Brasil solicitou financiamento do Mineral (Amazonas em Tempo, 06 de setembro de Banco Mundial no início da década de 1980 para 1987). A cassiterita na Amazônia é muitas vezes agilizar a construção de Balbina, o partido político extraída com balsas flutuando em lagoas artificiais que estava no poder (o PDS), tanto a nível nacional construídas para esta finalidade. As dragas podem quanto no Estado do Amazonas, tinha boas pers- operar até uma profundidade de 30 m, e assim te- pectivas de ganhar apoio nas eleições de 1982 ba- riam acesso à represa inteira (que tem uma profun- seado na imagem do partido como um caminho à didade máxima de 21 m). Como as ocorrências de generosidade do governo central. Balbina foi apre- minérios são localizadas na parte superior da área de sentada ao público como um exemplo da capacidade inundação, estas estariam situadas na parte mais rasa do governador de conseguir benefícios de Brasília. que seriam mais facilmente dragadas usando balsas Na eleição de 1982, no entanto, o PDS perdeu na (profundidades menores que 6 m). As companhias disputa para o governo do Amazonas. Nesta altura, mineradoras têm registrado alvarás de pesquisa o novo partido majoritário (o PMDB) podia ter se mineral em grande parte da área de inundação de desfeito de Balbina como uma loucura do governo acordo com um mapa elaborado pelo Departamento anterior. Após alguma hesitação inicial no entanto, Nacional de Produção Mineral (mapa reproduzido Balbina foi endossada pelo novo governo e levado em: Melchiades Filho, 1987). para frente como a salvação do Estado. A hesitação A área de inundação contém ouro ( Junk & de inicial, em apoiar Balbina, elimina a teoria popular Mello, 1987), outro minério muitas vezes extraído 102 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras com a ajuda de balsas. Embora a ELETRONORTE junho de 1985). Embora muitos políticos e residen- afirme que as jazidas não são economicamen- tes de Manaus defenderam Balbina com veemência, te atraentes, até 1983 o diretor do Departamento tal apoio provavelmente se evaporaria rapidamen- Nacional de Produção Mineral (DNPM) em te caso os contribuintes locais fossem obrigados a Manaus apelou ao governador do Estado para que pagar o custo financeiro do projeto. Na verdade, a mineração do ouro começasse imediatamen- Manaus estava recebendo Balbina como um presen- te porque Balbina ia inundar a jazida (Jornal do te de contribuintes de outros lugares, do resto do Comércio, 23 de junho de 1983). Representantes da Brasil e, indiretamente, dos países estrangeiros que ELETRONORTE em Balbina lembram que (caso colaboraram ao empréstimo do Banco Mundial para o ouro na área fosse atraente) já estaria sendo ex- o setor elétrico brasileiro. plorado pelos vários garimpeiros que são atraídos às áreas ricas em ouro. A ausência de garimpeiros A loucura tecnológica em Balbina confirma as baixas concentrações ou- ríferas indicadas pelos levantamentos encomenda- Graves como são os impactos de Balbina, a dos pela ELETRONORTE, que encontraram uma magnitude do desastre ambiental e financeiro se média de 0,13g de ouro por metro cúbico de miné- encontra nos benefícios minguados que o proje- rio (Cel. Willy Antônio Pereira, comunicação pes- to produz. A capacidade nominal (instalada) de soal, 1987). Um levantamento encomendado pelo Balbina é de 250 megawatts (MW): o total de Departamento Nacional de Produção Mineral, na cinco geradores de 50 MW capacidade cada. A região dentro da área de inundação ao longo do rio quantidade de energia que a barragem realmente Pitinga, indicou várias ocorrências, porém nenhuma produz, no entanto, é muito menor. Na capacidade jazida grande (Viega Júnior et al., 1979: Vol. II-b plena, cada turbina engole 267 m3/segundo de água p. 467-469, Vol. II Anexo IIIc). Assim como no (Brasil, ELETRONORTE, 1987b), ou 1.335 m3/ caso da cassiterita, a possibilidade de usar balsas e as segundo para todas as cinco turbinas. As turbinas flutuações nos preços dos minérios poderiam alterar podem operar com menos água, porém produzem a atração sobre as jazidas no futuro. Funcionários menos energia. da ELETRONORTE negam qualquer ligação en- tre Balbina e a mineração, lembrando, com razão, A quantidade de água que passa no local do dos danos que o assoreamento causado por qualquer barramento é crucial para a capacidade de Balbina atividade desta natureza causaria para a geração de produzir a energia que os seus idealizadores es- energia pela hidrelétrica. peravam obter. A vazão as vezes cai para índices insignificantes. Em marão de 1983 a vazão em Outra teoria sobre a motivação por trás de Balbina chegou ao mínimo de 4,72 m3/segundo, de Balbina envolve a indenização que os donos das ter- acordo com as mensurações da ELETRONORTE ras receberiam. Mapas da ELETRONORTE indi- no local do barramento (Posto 08). Esta é uma cam que, com a exceção das terras tomadas da tribo quantidade própria para um pequeno igarapé ao in- Waimiri-Atroari, quase toda a área do projeto per- vés de um projeto hidrelétrico; os engenheiros no tence a particulares (Brasil, ELETRONORTE, s/d). canteiro de obras podiam até cruzar o rio de au- O pagamento de indenização ainda estava sob nego- tomóvel do tipo “Fusca”. A “vazão mínima regis- ciação nos últimos meses antes do início do enchi- trada” indicada no panfleto da ELETRONORTE, mento do reservatório. Embora seja lógico que aque- distribuído ao público para explicar o projeto, não les que reinvidicam os seus direitos referentes as suas reflete esta falta dramática de água. Um valor de propriedades de terras estejam tentando conseguir o 68,9 m3/segundo foi dado na versão de outubro de máximo de recompensa financeira possível, é pouco 1985 do panfleto, o que foi posteriormente revisa- provável que este grupo de interesse tivesse influen- do para 19,7 m3/segundo, na versão de fevereiro de ciado as decisões globais referente ao projeto. 1987 (Brasil, ELETRONORTE, 1985b, 1987b). A oferta de emprego e dos lucros do fornece- Os representantes da ELETRONORTE explicam mento de bens e serviços ao esforço de construção a discrepância dizendo que o “mínimo” refere-se a tem sido, sem dúvida, uma força crítica atrás de um valor médio mensal ao invés da vazão em qual- Balbina. O setor comercial de Manaus foi espe- quer dia determinado. Vale a pena notar que a vazão cialmente tenaz nos seus objetivos de evitar que as média mensal em fevereiro de 1983 era de 17,51 m3/ verbas para Balbina sejam cortadas (A Crítica, 14 de segundo (dados da ELETRONORTE, Posto 08). A Hidrelétrica de Balbina: 103 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia Embora seja mirabolante o contraste entre as ne- 5% em transmissão (Brasil, ELETRONORTE/ cessidades de água e as vazões mínimas (sejam ex- MONASA/ENGE-RIO, 1976: B-47), o que im- pressas como mensurações diárias ou como médias plicaria uma potência firme em Manaus de apenas mensais), a água armazenada no reservatório per- 60,8 MW. Embora toda barragem gere menos que mitirá que os operadores da hidrelétrica supram as a sua capacidade nominal, com 26% (medida no lo- turbinas durante breves períodos de vazão baixa. A cal de barragem), a potência firme de Balbina é me- vazão média anual, no entanto, não é uma limitação nor do que o normal. que pode ser contornada pelo manejo cuidadoso do reservatório (ao contrário das afirmações do setor de A pequena vazão do rio Uatumã pode servir relações públicas da ELETRONORTE em Balbina). como justificativa para outro projeto de engenharia prejudicial ao meio ambiente: o desvio do rio Alalaú Uma quantidade de água severamente limitada é para desaguar em Balbina. O rio Alalaú passa pela o resultado inevitável da pequena bacia hidrográfica reserva dos índios Waimiri-Atroari fornecendo um de Balbina, que é apenas oito vezes maior que a pró- recurso vital da pesca, especialmente a partir do mo- pria área da represa, o que representa uma situação mento que Balbina destruiu o único outro rio da extremamente fora de propósito no desenvolvimento tribo: o Uatumã. A construção do canal de desvio hidrelétrico. Mesmo um cálculo grosseiro baseado de 30 km, todo dentro da reserva, também causaria na área da bacia hidrográfica e a pluviosidade (um uma grande perturbação pela presença dos trabalha- cálculo que poderia ter sido feito antes mesmo de dores na obra. realizar o estudo de viabilidade) indica que a vazão média anual seria pequena: a média anual de precipi- A história e situação atual dos planos para o des- tação registrada em Balbina de 2.229 mm ( Januário, vio do Alalaú não são claras. Um mapa da rota de 1986: 15), caindo sobre a bacia de 18.862 km2 (Brasil, desvio aparece no relatório de viabilidade de Balbina ELETRONORTE, 1987b), produziria um volume (Brasil, ELETRONORTE/ MONASA/ENGE- de água que, levando em conta os 50% que retornam RIO, 1976: Illustração 19). O desvio não foi incluí- a atmosfera através da evapotranspiração (Leopoldo do no orçamento para Balbina, nem foram incluídos et al., 1982; Villa Nova et al., 1976), produziria uma nos estudos ambientais quaisquer dos seus impactos. vazão média de 660 m3/segundo. Esta não inclui a Durante o enchimento muito lento do reservatório evaporação da água guardada no reservatório. O es- de Balbina em 1988, a possibilidade de desviar o rio tudo de viabilidade da ELETRONORTE também Alalaú “voltou” à consideração em alguns setores da tinha estimado uma vazão média anual baixa: 657 m3/ ELETRONORTE (embora não no departamento de segundo (Brasil, ELETRONORTE/MONASA/ planejamento: Tadeu Ávila, declaração pública, 28 de ENGE-RIO, 1976: A-21). A experiência subse- novembro de 1988). Francisco Queiroz da Nóbrega, quente revelou uma vazão média ainda menor em coordenador da obra da ELETRONORTE em Balbina: 480 m3/segundo, em média (Rogério Gribel, Balbina, declarou claramente numa entrevista grava- declaração pública, 1988). da para um documentário de televisão em 1988 que o desvio do Alalaú “não deixa de ser uma alternativa A vazão média anual do rio Uatumã no local para o futuro” (Sautchuk, 1988). Representantes da do barramento, conforme a estimativa no estudo de viabilidade, é um pouco acima da quantidade ne- ELETRONORTE negam que os impactos de des- cessária para duas turbinas (em média). Já que se vio do Alalaú poderiam ter sido propositadamente espera que 13% da vazão total anual passará pelo deixados sem estudo até que a Balbina fosse um fato vertedouro sem gerar energia, produção “média” é consumado e a surpresa descoberta de que mais água de 112,2 MW. Desta energia, 64 MW representa seria necessária (Tadeu Ávila, declaração pública, 28 “potência firme” no nível de depleção do espelho de de novembro de 1988). água de 4,4 m, que é o máximo para qual as turbi- A capacidade nominal de Balbina de 250 MW nas foram projetadas (Brasil, ELETRONORTE/ é, por si mesmo, uma quantidade minguada para MONASA/ENGE-RIO, 1976: B-47). Uma per- uma represa deste porte (2.996 km2: Capítulo 6), da presumida de 2,5% em transmissão reduz a po- que é aproximadamente do mesmo tamanho do re- tência firme entregue a Manaus para apenas 62,4 servatório de 2.850 km2 de Tucuruí-II, que sustenta MW (Brasil, ELETRONORTE/MONASA/ uma capacidade nominal de 8.370 MW. Balbina ENGE-RIO, 1976: B-49). Alguns dos cálculos sacrifica 35 vezes mais floresta por megawatt de ca- da ELETRONORTE presumíam numa perda de pacidade de geração instalada do que Tucuruí. 104 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Uma grande parte do reservatório é extremamen- A represa de Balbina é um labirinto de canais te rasa porque o relevo em Balbina é bastante plano. entre aproximadamente 3.300 ilhas e 60 igarapés A área oficial de 2.360 km2 da represa na cota de 50 afluentes (Figura 4). m cai para 1.580 km2 na cota 46, o que significa que 780 km2 (33%) terão menos que quatro metros de O tempo de residência em algumas destas baías profundidade (Figura 3). A profundidade média é de de águas paradas será muitas vezes maior que a média 7,4 m (Brasil, ELETROBRÁS, 1986b: 6.12). Nessa que já é extremamente grande: de 11,7 meses calcula- extensa área de água rasa pode se esperar a sustenta- dos no estudo de viabilidade (Brasil, ELETROBRÁS, ção de uma vegetação aquática enraizada no fundo, 1986b: 6.12), ou 14,0 meses se calculado a partir dos que - adicionada ao problema de macrófitas flutuan- valores mensurados de vazão. A água em Tucuruí tes - poderiam afetar a represa inteira. A combina- contrasta com isto, com um tempo de residência em ção de superfície extensa por volume de água num média de 1,8 mêses ou 6,4 vezes menor que o valor reservatório raso e a alta biomassa de vegetação aquá- oficial para Balbina. Algumas partes do reservató- tica levará a pesadas perdas de água por evaporação rio de Balbina podem ser renovadas apenas uma vez e a transpiração. A ELETRONORTE apresentou em vários anos. Além da configuração reticulada das a criação de um rebanho de peixes-boi, como antí- baías interligadas em Balbina (Figura 1c), que parece doto contra a proliferação de macrófitas, numa re- um corte transversal de um pulmão humano, o tem- vista em quadrinhos na qual um papagaio explica a po de residência no fundo do reservatório, onde as “Maravilhosa Viagem da Luz até sua Casa” (Brasil, folhas em decomposição seriam concentradas, seria ELETRONORTE, s/d. (1987)). Os pesquisadores maior que a média geral para o reservatório porque do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia espera-se uma estratificação térmica (Fisch, 1986). (INPA) responsáveis pelo programa enxergam-no A água entrando no reservatório segue em direção como um esforço estritamente para fins de pesquisas à barragem nas camadas superficiais (Branco, 1986), ao invés de uma medida de controle de macrófitas, embora alguma mistura ocorrerá perto à barragem, já que os peixes-boi se reproduzem muito lentamen- sendo que a água removida do reservatório será tira- te (Vera da Silva, comunicação pessoal, 1988). Os da do fundo, onde estão situadas as tomadas de água peixes-boi têm um período de gestação longo (Best, para as turbinas. 1982) que, junto com a fertilidade reduzida duran- te a lactação, restringe a reprodução a um filhote por A lenta renovação da água no reservatório signi- fêmea a cada três anos (Best, 1984: 376 & Vera da fica que a vegetação em decomposição pode produ- Silva, comunicação pessoal, 1988). Por enquanto, a zir ácidos que causarão corrosão nas turbinas. Em ELETRONORTE retirou algumas das macrófitas Tucuruí, apesar da renovação da água ser relativa- à mão, removendo-as da área em canoas com motor mente rápida pois é dominada pelo fluxo no leito de popa e caminhões: um método que tinha poucas principal, um braço lateral, que comunica com o cor- chances de ser financeiramente sustentável. po principal da represa através de um pescoço estreito, é alimentado por igarapés tão pequenos que em anos secos a entrada de água corresponde a um tempo de Figura 3. Parte do reservatório de Balbina durante o enchimento, com o nível da água na cota de 47 m acima do nível do mar (3 m abaixo do nível cheio do reservatório). Um terço do reservatório tem menos que Figura 4. Algumas das 3.300 ilhas no reservatório de Balbina. As árvores 4 m de profundidade. de cor clara são mortas ou moribundas. A Hidrelétrica de Balbina: 105 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia residência na ordem de 50 anos. Antes de fechar a barragem, a ELETRONORTE limpou a vegetação com tratores de esteira nesta baía, conhecida como o Lago do Caraipé, para deixar a área tão estéril quan- to possível, minimizando assim a eutroficação (Cel. Willy Antônio Pereira, comunicação pessoal, 1987; ver Brasil, INPA, 1983: 32-34). Sem dúvida, o tra- tamento especial foi motivado também pela proxi- midade da baía a áreas habitadas perto à barragem. Mesmo com a limpeza por tratores de esteira, a baía foi rapidamente coberta por tapetes de macrófitas flu- tuantes (Cardenas, 1986a: 9, 17). O aumento na acidez da água causado pela de- composição da vegetação pode tornar a manutenção cara. Tucuruí já sofreu reparos em suas turbinas, a um Figura 5. A barragem de Balbina e parte dos 2% da área do reservatório onde a floresta foi removida. custo não divulgado. Na Hidrelétrica de Curuá-Una, perto a Santarém, Pará, a geração de energia teve que parar temporariamente em 1982 (apenas cinco anos O material usado nas turbinas originalmen- depois da sua entrada em funcionamento) para permi- te encomendados para Balbina foi mudado para tir reparos nas turbinas corroídas a um custo de US$ aço inoxidável quando a barragem estava sendo 1,1 milhão (Brasil, ELETROBRÁS/CEPEL, 1983: construída. Arcar com o custo adicional de usar 34). O custo acumulado de manutenção nos primei- ros seis anos totalizou US$ 2 milhões, ou US$ 16.600 aço mais resistente foi motivado por medo de cor- por megawatt instalado por ano: 70 vezes o custo por rosão. A comparação direta dos custos de manu- megawatt para uma hidrelétrica comparável na região tenção de Balbina e de Curuá-Una está, portanto, nordeste (Brasil, ELETROBRÁS/CEPEL, 1983: complicada por dois fatores opostos: aço melhor 44). O relatório é ricamente ilustrado com fotografias e água pior. Dado a acidez sem precedentes na das turbinas altamente corroídas em Curuá-Una. A água de Balbina, os custos de manutenção serão, perda de geração de energia não está incluída nos cus- sem dúvida, altos. tos de manutenção relatados. O tempo de residência O não desmatamento da área de inundação média de água em Curuá-Una é aproximadamente em Balbina é um assunto de controvérsia jurídica. 40 dias (Robertson, 1980: 10); o tempo de residên- A lei No. 3.824 de 23 de novembro de 1960 resa cia em Balbina aproximadamente dez vezes maior que é “obrigatória a destoca e conseqüente lim- significa que a qualidade da água e os problemas de peza das bacias hídricas dos açudes, represas ou corrosão seriam piores que em Curuá-Una. O maior lagos artificiais”. A ELETRONORTE não ten- número de baías e canais de água parada em Balbina aumentará ainda mais esta diferença. Pela taxa ob- tou uma limpeza desta natureza na área inundada servada em Curuá-Una, a manutenção em Balbina em Tucuruí, alegando que a lei se referia apenas custaria US$ 4,15 milhões por ano ou 4,3 mils (mi- a reservatórios destinados ao abastecimento de lésimos de dólar norteamericano) por quilowatt-hora água, não para a geração de energia elétrica. O (kWh) de eletricidade entregue a Manaus (cerca de precedente de Tucuruí foi posteriormente aplica- 10% da tarifa cobrada aos consumidores). Nos seus do para justificar o não desmatamento em Balbina primeiros 13 anos de operação, reparos devido à cor- (A Crítica, 08 de novembro de 1985). Antes de rosão na Hidrelétrica de Brokopondo no Suriname Tucuruí, a floresta permaneceu na represa de 86 totalizaram US$ 4 milhões, ou mais de 7% do custo km2 em Curuá-Una, no Pará, fechada em 1976, de construção (Caufield, 1983: 62). Assim como em e apenas 50% da área de inundação foi desma- Brokopondo e Curuá-Una, a vegetação permanece tada na represa de 23 km2 de Coaracy Nunes para se decompor na maior parte da área de inunda- (Paredão) no Amapá, fechada em 1975 (Paiva, ção de Balbina: apenas uma área simbólica de 50 km2 1977). Quando a vegetação permanece em reser- (2%) na represa foi desmatada antes do fechamento vatórios entra em decomposição, a água torna-se da barragem (Figura 5). ácida e anóxica (Garzon, 1984). 106 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras A loucura ambiental é tão grande que uma represa com 4.000 km2 está dentro da faixa das possibilidades (Antônio Donato a) Impactos sobre Sistemas Naturais Nobre, comunicação pessoal, 1988). A possibilidade A perda da floresta é um dos principais custos de que o reservatório podia inundar uma área muito de grandes represas como Balbina. A área prejudi- maior que a estimativa oficial não tinha confirma- cada é muito maior que os 2.360 km2 oficialmente ção independentemente; isto permanece apenas um inundados, já que a inclusão de ilhas aproximada- boato persistente. Somente o mapeamento do re- mente duplica a área afetada. Apesar da promo- servatório cheio mostraria o verdadeiro tamanho da ção pela ELETRONORTE das ilhas como tendo represa [ver Capítulo 6]. “condições de vida para animais e plantas” (Brasil, A decomposição da vegetação na água produz o ELETRONORTE, s/d. (1987): 18), sabe-se que gás sulfídrico (H2S), resultando num cheiro de ovo uma floresta dividida em pequenos fragmentos per- podre. O reservatório de Brokopondo, no Suriname, de muitas espécies de animais e plantas à medida produziu H2S, obrigando os trabalhadores do local a em que os pedaços isolados de floresta se degradam usar máscaras durante dois anos após o fechamento (Lovejoy et al., 1984). da barragem (Melquíades Pinto Paiva, comunicação Não se sabia a área a ser inundada apesar da pessoal, 1988; Paiva, 1977; Caufield, 1982). Na re- aparente precisão dos mapas e declarações da presa muito menor de Curuá-Una, no Pará, o cheiro ELETRONORTE. As informações topográficas foi até percibido por pessoas sobrevoando a área em nos mapas, e nos cálculos de área derivados destes, pequenos aviões (Barbara A. Robertson, comunica-2 eram baseadas em fotografias aéreas. As fotografias ção pessoal, 1988). Além do mau cheiro. H S pro- registram o nível do topo das árvores na floresta, não duz chuva ácida. Apesar das preocupações populares o do chão por baixo das árvores; já que uma par- com a poluição do ar como um aspecto do impacto 2 te significativa da represa terá apenas um ou dois ambiental do projeto, o H S é um fenômeno relativa- metros de profundidade, erros desta grandeza pode- mente temporário e restrito. riam facilmente alterar o resultado final. A rasa represa com uma grande área de terra, Era sugerida a possibilidade de que a área inun- alternadamente inundada e exposta também produ- dada na cota de 50 m poderia ser até o dobro da área zirá o gás metano (CH4). Foi sugerido de antemão oficialmente admitida. “Fontes no setor econômico que Balbina seria uma contribuinte em potencial do governo federal” foram citadas como revisando a a este problema (Goreau & Mello, 1987). O gás área de 1.600 para 4.000 km2 (Barros, 1982). Um metano contribui ao efeito estufa que está atual- deputado acusou o governo de propositadamente mente aumentando a temperatura média do globo subestimar a área a ser inundada (A Crítica, 29 de (Dickinson & Cicerone, 1986). A Amazônia tem dezembro de 1982). A ELETRONORTE imedia- sido identificada como uma das fontes principais de temente negou que o reservatório inundaria mais metano para a atmosfera; a várzea é a fonte principal que 1.650 km2. Não se conhece a origem do va- da contribuição amazônica (Mooney et al., 1987). 6 lor de 1.650 km2, embora este valor também apa- A várzea ocupa aproximadamente 2% dos 5 × 10 2 reça em um dos primeiros levantamentos florestais km da Amazônia Legal brasileira (Figura 2) ou ( Jaako Pöyry Engenharia, 1983: 8). Inicialmente seja a mesma percentagem que seria inundada pelas a ELETRONORTE esperava que a represa ocu- 79 barragens sendo consideradas para construção, passe apenas 1.240 km2 quando cheia, (Brasil, na região, ao longo das próximas décadas (Brasil, ELETRONORTE/MONASA/ENGE-RIO, ELETROBRÁS, 1987: 150). Se estas represas 1976: B-55). O valor oficial para a área do reserva- contribuirem para um fluxo de metano, da mesma tório na cota de 50 metros é atualmente 2.360 km2 ordem daquele produzido pelas várzeas, elas repre- (Brasil, ELETRONORTE, 1987b), ou seja, quase o sentariam, como um todo, uma contribuição signifi- dobro do valor original. O valor atual foi calculado cante aos problemas atmosféricos globais. em 1980 (Brasil, ELETRONORTE, 1981), e não A morte de peixes na hora do fechamento da reflete quaisquer melhorias que possam ter havido barragem é um dos impactos que mais atrai a aten- desde aquela época nas informações topográficos. ção pública. A ELETRONORTE tornou difícil Engenheiros que trabalharam no levantamento to- para observadores testemunhar este aspecto, não in- pográfico de Balbina têm falado para pesquisadores formando a pesquisadores e outros de quando a bar- do INPA que a margem de erro do levantamento ragem seria realmente fechada. Balbina foi fechada, A Hidrelétrica de Balbina: 107 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia sem aviso prévio, 30 dias antes da data anunciada de Residentes ao longo do rio abaixo da barragem 31 de outubro de 1987. No entanto, alguns pesqui- optaram por ficar onde estavam, em troca de benefí- sadores estavam presentes na época. Peixes morre- cios para compensar a perda de pesca e de água potá- ram a jusante da barragem em Balbina ( José A.S. vel durante a fase de enchimento: as 50 famílias mais Nunes de Mello, comunicação pessoal, 1988). No próximas da barragem (aqueles localizadas acima da caso de Tucuruí, a ELETRONORTE fechou a bar- Cachoeira Morena, 30 km abaixo da barragem) se- ragem sem aviso no dia 06 de setembro de 1984, um riam dados secadores solares para uso na preservação dia antes do feriado de três dias de comemoração dos peixes que ficassem presos nas poças de água da indepêndencia nacional. Uma equipe do INPA formadas no leito seco do rio; estas famílias mais as conseguiu chegar até o local no dia 10 de setembro, 50 famílias adicionais entre Cachoeira Morena e o e uma razoável mortandade de peixes foi oberva- rio Abacate receberiam poços e tanques de água. A da. A mortandade dos peixes em Tucuruí também ELETRONORTE completou apenas cerca de um ocorreu quando a primeira água passou pelas tur- terço dos 100 poços antes do fechamento da barra- binas num teste anterior à cerimônia de abertura. gem. A ELETRONORTE prometeu abastecer com O lançamento de água anóxica matou muitos pei- água de carros pipa aqueles que não tinham recebido xes no trecho imediatamente abaixo da barragem; o poço (aproximadamente a metade das famílias es- a ELETRONORTE removeu estes de caminhão tavam em lotes com acesso a estrada construída de para melhorar a imagem visual e olfativa da área para Balbina até Cachoeira Morena). Apenas uma entre- a cerimônia de inauguração. Em Balbina, as toma- ga de água foi realmente efetuada ( Jaime de Araújo, das de água para as turbinas, localizadas no fundo da comunicação pessoal, 1988). represa, fatalmente tiram a água praticamente sem oxigênio nenhum. A entrada em funcionamento O número de residentes a jusante beneficiados da segunda turbina de Balbina, em marão de 1989, pelo programa de assistência foi reduzido durante provocou a morte de peixes até abaixo da foz do rio o curso da construção da barragem. Originalmente, Jatapú, 145 km a jusante de Balbina. 177 famílias foram entrevistadas a jusante da barra-gem para a inclusão no programa; um levantamento b) Impactos sobre residentes não Indígenas mais detalhado parou em 151 famílias, indicando fa-mílias apenas até o rio Jatapu, ou seja 145 km abaixo Relativamente poucas pessoas habitavam a área do barramento (Brasil, ELETRONORTE, 1986a). de Balbina, em comparação com muitos projetos O levantamento foi interrompido em dezembro de hidrelétricos no mundo. A ELETRONORTE 1986 quando a ELETRONORTE decidiu restrin- reconheceu apenas uma família não indígena, com gir a assistência às 100 famílias morando acima do sete membros, na área de inundação e 100 famílias rio Abacate, 95 km abaixo da barragem. Um clima entre o barramento e o rio Abacate, 95 km a jusante. de desconfiança se estabeleceu entre os moradores a Um levantamento realizado por três organizações jusante e a ELETRONORTE. que se opuseram à construção da barragem concluiu que 217 famílias, totalizando mais de 1.000 pessoas, c) Impactos sobre os Índios seriam diretamente afetadas. Uma publicação de negócios, favorável à barragem, indicou que a popu- A inundação de uma parte da área da tribo lação não indígena na área de inundação era de 42 Waimiri-Atroari é um dos custos não monetários pessoas em 11 famílias (Visão, 16 de julho de 1986). mais drásticos da barragem. Duas das dez aldeias ainda existentes foram inundadas: Taquari (po- Uma parte da rodovia Manaus-Caracaraí (BR- pulação 72) e Tapupunã (população 35) (Brasil, 174) também foi inundada. Seriam indenizados FUNAI/ ELETRONORTE, s/d. (1987): 11). As pela ELETRONORTE os proprietórios de terra duas representam 29% da população da tribo, na na área que foi calculada como provável a ser inun- época totalizando 374 indivíduos. Este total estava dada uma vez em cada mil anos. Um relatório da dividido entre 223 Waimiri e 151 Atroari (Brasil, ELETROBRÁS reconhece 65 propriedades e pos- ELETROBRÁS, 1986b: 6-12). As 107 pessoas nas ses na área da represa, com um total de 250 pes- duas aldeias inundadas eram todas Waimiris, re- soas (Brasil, ELETROBRÁS, 1986b: 6-13). Aos presentando 48% da população deste grupo. Já que residentes não indígenas da área de inundação de os grupos se movimentam dentro do seu território Balbina foram oferecidas terras num projeto de as- para caçar e pescar, o número afetado é maior do que sentamento do governo. apenas aqueles nas aldeias inundadas. 108 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras A área que seria tomada da reserva foi calculada menor em relação ao pano de fundo de reveses sofri- na base do nível em que o reservatório é provável dos pelos índios em toda a região em anos recentes. chegar com uma frequência de uma vez em 1.000 O caso de Balbina é significativo, no entanto, por anos. A cota assim calculada é de 53 m acima do causa da dizimação especialmente dramática da tri- mar, ou 3 m acima da cota normal do reservatório bo na década anterior ao início da construção. cheio. Inundação mais alta era esperada na parte superior do reservatório, onde a reserva está locali- A tribo contava com uma população de 6.000 zada, porque o pescoço estreito que divide a represa índios em 1905, segundo uma estimativa dos natu- de Balbina em duas partes (ver Figura 1b) restringe ralistas alemães Georg Hubner e Theodore Koch- o fluxo de água até a barragem (Cel. Willy Antônio Grünberg (CIMI, 1979: 5; ver também Garcia, 1985; Pereira, comunicação pessoal, 1987; ver Brasil, MAREWA, 1987). Até aquele ano a tribo já tinha ELETRONORTE, 1986b). Deve ser lembrado sofrido uma longa série de massacres. O primeiro que o assoreamento começará no extremo superior registro oficial de uma expedição punitiva contra a da represa. Caso os sedimentos entupam parcial- tribo foi em 1856, quando uma força de 50 soldados mente a passagem estreita entre as duas partes da eliminou algumas dúzias de índios. Expedições si- represa, a chance de haver maiores e mais freqüen- milares foram realizadas em 1872, 1873, 1874 e 1881 tes inundações na área dos Waimiri-Atroari seria (Martins, 1982: 284). bastante aumentada. A população de 6.000 na virada do século foi Na cota de 53 m, 331 km2 da reserva seriam reduzida a 3.500 até 1973 através de uma longa série inundadas (Brasil, ELETROBRÁS, 1986b: 6-13). de contatos violentos. Em 1905 e 1906 expedições Da área proposta de 24.400 km2 na reserva, esta punitivas renderam 300 e 203 cadáveres respectiva- representava 1,3%. Embora a parte inundada seja mente; cada uma destas expedições também captu- muito pequena como percentagem da área da reser- rou vários índios como “troféus”, que foram levados va, esta parte inclui uma proporção significante da a Manaus onde eles subsequentemente adoeceram e população tribal e dos seus recursos alimentares. morreram (Martins, 1982: 284-286). A Fundação Nacional do Índio (FUNAI) levou Contatos violentos continuaram até a década de uma delegação de lideranças dos Waimiri-Atroari 1980. Os mortos do lado não indígena receberam para visitar a tribo Parakanã, cujo território, em gran- farta reportagem em Manaus, enquanto no lado in- de parte, tinha sofrido inundação em 1984 pela re- dígena não recebeu esta divulgação, um padrão que presa de Tucuruí. A visita rapidamente convenceu reforça a visão pouca simpática da tribo entre resi- os Waimiri-Atroari de que eles tinham que deixar dentes de Manaus. Em 1970 a rodovia Manaus- as suas aldeias e cooperar com a FUNAI: algo que Caracaraí (BR-174) foi iniciada para ligar Manaus explicações orais e uma demonstração, usando uma com a Venezuela. A rodovia cortou o território da maquete da barragem e do reservatório, não tinham tribo; durante e depois da construção da rodovia, o conseguido fazer. Duas aldeias novas foram construí- acesso à área foi restringido pelo exército. Em 1973 das pela própria tribo em outra parte do território. era proibido viajar na rodovia através da área tribal, e A população que mudou recebeu diversos presentes durante pelo menos mais cinco anos o trânsito foi res- da FUNAI, tais como motores de popa, e canoas de trito a comboios de veículos durante o dia. Contatos alumínio, para substituir as suas canoas tradicionais violentos continuaram: em 29 de dezembro de feitos de troncos de árvore. Os indivíduos que indu- 1974, Gilberto Figueiredo Pinto Costa (o agente da ziram a colaboração com a FUNAI não eram as lide- FUNAI que era o único não índio a ter amizade com ranças tradicionais da tribo; a riqueza material súbita a tribo e visitar suas aldeias) foi morto, e oficialmente dos agraciados com os presentes criou tensões inter- isso ocorreu durante um ataque dos Waimiri-Atroari nas na tribo (ver Adolfo, 1987). Antropólogos traba- contra o posto índigena Alalaú-II (obs.: alguns fun- lhando na área ficaram chocados com a rapidez pela cionários da FUNAI acreditam que ele foi assassina- qual os que aceitam os presentes deixaram de lado do por outros funcionários daquele órgão que temiam os seus costumes e perderam a sua autossuficiência o que ele sabia a respeito de suas participações em (Arminda Muniz, comunicação pessoal, 1987). massacres: ver Athias & Bessa, 1980). Em 1975 a FUNAI decidiu que haviam acontecido tantos en- O deslocamento de duas aldeias indígenas e contros hostis que as tentativas do órgão “pacificar” a a perda de parte de uma reserva seria um assunto tribo foram suspensas (Martins, 1982: 278). No ano A Hidrelétrica de Balbina: 109 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia seguinte, os contatos entre a ELETRONORTE e a sobre a existência dos Waimiri-Atroari não eram di- FUNAI começaram visando a limpeza da área para fíceis de se obter na época. Balbina (Garcia, 1985). Devido ao impacto sobre o Waimiri-Atroari A população de 3.500 em 1973 (uma estimati- implícito nos planos para Balbina, a França e o va feita por Gilberto Pinto) foi reduzida para 1.100 Brasil foram acusados de genocídio no Quarto em 1979 (de acordo com estimativas da FUNAI, Tribunal Bertrand Russell em Rotterdam, Holanda, ver Athias e Bessa, 1980), e daí para 374, sendo em novembro de 1980. Severos como são os im- a maior parte crianças, até o ano de 1986. Como pactos do reservatório, a sua classificação como “ge- afirma Garcia (1985): “Em doze anos, mais que nocídio” foi provavelmente influenciada mais pelos três mil índios desapareceram, mortos por epide- massacres associados às atividades (brasileiras) de mias de sarampo ou pelas balas dos aventureiros, construção rodoviária no território da tribo durante caçadores e tropas jagunças de latifundiários, com a época em que Balbina estava em fase de plane- claro apoio das autoridades federal e estadual”. jamento, especialmente 1974-1975. Os engenhei- Estes acontecimentos não são fatos acadêmicos ros da ELETRONORTE são rápidos em apontar referentes a alguma época histórica distante; eles as injustiças de se criticar Balbina por inundar uma ocorreram apenas a 200 km de Manaus ao longo pequena parte do território da tribo quando não se de um período em que parte da população adulta diz nada sobre a liquidação flagrante a apenas pou- da cidade pode se lembrar. cos quilômetros distantes (Adelino Sather Filho, comunicação pessoal, 1987). No entanto, o pano A reserva da tribo Waimiri-Atroari tem sido re- de fundo de atrocidades vizinhas não altera o fato duzida todas as vezes que foi julgado conveniente. de que Balbina tem um impacto negativo sobre os A reserva foi criada através dos decretos 69.907/71, Waimiri-Atroari sobreviventes. As fontes interna- 74.463/74 e 75.310/75 (de 1971, 1974 e 1975). Em cionais de financiamento para a obra aparentemente 1981 o Presidente Figueiredo revogou estes através não consideravam este impacto. No caso do Banco do processo BSB/22785/81 quando ele assinou o Mundial, as diretrizes da instituição exigem que se- decreto 86.907/81. Isto aboliu a reserva, transfor- jam dadas considerações devidas a quaisquer impac- mando-a numa mera “área temporariamente dotada tos que os empréstimos possam vir a ter sobre povos para fins de atração e pacificação dos índios Waimiri- tribais (Goodland, 1982). Atroari” (Brasil, FUNAI/ELETRONORTE s/d. (1987): 15). Nesta transformação, a área perdeu A loucura econômica não apenas parte da sua proteção legal mais tam- a) Os Custos de Construção bém foi diminuída em 526.000 ha, que foram da- dos à Timbó Mineradora Ltda., uma subsidiária da O custo de construir a barragem aproximada- Paranapanema, a firma que está minerando a cassi- mente dobrou desde a estimativa inicial de US$ 383 terita em Pitinga, na parte superior da bacia hidro- milhões (Brasil, ELETRONORTE/ MONASA/ gráfica de Balbina. As verbas da ELETRONORTE ENGE-RIO, 1976: A-24). A ELETRONORTE depois ajudaram a acelerar a demarcação da reserva, admitiu um custo de US$ 750 milhões, excluindo levantando e demarcando no chão os seus limites. o custo da linha de transmissão. O custo de cons- trução de Balbina foi de US$ 3.000 por quilowatt O acontecimento chave na transformação de de capacidade instalada. Em comparação, quando Balbina de uma massa de papéis para uma realidade completa, Tucuruí custou US$ 675/quilowatt (4,6 de 2.360 km2 de árvores mortas e água fétida foi o vezes menos que Balbina) e Itaipú US$ 1.206/qui- acordo franco-brasileiro assinado pelo presidente bra- lowatt (2,6 vezes menos que Balbina) (custos de sileiro Ernesto Geisel e pelo presidente francês Valery construção de Tucuruí e Itaipú segundo a Veja de Giscard D’Estaing durante uma visita à Brasília em 20 de maio de 1987: 30). A eletricidade de Balbina 1978. Os franceses foram duramente atacados por pode custar mais do dobro deste valor já astronô- organizações a favor dos direitos indígenas por ter mico, pois o cálculo presupõe que 250 MW seriam assinado um acordo que inundaria terras indígenas; gerados ao invés da potência média de apenas 109,4 os franceses responderam que o governo brasileiro ti- MW a ser entregue a Manaus. Também não es- nha informado que não existiam índios na área (Folha tão incluídos nos cálculos os custos de manutenção, de São Paulo, 08 de outubro de 1978). Informações substituição de peças e a depreciação da hidrelétrica 110 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras como um todo, ao longo da sua vida útil esperada. especialmente a madeira. O valor em potencial da Os juros pagos na dívida contraída para construir floresta sacrificada não foi incluído nos cálculos do também não são incluídos. custo do reservatório, o que se tornou um foco de atenção pública (e.g., A Crítica, 22 de setembro de b) O Acordo Franco-Brasileiro 1984, 03 de outubro de 1985). Um levantamento O acordo franco-brasileiro contribuiu com as- florestal feito pelo INPA revelou 28,8 m 3 de madei- sistência técnica e uma linha especial de crédito para ra nobre por hectare (Higuchi, 1983: 20), ou aproxi- a compra de turbinas da França. A primeira turbina madamente 6,8 milhões de m 3 na área de 2.360 km2 foi fabricada na França por Neyrpic, uma compa- do reservatório. Um levantamento feito por uma nhia pertencente ao Grupo Creusot Loire; as outras firma de consultoria concluiu que o volume de ma- quatro turbinas estão sendo fabricadas em Taubaté deira de todas as espécies era, em média, 161 m 3/ha (no Estado de São Paulo) pela Mecânica Pesada, para árvores acima de 10 cm de diâmetro à altura do uma subsidiária do mesmo Grupo Creusot Loire. peito (DAP) e 58 m 3/ha para árvores superiores a 50 cm DAP ( Jaako Pöyry Engenharia, 1983: 50). Este A tentação de comprar mais turbinas e gerado- valor foi considerado insuficiente e desanimou os res do que o necessário é forte quando os acordos esforços de exploração madeireira (Visão, 16 de ju- sobre compras formam parte de um pacote generoso lho de 1986). A pequena antecedência de aviso dada de financiamentos; Paulo Maluf, ex- governador de aos potenciais concessionários madeireiros também São Paulo, provocou um escândalo financeiro gra- fez com que qualquer exploração na escala comer- ve quando foi descoberto que tinha sido comprado cial fosse improvável: as firmas madeireiras tinham para a Hidrelétrica de Três Irmços mais turbinas que menos de dois anos entre a data da licitação e a data o necessário (Isto É, 03 de setembro de 1986). As originalmente fixa para o fechamento da barragem. turbinas de Três Irmãos foram adquiridas da mesma fábrica francesa que forneceu a turbina importada A incapacidade da ELETRONORTE em de Balbina. Embora cinco turbinas de 50 MW num despertar o interesse de empresas madeireiras na rio tão pequeno quanto o Uatumã seja considerado exploração da área do reservatório representou um “supermotorizado” pela ELETRONORTE, os en- revés em termos de relações públicas, dado a alta genheiros insistem que cai dentro da faixa normal. visibilidade da perda envolvida. O presidente da Eles citam justificativas: (1) a demanda de energia ELETRONORTE enfatizou que a madeira inun- em Manaus excede tanto a capacidade geradora dada não era perdida, e sugeriu que durante a vazan- da hidrelétrica que toda a energia produzida pode te os madeireiros podem cortar as árvores na terra ser vendida (normalmente barragens deixam pas- exposta e voltar de barco para rebocar as toras du- sar água pelo vertedouro na época chuvosa porque rante a enchente (Lopes, 1986). Em Tucuruí alguns não precisam de toda a energia); (2) a falta de uma madeireiros têm cortado as espécies valiosas usando rede regional para cobrir a demanda durante perío- mergulhadores com motoserras especiais para uso dos em que uma das turbinas está sofrendo reparos. debaixo de água; os custos são muitos menores do Ao invés de 10% de excesso de capacidade instalada, que na exploração tradicional em terra firme devido que é o normal no Brasil em redes regionais, uma à facilidade de rebocar as toras cortadas. No en- turbina suplente inteira está planejada para Balbina tanto, o perigo é grande para a pessoa que serra as (i.e., 20% de excesso de capacidade). A projeção da árvores. Nas pastagens amazônicas, quando as árvo- ELETRONORTE da produção esperada de ener- res morrem em pé, elas não são cortadas, devido ao gia ao longo do tempo indica que todas as cinco tur- perigo de galhos mortos cairem sobre a pessoa que binas iriam operar durante um mês, no máximo, por serra o tronco embaixo. ano, e que a hidrelétrica poderia operar com quatro turbinas durante apenas um mês adicional, na época Produtos florestais não madeireiros também da enchente (Brasil, ELETRONORTE, 1987a). são perdidos. A seringa e o pau rosa estavam sendo explorados até os últimos meses antes do enchi- c) Os Custos da Corrida para Encher a Represa mento. Os produtos potencialmente mais valiosos das florestas, aqui (assim como em outras partes A perda mais evidente--proveniente da pres- da Amazônia) nem sequer têm sido identificados, sa da ELETRONORTE para encher a represa- especialmente os compostos farmacêuticos (ver -estava relacionada com os produtos da floresta, Myers, 1976). A Hidrelétrica de Balbina: 111 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia A ordem em que as diversas partes do proje- Alternativas a Balbina to foram construídas poderia ter sido modificada, com possíveis benefícios ambientais e financei- a) Aproveitamento de Fontes Alternativas ros. A linha de transmissão foi o último item a de Energia ser construído, enquanto que se isto tivesse sido o Balbina é especialmente infeliz porque é des- primeiro item, usinas termoelétricas no local do necessária. Esperava-se que a barragem produza barramento poderiam ter usado a madeira da área energia firme que possa garantir apenas cerca de um do futuro reservatório e ter transmitido a energia para Manaus. O peso seco da biomassa acima do terço da demanda de 218 MW em Manaus em 1987 solo, estimado como média ponderada dos tipos de (Brasil, ELETRONORTE, 1987b); a potência mé- floresta na área, é de 400 toneladas/ha (Cardenas, dia entregue a Manaus (109,4 MW após a perda de 1986b: 27). Considerando a percentagem do total 2,5% de transmissão) seria a metade da demanda em representado por troncos, nas quadras de amos- 1987. Em relação aos aproximadamente 130 MW tragem (Cardenas, 1986b: 16), o peso seco dos realmente consumidos em 1987 isto representa troncos seria, em média, 267 toneladas/ha ou 63 84%. A hidrelétrica nunca vai fornecer os 50% dava milhões de toneladas nas 2.360 km2 da área de demanda de Manaus que seria suprida se estivesse inundação. Os planos para usinas termoelétricas funcionando em 1987. à lenha picada, implantadas nas pequenas cidades A percentagem da energia consumida em do Estado do Amazonas, consideraram o conteúdo Manaus fornecida por Balbina vai diminuir a cada calórico médio da madeira como 2.500 Kcal/kg, e ano sucessivo na medida em que a cidade continua a geração de eletricidade de usar 4.000 Kcal/kWh a crescer. A produção média de energia (na cota de (Brasil, CELETRA, 1984). Os troncos das árvores 50 m) entregue a Manaus corresponde apenas a 38% da área a ser inundada em Balbina eram, portanto, dos 285 MW anualmente consumido, 26% da de- equivalentes a (aproximadamente) 39,4 gigawat- manda anual de 420 MW que a ELETRONORTE ts-hora (GWh) de eletricidade. Para gerar isto a prevê para a cidade em 1996 quando esperava-se partir de petróleo, usando as proporções de diesel e que o déficit energético de Manaus seja suprida por óleo combustível usados em Manaus, seria neces- uma outra hidrelétrica a ser construída a 500 km sário o equivalente de mais de 161.000 barrís de da cidade em Cachoeira Porteira, no rio Trombetas óleo cru (calculado de Brasil, ELETRONORTE, (Brasil, ELETRONORTE, 1987b). A Hidrelétrica 1985c: 19), o que valia US$ 3,2 milhões no baixo de Cachoeira Porteira teria uma capacidade ins- preço de US$ 20/barril vigente em 1989. talada de 1.420 MW e produziria, em média, 760 Apesar da não competitividade de usar lenha MW (Brasil, ELETRONORTE, 1985b), ou seja, no lugar do petróleo com os preços baixos na épo- aproximadamente sete vezes a produção de Balbina. ca, deve ser lembrado de que o petróleo represen- Apenas uma barragem (Cachoeira Porteira) poderia ta um recurso físico, não apenas um determinado ter sido construída, com a metade do custo e a me- valor em dinheiro. Ao se jogar fora a floresta que tade do impacto, ao invés de duas barragens. A poderia ter sido usada para gerar energia no lugar futilidade de Balbina torna-se ainda mais aparen- do petróleo, se joga fora também a oportunidade te quando considera-se que o gás natural a 500 km de se guardar aquela quantidade de petróleo no de Manaus na bacia do rio Juruá podia abastecer chço até o dia em que o petróleo esteja em falta e, Manaus com energia. Esta era a proposta como al- consequentemente, o seu preço seja muito maior. ternativa a Balbina feita pelo perito mais conhecido Usando a floresta na área de inundação reduziria do Brasil em assuntos energéticos: José Goldemberg também os problemas de má qualidade de água (1984; ver também Melchiades Filho, 1987). provocados pela vegetação em decomposição nas A descoberta de petróleo e gás em Urucú, mais pró- represas. Qualquer plano para converter em ener- ximo a Manaus, também poderia abastecer a cidade gia termoelétrica, a biomassa da floresta em repre- com energia sem Balbina (ver Falcão Filho, 1987). sas futuras deve ser acompanhado de exigências A magnitude da ocorrência de gás em Juruá se tor- estritas de que as usinas sejam mudadas para outro nou aparente enquanto Balbina estava em fase de local depois que a área de inundação seja cortada, construção. Mesmo assim, a construção de Balbina para evitar que as usinas contribuam ao desmata- poderia ter sido parada anos antes da sua conclusão, mento além dos limites dos reservatórios. com uma economia de várias centenas de milhões 112 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras de dólares que poderiam ter sido gastos de forma de Tucuruí até Cachoeira Porteira seria US$ 600 mi- melhor para transmitir a energia de Juruá. lhões ( Joaquim Pimenta de Arrila, comunicação pes- Estudos preliminares foram elaborados para soal, 1987). Este total é mais barato que os US$ 730 transmissão de energia do Juruá até a área de milhões gastos em Balbina, porem a inflação do dólar Grande Carajás na Amazônia oriental, onde a ele- pode reduzir ou eliminar a diferença. O que faz a tricidade seria usada em usinas de ferro-gusa. A dis- transmissão substancialmente mais barata do que este tância atravessada num projeto desta natureza seria cálculo indica é o fato de que grande parte da linha muito maior do que um trajeto do campo de gás do seria construída de qualquer forma. Juruá até Manaus. A distância de 500 km de Juruá Aproximadamente a metade do custo da ligação até Manaus é a mesma de Manaus até Cachoeira entre Tucuruí e Cachoeira Porteira seria para cruzar o Porteira, embora que a transmissão de Juruá exigiria rio Amazonas. A travessia não poderia ser feita com o gasto adicional de cruzar ou o rio Amazonas ou um cabo submerso devido à forte correnteza do rio. ambos os rios Solimões e Negro. No entanto, cons- Para uma linha suspensa, o rio é largo demais para truir uma hidrelétrica também sai caro. fazer a travessia num só vão, mesmo no ponto mais Rotas para gasodutos também foram propos- estreito em Óbidos: as torres necessárias seriam altas tas para Manaus de Juruá (Brasil, CEAM, 1985) demais para serem práticas. A travessia seria feita, ou de Urucú (Brasil, ELETRONORTE, 1987c: portanto, num ponto largo e raso usando ou uma sé- Amazonas-6). O presidente da ELETRONORTE rie de torres fixas no leito do rio ou um sistema de declarou que era uma decisão da população de torres flutuantes. Locais possíveis para uma travessia Manaus de construir Balbina ao invés de usar gás ou dessa natureza eram Almeirim (Pará) e Itacoatiara construir linhas de transmissão, e que a geração a gás (Amazonas). Corrente direta seria usada para a tra- e a construção de linhas de transmissão eram tec- vessia; a electricidade seria convertida para corrente nologicamente viavéis (Lopes, 1986). No entanto alternada em sub-estações em cada lado do rio, a um nenhum debate público foi realizado sobre assuntos custo de cerca de US$ 100 milhões por sub-estação. energéticos, já que a construção de Balbina começou Avanços na tecnologia da transmissão de energia numa época em que o regime militar no Brasil li- desde a época quando foram feitas estas estimativas mitava tais discussões (ver Brasil, INPA, Núcleo de de custo poderiam abaixar bastante o preço (Pires Difusão Tecnológica, 1986). & Vaccari, 1986) [Obs.: Uma linha de transmissão Tucuruí-Manaus foi concluída em 2013]. A transmissão de energia das principais áreas de geração hidrelétrica nas bacias dos rios Tocantins, Planos preliminares para o Complexo de Altamira Xingú, e Tapajós também é possível. Estes gran- no rio Xingú incluem mapas que implicam que li- des afluentes chegam ao rio Amazonas do lado sul, nhas de transmissão ligarão Altamira com Cachoeira descendo a partir do platô central do Brasil. O seu Porteira (Brasil, ELETRONORTE/CNEC, s/d. potencial de gerar energia é enorme. As barragens (1986): 36). Um mapa da ELETRONORTE sobre nesta região também causariam grandes impactos os planos de expansão de linhas de transmissão indi- ao meio ambiente, mas a superfície inundada por ca uma ligação entre Tucuruí e Monte Dourado, no megawatt de energia produzida seria muito menor Projeto Jari ao norte do rio Amazonas, com uma tra- do que no caso de Balbina. A construção de linhas vessia perto de Almeirim (Brasil, ELETRONORTE, de transmissão até estes locais de hidrelétricas for- 1987c, p. Pará-30). Esta foi o meio preferido pela neceria uma solução praticamente permanente para ELETRONORTE para suprimento de energia ao o abastecimento de energia a Manaus, e seria mais Projeto Jari, até agosto de 1988, quando o Jari ob- barato do que Balbina ficou no final. teve permissão para construir uma hidrelétrica par-ticular ( José Antônio Muniz Lopes, declaração Uma parte da distância de Manaus até Tucuruí e pública, 1988). Uma linha de transmissão de apro- outros locais de hidrelétricas nos afluentes ao sul do ximadamente de 520 km seria necessária para ligar rio Amazonas era para ter linhas de transmissão, de Almeirim com Cachoeira Porteira. Já que a linha de qualquer forma, porque Cachoeira Porteira se encon- transmissão de 190 km de Manaus até Balbina está tra numa das possíveis rotas. As linhas de Balbina previsto a um custo de US$ 33 milhões (A Crítica, 11 também fazem parte deste trajeto. Um estudo feito de junho de 1985), o custo de US$ 174 mil por qui- pela ELETRONORTE por volta de 1976 estimou lômetro implica num custo de US$ 90 milhões para que o custo de construir uma linha de transmissão ligar Cachoeira Porteira com Almeirim. Incluindo os A Hidrelétrica de Balbina: 113 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia US$ 300 milhões para cruzar o rio Amazonas, este As tarifas energéticas no Brasil são, em média, valor aumentaria para mais ou menos a metade dos muito abaixo do custo de produção de eletricidade. US$ 750 milhões gastos em Balbina. O chefe do de- Isto desencoraja a conservação de energia e fornece partamento de planejamento da ELETRONORTE grandes subsídios às indústrias com consumo inten- citava estimativas mais baixos de custo: US$ 60- sivo de energia, tais como a produtoras de alumí- 100 milhões para a travessia do rio Amazonas em nio. A produção de alumínio na área do Programa Almeirim, e US$ 700 milhões para o sistema inteiro Grande Carajás é especialmente favorecida, já que a para ligar Manaus com Tucuruí (Frank Tadeu Ávila, ELETRONORTE concordou em fornecer energia declaração pública, 1988). Vale a pena ressaltar que para as usinas a uma tarifa ligada ao preço interna- US$ 700 milhões também era o custo esperado da cional de alumínio, ao invés do custo de produzir a Hidrelétrica de Cachoeira Porteira, que, por sua vez, energia: para a usina de ALUNORTE/ALBRÁS também podia ser dispensada se Manaus fosse liga- em Barcarena, Pará (que pertencia a um consórcio da à Tucuruí. A ELETRONORTE só ia considerar de 33 firmas japonesas junto com a Companhia Vale ligar Manaus à Tucuruí e às outras barragens ao sul do Rio Doce, do Brasil), se cobrava apenas 10 mi- do rio Amazonas após a ano 2005 porque a área de lésimos de dólar norteamericano por quilowatt/hora Belém estava classificado como “deficiente” de ener- (US$ 10 mils/kWh), enquanto a energia transmitida gia (Frank Tadeu Ávila, declaração pública, 1988). em Tucuruí tinha um custo de geração estimado em A “deficiência” de Belém era resultado de toda a US$ 60 mils/kWh (Walderlino Teixeira de Carvalho, energia disponível ser comprometida para fazer alu- declaração pública, 1988). A tarifa cobrada às empre- mínio em Barcarena (Pará) e São Luis (Maranhão). sas de alumínio era cerca de um terço da tarifa paga Indiretamente, Balbina e Cachoeira Porteira se tor- pelos consumidores residênciais em todo país, e assim nam “necessários” por causa das concessões especiais era fortemente subsidiada pelo povo brasileiro através que foram dadas às empresas estrangeiras que estão dos seus impostos e contas de luz. ALBRÁS consu- beneficiando alumínio em outras partes da região. mia 1.673 GWh de eletricidade em 1986, ou 1,7 ve- Fazer alumínio também é questionavel como opção zes o consumo da cidade de Manaus no mesmo ano de desenvolvimento porque isto não cria quase ne- (Brasil, ELETRONORTE, 1987c, p. Amazonas-32, nhum emprego e porque poucos dos benefícios fi- Pará-12). Os planos de expansão na época iam mais nanceiros permanecem no País. que triplicar o consumo anual de ALBRÁS para 5.225 GWh até o final da década de 1980 (Brasil, b) Diminuição da Demanda de Energia ELETRONORTE, 1987c, p. Pará-19). Fornecer energia de fontes alternativas não é a O representante dos Estados Unidos no única maneira de substituir os 109,4 MW de po- Conselho de Diretores Executivos do Banco tência média que Balbina entregaria para Manaus. Mundial, que liderou uma tentativa fracassada de A conservação de energia poderia reduzir a necessi- evitar a aprovação do Empréstimo ao Setor Elétrico dade para uma fração substancial da energia usada. Brasileiro, em 1986, descreveu Balbina como um Com a exceção de medidas para desencorajar o uso exemplo de “investimentos totalmente inaceitáveis”, de gasolina, o Brasil tem feito pouco para promover tanto por conta de preocupações ambientais quanto a conservação de energia (ver Goldemberg, 1978). à falta de qualquer exigência de que o setor elétrico Eletrodomésticos e equipamentos industriais po- brasileiro aumente as suas tarifas o suficiente para deriam ser muito mais eficientes com modifica- cobrir os seus custos (Foster, 1986). Embora não ções já em uso em outros países (Goldemberg et al., seja uma condição dos seus empréstimos, o Banco 1985). Especialmente no caso de Manaus onde a Mundial tem encorajado o Brasil a aumentar as ta- energia é fornecida a partir de fontes de alto cus- rifas para dar ao monopólio elétrico uma rentabi- to tais como Balbina, eliminar usos ineficientes de lidade de no mínimo 6% (O Globo, 04 de fevereiro energia é um primeiro passo lógico (ver Branco, de 1988). A ELETRONORTE tem pouco mo- 1987). Mesmo sob condições médias nos países tivo para se transformar numa empresa altamente em desenvolvimento, ao invés do caso extremo de rentável porque o empreendimento está legalmente Balbina, investimentos em eficiência energética obrigado a dar quaisquer lucros acima de 10% ao são muito mais rentáveis em termos financeiros do Tesouro Nacional, como parte da Reserva Global de que investimentos em mais capacidade de geração Garantia (R.G.G.). Este limite a lucratividade tem (Goldemberg et al., 1985). sido sugerido como uma explicação para o fato que 114 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras os diretores da empresa têm frequentemente opta- meio ambiente, tais como, os esforços muito divul- dos por investimentos caros e ineficientes (Veja, 12 gados de resgatar a fauna que seria afogada pelas de agosto de 1987: 26). A ELETRONORTE corre águas na represa, é um assunto de intensa controvér- pouco risco de obter lucros em Balbina. sia. Mudar os animais para florestas fora da área de inundação, rende pouco benefício líquido em termos Implicações para a política de vidas salvas de animais: as populações de animais já presentes normalmente, concorrem com os recém- a) Balbina e a Política Científica chegados até que a densidade de cada espécie decli- A Balbina e outras hidrelétricas têm um forte ne rapidamente até aproximadamente os mesmos efeito, nem sempre benéfico, sobre a a ciência e a po- níveis de antes. A operação de resgate de fauna em lítica científica no Brasil. A disponibilidade de di- Balbina, conhecido como a “Operação Muiraquitã” nheiro e de emprego através da ELETRONORTE alocou 38 barcos novos com 45 motores de popa de e as firmas de consultoria associadas a ela têm dire- 45 HP (Walter de Andrade, comunicação pessoal, cionado muitas das pesquisas feitas na Amazônia, 1987). Trabalharam na operação 240 trabalhadores porque quase nenhuma verba pode ser obtida para durante nove meses--de outubro de 1987 a julho de apoiar pesquisa através dos canais tradicionais, tais 1988 (Sautchuk, 1988). Os pesquisadores do INPA, por sua vez, tinham que trabalhar alugando os equi- como, o Conselho Nacional de Desenvolvimento pamentos mal conservados dos pescadores locais. Científico e Tecnológico (CNPq) e os orçamentos das instituições de pesquisa e das universidades. O esforço da pesquisa por si mesmo é usa- do para fins de relações públicas. O papagaio Muito da pesquisa feita é a simples coleção de que explica Balbina, na revista em quadrinhos da exemplares, a confecção de listas e a preparação de ELETRONORTE, diz que “as condições ambien- relatórios. Pesquisas orientadas a testar hipóteses são tais serão rigorosamente controladas por pesquisas e praticamente inexistentes. As informações são cen- estudos constantes!” (Brasil, ELETRONORTE, s/d. tralizadas dentro da ELETRONORTE, a tal pon- (1987): 20). No caso de Tucuruí, durante um ato pú- to, que frequentemente é possível encontra pessoas blico em Belém contra o fechamento da barragem, tanto dentro e fora da ELETRONORTE que não folhetos foram lançados de helicóptero que avisavam dispõem das informações diretamente relevantes às aos leitores que as pesquisas do INPA, na área, garan- suas tarefas. Por exemplo, o engenheiro responsável tiam que não haveria nenhum problema ambiental pela mitigação dos impactos a jusante da barragem (Brasil, ELETRONORTE, s/d. (1984)). Nenhum não tinha nenhuma informação sobre a vazão dos aval tinha sido dado, nem pelo INPA e nem por diversos igarapés afluentes do rio Uatumã abaixo do quaisquer dos pesquisadores envolvidos no estudo. A barramento: o levantamento tinha sido feito por uma publicação dos resultados pelos pesquisadores estava das firmas consultoras e o relatório não estava dispo- sujeito à aprovação pela ELETRONORTE, de acor- nível em Balbina. A sede da ELETRONORTE em do com os termos do contrato de financiamento. É Balbina não tem uma biblioteca: mesmo os próprios essencial que tanto as pesquisas propriamente ditas engenheiros da ELETRONORTE somente podem quanto à sua disseminação subsequente seja realiza- consultar os relatórios das várias firmas consultoras da livre de interferência de qualquer fonte. Como e grupos de pesquisa através do encaminhamento os funcionários do INPA afirmaram: “a discussão de um requerimento escrito à matriz em Brasília. pública é um elemento essencial que tem faltado ao Muitos dos relatórios são até mais raros do que planejamento de Balbina” (Brasil, INPA, Núcleo de manuscritos medievais copiados a mão: apenas três Difusão Tecnológica, 1986). exemplares existem de um relatório sobre macrófi- tas em Tucuruí, segundo a secretária que serve como O programa de pesquisa em Balbina começou curadora do original no INPA. depois que a construção já estava em andamento, o que significa que o efeito máximo que os resultados O papel da pesquisa no planejamento, autoriza- poderiam ter era de sugerir pequenas modificações ção e execução de grandes projetos de engenheria, nos procedimentos, uma vez que a barragem já era tais como, hidrelétricas, é um assunto crítico se é um fato consumado (ver Fearnside, 1985). Relegar para evoluir procedimentos de tomada de decisão as pesquisas a um papel meramente simbólico é uma que evitam futuras desventuras. O foco de relações tradição infeliz no planejamento de desenvolvimen- públicas de muitos das atividades relacionadas ao to na Amazônia (Fearnside, 1987). A Hidrelétrica de Balbina: 115 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia O fato de que pesquisas estavam sendo feitas de eliminar o desvio--para esforços de relações na área foi usado extensivamente em propaganda públicas--do dinheiro destinado à proteção am- da ELETRONORTE na televisão, rádio e meios biental e à pesquisa. impressos de comunicação. A implicação era de que a Hidrelétrica de Balbina seria benéfica ao meio am- O mandato do órgão que distribui as verbas biente: uma conclusão contrária daquela formulada precisa ser suficientemente amplo para que sejam por qualquer pesquisador envolvido nos estudos. consideradas alternativas aos projetos propostos. Num anúncio veiculado pelas emissoras de rádio Por exemplo, ao avaliar a racionalidade de construir em Manaus, a cada 15 minutos, em agosto de 1987, Balbina, seria preciso examinar alternativas, tais a voz de Curupira (o espírito da floresta) garantiu como, petróleo, gás, linhas de transmissão até outras aos ouvintes que ele não permitiria a existência de hidrelétricas, conservação de energia, e a simples Balbina se a barragem não fosse benéfica para uma não produção de energia. extensa lista de espécies de peixes e outras formas de A utilização dos resultados de pesquisa na ela- vida silvestre. Numa propaganda na televisão, uma boração do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) mulher troglodita era batida na cabeça com um osso e Relatório sobre o Impacto ao Meio Ambiente enorme, numa representação de como, sem Balbina, (RIMA), que são obrigatórios para cada projeto hi- Manaus reverteria aos tempos neolíticos. Muitas drelétrico, carece de mecanismos para garantir que das propagandas em todos os meios de comunica- as recomendações refletem as conclusões dos pes- ção levaram à afirmação explícita de que “quem não quisadores que conduzem os estudos. Atualmente a está a favor de Balbina está contra você” (e.g., Brasil, maior parte dos dados é coletada por instituições de ELETRONORTE, 1987a). pesquisa (tais como o INPA) e entregue para em- Apesar dos problemas das pesquisas atuais fi- presas privadas de consultaria que são contratadas nanciadas através dos projetos hidrelétricos, este pela ELETRONORTE para escrever os relató- dinheiro é essencial para aumentar a base dos rios. Estas empresas são totalmente dependentes da conhecimentos sobre a região. Precisa-se desen- ELETRONORTE e outros grandes patrões para a volver mecanismos para manter o fluxo de verbas sua sobrevivência, e assim estão sujeitos a uma ten- e ao mesmo tempo eliminar os impedimentos ao dência para minimizar as suas críticas de perigos livre intercâmbio de informações e à chegada a ambientais. A Resolução Número 001 do Conselho conclusões que possam ser heresias do ponto de Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), que ini- vista da ELETRONORTE. Uma solução seria ciou a exigência do EIA-RIMA em 23 de janeiro de ter um percentual das verbas alocadas à cons- de 1986, especifica que estes relatórios sejam prepa- trução das barragens e outras formas de geração rados por uma “equipe multidisciplinar qualificada de energia ir para um fundo independente, que que não seja dependente, direta ou indiretamente, então distribuiria o dinheiro para instituições e do proponente do projeto”. Mecanismos para ga- laboratórios de pesquisa em base de uma com- rantir esta independência precisam ser criados. petição, possivelmente com algum dispositivo b) Avaliação dos Impactos ao Meio Ambiente para dar prioridade às instituições localizadas na Amazônia. É necessário um mecanismo para A história de Balbina deixa claro o imperativo garantir que os pesquisadores e instituições que de se fazer um verdadeiro estudo de impacto am- recebem financiamento não sejam encorajados a biental completo e publicamente discutido, antes entregar resultados favoráveis para garantir a con- de quaisquer ações que tornariam um projeto num tinuidade do envio das verbas para as suas pesqui- fato consumado, real ou imaginado. A maneira com sas tanto no projeto de desenvolvimento em jogo, que os estudos de impacto ao meio ambiente têm quanto em projetos futuros. Ao mesmo tempo, sido feitos em Balbina favorece o uso altamente se- aqueles que recebem verbas precisam satisfazer letivo e enganador dos resultados. A responsabili- exigências apropriadas quanto à entrega de rela- dade final para as análises ambientais ficou com a tórios para que padrões mínimos de quantidade e ELETRONORTE--o mesmo órgão que é respon- qualidade de trabalho científico sejam atingidos. sável pela promoção de energia elétrica. As firmas Um fundo independente encorajaria melhor dese- comerciais de consultoria que são contratadas para nho científico (o plano científico de um projeto de elaborar os relatórios, contratam os serviços de ins- pesquisa) e o uso mais eficiente das verbas, além tituições para coletar os dados crus; a interpretação 116 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras destes dados para chegar a quaisquer conclusões (01 de outubro de 1987) em que a última adufa foi mais amplas sobre racionalidade do projeto como fechada para bloquear o rio Uatumã. O preceden- um todo não é encorajado. Os dados de cada um dos te de fazer do processo de avaliação ambiental uma subprojetos são entregues separadamente e qualquer mera formalidade simbólica é, talvez, o impacto de visão global só é atingida no Rio de Janeiro ou em maior alcance deste projeto altamente questionável. Brasília ao invés de acontecer nas instituições dire- tamente envolvidas na coleta dos dados. Os dados c) Balbina e o Banco Mundial de outros subprojetos são liberados em quantidades pequenas na base da opinião da ELETRONORTE Verbas para a construção de Balbina foram soli- sobre a necessidade para o requerente saber dessas citadas do Banco Mundial, mas foram negadas com informações. Mesmo a publicação dos resultados base nos impactos ambientais. Mais tarde, o Brasil obteve um “empréstimo setorial” para aumentar a dos subprojetos individuais exigia a aprovação da capacidade de geração de energia em todo o País, ELETRONORTE. O sigilo em toda parte do pro- assim evitando a revisão pelo Banco dos aspectos jeto tem impedido bastante qualquer planejamento ambientais de cada projeto. Brechas deste tipo te- ou tomada de decisão bem informada. rão que ser evitadas para que o Departamento do O ímpeto da construção da obra conseguiu es- Ambiente, no Banco Mundial, criado em 1987, seja magar o processo de avaliação ambiental, que ainda capaz de impedir que futuras Balbinas recebam as era embrionário no Brasil. Balbina teve uma for- verbas canalizadas através desta agência. te oposição do Paulo Nogueira Neto, que dirigiu Representantes do Banco Mundial dizem que a Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA) as turbinas e outros equipamentos para Balbina já de 1974 até 1986. Ao sair do cargo (por razões tinham sido comprados antes do empréstimo ser não relacionadas a Balbina), ele fez uma declara- efetuado em meados de 1986 e portanto nenhum ção sobre a barragem: “prevê-se ali o maior desas- dinheiro do Banco foi usado diretamente para esta tre ecológico jamais provocado por uma represa” finalidade (Maritta Koch-Weser, comunicação pes- (Veja, 16 de julho de 1986: 91). O seu sucessor soal, 1988). As turbinas chegaram a Manaus de- também se opusera à Balbina, porém, começan- pois dessa data, porém não se tem confirmação de do em 1986, a autoridade sobre o monitoramen- quando foi realizado o pagamento. No mínimo, a to e licenciamento foi progressivamente passada injeção de verbas no setor elétrico liberou recursos da SEMA (desde janeiro de 1989 substituída pelo financeiros do governo brasileiro que, na ausência do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos empréstimo, teriam sido gastos em projetos de prio- Naturais Renováveis--IBAMA) para as reparti- ridade mais nobres. É difícil avaliar até que ponto ções dos governos estaduais. No caso do Estado do este efeito indireto acelerou a construção de Balbina. Amazonas, esta era o Centro de Desenvolvimento, Balbina foi, durante muito tempo, um projeto mar- Pesquisa e Tecnologia do Estado do Amazonas ginal no orçamento federal brasileiro: em junho (CODEAMA) (substituído desde junho de 1989 de 1985, Balbina estava na iminência de ser inter- pelo Instituto de Desenvolvimento dos Recursos rompida devido a cortes orçamentais que seguiam Naturais e Proteção Ambiental do Amazonas— um acordo com o Fundo Monetário Internacional IPAAM). A Hidrelétrica de Balbina foi dispensada (FMI) sobre a dívida externa brasileira, e somente do EIA-RIMA por estar sob construção antes da apelos urgentes ao então Presidente José Sarney resolução de 23 de janeiro de 1986, que tornou esse feitos pelo governador e outros representantes do relatório obrigatório para todos os grandes projetos Estado do Amazonas permitiram que o projeto não do desenvolvimento. Mesmo assim foi necessária a fosse paralisado (Jornal do Comércio, 11 de junho de obtenção da Licença para entrada em operação, da 1985; A Crítica, 12 de junho de 1985). Verbas limi- CODEAMA. A diretora do CODEAMA, Lídia tadas adiaram o projeto várias vezes: os planos visa- Loureiro da Cruz, foi, repentinamente, substituída vam o começo de construção em 1979 e da geração apenas nove dias antes do licenciamento da bar- de energia em 1983, porém as obras só começaram ragem (Melchiades Filho, 1987). Ela não apoiava em 1981. Em 16 de abril de 1988, com o processo Balbina e tinha elogiado, nos jornais locais, uma sé- de enchimento já em andamento, foi anunciado que rie de debates em que a ELETRONORTE foi du- o começo de geração de energia poderia ser adiado ramente criticada (A Crítica, 27 de agosto de 1987). além da data oficial, isto é, outubro de 1988, porque A licença de operação foi aprovada no mesmo dia US$ 85 milhões, do orçamento, ainda não haviam A Hidrelétrica de Balbina: 117 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia sido liberados e equipamentos vitais não haviam Balbina levanta a questão de até que ponto o de- sido entregues, inclusive painéis elétricos, cabos, e senvolvimento na Amazônia deve ser subsidiado pelo o sistema de refrigeração para as turbinas (A Crítica, resto do País. A política no Brasil de tarifa “unificada” 16 de abril de 1988). Não se sabe se alguma parte para a eletricidade significa que a indústria e a popu- destes equipamentos precisava ser importada. lação podem se localizar aonde eles bem quiserem e a Se nenhum dinheiro do Banco Mundial foi empresa estatal que fornece energia é, então, obriga- gasto diretamente em Balbina, então isto foi evi- da a tomar medidas heróicas para fornecer energia a elas. Energia em locais não favoráveis, como Manaus, tado puramente ao acaso e não devido a qualquer é subsidiada por consumidores que moram perto a controle que as políticas ambientais do Banco po- locais favoráveis, como Itaipú. deriam ter tido sobre como e onde foi gasto o di- nheiro. Já que estas verbas vêm de contribuintes de Caso a energia fosse vendida a tarifas que refle- impostos nos países que apóiam o orçamento do tissem o seu custo de geração, os centros industriais Banco, a políticas ambientais dos países fontes do iriam se mudar para ficar mais próximo aos locais dinheiro também afetam potencialmente a maneira com maior potencial hidrelétrico, assim aumentan- como as verbas são aplicadas. As contribuições ao do significativamente a quantidade total de emprego orçamento são aproximadamente proporcionais ao urbano. Porque o monopólio elétrico brasileiro co- número de ações que cada país possui no Banco: os bra uma tarifa fixa para eletricidade no País inteiro, E.U.A. têm 20%, o Reino Unido, República Federal consumidores em Manaus estão sendo subsidiados de Alemanha, França e Japão juntos têm 25%, e os por consumidores do Centro-Sul. O subsídio é se- outros 146 países membros têm os 55% restantes. melhante àquele que consumidores no Centro-Sul dão aos transportes na Amazônia: cobra-se o mes- d) Prioridades Nacionais para o mo preço pela gasolina no porto de Santos que se Desenvolvimento cobra nos cantos mais afastados da Amazônia. A economia nacional pode tolerar subsídios deste tipo Esquecendo por um momento as conside- desde que a população da Amazônia permaneça re- rações políticas e outras de natureza não técnica lativamente insignificante (cerca de 10% da popu- que entraram nas decisões de iniciar e continuar lação total do Brasil em 1987). Estes subsídios se a construção de Balbina, o projeto representa um tornarão cada vez mais inviáveis se o equilíbrio da dilema comum no planejamento de desenvolvi- população mudar, como vai acontecer se o fluxo de mento: a escolha entre responder ao aumento de migração para Amazônia continuar. A hora pode já população, através de uma série de respostas cui- ter chegado para questionar se um grande centro in- dadosamente crescentes, versus grandes pulos em dustrial e populacional como Manaus deve ser enco- antecipação de crescimento futuro. Em favor das rajado a continuar crescendo com base em subsídios respostas gradativas está a tendência do crescimen- de fora. Entre 1970 e 1980 Manaus cresceu numa to maciço se tornar uma profecia auto-realizada se taxa anual de 7,1%, enquanto a população brasileira a infra-estrutura estiver construída para atender a como um todo foi de 2,4% no mesmo período. A demanda antes que esta exista. A população seria população de Manaus chegou a aproximadamente atraída a Manaus até que o recurso limitante (neste 1,3 milhões em 1987. caso, emprego industrial) seja novamente carente. Se a eletricidade fosse vendida a uma tarifa No caso de Manaus, os fatores que favoreceriam que refletisse o seu custo de geração, as pessoas e a construção de uma obra maior em antecipação as indústrias provavelmente sairiam de Manaus, eli- da demanda eram a eficiência extraordinariamente minando assim a necessidade de maior capacidade baixa e os altos custos ambientais de Balbina como de geração ou mais linhas de transmissão. Os me- solução interina: optando por Balbina, não apenas canismos para induzir a população a se mudar de seriam arcados todos os custos e impactos deste um lugar para outro precisam ser cuidadosamente projeto, mas também linhas de transmissão até bar- pensados e as políticas tarifárias estabelecidas de ragens mais distantes e mais potentes teriam que acordo com isto. Caso fosse assim decidido, as ta- ser construídas de qualquer forma. A existência de rifas industriais podiam ser ligadas estritamente aos Balbina apenas diminui a viabilidade econômica de custos de geração, enquanto as tarifas residenciais aproveitar mais cedo estes locais topograficamente continuariam a receber subsídios parciais ou inte- mais apropriados para hidrelétricas. grais. As tarifas baseadas em custo de geração não 118 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras implicariam em que os pobres tivessem que usar a para construir Balbina contribuíam à crise da dívida luz de velas: tabelas progressivas de tarifas poderiam externa. A inflação resulta de gastos para projetos facilmente ser elaboradas para fornecer uma quanti- que produzem pouco retorno. O dinheiro é coloca- dade modesta de energia a um preço baixo, seguido do nos bolsos das pessoas que trabalharam na barra- por aumentos cada vez maiores para consumidores gem ou que fornecerem bens e serviços àqueles que maiores. Manaus ilustra o extremo de crescimento trabalharam na barragem, porém o projeto produz subsidiado. pouco para estes consumidores comprarem no mer- A energia de Balbina beneficiará, em grande cado. Os preços sobem quando aumenta a demanda parte, as empresas internacionais que estabeleceram enquanto a oferta permanece a mesma. O peso da fábricas na Zona Franca de Manaus. O fato de a perda de poder aquisitivo devido à inflação é com- energia ser subsidiada para estas firmas a custa dos partilhado por todos os brasileiros consumidores residenciais em todo o País causa uma e) Projetos “Irreversíveis” versus. irritação a muitos brasileiros. A Superintendência Planejamento Racional da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA) foi es- tabelecida em 1967 para compensar a Amazônia O dogma de que Balbina era “irreversível”, repe- Ocidental pela concentração dos investimen- tida constantemente desde seu início, se tornou tão tos da Superintendência do Desenvolvimento poderoso que parecia natural que nenhum cálculo da Amazônia (SUDAM) na Amazônia Oriental de custo e benefício tenha sido feito em qualquer (Mahar, 1976: 360). Os custos financeiros e am- hora desde o lançamento do projeto. Mudanças bientais são altos quando decisões políticas levam a durante a década que durou a fase de construção localização de centros industriais em lugares onde incluiram preços mais baixos de petróleo, descober- a geração de energia é difícil. Todas as consequên- ta de grandes quantidades de petróleo e gás natu- cias de sustentar indústrias e população precisam ser ral perto a Manaus, conclusão da Hidrelétrica de consideradas, antes de tomar as decisões iniciais. Tucuruí e o planejamento de outras grandes bar- A decisão de conceder a isenção de impostos a ragens ao sul do rio Amazonas, início das prepara- Manaus significa que o resto do Brasil subsidia a ções para a Hidrelétrica de Cachoeira Porteira no cidade não apenas por deixar de lado qualquer re- rio Trombetas (500 km a leste de Manaus), avanços ceita dos impostos que poderiam ser cobrados sobre significativos na tecnologia para transmissão à longa mercadorias importadas, mas também por encorajar distância de energia elétrica, crescimento da popula- o uso de energia subsidiada, pelas fábricas que mon- ção de Manaus em mais de 100%, o descobrimento tam produtos a partir de componentes importados. de equívocos grosseiros no estudo de viabilidade que Mesmo alto como é o custo de vida em Manaus, subestimava a área do reservatório, e elevação dos a energia subsidiada que a cidade recebe encoraja a custos de construção a mais do dobro do preço esti- migração, por permitir que os residentes desfrutem mado inicialmente. de um padrão de vida que não poderiam alcançar de As declarações da ELETRONORTE ao longo outra forma com salários brasileiros. da controvérsia prolongada sobre Balbina são qua- A localização de Manaus também é ineficiente se idênticas às do governo dos Estados Unidos du- como centro de distribuição das mercadorias produ- rante a guerra do Vietnã. Os mesmos argumentos zidas. Na época da construção de Balbina, cada ano eram usados, isto é, que o caos seria instaurado se milhares de pessoas do Centro-Sul brasileiro faziam o esforço fosse abandonado; pessoas que criticam o numa viagem de aproximadamente 6.000 km ida e projeto são inimigas do povo e provavelmente ví- volta para passar férias em Manaus (ou a serviço ofi- timas de subversão estrangeira; e que já se dedicou cial, frequentemente sem uma finalidade específica) tanto esforço ao projeto que não se pode abando- para poder comprar, a preços livres de impostos pro- ná-lo independente das perspectivas do ponto de dutos, tais como gravadores de videocassete. A ine- vista de retornos sobre investimentos futuros. Não ficiência energética deste mecanismo de distribuir as só as declarações públicas da ELETRONORTE mercadorias dificilmente poderia ser maior. eram as mesmas que as racionalizações oficiais da época de Vietnã, mas também eram os mesmos A ineficiência de localizar indústrias num lugar motivos subjacentes para a continuação do esforço onde a geração de energia é cara contribui à inflação muito depois que a sua loucura se tornou aparen- crônica do País, assim como os empréstimos obtidos te para a maioria de observadores desinteressados. A Hidrelétrica de Balbina: 119 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia Devido ao custo que significaria às suas carreiras e estaria livre dos custos de manutenção desta barra- ao seu orgulho pessoal, políticos e funcionários do gem altamente problemática governo que tinham promovido o projeto não po- diam alterar as suas posições para servir o interes- Depois que as comportas foram fechadas, a pró- se público. Como o então presidente norte-ame- xima solução teria sido de parar o enchimento em ricano Lyndon Johnson frisou com referência ao qualquer nível entre 37 m e o nível de 46 m necessá- Vietnã, a ELETRONORTE não pode “ir embora rio para produzir energia. Já que isto não foi feito, a como um cachorro com o rabo entre as pernas”. próxima solução teria sido a paralisação permanente Soluções que foram propostas durante a época do do enchimento na cota de 46 m, assim produzindo Vietnã se aplicavam aqui, tais como, a de reduzir uma quantidade simbólica de energia mas salvando o projeto a um nível figurativo, para abandoná-lo os últimos 800 km 2 de floresta e liberando alguns dos depois que passasse um “intervalo decente”. geradores e turbinas para uso em outros lugares. Se Balbina fosse deixada com apenas duas turbinas na O reservatório poderia ter sido deixado vazio, cota de 46 m, teria 100 MW de potência instalada. mas, com o fechamento da última adufa, a próxi- Encher o reservatório até a cota de 50 m e instalar as ma solução teria sido de encher a represa apenas outras três turbinas acrescentaria apenas 0,19 MW até a cota de 37 m (o nível do vertedouro aberto), de capacidade nominal por km2 de floresta sacrifica- assim produzindo um lago de 370 km2 (Brasil, da. Este ganho é pouco em comparação com 1,56 ELETRONORTE, 1981), mais nada de eletricida- MW/km2 em Cachoeira Porteira ou 3,29 MW/km2 de. O processo de represamento das águas poderia em Tucuruí. Se três dos geradores e turbinas fossem ter sido interrompido antes do nível da água che- transferidos para uma outra hidrelétrica, a economia gar ao vertedouro se permitissem que o rio passasse de aproximadamente US$ 70 milhões poderia ser através das aberturas na base da barragem que ti- mais bem aplicada à construção de outras barragens. nham sido deixadas para a instalação das turbinas. No entanto, depois de 16 meses de enchimento, a op- O reservatório chegou ao nível do vertedouro ção de deixar a represa apenas parcialmente ocupada (37 m) em fevereiro de 1988. Parar o enchimento foi deixada de lado para sempre. neste ponto teria significado a inundação de apenas Depois de encher até a cota de 50,0 m, a um sexto da floresta na represa toda e teria permitido ELETRONORTE continuou a encher o reservató- que a qualidade da água melhorasse antes de se con- rio além deste “nível d’água máximo normal”, presu- siderar qualquer enchimento a mais. Deixando-se mivelmente visando armazenar o máximo possível neste nível, equipamentos eletromecânicos no valor de água para uso posterior na geração de energia. de US$ 120 milhões poderiam ser liberados para uso O nível da água chegou em 50,6 m em 12 de feve- em outra barragem qualquer. Os US$ 33 milhões da reiro de 1989, quando as comportas foram parcial- linha de transmissão também não teriam sido perdi- mente abertas (A Crítica, 13 de fevereiro de 1989). dos, já que a mesma linha seria usada para energia de Já que isto ocorreu no início da época das chuvas Cachoeira Porteira. Os aproximadamente US$ 610 mais fortes na região, o nível da água continuou a milhões gastos para o resto da construção em Balbina subir. No início de março a cota de 51 m foi atingi- não seriam “perdidos” pelo abandono do projeto, sen- da, e, com o reservatório faltando menos de um me- do que a maior parte deste dinheiro já estava perdido tro para transbordar (o nível máximo maximorum de qualquer forma. No máximo seria perdida a con- é de 51,17 m), a continuação das chuvas obrigou a tribuição média de 109,4 MW por ano para Manaus ELETRONORTE a abrir as comportas completa- durante o período de sete anos antes da Hidrelétrica mente. Em conseqência disto, o nível do rio entre de Cachoeira Porteira começar a funcionar. Isto cor- Balbina e Cachoeira Morena subiu vários metros responde a 6.992 GWh. Sendo que a energia termoe- acima do seu máximo normal, assim inundando as létrica rende 3 kWh/litro de óleo, cada barril de 159 casas e muitas das roças dos residentes ao longo do litros produz 477 kWh (Brasil, ELETRONORTE/ rio, assim como os poços que a ELETRONORTE MONASA/ENGE-RIO, 1976: B-53); no preço em tinha cavado para eles (Bermudes et al., 1989). 1989 de US$20/barril, a energia perdida valeria US$ Nesta época do ano, as águas da enchente do rio 293 milhões. Se este valor for o preço da lição de Amazonas impedem a saída de água através do baixo Balbina, ele deveria ser considerado uma pechincha. Uatumã (o ciclo anual de enchente e vazante do rio O País não apenas ganharia a lição, mas também Amazonas afeta o nível do Uatumã até a Cachoeira ganharia muito da floresta na área de inundação e Morena). A água liberada da barragem, nesta época 120 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras do ano, portanto, resulta numa maior subida do nível usada pelo ELETRONORTE cada vez que divul- de água no rio do que seria o caso com ao mesmo gou a área a ser inundada por Balbina, inclusive na volume de água liberada em outra época revista em quadrinhos amplamente distribuída em Além da água liberada pelo vertedouro, a água Manaus (Brasil, ELETRONORTE s/d. (1987)). também estava entrando no rio através das turbinas. Quando o nível da água chegou na cota de 46 m Esta água não contém praticamente nenhum oxigê- em 15 de julho de 1988, o processo de enchimento nio porque as tomadas de água para as turbinas es- não parou um segundo sequer, e continuou discre- tão localizadas justamente no fundo da barragem. A tamente rumo o nível cheio de 50 m (e até mais que mortandade de peixes foi observada abaixo da bar- isso). Declarações de que decisões controvertidas ragem até a foz do rio Jatapú (145 km a jusante) e serão tomadas mais tarde não podem ser interpre- os peixes desapareceram do rio (possivelmente fugi- tadas a significar que os planos em questão serão ram da água fétida de Balbina) num trecho adicional abandonados, ou mesmo que eles serão adiados na até a cidade de São Sebastião do Uatumã (mais que dependência de uma avaliação ambiental mais com- 200 km abaixo de Balbina). A frota de barcos pes- pleta. Os planos para a Hidrelétrica de Babaquara queiros normalmente baseada em São Sebastião de (Altamira), que inundaria uma área de 6.140 km 2 Uatumã foi para outros lugares. O governo estadual habitada por várias tribos indígenas no rio Xingu do Amazonas fez, em caráter emergencial, uma doa- (Santos & de Andrade, 1988), foram descritos pela ção de pescado para alimentar a população da cidade. ELETRONORTE como apenas “adiados”. Os moradores ao longo do rio a jusante de O maior benefício de Balbina pode ser a lição Balbina não só perderam a sua fonte principal de que ela ensina sobre como não deve ser feita a po- proteína: eles também descobriram que a água de lítica pública. Se esta lição fosse bem aprendida, Uatumã não pode ser bebida e que causa coceira muitas desventuras poderiam, sem dúvida, ser evi- intensa e lesões na pele quando usada para banho. tadas no processo de decisão de quantas barragens Os residentes a jusante de Balbina tentaram acionar devem ser construídas da lista de 80 hidrelétricas a ELETRONORTE (A Notícia, 11 de março de da ELETRONORTE. Estas lições não podem ser 1989) baseado na cláusula da Licença de Operação consideradas como já aprendidas. Repetidamente, que reza: “Caso venham a existir reclamações pro- grandes projetos de desenvolvimento na Amazônia cedentes da população vizinha em relação a proble- têm sido propostos com o reconhecimento explíci- mas ambientais causados pela Empresa em questão, to dos fracassos anteriores, após o que os mesmos esta deverá tomar medidas saneadores no sentido erros são repetidos. Exemplos incluem o projeto do solucioná-las em caráter de urgência” (Brasil, POLONOROESTE, que reconheceu os proble- CODEAMA, 1987: 2). mas da colonização na rodovia Transamazônica (Fearnside, 1986b), o Programa Grande Carajás, que O exemplo de Balbina serve como um alerta reconheceu a devastação ambiental e social causada que garantias muito mais fortes são necessárias para pelas fazendas financiadas pela SUDAM (Fearnside, cancelar, em definitivo, projetos danosos ao meio 1986a), e o programa de asfaltamento rodoviário ambiente, ao invés destes serem meramente adiados. no Acre financiado pelo Banco Interamericano de A ELETRONORTE começou o enchimento de Desenvolvimento, que reconheceu os efeitos desas- Balbina com promessas de interrompê-lo quando o trosos do projeto POLONOROESTE do Banco nível de água chegasse a 46 m acima do nível do mar Mundial, em Rondônia (Fearnside, 1987b). Mário (parar o enchimento na cota 46 para operar neste Penning Bhering, presidente da ELETROBRÁS, nível durante uma “primeira etapa” foi o plano oficial reconhecia a Balbina como um “mau projeto” desde 1986: declaração de Miguel Rodrigues Nunes, (Adam, 1988: 34). Miguel Rodrigues Nunes, presi- presidente da ELETRONORTE citado por Lopes, dente da ELETRONORTE, também admitiu que 1986). O reservatório seria mantido neste nível du- Balbina é um “pecado” (A Crítica, 19 de março de rante vários anos para permitir que a qualidade da 1989). É bom lembrar, no entanto, que em julho água fosse estabilizar, após o que uma decisão sepa- de 1986 o mesmo dirigente da ELETRONORTE rada seria tomada sobre a realização do resto do pro- já tinha reconhecido que iniciar a construção de cesso de enchimento até a cota de 50 m. Durante os Balbina foi um erro que não seria repetido nova- meses anteriores ao fechamento da barragem, a cifra mente (Lopes, 1986). Se a obra tivesse sido susta- de 1.580 km2 (que corresponde à cota de 46 m) foi da em julho de 1986, seriam poupados pelo menos A Hidrelétrica de Balbina: 121 O Faraonismo Irreversível versus o Meio Ambiente na Amazônia US$ 250 milhões em despesas na construção, além um grupo forte de interesse promovendo o proje- de evitar os impactos ambientais e humanos. Em to, independente da razão entre custos e benefícios julho de 1986, a ELETRONORTE tinha inves- do ponto de vista da sociedade como um todo. O tido apenas US$ 500 milhões, segundo seu presi- desenvolvimento na Amazônia frequentemente dente (Lopes, 1986). Mesmo em dezembro de toma a forma de “obras faraônicas” deste tipo que 1987 (após o fechamento de Balbina), quando foi (assim como as pirâmides do antigo Egito) absor- publicado o Plano 2010, ainda faltava gastar US$ vem os recursos da sociedade inteira para produzir 155 milhões em Balbina (Brasil, ELETROBRÁS, pouco benefício para a população do País. Balbina 1987: 173). Amazonino Mendes, então governador demonstra a urgência de fortificar os procedimen- de Amazonas, chegou a dizer que o Estado foi “bur- tos de revisão ambiental de projetos de desenvol- lado”, já que a produção de energia seria menor do vimento tanto dentro do Brasil, como nas agências que a propaganda de ELETRONORTE indicava internacionais de financiamento que contribuíram (A Crítica, 22 de dezembro de 1987), e que Balbina ao projeto. Balbina poderia ter sido sustada com lu- é um “erro irreparável” (A Crítica, 12 de fevereiro de cro, em qualquer hora durante o processo de enchi- 1989). O fato que a Balbina foi terminada, apesar mento. Sob nenhum pretexto deve-se permitir que dos seus grandes custos e minguados benefícios te- a ELETRONORTE possa reativar os seus planos rem sido reconhecidos, deixa claro que não basta para desvio do rio Alalaú. Balbina fica como um apenas reconhecer que a Balbina foi um erro e dizer monumento cujo benefício maior será as lições so- que isto não se repetirá no plano 2010: precisa-se de bre como a tomada de decisões não deve ser feita. mudanças estruturais. Balbina é uma pirâmide à loucura. Apesar de necessitar de grandes mudanças, o Brasil já fez muitos avanços na proteção dos seus AGRADECIMENTOS ecossistemas naturais e a incorporação de fatores ambientais nos procedimentos para desenvolvimen- Agradeço ao Miguel Rodrigues Nunes, presi- to. Na ocasião do Congresso de Estocolmo sobre dente da ELETRONORTE, pela permissão de visi- o Meio Ambiente em 1972, o Brasil foi classifica- tar Balbina, e os funcionários da ELETRONORTE do como o “vilão de Estocolmo” pelo seu papel na pela sua paciência em responder às perguntas sobre liderança dos países em desenvolvimento para con- o projeto. Niwton Leal Filho, do Departamento de denar qualquer sugestão de que estas nações deve- Ecologia do INPA, me acompanhou em Balbina riam proteger o seu próprio meio ambiente (Sanders, (8-12 de setembro de 1987). Agradeço às muitas 1973). Hoje o Brasil tem um Instituto Brasileiro do pessoas que discutiram o projeto comigo no INPA, Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis na Universidade do Amazonas, no Banco Mundial (IBAMA), um sistema de parques nacionais, e uma e nas várias firmas de consultoria, assim como os lei que exige um Relatório sobre o Impacto ao Meio- residentes nas margens do rio Uatumã. Antonio Ambiente (RIMA) antes da aprovação de qualquer Donato Nobre, Fernando José Alves Rodrigues, grande projeto de desenvolvimento. Os avanços le- Muriel Saragoussi, Neusa Hamada, Niwton Leal gais e institucionais na proteção do ambiente têm que Filho, Paulo Maurício Lima de Alencastro Graça, ser fortalecidos pela formação de um corpo de pessoas e Summer Wilson fizeram comentários no manus- qualificadas para executá-los, e pela efetiva inserção crito. Summer Wilson desenhou as figuras. Uma de uma tradição de consideração séria do ambiente versão mais curta em inglês foi publicada (Fearnside, no planejamento de desenvolvimento, especialmente 1989). Esta versão é atualizada de Fearnside (1990). nas fases iniciais da formulação dos projetos antes que eles se tornem fatos consumados “irreversíveis”. NOTAS CONCLUSÕES 1 Afiliações dos indivíduos citados no texto: Frank Tadeu Ávila, chefe do departamento de pla- Balbina é indefensável em bases técnicas por nejamento, ELETRONORTE, Brasília; Walter causa dos seus altos custos ambientais, humanos e de Andrade, chefe da “Operação Muiraquitã” (sal- financeiros, e de seu reduzido potencial para produ- vamento da fauna), ELETRONORTE, Balbina; ção de energia. Os muitos beneficiários das verbas Jaime de Araújo, Presidente, Conselho Nacional públicas gastas na construção da barragem formam dos Seringueiros, Manaus; Joaquim Pimenta de 122 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Arruda, Engenheiro, ENGE-RIO, Rio de Janeiro; Athias, R. & R. Bessa. 1980. “Waimiri-Atroari, os ‘mais ferozes Walderlino Teixeira de Carvalho, Presidente, do mundo’ fortalecem confederação”. Porantim (Manaus) Coordenadoria Nacional de Geólogos, Belém; José janeiro-fevereiro de 1980, p. 3. A.S. 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Manaus - Am, Brasil Gleicy02geog@bol.com.br 2 Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). - CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil. {Paulo Maurício} pmlag@inpa.gov.br {Philip} pmfearn@inpa.gov.br. Publicação original: Feitosa, G.S., P.M.L.A. Graça & P.M. Fearnside. 2007. Estimativa da zona de deplecionamento da hidrelétrica de Balbina por técnica de sensoriamento remoto pp. 6713 – 6720 In: J.C.N. Epiphanio, L.S. Galvão & L.M.G. Fonseca (eds.) Anais XIII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, Florianópolis, Brasil 21-26 abril 2007. Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), São José dos Campos-São Paulo. 128 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO somente nos primeiros anos depois da formação de um reservatório. Barragens são fontes permanentes de gases de efeito estufa, incluindo o metano (CH4). A produ- O presente trabalho analisa o caso particular da ção e a emissão deste gás ocorre devido à flutuação hidrelétrica de Balbina, cujo recrescimento de vege- do nível de água. Quando é alcançado o nível míni- tação na zona de deplecionamento do seu reserva- mo, uma grande área conhecida como a “zona de de- tório, a cada ano, remove o carbono da atmosfera plecionamento” é exposta, onde a vegetação herbácea pelo processo de fotossíntese, e depois o emite na cresce rapidamente. Essa vegetação se decompõe e forma de metano quando a vegetação é inundada. O emite metano, quando se eleva o nível do reservató- recrescimento vegetal na zona de deplecionamento rio. O objetivo deste estudo é estimar a extensão da deste reservatório tem semelhança ao que ocorre nas área de deplecionamento da hidrelétrica de Balbina várzeas, sendo que Graciani e Novo (2003) apontam no nível mínimo de 1997 e com o máximo de 2003. para a ocorrência de um regime artificial constante O resultado desta técnica é um mapa de deteção de de enchente e estiagem nos lagos de hidrelétricas, já mudança derivado do sensor Landsat-TM, produ- que o nível da água é controlado de acordo com as zindo uma representação temática da zona de deple- necessidades operacionais para a produção de hidro- cionamento de Balbina. eletricidade da usina. Palavras-chave: Balbina, sensoriamento remoto, Esta hidrelétrica é uma fonte potencial de gases detecção de mudança, Hidrelétrica de Balbina, de- de efeito estufa, pois suas emissões após três anos de plecionamento, sensoriamento remoto. operação ultrapassavam em 22,6 vezes do que seria emitido se utilizada a mesma quantidade de energia a partir de combustíveis fósseis (Fearnside, 2005). INTRODUÇÃO A estimativa da área de deplecionamento do re- Ao contrário do que comumente se pensa, a ge- servatório desta hidrelétrica pela técnica de detecção ração de energia por hidrelétricas não consiste em de mudança, permitiu mapear e quantificar esta área. uma fonte de energia limpa, e um dos seus mais Corresponde à subtração do nível mínimo, referente sérios problemas advém de sua alta capacidade de ao mês junho do ano de 1997, do nível máximo, no emissão de gás metano (CH ), um gás de efeito es- mês agosto do ano de 2003. As informações geradas 4 tufa (Bel Levy, 2005). neste estudo contribuirão na melhoria dos modelos utilizados também para estimativa das emissões de A potencialidade de geração desse gás em repre- gases de efeito estufa, originadas pelas hidrelétricas sas deve-se a flutuação do nível da água. A cada vez na Amazônia. que o nível mínimo operacional normal é atingido, um vasto lamaçal é exposto, e a vegetação herbácea, de fácil decomposição, cresce rapidamente nesta ÁREA DE ESTUDO zona, conhecida como zona de “deplecionamento”, ou de “drawdown”. Subsequentemente, quando o nível A Hidrelétrica de Balbina (Eletronorte) foi da água sobe, a biomassa se decompõe no fundo do construída em 1987 no rio Uatumã no povoado reservatório, produzindo metano (Fearnside, 2005). de Balbina, município de Presidente Figueiredo, Amazonas, a 155 km ao norte de Manaus, Fearnside (2005) aponta que o gás metano ge- Amazonas, com o objetivo de fornecer energia rado e emitido por esta zona difere da emissão da- para Manaus (Moura et al., 2004). O lago forma- quele originado a partir da decomposição de esto- do ocupou uma área de floresta de 2.360 km² que, ques iniciais de carbono no solo, folhas e serapilheira ao ser inundada, condicionou a existência de uma da floresta original inundada. Essa diferença se dá hidrelétrica desproporcional à sua modesta capaci- pela zona de deplecionamento ser uma permanente dade energética, cuja geração média de energia é de fonte deste gás e, já a decomposição de carbono da 112,2 MW (Figueiredo e Laraque, 1999). A região parte superior das árvores da floresta inundada, re- possui um lago com cerca de 3.300 ilhas formadas presenta uma grande fonte temporária de emissão principalmente devido ao relevo altamente plano e de gás de efeito estufa, pois sua decomposição se dá entalhamentos pouco pronunciados. Possui margens Estimativa da zona de deplecionamento 129 da hidrelétrica de Balbina por técnica de sensoriamento remoto dendríticas e grande quantidade de “paliteiros” (árvo- Procedimentos Metodológicos res afogadas). O regime hidrológico segue o mesmo padrão característico dos demais rios amazônicos, A metodologia empregada neste estudo baseou- com um período de águas altas, nos meses de abril se na técnica de detecção de mudanças por subtra- a junho, e de águas baixas de agosto a dezembro. O ção de imagens. As etapas envolvidas no procedi- clima da região é classificado como tropical úmido, mento metodológico são apresentadas na figura 1 e típico da região amazônica, com temperaturas eleva- descritas a seguir: das (média de 36º a 38º C) e alta pluviosidade (2000 mm), possuindo estações seca (junho a novembro) e chuvosa (dezembro a maio) bem definidas. MATERIAL E MÉTODOS As informações das imagens de satélite nes- te trabalho foram extraídas com a utilização do aplicativo ENVI e da linguagem de programa- ção computacional LEGAL (Linguagem Espacial para Geoprocessamento Algébrico) do software SPRING (Câmara, 1995). Para a produção dos ma- pas foram utilizados os aplicativos ArcGis e Global Mapper. Para o georreferenciamento das imagens foram utilizadas imagens do banco de dados (“geo- cover”) da NASA (National Areonautics and Space Administration), disponível na página de rede https://zulu.ssc.nasa.gov/mrsid/. Dados Multitemporais A dimensão da zona de deplecionamento foi obtida a partir de dados multitemporais do sensor TM/Landsat para as datas de 30 e 21 de junho de 1997 e 09 e 18 de agosto de 2003. Estas imagens representam uma subcena do mosaico formado pe- las cenas 231/61 (datas 21/06/1997 e 09/08/2003) e 230/61 (datas 30/06/1997 e 18/08/2003). Figura 1 - Fluxograma dos procedimentos metodológicos. Para cada ano foi necessário utilizar duas cenas diferentes para compor um mosaico de imagens, no qual abrangesse a totalidade da represa, impon- do a utilização de datas distintas para a composi- A técnica de detecção tem como um de seus ção do mosaico, pois as cenas adjacentes 231/61 e pré-requisitos básicos a intercalibração geométrica 230/61 possuem intervalos de aquisição diferentes e radiométrica. Por isso as imagens analisadas foram pelo sensor. A fim de minimizar a diferença entre corrigidas geometricamente através de um registro as cotas dos mosaicos, utilizaram-se datas com o imagem-imagem e de um polinômio de mapea- menor intervalo de tempo possível. Estas imagens mento de primeiro grau e reamostragem pelo vizi- também foram selecionadas por apresentarem pou- nho mais próximo. Com a finalidade de normalizar ca presença de nuvens, e também por representarem a radiometria das imagens adquiridas em diferentes o período de estiagem e enchente do regime hídrico datas foi realizada uma intercalibração radiomé- artificial do Lago de Balbina, respectivamente, res- trica a partir do método de retificação radiométri- saltando que a primeira imagem consistiu em dados ca de imagens, de acordo com Hall et al. (1991). de ano com atuação do fenômeno El Niño. Posteriormente, o georreferenciamento da imagem 130 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras classificada a um sistema de coordenadas geográfi- o melhor limiar obtido pela estatística da imagem cas foi obtido a partir do co-registro desta com as detecção, a partir de uma avaliação visual das ima- imagens disponíveis no banco de dados (“geocover”). gens. O limiar escolhido por este procedimento foi A técnica utilizada envolveu a álgebra de ima- de ± 1,25 desvio padrão. gens, sendo aplicada uma operação aritmética de Para aferir a consistência do mapeamento foram subtração aos pixels em cada imagem, obtendo-se a utilizados dados de imagens de satélite TM Landsat partir dos valores resultantes, uma terceira imagem, na composição 3(B), 4 (G) e 5(R) para o período de a imagem de mudança, que é simplesmente o resul- vazante (junho de 1997), com base na experiência do tado de uma operação de subtração realizada em um fotointérprete para região de estudo. O grau de concor- par de imagens co-registradas de uma mesma área dância do mapeamento foi avaliado com base em uma adquirida em diferentes datas (Mather, 1999). matriz de erro e na estatística Kappa, de acordo com O procedimento descrito aplicou-se somente Congalton e Green (1999). para a banda do espectro do sensor TM5 corres- pondente à faixa espectral do infravermelho médio (1,55 mm a 1,75 mm) ou banda 5. Esta banda foi RESULTADOS selecionada por apresentar sensibilidade ao teor de A dimensão da área de deplecionamento da umidade das plantas, condicionando a visualização de hidrelétrica de Balbina (659,6 km2), consistiu em áreas expostas em regiões inundadas. Esta região do aproximadamente 22,0% do total da área afetada espectro tem sido utilizada em estudos relacionados pelo sistema lacustre, que correspondeu a uma área aos sistemas lacustres na Amazônia de acordo com de 2.995,5 km² (espelho d’água e área de deplecio- Assis e Matos (2001), que concluíram que sua uti- namento) (Figura 2). A área da represa (área ala- lização é adequada para mostrar áreas de exposição gada) estimada por este estudo foi de 2.335,9 km2, em locais inundados, formando reservatórios que so- para uma cota de 47,6 m1. Este valor está próximo frem influência climática sazonal para seu preenchi- da área de inundação de 2.360 km2 estimado pela mento. Conforme mencionado por Slater (1980), a Eletrobrás (1986) para a cota 50 m. No entanto, banda do infravermelho médio é pouco afetada pelo quando considerado o espelho d’água e a área de espalhamento atmosférico, ao contrário das três pri- deplecionamento (2.995,5 km2), que corresponde à meiras bandas espectrais do visível do sensor (azul, área alagada na cota 49,54m, a área estimada para verde, vermelho). Este fato nos levou a desconsiderar o lago da represa foi 26,9% (635,5 km2) superior o procedimento de correção atmosférica das imagens. aquela estimada para cota 50 m pela Eletrobrás. 2 A imagem detecção foi classificada através da Estes dados indicam que a estimativa de 2.360 km técnica de fatiamento, rotulando-se as mudanças para a cota 50 m deva estar subestimada. ocorridas entre as datas de acordo com o tipo de De acordo com Asner (2001) a utilização de dados mudança: 1) Inundação – classe com alterações na multiespectrais do sensor Landsat para a região tropi- cobertura vegetal ou na superfície do solo, em de- cal úmida, particularmente para a Amazônia Brasileira, corrência do alagamento pela água da represa; 2) apresenta como maior obstáculo a presença de nuvens Não mudança – classe de áreas que mantiveram na maior parte do ano. Isto pode impossibilitar ou di- o mesmo tipo de cobertura de um ano para outro, ficultar a visualização da superfície terrestre através das com alterações mínimas na resposta radiométrica, imagens captadas pelo sensor, e consequentemente os não sensíveis à técnica utilizada e; 3) Exposição – estudos através de sensoriamento remoto. caracterizada como a classe que apresentou ganho A estimativa da zona de deplecionamento da de cobertura vegetal ou cobertura de solo exposto, represa de Balbina também foi prejudicada pela pre- resultante da redução do nível de água da represa, sença de nuvens sobre a superfície do reservatório, no caso deste estudo, a região de interesse, a zona de que representaram juntamente com suas respectivas deplecionamento. Estas classes foram estabelecidas sombras, uma área de 159,6 km2, o que correspon- por limiares de mudança baseados no desvio padrão. deu a 5,3% do total dos 2.995,5 km² (Tabela 1). Intervalos de 0,25 desvios padrão, numa amplitude Desta maneira a estimativa encontrada deste estudo de 0,25 a 2,0 desvios foram testados para selecionar pode ter sido subestimada. 1. Média entre as cotas das duas cenas utilizadas para o mosaico Estimativa da zona de deplecionamento 131 da hidrelétrica de Balbina por técnica de sensoriamento remoto Figura 2 - Mapa de detecção de mudanças. Tabela 1. Quantificação das áreas mapeadas. No entanto, a diferença de cota utilizada nes- Categoria Área (km2) te estudo foi em média de 2,0 m (Tabela 3), valor que pode ser encontrado em anos de ausência de El 1. Floresta e áreas desmatadas 21.891,6 Niño. As diferenças sazonais intra-anuais apontam 2. Deplecionamento 659,6 para médias de cotas, normalmente aproximadas, ou 3. Água 2.335,9 até superiores, que as dos períodos das imagens es- 4. Nuvens/Sombras 159,6 tudadas, como, por exemplo, no ano de 2002, que apresentou diferença entre nível mínimo e máximo Total 25.046,7 de 3,21 metros. 1. Floresta e áreas desmatadas; 2. Deplecionamento-exposição de solo entre um período de enchente e outro de estiagem; 3. Água- o lago propriamente dito e; 4. Nuvens/Sombras sobre a represa. Na avaliação do mapeamento, a exatidão global obtida foi de 98.2%, no entanto a classe de interes- se “deplecionamento” apresentou uma exatidão de Vale ressaltar que esta estimativa foi realizada a 76.1%, portanto, uma confusão de 12,9% com a clas- partir da técnica de subtração de imagens, utilizando se “floresta/desmatamento”. Esta confusão relativa- uma das imagens com data em ano de passagem do mente alta pode ter sido resultado de sombreamento fenômeno atmosférico global El Niño, responsável da floresta sobre o solo argiloso seco, por exemplo. A por mudanças significativas na cota de alagamento exatidão de mapeamento para a classe floresta/des-matamento foi de 99,26 %, ou seja, de um total de desta hidrelétrica. Por exemplo, as cotas do reserva- 2.188 pontos de teste (pixels), apenas 16 pixels des- tório desta hidrelétrica atingiram seus picos míni- ta classe foram classificados erroneamente, apresen- mos nos anos de passagem deste fenômeno, de 1997 tando um erro de comissão de 0,7% e de omissão de a 1998, se estendendo a 1999 (Tabela 2), no período 1,2%. Em geral, a matriz de confusão indicou maiores de analisado de 1995 a 2004. erros de comissão que de omissão (Tabela 4). 132 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Tabela 2. Valores anuais de cotas máximas e mínimas e suas respectivas diferenças durante um período de dez anos2. Ano 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Cota máxima 49,91 51,15 48,38 45,08 50,82 51,14 50,63 50,86 49,66 48,17 Cota mínima 47,56 48,44 42,07 40,86 45,1 48,53 47,43 47,65 47,69 47,14 Δ cotas 2,35 2,71 6,31 4,22 5,72 2,61 3,2 3,21 1,97 1,03 2. Dados fornecidos pela empresa Manaus Energia. Tabela 3. Datas de aquisição das imagens utilizadas, suas respectivas cotas e média das cotas entre as cenas3. IMAGEM (cena) DATA COTA (metros) Média de cotas (metros) 230/61 21/6/1997 47,7 47.6 231/61 30/6/1997 47,51 230/61 9/8/2003 49,58 49.6 231/61 18/8/2003 49,54 Δcotas (metros) 2 3. Dados para média de cotas, fornecidos pela empresa Manaus Energia. Tabela 4. Matriz de erro do mapeamento. Terrestre Referência Erro de Total Floresta Água Deplecionamento Outras Comissão (%) Floresta 2172 0 8 8 2188 0,7 Classes Água 5 68 0 3 73 10,9 temáticas Deplecionamento 15 0 54 2 71 23,9 Outras 6 0 0 42 48 12,5 Total 2198 68 62 55 2380 Erro de Omissão (%) 1,2 0 12,9 23,6 Exatidão global = 98.2% Coeficiente Kappa= 0,95 CONCLUSÕES AGRADECIMENTOS O resultado da avaliação do desempenho Agradecemos ao CNPq (Proc.55712/2005- do mapeamento foi bastante satisfatório, alcan- 4, 306031/2004-3, 420199/2005-5) e ao INPA çando um valor de Kappa igual a 0,95 (excelen- (INPA: PPI 851 1-1005) pelo suporte financeiro, ao te). Demonstrou-se assim que a técnica utilizada, aplicada a dados multitemporais, possui um gran- projeto Geoma/INPE pelas imagens cedidas e ao de potencial para o mapeamento de áreas sujei- CNPq pela bolsa de iniciação científica. tas à inundação, como no caso do reservatório de Balbina. Com a utilização destes dados para a es- LITERATURA CITADA timativa da zona de deplecionamento da represa de Balbina, seria possível a construção de um modelo Asner, G.P. Cloud Cover in Landsat Observation of the Brazilian de previsão de área de deplecionamento. Este mo- Amazon. International Journal of Remote Sensing. vol. 22, n. delo teria por base a relação entre as diferenças de 18, p. 3855-3862, 2001. nível de cota dos anos analisados, e as áreas de de- Assis, F.P.; Matos, F. D. A. Análise Multitemporal da UHE plecionamento obtidas pela detecção de mudança, de Balbina Através de Imagens de Sensoriamento Remoto derivadas de imagens de satélite. Esforços futuros, Orbital. In: Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto neste sentido, serão empenhados para o desenvol- (SBSR), 10, 2001, Foz do Iguaçu. Anais. São José dos vimento deste modelo. Campos: INPE, 2001. Artigos p. 527-529. Estimativa da zona de deplecionamento 133 da hidrelétrica de Balbina por técnica de sensoriamento remoto Bel Levy. 2005. Uma energia nem tão limpa. Instituto Ciência Figueiredo, M. D. M.; Laraque, A. 1999. Balbina: 10 anos depois. Hoje. Disponível em: . Acesso em: 05 mai. 2006. large scale riverbasins: extended abstracts. Brasília: HIBAM, Brasil, Eletrobrás. 1986. Programa de expansão do setor 1999. 1 CD-ROM. elétrico brasileiro, ano 2010- PRS. Centrais Elétricos S.A. Graciani, S.D.; Novo, E.M.L.M. 2003. Determinação da (Eletrobrás). Brasília, 1986. 2 vols. Cobertura de Macrófitas Aquáticas em Reservatórios Câmara, G. Modelos, linguagens e arquiteturas para banco de dados Tropicais. In: Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto geográficos. 1995, 286 p. Tese (Doutorado em Computação (SBSR), 11, 2003, Belo Horizonte. Anais. São José dos Aplicada) - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São Campos: INPE, 2003. Artigos p. 2509-2516. José dos Campos. 1995. 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São Paulo: IRN, p. Slater, P.N. 1980. Remote sensing: optics and optical systems. 204-241, 2005. Reading, MA, Addison-Wesley. 574 p. Barragens do Rio Madeira Hidrelétricas na Amazônia 137 Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Capítulo 7 Impactos das Barragens do Rio Madeira: Lições Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia Philip M. Fearnside Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). Av. André Araújo, 2936 - CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil. E-mail: pmfearn@inpa.gov.br Tradução de: Fearnside, P.M. 2014. Impacts of Brazil’s Madeira River dams: Unlearned lessons for hydroelectric development in Amazonia. Environmental Science & Policy 38: 164-172.. doi: 10.1016/j.envsci.2013.11.004 138 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO barragens para conclusão no intervalo de 2012-2021 na Amazônia Legal brasileira totalizam 17 (Brasil, As barragens de Santo Antônio e Jirau, em cons- MME, 2012, p. 77-78). Isso fará com que o número trução no rio Madeira, terão impactos significativos, de grandes barragens concluídas e 29 na região da incluindo inundação na Bolívia devido à formação Amazônia Legal. Muitas outras grandes barragens de um remanso superior a montante do reservató- planejadas não estão incluídas no Plano Decenal rio de Jirau. Os reservatórios eliminam ecossistemas (Ver: Fearnside, 2014a). naturais, bem como bloqueiam à migração de peixes afetando a biodiversidade e a produção comercial, As barragens planejadas na Amazônia (e em especialmente os grandes bagres do rio Madeira, que muitas outras partes do mundo) teriam muitos im- são recursos importantes na Bolívia e no Peru, assim pactos, os quais precisam ser quantificados e pesados como no Brasil. Mudanças nos regimes de inunda- contra os benefícios esperados se decisões racionais ção também afetarão os lagos de várzea e a pesca a fossem feitas. Muitos dos impactos caem sobre as jusante. A metilação de mercúrio e as emissões de populações locais que vivem ao longo dos rios que gases de efeito estufa são problemas adicionais. Os serão represados, enquanto os benefícios revertem reservatórios fazem parte de uma série planejada de para cidades distantes, por vezes, mesmo localizadas hidrovias que, se concluída, abriria grandes áreas na em outros países. Uma avaliação completa e justa dos Amazônia boliviana para plantio de soja, estimu- impactos representa um componente importante de lando o desmatamento. As barragens têm impactos um processo de tomada de decisão capaz de equili- sociais significativos, incluindo o deslocamento da brar essas preocupações. Infelizmente, este ideal está longe de ser alcançado. O exame de um caso espe- população ribeirinha e a eliminação dos meios de cífico, as barragens de Santo Antônio e Jirau, no rio subsistência pela pesca. Apesar da equipe técnica Madeira, oferecem um exemplo concreto dos pro- responsável pelo licenciamento ambiental ter apre- blemas envolvidos e de lições não aprendidas para sentado um parecer formal, considerando estas pre- barragens futuras. ocupações extremamente graves e insuficientemente estudadas para poder autorizar a construção da bar- O rio Madeira é um dos maiores rios do mun- ragem, designados políticos aprovaram as licenças. do, embora seja um mero afluente do rio Amazonas. As barragens do no Madeira oferecem lições impor- A vazão média do rio Madeira de 17.686 m3/s em tantes para o controle ambiental no Brasil. Jirau é 24% maior do que a do rio Yangzi na altura da barragem de Três Gargantas, na China. A drena- Palavras-chave: Barragens; Hidrelétricas; EIA, Impacto ambiental; Santo Antônio, Jirau; Aquecimento global gem do rio Madeira acima das represas cobre partes de Brasil, Bolívia e Peru, totalizando 984.000 km2, uma área maior que a França, Alemanha, Bélgica INTRODUÇÃO e os Países Baixos (Figura 1). O plano inicial era para construir uma única barragem alta na cachoeira O Brasil lançou um programa massivo de de Santo Antônio, logo a montante de Porto Velho construção de barragens hidrelétricas, a maioria (Brasil, ELETROBRÁS, 1987; ver Fearnside, destas está focalizada na Amazônia Legal, com 1995). No entanto, o reservatório inundaria parte da nove estados do País (Figura 1). Embora os pla- Bolívia, e o plano foi alterado para dividir o trecho nos para as represas e seu cronograma de constru- do rio entre a cachoeira de Santo Antônio e fronteira ção estão em constante evolução, o resultado final com a Bolívia em dois reservatórios menores: Santo é a conversão de praticamente todos os afluentes Antônio e Jirau (PCE et al., 2002). As barragens de do rio Amazonas em cadeias contínuas de reser- Santo Antônio, de 3.150 MW, e de Jirau, de 3.750 vatórios nos dois terços da região no lado oriental MW, são projetos a fio d’água com turbinas do tipo (Fearnside, 2013a). O Plano Decenal de Expansão bulbo, permitindo reservatórios menores do que as de Energia 2011-2020 solicitou 30 novas “grandes barragens tradicionais de armazenamento com tur- barragens” (definido no Brasil como > 30 MW) na binas Kaplan ou Francis. Um Estudo de Viabilidade região da Amazônia Legal até 2020 (Brasil, MME foi elaborado (PCE et al., 2004), simultanea- 2011, p. 285). Várias das pequenas barragens nesta mente com um Relatório de Impacto Ambiental lista foram adiadas para depois de 2021 no plano (RIMA) e um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) de 2012-2021, mas duas barragens muito grandes (FURNAS et al., 2005a,b), conhecido, em conjunto, foram aceleradas para serem incluídas nesse ano, as como o “EIA/RIMA”. Esses e outros documentos Impactos das Barragens do Rio 139 Madeira: Lições Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia técnicos do governo citados neste artigo estão dis- construída e operada por Santo Antônio Energia, poníveis em http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/ que é composto por Furnas (39%), FIP (formado Dossie/Mad/BARRAGENS%20do%20RIO%20 pelos bancos Santander e Banif ) (20%), Odebrecht MADEIRA.htm. (18%), Andrade Gutierrez (12%) e Cemig (10%). O O processo de aprovação das licenças ambien- consórcio de Jirau é da Energia Sustentável do Brasil tais foi extremamente controverso (por exemplo, (ESBR), que é composta por GDF Suez (60%), Switkes, 2008). Os técnicos do Instituto Brasileiro Eletrosul (20%) e Chesf (20%). Em 2 de julho de do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais 2013 o governo brasileiro aprovou uma proposta de Renováveis (IBAMA), que é o órgão vinculado ao venda de uma participação de 20% pela GDF Suez Ministério do Meio Ambiente, responsável pelo li- (da França) para a Mitsui (do Japão). A construção cenciamento, apresentou um parecer técnico de 221 das estruturas das barragens está atualmente em fase páginas se opondo à aprovação da Licença Prévia de conclusão em ambos os locais, embora a insta- (Deberdt et al., 2007) e um parecer 146 páginas lação das turbinas continuará durante vários anos. contra à aprovação da Licença de Instalação (Brasil, A geração de eletricidade a partir das primeiras IBAMA, 2008), mas, em ambos os casos, eles fo- turbinas começou em dezembro de 2011 em Santo ram sumariamente rejeitados por indicados políti- Antônio e em setembro de 2013 em Jirau. cos. As concessões para as barragens foram ganhas Entre as controvérsias que cercam a decisão por consórcios diferentes. Santo Antônio está sendo do Ministério das Minas e Energia de construir Figura 1. Locais mencionados no texto. 140 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras as barragens e ao licenciamento ambiental pelo em Jirau = 529 km2), cerca do dobro dos números IBAMA é a adequação das informações sobre os muitas vezes apontados ao descrever o projeto (138 impactos e o grau de imparcialidade em sua apre- km2 em Santo Antônio + 110 km2 em Jirau = 241 sentação e interpretação. O objetivo do presente km2) (por exemplo, Machado, 2003). trabalho é examinar os possíveis impactos dessas A avaliação do impacto da perda de florestas de barragens e identificar lições que podem servir para várzea e de outros ecossistemas ribeirinhos depende melhorar a tomada de decisão sobre o desenvolvi- muito da qualidade dos levantamentos das espécies mento hidrelétrico na Amazônia. de plantas presentes. Infelizmente, a parte botâni- ca do EIA/RIMA tinha graves deficiências na sua Inundações na Bolívia utilização de pessoal sem treinamento botânico, que A extremidade superior do reservatório de Jirau foram trazidos de partes da Amazônia que são bo- está na fronteira entre o Brasil e a Bolívia. O plano tanicamente diferentes do local em estudo, e devido de gestão de água anunciado para Jirau reduziria o à não-adesão aos protocolos para a coleta e depósito nível de água durante parte do ano, a fim de evi- de espécimes, de tal forma que é impossível verificar tar que o reservatório propriamente dito inundasse as identificações utilizadas no levantamento, essas na Bolívia. No entanto, embora não seja admitido tendo sido feitas apenas visualmente no local. Esta no cenário oficial, é provável que se forme um tre- parte do EIA/RIMA recebeu as críticas mais devas- cho de remanso superior (“backwater stretch”), onde tadoras de peritos independentes que participaram no relatório do Ministério Público sobre o EIA- o acúmulo de sedimentos no início do reservatório RIMA (Hopkins, 2006). impedirá o fluxo de água e eleva o nível da água do rio acima do reservatório em si, assim inundando na Bolívia (ver Anexo A). O cenário para a sedimenta- Impacto sobre os peixes e a pesca ção mudou radicalmente ao longo do licenciamen- Uma extensa pesquisa sobre peixes apoiada to das barragens, com fortes indícios de um papel pelos projetos de barragens encontrou cerca de importante de interferência política (Fearnside, 800 espécies na porção brasileira da bacia do rio 2013b). Madeira, 40 delas eram novas para a ciência (Lopes, 2011). Felizmente, a proporção que é endêmica ao Perda de ecossistemas naturais Madeira é menor do que se pensava anteriormen- te, o que significa que a maioria das espécies tam- Foi repetida constantemente em discussões bém ocorre em outros rios amazônicos e não desa- sobre as barragens que o nível da água não subiria pareceria como espécie, se as populações na bacia acima do nível de inundação “natural”. Este não é do rio Madeira fossem eliminadas. A classificação o caso: como é indicado nos relatórios, o nível nas como uma espécie “não endêmica” não significa que áreas acima de cada barragem é de aproximadamen- a eliminação da população do rio Madeira estaria te 3,5 m acima do nível máximo de inundação (que, sem riscos para a sobrevivência da espécie. As mui- por sua vez, é significativamente mais elevado do tas outras barragens propostas, que converteriam a que o de inundação “normal” que a população tem maior parte dos afluentes na Amazônia brasileira uma referência). A apresentação da comparação em cadeias de reservatórios, poderiam eliminar, po- com a inundação natural implica que a área real das tencialmente, espécies de peixes que não são endê- barragens é de apenas 281 km2, que se estende além micas ao rio Madeira. do leito do rio, incluindo a várzea natural. O impacto sobre a biodiversidade está sepa- Grande parte da planície de inundação do rio rado da perda da pesca comercial para os grandes Madeira é coberta por floresta inundada (floresta bagres migradores. Este grupo engloba várias es- de várzea), que é adaptada para ficar debaixo d’água pécies da família Pimeloididae, inclusive dourada durante um período de vários meses a cada ano. (Brachyplatatystoma rouxeauxii), pirarara (hemio- No entanto, esta floresta não está adaptada para ser liopterus Phractocephalus), filhote (B. filamentosum), subaquática durante o ano todo, e morreria quan- caparari (Pseudoplatystoma tigrinum ) e surubim (P. do inundada permanentemente por uma represa. fasciatum) (FURNAS et al., 2005b: Tomo B, Vol. 1, O impacto do reservatório é, portanto, toda a área p. III-147). Barthem e Goulding (1997, ver também inundada (271 km2 em Santo Antônio + 258 km2 Barthem et al., 1991) fizeram um estudo detalhado Impactos das Barragens do Rio 141 Madeira: Lições Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia da migração anual de dourada (Brachyplatatystoma A migração em massa de peixes (piracema) foi rouxeauxii) e piramutaba (B. vaillantii). Antes das completamente bloqueada em 2011 e parcialmente barragens, estas duas espécies comercialmente im- bloqueada no início de 2012. Uma das duas pas- portantes de grandes bagres subiam o rio Madeira sagens de peixes planejadas em Santo Antônio foi a cada ano para se reproduzir nas cabeceiras dos concluída a tempo para a migração de peixes em afluentes superiores, como os rios Beni e Madre de 2012, mas a maioria das espécies de bagres, tais Dios. Os alevinos (peixes recém-nascidos) desciam como a dourada, não foi vista subindo a passagem. os rios à deriva e ficavam para se alimentar e crescer Se milhares destes bagres gigantes migrarem através até a maturidade no baixo Amazonas. Escadas de da passagem, seria óbvio, não havendo necessidade peixes têm sido utilizadas (nem sempre com suces- de quaisquer dispositivos especiais de controle. Os so) para espécies migradoras, tais como o salmão, bagres são capazes de subir a passagem, como mos- mas as exigências do grande número de espécies de trado por testes com indivíduos capturados e soltos peixes amazônicos, incluindo os bagres gigantes, são, na parte inferior da passagem. No entanto, o peque- sem dúvida, diferentes, e um dispositivo de transpo- no volume de água na passagem é, aparentemente, sição de peixes para estas espécies ainda não havia insuficiente para atrair os peixes para a entrada, já sido testado. que o seu instinto é de seguir a corrente principal O EIA/RIMA não menciona quais seriam as do rio. Muitos relatos mencionado que os peixes ti- consequências se o dispositivo de transposição de nham “desaparecidos” vêm de comunidades ao longo peixes não funcionar para os grandes bagres. O rela- da parte superior Madeira e seus afluentes. tório não tira a conclusão óbvia de que as populações de peixes na Bolívia e Peru seriam drasticamente re- Mercúrio duzidas. As consequências para das populações de peixes no próprio rio Amazonas são incertas, espe- O rio Madeira e seus afluentes foram o palco cialmente se outros afluentes também forem repre- de uma grande corrida do ouro, onde os mineiros sados como planejado. (garimpeiros) usaram o mercúrio para amalgamar partículas de ouro e separá-los dos sedimentos alu- O dispositivo de transposição de peixes não é viais (por exemplo, Malm et al., 1990; Martinelli et uma escada, mas sim um canal com obstáculos e al., 1988; Pfeiffer et al., 1989, 1990). Durante a cor- velocidades da água semelhantes àquelas no rio na- rida do ouro na década de 1980 aproximadamen- tural, no caso da barragem de Santo Antônio. No te 100 t de mercúrio foram liberadas para o meio caso da barragem de Jirau, os peixes não sobem a ambiente na região do rio Madeira (Bastos et al., passagem, inaugurada em julho de 2012, que não 2006). Embora a maior parte da atividade de mine- perfez todo o caminho até o reservatório: a passa- ração de ouro tenha sido no alto Madeira (acima de gem termina em um grande recipiente de metal, que Porto Velho), os peixes e a população humana em é depois transportado por caminhão e esvaziado no todo o baixo Madeira, entre Porto Velho e a con- reservatório acima. O melhor que se pode esperar é fluência com o rio Amazonas tinham altos níveis de que o dispositivo pode funcionar para os peixes adul- mercúrio mais de uma década após o fim da corrida tos que migram rio acima, mas não iria funcionar (Bastos et al., 2006). para a descida dos ovos e larvas que seguem a jusan- te a deriva. Normalmente, as larvas descem a jusan- Nas áreas dos reservatórios de Santo Antônio e te flutuando, e, depois de dois anos de crescimento, Jirau (que eram o foco da corrida do ouro da década os peixes são capazes de migrar até as cabeceiras de 1980), o mercúrio da corrida do ouro se acumu- para desovar. Mesmo que as passagens para peixes lou no ponto onde o aluvião repousa sobre a rocha em Santo Antônio e Jirau fossem completamente (a uma profundidade de cerca de 5 m nas áreas de bem-sucedidas, ainda não se teria certeza sobre o mineração de ouro). Foi acumulado tanto mercúrio destino da migração de bagres para o Peru, porque que os garimpeiros cavando a este nível não pre- isso também depende dos peixes passarem também cisam mais usá-lo para amalgamar o ouro: já está a barragem planejada de Cachuela Esperanza, na amalgamado (Bruce R. Forsberg, comunicação pes- Bolívia. Além disso, os peixes teriam que passar com soal). A possibilidade de que o mercúrio da corrida êxito pela barragem proposta de Guajará-Mirim do ouro que atualmente reside nos sedimentos possa (Cachoeira Ribeirão) para a desova ocorrer tanto na ser remobilizado por uma segunda fase de explora- Bolívia como no Peru. ção mineira nesses sedimentos foi levantada pelos 142 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras opositores da barragem (Moret, 2006). Hoje os pre- Gases de efeito estufa ços do ouro voltaram a níveis recordes, e esta mi- neração dos sedimentos tem sido, de fato, iniciada, Embora seja esperada que a usina de Jirau emita mesmo no próprio reservatório de Santo Antônio menos gases de efeito estufa do que a maioria das (observação pessoal). represas existentes na Amazônia, devido ao seu re-servatório relativamente pequeno e ao tempo rápido O impedimento do fluxo de água nos afluentes de substituição da água, as emissões não serão zero. cria condições anóxicas, apropriadas para a metila- O maior impacto de Jirau sobre o aquecimento glo- ção de mercúrio. A metilação transforma o mercú- bal decorre de seu projeto de crédito de carbono no rio elementar na forma tóxica para os seres huma- âmbito do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo nos, mesmo em quantidades ínfimas. O mercúrio (MDL), do Protocolo de Quioto. O Conselho se acumulou nos sedimentos, não só no próprio rio Executivo do MDL aprovou o registro do projeto de Madeira, mas também nos seus afluentes, especial- Jirau em 17 de maio de 2013, tornando-se o maior mente no rio Mutum-Paraná (Forsberg & Kemenes, projeto MDL de “energia renovável” no mundo. O fato de que a construção já estava em andamento 2006). A cidade de Mutum-Paraná, na foz do rio, antes do projeto de MDL ser elaborado em abril de foi uma grande base para a construção e reparação 2012 fornece fortes evidências de que a barragem te- de dragas, causando contaminação adicional. ria sido construída de qualquer maneira (ou seja, não O represamento deverá tornar a velocidade da é “adicional”), e os 6 milhões de toneladas de CO2 água nos afluentes do rio Madeira muito mais lenta que serão emitidos pelos países que compram o cré- do que a diminuição da velocidade no próprio rio dito de carbono vai representar um impacto líquido (Molina Carpio, 2008, p. 67). A consequente mu- sobre o aquecimento global. O mesmo se aplica ao dança nos afluentes, desde características lóticas para projeto de carbono de Santo Antônio, aprovado pelo MDL em 26 de novembro de 2013 (ver Anexo A). lênticas, com diminuição do oxigênio dissolvido, é indicada pelo EIA, mas as análises dos afluentes Efeitos a jusante não foram incluídas e estudos adicionais foram re- comendados (FURNAS et al., 2005b, Tomo B, Vol. Erosão fluvial 7, p. 3.10-3.11). No rio Mutum Paraná, localizado a 55 km acima da usina de Jirau, o nível de água O estudo de viabilidade e do EIA/RIMA presu-me que não haverá erosão do leito do rio e das mar- no Madeira deverá aumentar a uma média de 5 m, gens abaixo das barragens, como resultado da carga variando de 3 m em março para 6 m, em setembro de sedimentos reduzida. A possibilidade de lavagem de acordo com o Estudo de Viabilidade (PCE et al., merece estudo cuidadoso por causa da gravidade dos 2005, Tomo A, Vol. 7, p. VII-15). No entanto, o EIA impactos potenciais, se ela ocorrer. O mais conhe- não analisa as mudanças na velocidade e na quali- cido é a desastrosa erosão a jusante da barragem de dade da água deste importante afluente (Molina Assuão, no rio Nilo, no Egito (e.g., Shalash, 1983). A Carpio, 2006). Mais tarde, isso foi feito em resposta carga de sedimentos transportados pelo rio Madeira ao IBAMA pelos proponentes em maio de 2007, (750 milhões de toneladas/ano em Jirau) é 15 vezes mostrando que, durante pelo menos uma parte do maior do que a carga de sedimentos transportados ano a água seria, de fato, estratificada nos afluentes, pelo Nilo, antes da Barragem de Assuão (50 milhões resultando em água anóxica no fundo (FURNAS & de toneladas na foz em 1964) (Shalash, 1983). As CNO, 2007, Anexo V). Os proponentes da barra- barragens do rio Madeira teriam muito menos im- gem negaram que haveria qualquer sedimentação na pacto do que a barragem de Aswuão, uma vez que foz do rio Mutum-Paraná (FURNAS et al., 2006b). o percentual de sedimentos retidos será menor (re-tenção de 20% nos primeiros anos em Jirau, mais Uma indicação de que os afluentes que entram no 20% do restante em Santo Antônio = 36% do total) reservatório de Jirau vão estratificar é fornecida por (FURNAS et al., 2006a, Vol. 1, p. 21). Note-se que uma medição indicando elevada emissão de metano este valor para a retenção percentual, nos primeiros a partir da superfície da água num afluente que entra anos é substancialmente mais elevado do que o valor no reservatório de Santo Antônio, imediatamente a de 12% dado no RIMA (FURNAS et al., 2005a, p. jusante de Jirau (Hallqvist, 2012, p. 25). 56). Presumivelmente, o valor de 12% é uma média Impactos das Barragens do Rio 143 Madeira: Lições Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia ao longo de um período de tempo maior. No Nilo, passando pelos peixes até os seres humanos. Quando o sedimento descarregado no estuário foi de ape- o nível da água começa subir no rio Madeira, a vazão nas 5-6% da carga pré-represa, mesmo após a recu- do rio principal começa a aumentar vários dias antes peração de uma carga de sedimentos por lavagem que o fluxo aumente nos afluentes que alimentam os abaixo da barragem (Shalash, 1983). No caso do lagos pelos fundos, como o Lago de Purusinho (lo- rio Madeira, mais estudos seriam necessários para calizado a jusante de Humaitá). O fluxo normal dos avaliar os efeitos no baixo rio Madeira, especial- lagos é invertido durante um período de 2-3 dias (o mente nos primeiros anos (Molina Carpio, 2006). A “repiquete”), e em seguida, para durante cerca de um construção da Barragem de Cachuela Esperanza, no dia quando os dois fluxos estão em equilíbrio. Neste rio Beni é deverá resultar em retenção de uma quan- momento, uma grande quantidade de sedimento tidade substancial de sedimentos, o que seria acres- precipita no lago. Depois, com o aumento da vazão centado aos efeitos de Jirau e Santo Antônio para do afluente, a direção normal do fluxo do lago para produzir riscos ainda não analisados de aumento de fora é reestabelecida. No entanto, o aumento do ní- erosão fluvial e de redução de fluxos de nutrientes no vel de água no rio Madeira ocorre de forma inter- baixo rio Madeira e no rio Amazonas. mitente, dependendo dos eventos de precipitação na A liberação de água através dos vertedouros com parte superior da bacia. Na medida em que o nível da grande força em 2012 (antes de instalar a maior par- água sobe, 2-3 “repiquetes” ocorrem normalmente, te das turbinas) resultou em erosão da orla da cidade quando a água e os sedimentos do Madeira entram de Porto Velho, localizado logo abaixo da barragem. nos lagos. Durante o período da cheia propriamente Cerca de 300 casas foram destruídas ou condenadas dito, quando a água permanece no seu nível máximo, devido à erosão. O consórcio construtor de Santo pouco ou nenhum sedimento entra nos lagos, apesar Antônio insiste que a erosão não tinha nada a ver dos lagos serem completamente ligados ao rio pela com a barragem, mas, mesmo assim, construiu um água. Isto é porque a taxa de fluxo dos tributários aterro de pedra britada ao longo de parte da margem que alimentam os lagos de trás também atinge um do rio e pagou para abrigar a população deslocada ponto alto, e a direção normal do fluxo do lago para em hotéis na cidade. A erosão forçou o porto de o canal de rio é mantida. Porto Velho a fechar durante várias semanas, cau- sando o caos com mais de 500 caminhões de soja Os “repiquetes”, especialmente o primeiro do que foram incapazes de descarregar, entre outras ano, ocorrem quando a água no rio está em um nível consequências. A falta de consideração adequada muito baixo. Espera-se que o reservatório de Jirau, dos impactos a jusante do EIA/RIMA foi dramati- em particular, esteja no seu nível mais baixo neste zado por esses eventos. momento, e parte do pulso do fluxo seria captura- do para encher o reservatório, em vez de ser com- Sedimentos em lagos de várzea pletamente transferido para o baixo rio Madeira. O EIA/RIMA considerou que a “área de impacto O quanto a presença das barragens atenua o pico direto” para os parâmetros ambientais estendesse por do fluxo neste momento crítico é uma questão de uma distância de apenas 12 km abaixo da barragem incerteza, apesar da insistência dos proponentes de de Santo Antônio (FURNAS et al., 2005b, Tomo que não haveria nenhum efeito (FURNAS et al., A, Vol. 1, p. III-7). Uma área de estudo de impactos 2006a,b). Isto poderia ser um ponto crítico para os diretos sobre a população humana se estende subs- lagos, uma vez que qualquer alteração na força do tancialmente mais abaixo de Porto Velho (FURNAS “repiquete” teria um grande impacto. O quanto isso et al., 2005b, Tomo A, Vol. 1, p. III-5). A população iria diminuir a entrada de sedimentos nos lagos não humana será afetada por quaisquer mudanças no rio, foi determinado. que é a fonte de vida para a economia humana, assim A quantidade de entrada de sedimentos que con- como o é para os ecossistemas naturais. tribui para manter a fertilidade da água nos lagos é O pulso sazonal do fluxo de água e de movimen- uma questão chave. Os sedimentos foram mapeados to de sedimentos controla quase todos os aspectos em um lago: o Lago de Purusinho. Os sedimentos dos ecossistemas de várzea, ou planícies de inun- perto da boca do lago são principalmente argilas mi- dação de água branca ( Junk, 1997). Os sedimentos nerais do rio Madeira, enquanto que aqueles perto entram nos lagos de várzea, fornecendo nutrientes do ponto onde o afluente entra (um córrego de água que são a base da cadeia alimentar desde o plâncton preta) são mais ricos em matéria orgânica (W.R. 144 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Bastos, comunicação pessoal). Nutrientes aderem 2005a, p. 47). Estes números são, sem dúvida, subesti- tanto à matéria orgânica quanto à argila mineral. mados. Apenas os membros das cooperativas de pes- A Reserva Extrativista do Lago do Cuniã está ca na área totalizam 2.400 (Ortiz et al., 2007, p. 6). localizada a 130 km a jusante de Porto Velho, na mar- A população deslocada é, em grande parte, composta gem esquerda do rio Madeira (Figura 1). A reserva de pescadores e outros que dependem do rio para a foi criada em 1999 e é administrada pelo Instituto sua subsistência. Além de proporcionar emprego, os Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade bagres têm sido tradicionalmente a base da dieta para (ICMBio), anteriormente parte do IBAMA. Esta a população que vive ao longo do rio Madeira (Doria reserva de 55.850 ha contém mais de 60 lagos de et al., 2012; Goulding, 1979). As atividades de subs- várzea, especialmente o grande Lago do Cuniã, onde tituição para dar emprego, tais como uma praia artifi- a maior parte da população de 110 famílias depen- cial e um centro de turismo construídos na antiga ca- de da pesca (Brasil, IBAMA, s/d [2006]). O Lago choeira de Teotônio, parecem estar aquém de oferecer do Cuniã é especialmente conhecido como a prin- um meio de vida viável para essa população. Placas cipal fonte de pirarucu (Arapaimum gigas, um peixe postadas na praia artificial instalada para o centro de predador de grande valor comercial) consumido em turismo alertam que a água do reservatório é impró- Porto Velho. A possibilidade de que alterações cau- pria para o banho, proporcionando uma indicação da sadas pelas barragens do rio Madeira podem reduzir barreira para substituir a pesca com o turismo. a produtividade da pesca é uma preocupação para a população local. Nem a Reserva Extrativista de O rápido crescimento da população de Porto Cuniã nem qualquer das outras unidades de con- Velho, tanto de funcionários de construção e outros, servação a jusante das represas foi considerada no atraídos pelas oportunidades criadas pela atividade EIA/RIMA. Estudos são necessários para estimar econômica associada, resultou em grande pressão as mudanças na oferta de sedimentos e nutrientes sobre os serviços urbanos. Além disso, os serviços, para os lagos de várzea. obviamente, serão incapazes de lidar com o lan- çamento de 20 mil pessoas desempregadas após a Impactos sociais conclusão das barragens (Instituto Pólis, 2006). O estudo de viabilidade estima que 50 mil empregos A alegação de que as barragens não fariam com indiretos adicionais seriam criados por cada barra- que o nível da água subisse acima do nível de inun- gem para o fornecimento de bens e serviços durante dação natural foi repetida tantas vezes pelos propo- o processo de construção (PCE et al., 2004, Tomo nentes do projeto e pela imprensa que se tornou um 1, Vol. 1, p. 18), o que significa que 100 mil pessoas mito, tanto entre o público como entre a maioria desempregadas adicionais seriam lançadas em Porto das pessoas associadas com os preparativos para as Velho. Caso a rodovia BR-319 seja reconstruída e represas. No entanto, a altura que o nível de água asfaltada a esta altura, pode-se esperar uma migra- subirá varia desde zero na extremidade superior de ção substancial da população para Manaus (e.g., cada reservatório (isto é, perto de Abunã para o re- Fearnside & Graça, 2006). servatório de Jirau e no local da barragem de Jirau para o reservatório de Santo Antônio), até um má- ximo logo acima de cada barragem. Um valor médio Impactos da Hidrovia Madeira-Mamoré esconde o fato que a subida do nível da água fica O relatório de inventário (PCE et al., 2002, p. muito acima do nível de inundação natural sobre 6.22) mostrou entusiasmo com os benefícios poten- uma área substancial. Além disso, expressar o au- ciais das barragens para melhorar o transporte: mento em comparação com o nível de fluxo máximo histórico em cerca de 100 anos de monitoramento “Os ótimos solos da Bolívia, de alta produtivi- do rio Madeira (48.800 m3/s) é enganoso para os dade e custos operacionais competitivos, terão seu moradores ribeirinhos que pensam em termos dos potencial significativamente aumentado, podendo níveis de inundação mais baixos “normais” que eles sobrepujar os melhores no mundo. já vivenciaram a cada ano. Considerando que a navegação possui a melhor O total da população “diretamente afetada” é relação de custo entre todos os modais de transporte de 2.849 pessoas (1.762 em Santo Antônio e 1.087 .... podemos afirmar que a implantação do sistema em Jirau), de acordo com o RIMA (FURNAS et al., hidroviário integrado ora proposto acarretará, em Impactos das Barragens do Rio 145 Madeira: Lições Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia seu pleno uso, reflexos diretos nos índices da econo- resultado de interações entre populações locais, ex- mia agrícola nacional e regional.” cluindo povos da floresta, riberinhos, pescadores, Só os benefícios das hidrovias são enfatizados, e ...”. A “mudança inesperada do Governo Federal” não o impacto do desmatamento estimulado para a em relação à remoção das eclusas do plano [MME soja. As hidrovias previstas são mostradas na Figura 2. em declarações à imprensa em fevereiro de 2006] é descrito como “uma manobra política para confun- A relação das barragens do rio Madeira aos dir a opinião pública e licenciar o empreendimento, esquemas de integração regional mais amplo ocultando da sociedade um dos grandes objetivos com base na construção de hidrovia constitui um do projeto”. dos pontos de maior controvérsia (por exemplo, Killeen, 2007). Um grupo de 11 organizações não- Na sua comunicação oficial ao CONAMA, governamentais (ONGs) apresentou uma proposta respondendo à moção proposta, o Ministério das de uma “moção de referência” sobre as barragens Minas e Energia afirmou que “nada há de ocul- do Madeira para o Conselho Nacional do Meio to” sobre os planos da IIRSA, e afirmou que a Ambiente (CONAMA) (Maretto et al., 2006). A declaração do Ministério do Meio Ambiente proposta citou a inclusão de eclusas no projeto da “..consiste de argumentação especulativa e equi- barragem apresentado no RIMA como prova de vocada, sem qualquer fundamento técnico. É um que o projeto havia “ocultando por traz de tudo isto claro acinte à competência do órgão [MMA] e [os planos para barragens], um grande programa um inequívoco desmerecer de sua atuação” (Brasil, para a América do Sul de nome IIRSA [Iniciativa MME, 2006, p. 10). O Ministério das Minas e para a Integração da Infraestrutura da América do Energia afirmou que as barragens não são parte Sul] que representa um velho modelo de desenvol- da IIRSA (Brasil, MME, 2006, p. 6). No entanto, vimento baseado em grandes volumes financeiros as barragens aparecem como componentes im- sem, contudo, considerar o desenvolvimento como portantes da proposta IIRSA, da qual o Brasil é Figura 2. Hidrovias planejadas indicadas pelo Estudo de Viabilidade para as barragens do rio Madeira (redesenhado a partir de: PCE et al., 2004, Tomo 1, Vol. 1, p. 1.16). 146 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras parte (e.g., IIRSA, 2007, p. 33). Benefícios para a Amazônia (INPA: PRJ15.125) e Ministério Público IIRSA são enfatizados no Estudo de Viabilidade Federal do Estado de Rondônia. Agradeço a todos (PCE et al., 2005, Vol. 1, p. I-19), e foram dado aqueles que forneceram informações e que ajudaram destaque muitas vezes nas apresentações do pro- com apoio logístico nos locais das barragens e em jeto pela ELETROBRÁS. Porto Velho, entre eles Francisco Pereira, Artur de Souza Moret, Wanderley Rodrigues Bastos, Ronaldo CONCLUSÕES Cavalcante de Oliveira, Iremar Antônio Ferreira e Carolina Carneiro Fonseca, bem como aqueles em As barragens de Santo Antônio e Jirau, no rio orgãos federais, e residentes estaduais e municipais Madeira têm impactos severos, mas a decisão de na região das barragens. Agradeço ao Paulo M.L.A. construir as barragens foi feita antes que os impactos Graça pelos comentários. Esta é uma tradução de fossem avaliados e o licenciamento prosseguiu sobre Fearnside (2014b). Toda a responsabilidade pelo con- pressão política, apesar das preocupações levantadas teúdo do artigo recai sobre o autor. pela equipe técnica da agência de licenciamento. Garantir a efetiva independência do órgão licencia- dor é essencial. LITERATURA CITADA Impactos internacionais foram ignorados no caso Barthem, R. & Goulding, M. 1997. The Catfish Connection: Ecology, Migration, and Conservation of Amazon Predators. das barragens do rio Madeira, tais como o bloqueio da Columbia University Press, New York, E.U.A. 184 p. migração de peixes para Bolívia e Peru. Informações sobre o mercúrio e sobre alterações do fluxo de se- Barthem, R.B., Ribeiro, M.C.L.B. & Petrere Júnior, M. 1991. Life strategies of some long distance migratory catfish in dimentos a jusante também foram insuficientes. relation to hydroelectric dams in the Amazon Basin. Biological Nenhuma consideração foi dada aos impactos dos Conservation 5: 339-345. projetos de infraestrutura associados às barragens do rio Madeira, tais como as hidrovias planejadas para a Bastos, W.R., Gomes, J.P.O., Oliveira, R.C., Almeida, R., Nascimento, E.L., Bernardi, J.V.E., de Lacerda, L.D., expansão de soja no Brasil e na Bolívia. da Silveira, E.G. & Pfeiffer, W.C. 2006. 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Construindo o Desenvolvimento Sócio- são efetivamente independentes dos proponentes. Ambiental no Baixo Madeira. IBAMA, Porto Velho, RO. 8 p. A tomada de decisão sobre barragens (e outros Brasil, IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos projectos) precisa ser reformulada de modo que as Recursos Naturais Renováveis). 2008. Parecer Técnico No. informações obtidas pelos estudos de impacto am- 45/2008-COHID/CGENE/DILIC/IBAMA de 08 de biental cumpram o seu papel como uma referência maio de 2008. Assunto: Análise da solicitação da emissão para uma comparação racional entre os impactos e da Licença de Instalação do Aproveitamento Hidrelétrico de Santo Antônio. 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(Ed.), Águas Turvas: Alertas sobre as Conseqüências de damming-the-amazon-s-principal-tributary-3967 Impactos das Barragens do Rio 149 Madeira: Lições Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia ANEXO A: MATERIAL SUPLEMENTAR Além da inundação na Bolívia pelo remanso su- perior, também existe a possibilidade de que o nível Inundação na Bolívia de água no reservatório propriamente dito pode ser O rio Madeira tem uma das maiores cargas de elevado para inundar terras naquele país, apesar do sedimentos entre os rios do mundo, contribuindo plano oficial atual indicar o contrário. O plano ori- com cerca da metade do total transportado para o ginal do Estudo de Viabilidade, de 2004, teria man- Atlântico pelo rio Amazonas (e.g., Meade, 1994). tido o nível de água de Jirau constante a uma cota As questões em torno dos impactos dos sedimentos de 90 m, o que inundaria na Bolívia durante uma ilustram a elevada incerteza em que o licenciamento parte do ano. O Estudo de Impacto Ambiental, de das barragens ocorreu. O Estudo de Viabilidade e 2005, mudou o plano para um nível de água variável, o EIA/RIMA calcularam uma rápida acumulação com níveis abaixo de 90 m durante 8 meses do ano de sedimentos nos reservatórios, mas concluiu que (FURNAS et al., 2005b, Tomo A, p. VII-13). A pro- a viabilidade da barragem pode ser garantida, dei- posta de Jirau, de 2011, para crédito de carbono do xando as ensecadeiras no lugar para funcionar como Mecanismo do Desenvolvimento Limpo reduziria barreiras subaquáticas para evitar que a acumula- ainda mais o nível de água para evitar inundação na ção de sedimentos atingisse as turbinas (FURNAS Bolívia (Energia Sustentável do Brasil, SA & GDF et al., 2006, Tomo E, Vol. 1, p. 23). Pouco antes da Suez Energy Latin America Participações Ltda., aprovação da licença prévia para Santo Antônio e 2012). Os níveis de água mais baixos implicam per- Jirau, um relatório de consultoria encomendado da de geração de energia. Operação da barragem de pelo Ministério das Minas e Energia (Alam, 2007) Jirau com um nível de água constante (mais alto) alterou o cenário oficial completamente para um representa algo que poderia ser feito sem quaisquer no qual não haveria nenhuma acumulação de se- obras de engenharia adicionais além da presente dimentos em todos os reservatórios (FURNAS & barragem. O histórico passado em situações para- CNO, 2007, p. 22). A confiabilidade desta conclu- lelas não é promissor: a hidrelétrica de Balbina foi são tem sido fortemente contestada (Dunne, 2007; licenciada para operar em um nível de água 46 m Molina Carpio, 2007; Tucci, 2007). A polêmica dos acima do nível do mar, mas, em vez disso, o reser- cenários oficiais para a acumulação de sedimentos vatório foi enchido diretamente para a cota de 50 m mostra tanto o elevado grau de incerteza em que as (Fearnside, 1989), enquanto o projeto de Tucuruí- barragens foram licenciadas e a tendência a adotar, II foi realizado sem EIA/RIMA, alegando que iria seletivamente, interpretações favoráveis às barragens operar sem aumentar o nível de água além do nível (Fearnside, 2013a). anterior (Tucuruí-I) de 72 m acima do nível do mar, mas, desde 2002, o reservatório vem operando a 74 Uma questão importante sobre a sedimenta- m acima do nível do mar (Fearnside, 2006). ção é se os depósitos de sedimentos vão formar-se na extremidade superior do reservatório de Jirau, No caso de Jirau, o Brasil pode muito bem ser causando o aumento dos níveis de água em um capaz de conseguir a permissão da Bolívia para per- trecho de remanso superior rio acima do reserva- mitir a elevação do nível da água para 90 m ou até tório em si. Isso faria com que houvesse inunda- mesmo mais ainda, como parte das negociações para ção na Bolívia, já que o rio é binacional acima de a barragem binacional de Guajará Mirim, também Abunã. Efeitos no trecho de remanso superior não conhecida como Cachoeira Ribeirão. Um acordo são considerados no Estudo de Viabilidade e no informal foi alcançado entre o presidente brasileiro, EIA, apesar das afirmações enfáticas que a Bolívia Luiz Inácio Lula da Silva, e o presidente da Bolívia, não seria afetada pelas barragens (FURNAS et al., Evo Morales, segundo o qual o Brasil financiaria 2005, Tomo 1, Vol. 1, p. 7-103, 2006a, Vol. 1, p. 13; a construção de ambas as barragens de Cachuela PCE et al., 2004, Tomo 1, Vol. 1 p. 1.6 & p. 7-103, Esperanza e Guajará Mirim (Época, 2008). O en- 2005, Tomo A, Vol. 7, p. VII-15-16). No entanto, tendimento é que os bolivianos cessariam as suas o modelo HEC6 utilizado no EIA/RIMA indica objeções a Santo Antônio e Jirau. Presumivelmente, sedimentação a montante de Abunã depois de 50 isso pode incluir também não contestar o nível da anos, mesmo se o reservatório de Jirau fosse ope- água em Jirau ser mantido no nível planejado en- rado em um nível (cota) normal de 87 m acima do tre o Estudo de Viabilidade (PCE et al., 2005) e a nível do mar em vez do nível de 90 m esperado resposta em 2007 aos questionamentos do IBAMA para a maior parte do ano (PCE, 2007, p. 6.32). (FURNAS & CNO, 2007), o que teria permitido 150 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras formar um trecho de remanso superior e afetar maior projeto de energia “renovável” já aprovado a Bolívia. Pode até incluir “fechar os olhos” para pelo MDL (Thomson Reuters Point Carbon, 2013). a elevação da água de forma constante até a cota O projeto de Santo Antônio, com mais 4 milhões de 90 m originalmente especificada na versão de de créditos de carbono, foi aprovado pelo MDL em 2004 do Estudo de Viabilidade, o que implicaria 26 de novembro de 2013. Crédito de carbono para em inundação direta na Bolívia pelo reservatório, barragens como essas representa um impacto sobre além do trecho do remanso superior. Em 2 de julho o aquecimento global, uma vez que as barragens se- de 2013, a Agência Nacional de Energia Elétrica riam construídas de qualquer modo, sem subsídio (ANEEL) solicitou que o Ministério das Minas e por meio da venda de créditos de carbono (ambas as Energia (MME) iniciasse negociação com a Bolívia barragens do rio Madeira estavam quase concluídas para permitir o aumento do nível da água em Jirau no momento em que as propostas foram apresenta- (Tavares & Fariello, 2013). das). Este é um problema geral que afeta o MDL, com barragens não adicionais representando uma Gases de efeito estufa parte significativa das despesas de mitigação total As barragens do rio Madeira emitiriam substan- do MDL (Fearnside, 2013b). cialmente menos metano do que represas amazôni- cas existentes, porque o fluxo de água relativamen- Referências te rápido deve impedir a estratificação térmica na Alam, S. 2007. Rio Madeira Project: Hydraulic and Sediment maior parte da área dos reservatórios. A duração mé- Management Studies. Ministério das Minas e Energia, dia de rotatividade é de 1,34 dias em Santo Antônio Brasília, DF. 45 p. Disponível em: http://philip.inpa.gov. e de 1,32 dias em Jirau (FURNAS & CNO, 2007, br/publ_livres/Dossie/Mad/Documentos%20Oficiais/ p. 4). Isto resultará em menos produção de meta- Ali%20Sultan%20report/Sultan%20Alam%20report- no, no fundo do reservatório e ajudaria a evitar que English-11503.pdf qualquer água anóxica que fosse formada atingisse Dunne, T., 2007. Response to analyses of flow and sedimentation as turbinas. No entanto, as emissões não seriam zero, at the sites of proposed Rio Madeira hydroelectric projects. uma vez se espera a estratificação em baías e bocas 08 de julho de 2007. Report to International Rivers, Berkeley, dos afluentes ao longo das margens dos reservatórios Califórnia, E.U.A. 4 p. http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/ (Forsberg & Kemenes, 2006; FURNAS & CNO, Dossie/Mad/Outros%20documentos/Dunne%20parecer.pdf 2007, Anexo V). As medições de emissão de meta- Energia Sustentável do Brasil S.A. & GDF Suez Energy no a partir da superfície da água em Santo Antônio, Latin America Participações Ltda. 2012. Jirau Hydro utilizando câmaras, indicam emissões significativas Power Plant. Project Design Document (PDD) (18 April nos afluentes, mas muito menos emissões no corpo 2012) Project Design Document Form for CDM Project Activities (F-CDM-PDD) Version 04-0. 94 p. Disponível principal do reservatório (Hallqvist, 2012, p. 25). No em: http://cdm.unfccc.int/Projects/Validation/DB/ entanto, a concentração de metano medida na água M4OO2XA6U9D8X8CASOJDWPFTIZ2Z3H/view.html a jusante do reservatório é elevada (Grandin, 2012, p. 28), o que sugere que nem todo o metano produ- Época. 2008. Usina do Rio Madeira: Um novo acordo com Evo. Época 14 de janeiro de 2008, p. 30. zido nas partes anóxicas do reservatório será oxidado antes de atingir as turbinas. Além das emissões de Fearnside, P.M. 1989. Brazil’s Balbina Dam: Environment versus metano, dióxido de carbono também será emitido the legacy of the pharaohs in Amazonia. Environmental quando árvores cortadas ou mortas por inundação, Management 13: 401-423. doi: 10.1007/BF01867675. se decomporem na presença de oxigênio (Fearnside Fearnside, P.M. 2006. Dams in the Amazon: Belo Monte and & Pueyo, 2012). Brazil’s hydroelectric development of the Xingu River Basin. Environmental Management 38: 16-27. doi: 10.1007/s00267- Ambas as barragens apresentaram propos- 005-00113-6. tas para a obtenção de créditos de carbono do Fearnside, P.M. 2013a. Decision-making on Amazon dams: Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) Politics trumps uncertainty in the Madeira River sediments do Protocolo de Quioto. O projeto de Jirau foi controversy. Water Alternatives 6(2): 313-325. aprovado pelo MDL em 17 de maio de 2013, que Fearnside, P.M. 2013b. Carbon credit for hydroelectric dams as a lhe permite vender 6,2 milhões de créditos de car- source of greenhouse-gas emissions: The example of Brazil’s bono (que representam de toneladas de CO2) por Teles Pires Dam. Mitigation Adaptation Strategoes for Global ano, durante os próximos sete anos, tornando-se o Change 18: 691-699. doi: 10.1007/s11027-012-9382-6. Impactos das Barragens do Rio 151 Madeira: Lições Não Aprendidas para o Desenvolvimento Hidrelétrico na Amazônia Fearnside, P.M. & Pueyo, S.. 2012. Underestimating greenhouse- org/admin_iirsa_web/Uploads/Documents/mer_lima07_ gas emissions from tropical dams. Nature Climate Change 2: ppt_vn_pbb.pdf 382-384. doi: 10.1038/nclimate1540. Junk, W.J. (Ed.), 1997. The Central Amazon Floodplain – Forsberg, B.R. & Kemenes, A. 2006. Parecer Técnico sobre Ecology of a Pulsing System. Springer-Verlag, Heidelberg, Estudos Hidrobiogeoquímicos, com atenção específica à Germany. 525 pp. dinâmica do Mercúrio (Hg). in: Pareceres Técnicos dos Especialistas Setoriais—Aspectos Físicos/Bióticos. Relatório Meade, R.H., 1994. Suspended sediments of the modern Amazon de Análise do Conteúdo dos Estudos de Impacto Ambiental and Orinoco Rivers. Quaternary International 21: 29-39. (EIA) e do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) dos Aproveitamentos Hidrelétricos de Santo Antônio e Jirau Molina Carpio, J. 2007. Sobre el relatório preliminar de Sultan no Rio Madeira, Estado de Rondônia. Ministério Público Alam. 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Complexo Hidrelétrico RIO%20MADEIRA.htm do Rio Madeira: Estudos de Viabilidade do AHE Santo FURNAS (Furnas Centrais Elétricas S.A.), CNO (Construtora Antônio. Processo Nº 48500.000103/03-91. Relatório Noberto Odebrecht S.A.) Leme Engenharia. 2006. EIA- Final PJ-0532-V1-00-RL-0001), PCE, FURNAS, CNO, Estudo de Impacto Ambiental Aproveitamentos Hidrelétricas Rio de Janeiro, RJ. Disponível em: http://philip.inpa.gov. de Santo Antônio e Jirau, Rio Madeira-RO. Tomo E. br/publ_livres/Dossie/Mad/BARRAGENS%20DO%20 Complementação e Adequação às Solicitações do IBAMA. RIO%20MADEIRA.htm Atendimento ao Ofício No. 135/2006 de 24/02/06. 6315- RT-G90-002. FURNAS, CNO, Leme Engenharia, Rio de Shalash, S., 1983. Degradation of the River Nile, Parts 1 and 2. Janeiro, RJ. 3 Vols. Disponível em: http://philip.inpa.gov. Water Power and Dam Construction 35(7), 7-43 and 35(8), br/publ_livres/Dossie/Mad/BARRAGENS%20DO%20 56-58. 35, 37-43. RIO%20MADEIRA.htm Tavares, M, Fariello, D. 2013. 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Fevereiro de 2007. IIRSA (Iniciativa para la Integración de la Infraestructura Relatório para: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Regional de Sudamérica), 2007. IIRSA: Visión de negocios dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Brasília, D,. del eje Perú-Brasil-Bolivia. Initiative for the Integration 19 p. Disponível em: http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/ of the Regional Infrastructure of South America (IIRSA), Dossie/Mad/Documentos%20Oficiais/Ali%20Sultan%20 Washington, DC. 2007. 34 pp. Online. http://www.iirsa. report/sultan_relatorio_tucci.pdf Hidrelétricas na Amazônia 153 Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Capítulo 8 A Tomada de Decisão sobre Barragens na Amazônia: Política Vence a Incerteza na Controvérsia sobre os Sedimentos no rio Madeira Philip M. Fearnside Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). Av. André Araújo, 2936 - CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil. E-mail: pmfearn@inpa.gov.br Tradução de: Fearnside, P.M. 2013. Decision-making on Amazon dams: Politics trumps uncertainty in the Madeira River sedi- ments controversy. Water Alternatives 6(2): 313-325. 154 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO Madeira na Bolívia. O Brasil e os países vizinhos estão atualmente envolvidos em um programa mas- O rio Madeira, um afluente do rio Amazonas sivo de construção de barragens hidrelétricas em que drena partes da Bolívia, Peru e Brasil, tem uma seus territórios amazônicos. O plano de expansão de das mais altas cargas de sedimentos do mundo. As energia 2011-2020 do Brasil prevê 30 grandes bar- perguntas sobre como esses sedimentos afetariam as ragens adicionais a serem construídas ao longo deste hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, atualmente período de dez anos na Amazônia Legal, ou seja, em construção no Brasil, e como as barragens afeta- uma barragem a cada quatro meses (Brasil, MME, riam os fluxos de sedimentos, foram objeto de uma 2011: 285). O acordo Brasil/Peru, de 2010, pre- controvérsia prolongada associada ao licenciamen- vê cinco represas na Amazônia peruana, e mais de to ambiental das barragens. Pouco antes do licen- uma dezena de barragens adicionais estão em fase ciamento das barragens, o cenário oficial mudou de planejamento (International Rivers, 2011). No completamente daquele no qual os sedimentos se total, 80 barragens com capacidade instalada ≥ 100 acumulam rapidamente, mas poderiam ser conti- MW estão previstas nas porções amazônicas dos dos sem danos para a operação da barragem, para países andinos (Finer & Jenkins, 2012). O governo outro em que não haveria nenhuma acumulação brasileiro atua de forma consistente para expandir de sedimentos sequer. A incerteza deste cenário é a construção das barragens hidrelétricas. É relevan- muito elevada. Sobre pressão política, a equipe téc- te notar que, em janeiro de 2013, foram divulgados nica do departamento de licenciamento do Instituto pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) dados indi- Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos cando que os quatro principais contribuintes para Naturais Renováveis (IBAMA) foi substituída e as campanhas políticas ao longo do período 2002-2012 barragens foram construídas sem resolver uma série foram empresas empreiteiras que constroem barra- de controvérsias, incluindo a questão dos sedimen- gens e outras infraestruturas importantes (Gama, tos. Lições valiosas da controvérsia sobre sedimentos 2013). O licenciamento de Santo Antônio e Jirau no rio Madeira poderiam contribuir para melhorar ocorreu em um contexto de intensa pressão política a tomada de decisão sobre barragens e outros gran- sobre o Ministério do Meio Ambiente e o Instituto des projetos de infraestrutura no Brasil e em muitos Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos outros países. Naturais Renováveis (IBAMA) (ver: Switkes, PALAVRAS-CHAVE: 2008). Isso resultou na aprovação do licenciamento Barragens, Energia hidrelétrica, Hidrelétricas, Impacto apesar de a equipe técnica no IBAMA ter formal- ambiental, Santo Antônio, Jirau mente tomado uma posição contra a aprovação da licença sem um novo estudo de impacto ambiental (Deberdt et al., 2007). Todos os relatórios governa- INTRODUÇÃO mentais e documentos técnicos citados no presen- O Brasil tem duas grandes hidrelétricas em fase te trabalho estão disponíveis em http://philip.inpa. de conclusão no rio Madeira, um dos principais gov.br/publ_livres/Dossie/Mad/BARRAGENS% afluentes do Amazonas que drena partes do Brasil, 20do% 20RIO% 20MADEIRA.htm. Peru e Bolívia (Figura 1). A hidrelétrica de Santo Uma das questões no debate sobre a construção Antônio, com 3.150 MW de capacidade instalada, das barragens foi o efeito de sedimentos. Análise de está localizada a 7 km da cidade de Porto Velho, ca- como esta questão foi tratada no processo de licen- pital do Estado de Rondônia, enquanto a hidrelé- ciamento é importante como um contribuição para trica de Jirau, com 3.750 MW, está localizada 117 melhorar a tomada de decisões no Brasil e em mui- km a montante, no final do reservatório de Santo tas outras partes do mundo que enfrentam escolhas Antônio. O reservatório de Jirau se estende até a semelhantes de desenvolvimento. O objetivo deste fronteira do Brasil com a Bolívia em Abunã. Duas trabalho é extrair lições úteis a partir da história da barragens adicionais rio acima de Santo Antônio controvérsia sobre sedimentos e as barragens do rio e Jirau estão previstas: a hidrelétrica de Guajará- Madeira. O caso do Madeira é parte de uma tendên- Mirim (também conhecida como “Cachoeira cia no Brasil para a flexibilização das exigências am- Ribeirão”) no trecho binacional do rio Madeira bientais e abreviação do processo de licenciamento. entre Abunã e Guajará-Mirim, e a hidrelétrica de No entanto, a escala dos impactos de grandes proje- Cachuela Esperanza no rio Beni, um afluente do tos e o elevado grau de incerteza em que as decisões A Tomada de Decisão sobre Barragens na 155 Amazônia: Política Vence a Incerteza na Controvérsia sobre os Sedimentos no rio Madeira Figura 1. Locais mencionados no texto. são feitas indicam que o processo de licenciamento O primeiro cenário oficial: sedimentação deve ser reforçado ao invés de enfraquecido. controlável Os estudos de viabilidade de 2004 e 2005 (PCE A SEDIMENTAÇÃO E VIABILIDADE DAS et al., 2004, 2005) e os estudos de impacto ambien- BARRAGENS tal (EIA) de 2005 (FURNAS et al., 2005a, 2006) O rio Madeira tem uma das mais altas cargas de e o Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente (RIMA) (FURNAS et al., 2005b), conhecidos sedimentos em todo o mundo, com cerca de meta- conjuntamente como o “EIA/RIMA”, apresentam de do total dos sedimentos no rio Amazonas sendo resultados de modelagem indicando que os sedi- contribuído por este afluente (Meade, 1994; Filizola mentos se acumulam muito rapidamente nos reser- & Guyot, 2009; ver também Leite et al., 2011). No vatórios, com acumulação de sedimentos no pé das local da barragem de Jirau o rio Madeira transpor- barragens chegando até níveis 30 m acima do leito ta 2,1 milhões de toneladas de sedimentos por dia natural do rio em apenas dez anos (FURNAS et al., (PCE et al., 2004: Tomo 1, Vol. 1, p. 7.17). Este fato 2006: Tomo E, Vol. 1, p. 126). No entanto, os relató- é de grande importância tanto para a viabilidade em rios indicam que os sedimentos acumulados estabi- longo prazo das barragens como para os impactos a lizariam em níveis que poderiam ser mantidos sem montante e a jusante dos reservatórios. As questões afetar a operação das barragens para, pelo menos, relacionadas com os sedimentos são indicativas da 100 anos. Em abril de 2007, pouco antes da ministra elevada incerteza em que foram feitas as decisões do Meio Ambiente, Marina Silva, ceder à pressão sobre as barragens do rio Madeira. Questões sobre presidencial para facilitar a aprovação das barragens, sedimentos têm produzido uma série continuada de os proponentes (FURNAS, que é uma empresa mudanças de relatórios e declarações. que produz 40% da energia elétrica do Brasil e a 156 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Construtora Noberto Odebrecht (CNO), que é uma foram considerados nas entradas aos canais de adu- grande empresa de construção), de repente adotaram ção, como previamente explicado. Desta maneira, a posição de que não haveria nenhuma acumulação só os sedimentos suspensos, as frações menores, te- de sedimentos e que as duas barragens possuem uma rão acesso aos canais de adução e serão transporta- vida útil infinita (por exemplo, FURNAS & CNO, dos a jusante pelo fluxo nos canais e nas turbinas” 2007, p. 22). (FURNAS et al., 2006, Tomo E, Vol. 1, p. 25). Os planos iniciais presumiram que a retenção Em resposta às perguntas do IBAMA, de sedimentos seria baixa (mas não zero) com base FURNAS esclareceu ainda que, com a estabiliza- no grande fluxo de água e o pequeno volume do re- ção dos sedimentos acumulados abaixo da cota do servatório: 20% de retenção de sedimentos no iní- muro de retenção, “a vida útil da represa estará as- cio do projeto de Jirau, mas caindo para 1% após segurada” (FURNAS et al., 2006, Tomo E, Vol. 1. 15 anos e 0% após 30 anos (FURNAS et al., 2006, p. 130). Por outro lado, pode-se dizer que ultrapas- Tomo E, Vol. 1, p. 129-130). Quando a acumulação sar o muro de retenção representaria uma ameaça à de sedimentos no reservatório atinge um nível de vida útil da barragem. Teria sido, portanto, impor- equilíbrio, pressupõe-se que outros sedimentos que tante saber a probabilidade que isso pode ocorrer. entram no reservatório sejam canalizados para ju- A resposta às perguntas do IBAMA de 2007 mu- sante. O acúmulo de sedimentos no pé da barragem dou isso, afirmando que a ensecadeira submersa em foi projetado para aumentar ao longo de 30 anos, Santo Antônio seria removida para permitir que os estabilizando em 61,63 m acima do nível médio do sedimentos passem pelas turbinas (FURNAS & mar (MSL), no caso da barragem de Antônio Santo, CNO, 2007, p. 20). Em Jirau a ensecadeira também momento em que 52% do volume do reservatório era para ficar como um muro de retenção, mas em seriam perdidos pelo assoreamento (FURNAS et 2008 a empresa mudou este plano, informando ao al., 2006: Tomo E, Vol. 1, p. 129-130). A fim de evi- IBAMA que a ensecadeira seria completamente re- tar que estes sedimentos cheguem ao canal de adu- movida, a fim de facilitar o fluxo de sedimentos pela ção e as turbinas, um muro de retenção deveria ser barragem (Brasil, IBAMA, 2008a, p. 19). deixado no lugar, isto sendo parte da ensecadeira, que é um dique erguido durante a fase de constru- Uma vez que o estudo de viabilidade e o EIA/ ção para manter a água do rio fora do canteiro de RIMA calcularam um acúmulo de sedimentos com obras. O topo deste muro teria a uma altitude de estabilização esperada em 76,1 e 61,6 m acima do 63,00 m acima do nível do mar na crista do muro. nível do mar em Jirau e Santo Antônio, respecti- No entanto, a diferença de menos de 2 metros entre vamente, e as elevações das soleiras dos canais de o topo da pilha de sedimentos antecipados e a par- adução estão em 62,0 m acima do nível do mar em te superior do muro de retenção em Santo Antônio Jirau e 42,0 m em Santo Antônio, a acumulação de parece muito pequena, considerando as incertezas sedimentos seria como uma torre elevada sobre as prováveis no cálculo. O número de algarismos sig- entradas do canal de adução em 14,1 m (76,1 menos nificativos dados para a cota em que a acumulação 62,0) em Jirau e 19,6 m (61,6 menos 42,0) em Santo de sedimentos estabilizaria implica que este foi co- Antônio. Os primeiros 20-30 anos (quando o sedi- nhecido com uma precisão de um centímetro, o que mento grosso passando pelas turbinas será reduzido parece ser irreal. Nenhuma indicação do grau de pelo montante que teria sido depositado por trás certeza foi dada e testes de sensibilidade não foram das paredes de retenção) representaria um período apresentados. Nada foi dito sobre as consequências de relativamente fácil manutenção para os rotores que poderiam existir, caso que os sedimentos ultra- da turbina. O número de anos entre substituições passem o muro de retenção, que visava a “garantia dos rotores não foi indicado. Depois de estabilizar do não assoreamento das tomadas d’água durante o os sedimentos após 30 anos, com partículas de todas horizonte do estudo (100 anos)” (FURNAS et al., as dimensões sendo passadas através das turbinas, 2006, Tomo E, Vol. 1, p. 23). O relatório explica que: o efeito de abrasão seria maior. A taxa de descon-to aplicada aos futuros custos de manutenção, sem “A elevação dos sedimentos depositada ao pé dúvida, faz com que este fator tenha pouco peso no da represa poderia passar as soleiras dos canais de cálculo financeiro utilizado para justificar a constru- adução de ambas as barragens. Evitar o acesso de ção das barragens, mas este aumento de manutenção sedimento depositado (frações mais grossas) para representaria um custo que terá que ser suportado as unidades geradoras, elementos de construção pelos futuros usuários da energia. A Tomada de Decisão sobre Barragens na 157 Amazônia: Política Vence a Incerteza na Controvérsia sobre os Sedimentos no rio Madeira A carga de sedimentos transportada pelo rio Alam (2007) baseou sua análise na curva de Madeira não é constante, mas tem aumentado ao Brune (Brune, 1953), em vez de considerar o mo- longo dos anos - uma tendência que poderia ser espe- delo utilizado no EIA/RIMA: a versão de 2001 do rada pela continuação do desmatamento e da erosão modelo HEC-6 (versão atual: US Army Corps of na bacia. A taxa de aumento da carga de sedimentos Engineers, 2012). A curva de Brune fornece uma é presumida como sendo de 2% ao ano, um cálculo simples regra-de-ouro para avaliar o potencial mé- alternativo também é feito presumindo aumento de dio de sedimentação em reservatórios. É largamente 0% ao ano (FURNAS et al., 2006, Tomo E, Vol. 1, utilizada para o cálculo da eficiência aprisionamento p. 23). O aumento anual de 2% ao ano tem a inten- (a percentagem de sedimento retida no reservató- ção de representar a taxa observada de aumento na rio) por causa da simplicidade da curva: as únicas carga de sedimentos de 1,83% ao ano durante o pe- entradas requeridas são a vazão anual do rio, o vo- ríodo 1990-2001; durante o período de 1970-1990 lume do reservatório e uma classificação grosseira a carga de sedimentos não aumentou (FURNAS et de três níveis de diâmetro das partículas de sedi- al., 2006, Tomo E, Vol. 1, p. 116). O reservatório de mento. Realmente, é composta por uma família de Santo Antônio perde a metade da sua capacidade três curvas de gráficos sobre a eficiência de retenção de armazenamento depois de 22 anos considerando em função da razão entre a capacidade e a entra-3 o aumento da taxa de 2%, ou depois de 28 anos se da (e.g., m de volume do reservatório/m 3 de vazão nenhum aumento for presumido (FURNAS et al., anual). A curva superior representa a sedimentação 2006, Tomo E , Vol. 1, p. 23). Os mesmos períodos de partículas grossas, a curva inferior, representando de tempo (22 e 28 anos) se aplicam ao reservatório os sedimentos finos, e a curva do meio, que é a mais de Jirau (FURNAS et al., 2006, Tomo E, Vol. 1, p. frequentemente utilizada, representa uma mistura 25). Porque estas barragens a fio d’água dependem dos dois. A curva de Brune é descrito por Dunne do fluxo natural do rio, em vez de contar com a li- (2007) como uma “ferramenta muito aproximada”, que ele acredita que claramente não deve servir de beração do volume armazenado no reservatório, a base para decisões sobre algo tão importante como perda de volume não é intolerável a partir de um as barragens do rio Madeira. Os méritos e as incer- ponto de vista de fornecimento de água. Qualquer tezas de diferentes métodos para a previsão de re- impedimento ao funcionamento das estruturas das tenção de sedimentos por reservatórios são revisados barragens, no entanto, seria uma questão diferente. em Reid e Dunne (1996). Modelos mais comple- O segundo cenário oficial: nenhuma xos do encaminhamento dos sedimentos (tais como sedimentação FLUVIAL-12 [Chang, 2006]) são necessários para ter em conta os efeitos não lineares, tais como os Perguntas sobre sedimentação levaram o causados por irregularidades no caminho de canal Ministério das Minas e Energia a contratar um e no perfil vertical, bem como os compartimentos consultor internacional para produzir um relatório e outras características ao longo das margens do rio sobre o problema (Alam, 2007). Quando o relató- (Dunne, 2007). rio foi lançado em abril de 2007, Dilma Rousseff Alam (2007) argumentou que a curva inferior, (então ministra-chefe da “Casa Civil” do Brasil correspondendo aos sedimentos finos (<0,25 mm de e hoje Presidente da República) aclamou o docu- diâmetro), deve ser utilizada para as barragens do mento como demostrando que o problema de se- rio Madeira. No entanto, o rio Madeira transporta, dimentos poderia ser “descartado” (Peixoto, 2007). anualmente, aproximadamente 3,75 × 106 tonela- Infelizmente, o relatório não deu um aval desse tipo, das de sedimentos na faixa de 1-3 mm de diâme- mas sugeriu uma reformulação completa da barra- tro, além de um valor adicional na faixa de 0,25-1 gem de Santo Antônio e recomendou que um mo- mm (Alam, 2007, p. 8). Embora não mencionado delo físico da barragem e do reservatório seja cons- por Alam (2007), se os procedimentos da curva de truído para testar como os sedimentos podem-se Brune padrão forem aplicados a estes sedimentos, acumular. Além disso, o relatório só diz respeito à teria de ser aplicada a curva do meio ou a curva su- barragem de Santo Antônio, e não a barragem de perior a eles, e em nenhum desses casos a quanti- Jirau, onde os efeitos de sedimentos são ainda mais dade de sedimentos presos seria zero nas barragens controversos por causa de seus impactos potenciais do Madeira. Alam (2007) utiliza uma justificativa sobre a Bolívia. diferente para os sedimentos mais grossos, ou seja, 158 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras que os fluxos de pico iriam liberá-los. Para o movi- Assim, a previsão correta é de que todos os se- mento da areia, Alam (2007, p. 22) utilizou cálculos dimentos do rio Madeira continuarão a ser trans- baseados em equações de Rouse. Este procedimento portados a jusante, mesmo após a construção dos é criticado por Dunne (2007), que escreve: barramentos de Jirau e de Santo Antônio” (Tundisi “Eu não achei que a análise de equação de Rouse et al., 2007, p. 4). feita por Alam fosse útil para analisar o destino pro- Durante os dias críticos em 2007, quando a vável dos represamentos. Embora com base numa pressão estava aumentando para aprovar as barra- equação relativamente bem estabelecida, a análise gens, Sultan Alam foi convidado a subscrever as bar- de Alam não leva em conta a amplitude e duração ragens como livre de limitações de sedimentos. A do controlador principal sobre o transporte de sedi- correspondência, via e-mail, com Alam é reproduzi- mentos, que é o regime de fluxo”. da como prova de seu apoio, na resposta dos propo- nentes aos questionamentos do IBAMA (FURNAS A nota técnica escrita para os proponentes por & CNO, 2007, Anexo IV). O e-mail de Alam diz: Tundisi et al. (2007, p. 7) resume os resultados da curva de Brune como se segue: “PARA QUEM POSSA INTERESSAR. Eu, Sultan Alam, consultor independente, certifico que “A análise independente realizada pelo Dr. concordo plenamente com o texto em Português Sultan Alam corrobora a observação de que o uso respondendo várias perguntas feitas pelo IBAMA. da envoltória inferior da curva de Brune aplicada ao Sultan Alam, 10 de maio de 2007”. caso de sedimentos finos do Rio Madeira prevê re- tenção zero de sedimentos, ou seja, inexistência de Embora seu e-mail mencione que o documen- assoreamentos permanentes que provoquem a so- to que estava endossando era escrito em Português bre-elevação futura de níveis d’água por motivo de (que não é uma língua que ele fala), pode-se supor deposição de sedimentos”. que o conteúdo do texto de 239 páginas foi adequa- damente explicado a ele, particularmente as notas A nota técnica estende a conclusão de Alam até técnicas relevantes (Carvalho et al., 2007; Tundisi Abunã (ou seja, incluindo Jirau): et al, 2007). As notas técnicas em questão são, em “A análise realizada pelo consultor Dr. Sultan grande parte, dedicadas à usina de Jirau (especial- Alam permitiu concluir que o trecho do Rio Madeira mente para as questões que envolvem a Bolívia), ao entre Abunã e Porto Velho tem capacidade de trans- invés da barragem de Santo Antônio, que foi o tema portar praticamente todo o sedimento do rio Madeira, do relatório do consultor Alam (2007). O relatório mesmo com a construção dos projetos de Jirau e de do consultor (p. 4) indica que a visita de Alam (15- Santo Antônio. Os sedimentos finos (argilas, siltes e 17 de dezembro de 2006) foi confinada aos primei- parte das areias com diâmetro < 0,25 mm), mesmo ros 17 km do futuro reservatório de Santo Antônio. com reservatórios, serão transportados em suspensão O endosso feito por Alam foi um fator-chave na ou saltitação, de forma contínua pela elevada capa- anulação das preocupações levantadas pelo IBAMA. cidade de transporte em todos os meses do ano. Os Deve-se notar que, apesar de Sultan Alam ser repe- sedimentos de maiores dimensões serão igualmente tidamente referido na imprensa brasileira como “o transportados durante os meses de cheias (pelo me- consultor do Banco Mundial”, ele não estava traba- nos 4 meses do ano) quando são mobilizados, como lhando nessa qualidade aqui (nem deve o seu relató- ocorre atualmente.” (Tundisi et al., 2007, p. 4). rio ser considerado como representando um parecer do Banco). No entanto, o Banco Mundial empres- As novas notas técnicas afirmam que não have- tou ao Ministério de Minas e Energia um “pacote” ria acumulação de sedimentos na parte superior do de US$250.000 para contratar consultores, um dos reservatório de Jirau (e, consequentemente, a forma- quais era Sultan Alam (Salomon, 2007). ção de um remanso afetando a Bolívia): “Pelas características dos reservatórios, clas- OPINIÃO DE ESPECIALISTAS E OS CENÁ- sificados como “ reservatórios – calhas”, não serão RIOS OFICIAIS formadas ‘deltas’ por sedimentação a montante dos reservatórios. Tal condição ocorre nos reservatórios A elevada incerteza sobre sedimentos e seus im- de acumulação e não nos típicos ‘a fio d’água’ com pactos é indicada pelas opiniões de uma série de es- elevados gradientes de energia. pecialistas que examinaram os diferentes relatórios. A Tomada de Decisão sobre Barragens na 159 Amazônia: Política Vence a Incerteza na Controvérsia sobre os Sedimentos no rio Madeira Carlos Tucci (2007, p. 15), em um relatório enco- (FURNAS & CNO, 2007, Anexo IV). No entanto, mendado pelo consultor IBAMA, achou os resul- a 18.000 m3/s, apenas partículas de até 0,5 mm de tados do modelo HEC-6 no EIA/RIMA “incon- diâmetro seriam transportadas através do reservató- sistentes”. Por exemplo, o modelo dá o resultado rio (Alam, 2007, p. 39). “estranho” indicando que alguns trechos do rio a se- rem inundados pelo reservatório de Santo Antônio Thomas Dunne (2007), num parecer para a teriam mais sedimentação no rio não-represado ONG, Rios Internacionais, afirmou que a curva de do que com o reservatório (Tucci, 2007, p. 11). Ele Brune que Alam (2007) usou para concluir que os também considerou “aparentemente arbitrário” um reservatórios não acumularão sedimentos em uma ajuste para baixo de 30% que o EIA/RIMA aplicou base anual é menos adequada do que as simulações à saída do modelo para a sedimentação (Tucci, 2007, do movimento de sedimentos feitas com o modelo p. 11). Concluiu que eram necessários mais estudos HEC-6, que foram a base das conclusões do estu- dos sedimentos e pediu a formação de um painel do de viabilidade e EIA/RIMA. Dunne também internacional de peritos para examinar o problema apontou o alto grau de incerteza na informação so- (Tucci, 2007, p. 15). bre os tamanhos das partículas de sedimentos, espe-cialmente o percentual de areia na carga suspensa, José Tundisi e Takako Matsumura-Tundisi bem como a falta de informação sobre métodos de (2006), em um parecer para o Ministério Público amostragem (por exemplo, medidas com uma mé- do Estado de Rondônia, chamaram atenção para dia para o perfil vertical versus um cálculo a partir a incoerência entre as diferentes estimativas de se- de amostras de superfície). Ele também enfatizou a dimentos em suspensão versus a carga leito do rio falta de uma análise de incerteza. Além disso, no que Madeira e a dependência das conclusões do EIA/ diz respeito à conclusão do Alam que todos os se- RIMA no valor único que os autores desse docu- dimentos acumulados durante os períodos de baixo mento optaram por usar: “[T]odo o cálculo de se- fluxo serão carregados pelos fluxos de pico, Dunne dimentação realizado pelos projetistas é baseado na (2007) afirma que “simplesmente não é adequada proporção de 95% de carga suspensa para 5% no lei- para fazer julgamentos qualitativos a respeito do to do rio”. Tundisi e Matsumura-Tundisi apontaram efeito líquido sobre o acúmulo de sedimentos de vários fatores que podem aumentar sedimentos e muitos dias de baixo fluxo e um número menor de pediram informações sobre as fontes de sedimentos dias de alto fluxo”. em toda a bacia a montante das barragens. Mais tar- de, José Tundisi (2007) endossou a análise de curva de Brune feita por Alam indicando que não have- IMPACTOS DE BARRAGENS ria acumulação de sedimentos (FURNAS & CNO, 2007, Anexo III). Sedimentação e inundações no remanso superior Jorge Molina Carpio (2007) criticou o relatório do consultor Alam (2007) por ter presumido que o A deposição de sedimentos na extremidade su- rio Madeira tem um fluxo de mais de 40.000 m3/s perior do reservatório de Jirau é de particular pre- durante 1,5 a 2 meses por ano (Alam, 2007, p. 20), ocupação. Quando a água a partir de um rio entra permitindo que os sedimentos com até 3 mm de diâ- num reservatório, a velocidade da água diminua metro sejam levados do reservatório (Alam, 2007, p. subitamente e as maiores partículas suspensas pre- 8). No entanto, Molina Carpio (2007) apontou que cipitam para o fundo. Ao mesmo tempo, as partícu- os fluxos nesse ritmo duram, em média, apenas 1,5 las maiores na carga do leito (por exemplo, a areia semanas por ano, e que esses grandes fluxos, muitas grossa) param de se deslocar e formam bancos de vezes, são ausentes por períodos de vários anos, o areia. Grandes acumulações de material geralmente que significa que os sedimentos se acumulariam no formam nas extremidades superiores de reservató- reservatório além da quantia na qual os breves picos rios, mesmo em rios onde a quantidade de sólidos de fluxo poderiam remover. Em março de 2007, uma transportada é apenas uma pequena fração da quan- revisão dos dados de fluxo reduziu substancialmente tidade encontrada no rio Madeira. O acúmulo de a estimativa da frequência de ocorrência de vazões sedimentos atua como uma espécie de barragem, re- médias mensais muito altas (PCE et al., 2007, p. 11). presando a água no trecho do rio logo acima do re- Alam afirmou depois que um fluxo de apenas 18 mil servatório propriamente dito. Ao contrário de sedi- m3/s seria suficiente para expulsar os sedimentos mentação no interior do reservatório propriamente 160 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras dito, que, eventualmente, atinge um equilíbrio além para desovarem nas cabeceiras no Peru e na Bolívia do qual não há mais acumulo de sedimento, a depo- (Barthem & Goulding, 1997; Fearnside, 2009). A sição do remanso atrás da acumulação de sedimen- população de pescadores depende do rio, incluin- tos na extremidade superior do reservatório con- do 2.400 membros de cooperativas de pesca só na tinuará a crescer cada vez mais a montante, assim parte brasileira do rio (Ortiz et al., 2007). Outros continuamente ampliando o remanso (e.g., Morris impactos incluem desmatamento estimulado pelas & Fan, 1998). O remanso terá níveis de água mais barragens, tanto pela população deslocada pelos re- altos do que o natural do rio, causando inundação servatórios ou atraída pelas obras, assim como pela lateralmente a partir do remanso superior. Este, por agricultura estimulada por hidrovias planejadas (por exemplo, é uma das preocupações com a Barragem exemplo, Vera-Diaz et al., 2007; Escada et al., 2013). das Três Gargantas, na China, onde o remanso su- Apesar das hidrovias terem sido excluídas de con- perior aumenta as inundações em partes ribeirinhas sideração nos estudos de impacto ambiental, essas de Chongqing, uma das maiores cidades do mundo barragens são fundamentais nos planos para tornar (Lucas & Whitney, 1990, p. 83-84). No caso do rio o rio Madeira e seus afluentes navegáveis para o trá- Madeira, a cidade a ser afetada é Abunã. As inunda- fego de barcaças. Hidrovias seriam construídas até ções também afetariam terras na Bolívia, localizado as áreas de sojicultura no Estado de Mato Grosso e do outro lado do rio a montante de Abunã, incluin- em grande parte do norte da Bolívia. Mais de 4.000 do a área protegida Bruna Racua/Frederico Román. km de hidrovias estão planejados na Bolívia, abrin- Tanto o EIA (FURNAS et al., 2005, Tomo 1, Vol. 1, do vastas áreas de floresta para conversão em soja p. 7-103; FURNAS et al., 2006, Vol. 1, p. 13) e estu- (i.e., PCE et al., 2002; Killeen, 2007). O desmata- do de viabilidade (PCE et al., 2004, Tomo 1, Vol. 1, mento e a perda de habitats aquáticos e terrestres da p. 1.6 & 7-103; PCE et al., 2005, Tomo A, Vol. 7, p. inundação pelos reservatórios afetam a biodiversi- VII-15-16) afirmam enfaticamente que nem Abunã dade nesta área altamente diversificada (Fearnside, nem Bolívia serão afetadas, mas não levam em conta 2006). Outra preocupação é a metilação de mercúrio qualquer efeito potencial da sedimentação esperada em sedimentos anóxicos nos afluentes, onde muitas na parte superior do reservatório. toneladas de mercúrio foram depositadas durante Simulações com o modelo HEC-6 indicam o boom de mineração de ouro na década de 1980 uma sedimentação substancial no trecho binacional (Forsberg & Kemenes, 2006). A metilação converte do rio Madeira depois de 50 anos, mesmo se o reser- mercúrio metálico na forma que é extremamente tó- vatório de Jirau fosse operado em um nível normal xica para os seres humanos e outros animais. de 87 m acima do nível do mar, ou 3 m abaixo do Ambos Santo Antônio e Jirau têm pedidos aprova- nível de 90 m esperado para a maior parte do ano dos para crédito de carbono no âmbito do Mecanismo (PCE, 2007, p. 6.32). Esta sedimentação elevaria o de Desenvolvimento Limpo do Protocolo de Quioto nível do leito do rio Madeira na foz do rio Abunã, (MDL). Estes, como muitos projetos de MDL para as criando assim um efeito de represamento que ele- hidrelétricas, representam um retrocesso nos esforços varia os níveis de água no rio Abunã também. O para combater o aquecimento global, porque as barra- rio Abunã é binacional, fazendo parte da fronteira gens seriam construídas independentemente dos pro- entre Brasil e Bolívia. Efeitos neste rio não foram jetos de carbono (Fearnside, 2013a). As consequências incluídos no estudo de viabilidade e no EIA/RIMA. sociais, além de eliminar a principal fonte de subsis- Impactos não-sedimentológicos tência para a população local, incluem realocar cidades e moradores rurais. Também há impactos urbanos de A questão dos sedimentos do rio Madeira, que migração para a construção da barragem, como eram é o tema deste artigo, é apenas uma das muitas con- esperados antes do início da obra (Instituto Pólis, 2006). trovérsias que cercam a decisão de construir barra- Há possíveis impactos adicionais sobre os povos indí- gens no rio Madeira e da maneira em que as obras genas nas proximidades, incluindo vários grupos “iso- foram licenciadas. Um dos impactos esperados das lados” (Algayer et al., 2008; Zagallo & Lisboa, 2011). barragens, embora não seja reconhecido oficialmen- te, é a perda de grande parte da produção pesqueira TOMADA DE DECISÃO do rio Madeira, o mais importante sendo os gran- des bagres (especialmente Brachyplatatystoma rou- O licenciamento ambiental de barragens no xeauxii e B. vaillantii) que sobem o rio a cada ano Brasil passa por uma série de etapas. A licença A Tomada de Decisão sobre Barragens na 161 Amazônia: Política Vence a Incerteza na Controvérsia sobre os Sedimentos no rio Madeira prévia permite a licitação a ser realizada para o pro- de maio de 2009, a equipe técnica do IBAMA emi- jeto de construção, seguido por uma licença de ins- tiu um parecer de 127 páginas contra a aprovação da talação permitindo que as estruturas físicas sejam licença de instalação porque 12 das 32 condicionan- construídas, e uma licença de operação permitindo tes não foram cumpridas (Brasil, IBAMA, 2009). que a energia a seja gerada. O Estudo de Impacto Apenas oito dias depois, o mesmo chefe do IBAMA Ambiental (EIA) foi feito em conjunto por Santo emitiu a licença de instalação para Jirau em 03 de Antônio e Jirau (FURNAS et al., 2005b). Estudos junho de 2009 (Franco, 2009). Em 29 de junho de complementares foram concluídos no ano seguinte 2009, o Ministério Público Federal no Estado de (FURNAS et al., 2006). Em 21 de março de 2007, Rondônia entrou com uma ação civil pública contra o corpo técnico do IBAMA apresentou um parecer o chefe do IBAMA por improbidade administrati- de 221 páginas para o chefe do Departamento de va no licenciamento das barragens do rio Madeira. Licenciamento recomendando que seja necessário A ação afirmava que: “A Licença de Construção um novo EIA (Deberdt et al., 2007). Apenas dois no. 621/2009 emitida pelo Presidente Nacional do dias antes, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva IBAMA, contrariando a Constituição Federal, a Lei afirmou que ele teria uma reunião “muito dura” com de Licitações, o Devido Processo Legal Ambiental, a Ministra do Meio Ambiente para pressionar para Princípios de Legalidade e Moralidade, encerra um a aprovação rápida das barragens (OESP, 2007). Em dos maiores crimes ambientais impostos à sociedade ...” 30 de março de 2007, o chefe do Departamento [Ênfases no original] (MPF-RO & MPE-RO, de de Licenciamento emitiu uma ordem que solicitou 2009, Seção 2.1, veja: Zagallo & Lisboa, 2011). O algumas informações adicionais dos proponentes, processo foi julgado improcedente pela Advocacia mas rejeitou a necessidade de um novo EIA (Kunz Geral da União (AGU) em 16 de dezembro de Júnior, 2007). Nos dias 12 e 23 de abril de 2007 a 2009, como é o destino de muitos processos tais equipe técnica apresentou uma série de perguntas como esse. A construção das duas barragens já está sobre as muitas lacunas remanescentes nos estudos quase completa, a geração de energia pelas primeiras de impacto ambiental (Brasil, IBAMA, 2007a,b; turbinas de Santo Antônio começou em dezembro Franco & Campos, 2007). A resposta de 239 pá- de 2011 e de Jirau em setembro de 2013. ginas em 11 de maio de 2007 (FURNAS & CNO, 2007) foi, em grande parte, um “corte-e-cola” de tre- chos do EIA. Coincidindo com a apresentação de CONCLUSÕES questões por parte do pessoal técnico em abril de 2007, o chefe do Departamento de Licenciamento Questões permanecem não resolvidas sobre foi removido de seu posto. Em 04 de julho de 2007 o efeito de sedimentos sobre o funcionamento, os a pessoa que o substituiu emitiu um “parecer defi- custos de manutenção e os impactos ambientais nitivo”, que reafirmou a rejeição da exigência de um das barragens do rio Madeira e os efeitos das bar- novo EIA e declarou como resolvido uma série de ragens sobre o sedimento e fluxos de nutrientes para questões pendentes, incluindo a dos sedimentos os ecossistemas a jusante. Estas questões não foram (Franco, 2007). A licença prévia foi concedida em 09 devidamente resolvidas antes de licenciar as hidrelé- de julho de 2007. A mesma pessoa que aprovou a li- tricas de Santo Antônio e Jirau. cença prévia na condição de chefe do Departamento A tomada de decisão sobre grandes projetos de de Licenciamento foi, posteriormente, promovida a infraestrutura, como barragens, requer a aplicação chefiar o IBAMA como um todo, e, nessa função, dos instrumentos técnicos mais completos disponí- aprovou a licença de instalação para a hidrelétrica veis, incluindo a avaliação da magnitude das incer- de Santo Antônio em 13 de agosto de 2008 (Franco, tezas e as consequências das mesmas. A interpre- 2008). Isso aconteceu apenas cinco dias após a equi- tação dos resultados dessas análises deve ser isenta pe técnica ter formalmente se posicionado contra a de conclusões pré-determinadas. Esses princípios concessão da licença de instalação em um parecer de são comprometidos quando as pressões políticas são 146 páginas, porque a maioria das 33 “condicionan- aplicadas para acelerar o processo de aprovação e tes” que tinham sido estipuladas como exigências para garantir que as decisões que foram tomadas por não foram cumpridas (Brasil, IBAMA, 2008b). razões não técnicas sejam ratificadas. Uma sequência semelhante de eventos ocorre- Apesar de existir uma tendência no Brasil para rem no licenciamento da barragem de Jirau: em 25 a flexibilização das exigências ambientais e para a 162 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras abreviação do processo de licenciamento, a escala Brasil, IBAMA. 2008. Parecer Técnico No. 45/2008-COHID/ dos impactos de grandes projetos e do elevado grau CGENE/DILIC/IBAMA de 08 de maio de 2008. de incerteza em que as decisões são feitas indicam Assunto: Análise da solicitação da emissão da Licença que o processo de licenciamento deve preferivel- de Instalação do Aproveitamento Hidrelétrico de Santo Antônio. Brasília, DF, Brasil: Instituto Brasileiro do Meio mente ser reforçado. Estas lições também se aplicam Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). a muitos outros países. Disponível em: http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/ Dossie/Mad/Documentos%20Oficiais/IBAMA_parecer_ tecnico_45_2008_li_st_antonio%5b-08-08-08.pdf AGRADECIMENTOS Brasil, IBAMA. 2009. Parecer Técnico Nº 039/2009 – COHID/ Apoio financeiro foi fornecido pelo Conselho CGENE/DILIC/IBAMA de 25 de maio de 2009. Assunto: Nacional do Desenvolvimento Científico e Análise da solicitação da emissão da Licença de Instalação do Aproveitamento Hidrelétrico de Jirau. Brasília, DF, Brasil: Tecnológico (CNPq: Proc. 573810/2008-7, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos 304020/2010-9), Instituto Nacional de Pesquisas da Naturais Renováveis (IBAMA). Disponível em: http://www. Amazônia (INPA: PRJ15.125) e Ministério Público ibama.gov.br/licenciamento/index.php Federal do Estado de Rondônia. Agradeço a todos Brasil, IBAMA. 2008. COHID/CGENE/DILIC/IBAMA, Parecer aqueles que forneceram informações e que ajuda- Técnico No. 061/2008 de 03 de novembro de 2008. Assunto: ram com apoio logístico nos locais das barragens e Análise dos documentos relativos às implicações ambientais em Porto Velho, entre eles Francisco Pereira, Artur da modificação do eixo da Cachoeira de Jirau para a Ilha do de Souza Moret, Wanderley Rodrigues Bastos, Padre (Cachoeira do Inferno) da UHE Jirau. Brasília, DF, Brasil: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Ronaldo Cavalcante de Oliveira, Iremar Antônio Naturais Renováveis (IBAMA). Disponível em: http://www. Ferreira e Carolina Carneiro Fonseca, bem como energiasustentaveldobrasil.com.br/arquivos/33.pdf aqueles em orgãos federais, e residentes estaduais e Brasil, MME. 2011. Plano Decenal de Expansão de Energia 2020. municipais na região das barragens. Agradeço Paulo Brasília, DF, Brasil: Ministério das Minas e Energia (MME), M.L.A. Graça pelos comentários. Toda a responsa- Empresa de Pesquisa Energética (EPE). 2 vols. Disponível em: bilidade pelo conteúdo do artigo recai sobre o autor. http://www.epe.gov.br/PDEE/20120302_1.pdf Esta é uma tradução de Fearnside (2013b). Brune, G.M. 1953. Trap efficiency of reservoirs. Transactions of the American Geophysical Union 34(3), 407-418. LITERATURA CITADA Carvalho, N.O., Salgado, J.C.M., Cadman, J.D. & Madeira, E.F. 2007. Nota Técnica 26 de março de 2007. Assunto: Alam, S. 2007. Rio Madeira Project: Hydraulic and Sediment Parecer Técnico No. 014/2007-COHID/CGENE/DILIC/ Management Studies. Brasília, DF, Brazil: Ministério das IBAMA, de 21 de março de 2007. Anexo II, pp. 1-11. In: Minas e Energia. Disponível em: http://philip.inpa.gov. FURNAS & CNO. Respostas às Perguntas Apresentadas br/publ_livres/Dossie/Mad/BARRAGENS%20DO%20 Pelo IBAMA no Âmbito do Processo de Licenciamento RIO%20MADEIRA.htm Ambiental do Complexo Madeira, Informações Técnicas Nos 17, 19 E 20/2007 COHID/CGENE/DILIC/IBAMA. Algayer, A., Vaz, A. & Silveira, E. 2008. Atividades previstas para Rio de Janeiro, RJ, Brasil: Furnas Centrais Elétricas S.A. as regiões onde há referências de índios isolados que terão (FURNAS) & Construtora Noberto Odebrecht S.A. (CNO). influência da UHE Santo Antônio. 14 de julho de 2008. Brasília, Disponível em: http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/Dossie/ DF, Brasil: Diretoria de Assistência, Coordenação Geral dos Mad/BARRAGENS%20DO%20RIO%20MADEIRA.htm Índios Isolados (CGII), Fundação Nacional do Índio. Chang, H.H. 2006. Generalized Computer Program. 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Water Alternatives 7(1): 154-167. 168 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO toda a região. O Tribunal de Contas Eleitorais (TCE) divulgou dados que indicam que, no período As decisões sobre a construção de barragens 2002-2012 as quatro maiores contribuintes para as hidrelétricas serão fundamentais na definição do campanhas políticas no Brasil eram as empreitei- futuro da Amazônia, onde as barragens planejadas ras que constroem grandes obras de infraestrutura, converteriam a maior parte dos afluentes em cadeias tais como barragens (Gama, 2013). A força política de reservatórios. As hidrelétricas de Santo Antônio e financeira por trás deste desenvolvimento podem e Jirau, atualmente em fase de conclusão no rio afetar as políticas ambientais. Madeira, criaram precedentes perigosos em uma tendência de enfraquecimento da proteção ambien- Muita coisa mudou na tomada de decisão no tal no Brasil. Nomeados políticos rejeitaram os pa- Brasil ao longo dos anos desde 1986, quando gran- receres da equipe técnica do Instituto Brasileiro do des projetos de infraestrutura, como estradas e bar- Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis ragens, começaram a ser obrigados a ter um Estudo (IBAMA), que é responsável por avaliar o Estudo de de Impacto Ambiental (EIA) e um Relatório de Impacto Ambiental (EIA) e para o licenciamento Impacto sobre o Meio Ambiente (RIMA), que são barragens. Licenças de instalação foram concedidas conjuntamente conhecidos como o “EIA/RIMA”. sem satisfazer muitas das “condicionantes” que ti- O sistema de tomada de decisão é um fator chave nham sido estabelecidos como pré-requisitos. Este na determinação dos problemas ambientais e sua aspecto, junto com vários outros do processo de li- gestão em todo o mundo, e o impacto das decisões cenciamento para as barragens do rio Madeira, já tomadas é especialmente grande em lugares onde os foi repetido em licenciar a polêmica hidrelétrica de ecossistemas são ainda relativamente pouco afetados Belo Monte, no rio Xingu. O Brasil planeja cons- pelo “desenvolvimento”, como na região amazônica truir 18 grandes barragens na sua região amazônica do Brasil. Represas tropicais em todo o mundo são em uma década, e outras estão a serem financiadas conhecidas por seus efeitos particularmente graves e construídas pelo Brasil em Peru, Bolívia, Equador (WCD, 2000; Moore et al., 2010). e Guiana. Estes planos afetar praticamente todos O EIA/RIMA é visto pelos proponentes de os recursos hídricos em uma área maior do que a projetos de desenvolvimento como um impedimen- Europa Ocidental. As barragens do rio Madeira in- to para a implementação de obras públicas necessá- dicam a necessidade de reformar o processo de to- rias, colocando os proponentes contra o Ministério mada de decisão no Brasil. do Meio Ambiente (MMA), que é legalmente res- Palavras-chave: barragens, hidrelétricas, impacto am- ponsável pela supervisão e aprovação dos relatórios. biental, política energética, Amazônia Pressões dentro do governo são comuns para abre- viar o processo de aprovação de projetos, apesar de ter relatórios inadequados e/ou ter impactos despro- INTRODUÇÃO porcionalmente grandes (e.g., O Globo, 2007). Plano de expansão de energia do Brasil para O licenciamento ambiental de barragens no 2013-2023 prevê 18 grandes barragens adicionais na Brasil prossegue através de uma série de etapas região da Amazônia Legal até 2023 (Brasil, MME, (World Bank, 2008). Primeiro, um estudo de inven- 2013, p. 84-85). O acordo Brasil-Peru de 2010 prevê tário é elaborado para a bacia hidrográfica. Depois, cinco barragens no Amazônia peruana a serem fi- um estudo de viabilidade é preparado para cada nanciadas pelo Banco Nacional do Desenvolvimento barragem, seguido pelo EIA/RIMA. Uma vez que Econômico e Social (BNDES), em grande parte o documento inicial do EIA/RIMA é aprovado, as para a exportação de energia elétrica para o Brasil audiências públicas são realizadas nas áreas afetadas, (ver Finer & Jenkins, 2012). Financiamento do modificações são feitas no documento, e o EIA/ BNDES também está previsto para muitas barra- RIMA final é aprovado. Em seguida, uma Licença gens adicionais no Peru, Bolívia, Equador e Guiana Prévia deve ser concedida antes de os contratos se- (Fearnside, 2014a, b). Estas usinas têm o potencial rem liberados para a licitação das empresas de cons- para afetar os ecossistemas aquáticos em pratica- trução. Uma Licença de Instalação deve, então, ser mente todas as bacias hidrográficas na Amazônia. obtido antes que o trabalho de construção pode co- Eles também afetam infraestrutura rodoviária, o meçar, e uma Licença de Operação deve ser obti- movimento de população e o desmatamento em da antes de uma barragem poder gerar energia. Na As Barragens do Rio Madeira: 169 Um Revés para a Política Ambiental no Desenvolvimento da Amazônia Brasileira prática, na media em que o projeto avança por esses ambiental), incluindo explicitamente os “a requeri- estágios e grandes quantidades de dinheiro (e de mento do Ministério Público”, se travar um projeto capital político) são investidas no projeto, torna-se causaria lesão à economia pública (Lei no. 8.437 de cada vez mais improvável que grandes mudanças se- 30 de junho de 1992). Estas leis têm sido usadas riam feitas, especialmente uma opção “sem projeto”. repetidamente para justificar ignorando objeções A lei de “suspensão de segurança” (Lei No. 4.348 de às barragens, independentemente dos impactos e 26 de junho de 1964), ainda válida desde a época da da documentação de irregularidades (por exemplo, ditadura, permite suspender a execução de qualquer Fearnside & Barbosa, 1996). liminar “para evitar grave lesão à .... economia públi- O rio Madeira (Figura 1) é o local de duas bar- ca”. Este foi ampliado em 1992 para permitir que os ragens que estão atualmente em construção e que juízes anulassem quaisquer liminares (como aqueles resultaram em intensa polêmica no Brasil sobre o baseados em violações das normas de licenciamento EIA/RIMA: Santo Antônio, com 3.150 MW de Figura 1. Locais mencionados no texto. 170 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras capacidade instalada, e Jirau, com 3.750 MW. Em os de represas amazônicas “tradicionais”, tais como 2005, o EIA/RIMA para o complexo das duas bar- Balbina, Samuel, Curuá-Una e Tucuruí. A hidrelé- ragens foi apresentado ao Instituto Brasileiro do trica de Belo Monte, em construção no rio Xingu, Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis é também uma barragem a fio d’água com um re- (IBAMA), órgão vinculado ao Ministério do servatório pequeno em relação à capacidade instala- Meio Ambiente responsável pelo licenciamento da, mas nesse caso uma relação favorável da área de (FURNAS et al., 2005a,b). O estudo de viabilida- capacidade não depende da ficção que apenas uma de, o EIA/RIMA e outros documentos técnicos do barragem seria construído (Fearnside, 1996, 2006a). governo citados neste artigo estão disponíveis em Ao contrário de Belo Monte, no caso das barragens http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/Dossie/Mad/ de Santo Antônio e Jirau não é necessário o arma- BARRAGENS%20do%20RIO%20M ADEIRA. zenamento de água a montante em represas adicio- htm. Em 2006, a nacionalização de operações nais para justificar a potência instalada prevista. A brasileiras de gás na Bolívia pelo presidente Evo vazão muito alta do rio Madeira, combinado com Morales, combinada com cortes no fornecimento os pequenos volumes dos reservatórios, resulta em de gás da Bolívia, levou a uma pressão acrescida so- tempo de substituição excepcionalmente rápido, o bre o Ministério do Meio Ambiente para aprovar que implica em uma melhor qualidade de água do as barragens do rio Madeira, independentemente de que em reservatórios amazônicos existentes. Estas problemas não resolvidos. características positivas têm sido frequentemente apresentadas como significantes que o impacto das O objetivo deste trabalho é extrair lições para o barragens seria mínimo. Infelizmente, as barragens processo de tomada de decisão que pode ser aplicada têm grandes impactos ambientais. para o fortalecimento tomada de decisão ambiental em todo o Brasil. As barragens do rio Madeira têm turbinas do tipo bulbo, que podem ser operados sem a grande queda de barragens altas tradicionais usando tur- OS PLANOS PARA AS BARRAGENS DO RIO binas Kaplan ou Francis. A tecnologia a fio d’água MADEIRA com turbinas bulbo representa uma melhoria, mas não é a tecnologia benigna, quase sem impacto, su- Os planos para barragens no rio Madeira têm gerida pelos proponentes do projeto. Documentos evoluído ao longo do tempo e foram submetidos e apresentações sobre as barragens têm utilizado a mudanças bruscas de sua prioridade. No “Plano uma fotografia de uma hidrelétrica no rio Danúbio, 2010”, lançado em 1987, uma única grande bar- na Europa, sem reservatório ou queda perceptível ragem seria indicada no trecho de 254 km do rio (por exemplo, ARCADIS Tetraplan et al., 2005, p. que hoje é ocupado pelos reservatórios de Santo 116; PCE et al., 2005, Vol. 2, p. II-84). Isso é en- Antônio e Jirau (Brasil, ELETROBRÁS, 1987; ver ganoso, já que o muro de 55 m de altura erguido Fearnside, 1995). A mega-barragem inicial foi divi- em Santo Antônio e a estrutura de 65 m em Jirau dida em duas, a fim de reduzir a área a ser inundada são semelhantes em altura com outras barragens na e, principalmente, para evitar as complicações diplo- região amazônica. máticas de inundar na Bolívia. No entanto, a ques- tão dos impactos sobre a Bolívia ainda é uma parte O EIA/RIMA e os estudos de viabilidade de importante do debate sobre as barragens. Santo Antônio e Jirau foram feitas simultaneamen- te, com ambas sendo concluída em 2005 como do- A barragem de Santo Antônio está localiza- cumentos comuns para as duas barragens. A sequên- da logo acima Porto Velho (capital do Estado de cia lógica de eventos exigiria o estudo de viabilidade Rondônia), nos arredores da cidade, enquanto a usi- deve ser concluído antes de os estudos ambientais, na de Jirau é 117 km mais a montante, aproximada- porque é preciso conhecer as características técnicas mente a meio caminho entre Porto Velho e Abunã, de um projeto de barragem, a fim de avaliar corre- uma cidade na fronteira entre Brasil e Bolívia (veja a tamente os impactos que ela terá. Uma importan- Figura 1). As vantagens das barragens incluem o seu te mudança nos planos, ao longo dos estudos, foi a tamanho pequeno de reservatório em comparação decisão, em 2004, que o reservatório de Jirau será com a capacidade instalada: o reservatório de Santo operada com um nível de água variável, com média Antônio teria 0,11 km2 MW-1 e Jirau 0,10 km2 de 88 m acima do nível médio do mar (MSL), mas MW-1. Estes valores comparam muito bem com que variará de 82,5 a 90,4 m. Esta decisão foi a fim As Barragens do Rio Madeira: 171 Um Revés para a Política Ambiental no Desenvolvimento da Amazônia Brasileira de evitar inundações na Bolívia, mas, como será ex- na extremidade superior do reservatório elevariam plicado mais tarde, essa mudança não garante que as os níveis de água no trecho do rio imediatamen- inundações não ocorrem no país vizinho. te a montante do reservatório (Fearnside, 2006b). Aderindo ao plano do nível de água variável em Ecossistemas aquáticos e terrestres são eliminados Jirau aumenta o custo de geração em 12%, o que re- na área alagada pelos reservatórios. As populações presentaria um montante significativo nos balanços humanas que vivem ao longo do rio também são des- da empresa. O custo da geração aumentaria de US$ locadas, com impactos sociais que já são óbvias. Um 22.76/MWh como o nível de água constante de 90 impacto social particularmente grave é o bloqueio m acima do nível do mar para US$ 25.50/MWh da migração dos “grandes bagres” do rio Madeira, com o nível de água variável (PCE et al., 2004, Tomo especialmente (Brachyplatatystoma rouxeauxii) e (B. 1, Vol. 1, p. 1.1). Portanto, a tentação de elevar o ní- vaillantii) que sustentam pescadores na Bolívia e no vel de água ser uma presença constante. Além disso, Peru, assim como no Brasil (Barthem & Goulding, o plano para um nível variável da água só impede 1997; Fearnside, 2009). Peixes também serão afeta- o próprio reservatório de entrar na Bolívia, não o dos pela alteração do pico de inundações que forne- remanso superior (um remanso é a elevação do nível cem nutrientes para lagos de várzea logo a jusante de água na seção do rio acima de um reservatório em das barragens. O boom de mineração de ouro na virtude da acumulação de sedimentos). Em 2007, a década de 1980 deixou muitas toneladas de mer- equipe técnica do IBAMA colocou uma série de cúrio depositadas nos sedimentos. Com o advento perguntas para os proponentes (Brasil, IBAMA, das barragens, os sedimentos nos afluentes deverão 2007a,b,c), e, na sua resposta, os proponentes afir- tornar-se anóxicos, causando mercúrio em nestes maram que os níveis de água no reservatório de Jirau sedimentos para ser transformado na forma metil, seriam geridos de tal forma que não só o reservató- altamente tóxica (Forsberg & Kemenes, 2006). As rio propriamente dito, mas também o remanso seria emissões de gases de efeito estufa, mesmo sendo in- impedido de entrar na Bolívia (FURNAS & CNO, feriores às emissões em reservatórios tradicionais de 2007, p. 12). No entanto, a presunção parece ser que armazenamento, não são zero: um elevado fluxo de metano já foi medido a partir da superfície da água simplesmente não haverá remanso, o que significa nos afluentes em Santo Antônio (Hallqvist, 2012, p. que não haveria nenhuma acumulação de sedimen- 25), e uma alta concentração de metano na água foi tos na extremidade superior do reservatório de Jirau encontrada a jusante dessa represa (Grandin, 2012, que iria aumentar os níveis de água a montante do p. 28). Crédito de carbono no âmbito do Mecanismo reservatório propriamente dito. Não são dadas in- de Desenvolvimento Limpo foi aprovado para Jirau formações sobre quanto de redução adicional no ní- em 17 de maio de 2013, e para Santo Antônio foi vel de água seria necessário para evitar os efeitos de aprovado em 27 de novembro de 2013. Sendo que um remanso superior, ou em quanto isto reduziria o essas barragens teriam sido construídas de qualquer rendimento. Além do histórico das ações semelhan- maneira, este credito aumenta ainda mais o impacto tes sobre os níveis de água em reservatórios que fo- dessas hidrelétricas sobre o aquecimento global, per- ram feitas desrespeitando promessas anunciadas em mitindo mais emissões nos países que compram a outras barragens (Fearnside, 2006a), os fatores que crédito (Fearnside, 2013a). O desmatamento foi es- sugerem que os níveis de água do reservatório não timulado pela população deslocada pelas barragens podem ser reduzidos tanto quanto esta afirmação e por migrantes atraídos para a área (Escada et al., significa incluem a possibilidade de que poderia ser 2013). As barragens são uma parte essencial de uma obtida permissão de Bolívia para permitir a inunda- expansão planejada de hidrovias para o transporte ção de terras naquele país (e.g., Época, 2008). de soja de áreas de floresta tropical que se tornariam economicamente atraente para essa cultura, incluin- RESUMO DOS IMPACTOS do áreas a serem abertas por mais de 4.000 km de vias na Bolívia (e.g., Vera-Diaz et al., 2007). Embora As barragens do rio Madeira devem ter graves o inventário do rio Madeira que propôs estas barra- impactos ambientais e sociais, não só no Brasil, mas gens destaca os retornos financeiros a partir desta também na Bolívia e no Peru (e.g., Switkes, 2008; expansão da soja como um benefício das barragens Fearnside, 2014a). Impactos na Bolívia incluem (PCE et al., 2002, p. 6.22), o inventário, o estudo inundações devido ao remanso superior do reserva- de viabilidade e o EIA não consideram o aumen- tório de Jirau, onde os sedimentos que se acumulam to implícita no desmatamento a ser um impacto 172 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras das barragens (PCE et al., 2004; FURNAS et al., em parte, justificadas pelo seu papel na redução da 2005b). As barragens também exigem a construção CCC. A linha de transmissão a partir das barragens de uma linha de transmissão de 2.450 km. Em uma do rio Madeira para Manaus não foi incluído nem revisão dos aspectos legais do licenciamento das bar- nos estudos de viabilidade nem no EIA/RIMA ragens do rio Madeira, Sotelino (2013, p. 62) chama para as barragens do rio Madeira. Deve ser lembra- a atenção para a necessidade de evitar a “segmenta- do que a rodovia BR-319, que antigamente ligava ção” das partes interdependentes de grandes projetos Manaus a Porto Velho, tem sido abandonada des- para fins de licenciamento, e ele conclui que “Como de 1988. A proposta de reconstrução desta rodovia exatamente Odebrecht e Furnas conseguiram evitar ainda não teve um EIA/RIMA aprovado, embora o a necessidade de um EIA em relação às linhas de processo, atualmente em sua terceira revisão, con- transmissão permanece um mistério”. tinua a avançar. A reabertura da rodovia causaria sérios impactos sobre o desmatamento na região BENEFÍCIOS DAS BARRAGENS DO RIO central e norte da Amazônia (Fearnside & Graça, MADEIRA 2006). Supondo-se que a estrada não será reaber- ta nos próximos anos, devido a estas preocupações, As barragens do rio Madeira forneceriam uma linha de transmissão, que presumivelmente se- energia para Rondônia e Acre. Estes dois estados ria construída ao longo da rota da estrada, implica constituíam um “sistema isolado”, com geração de em estimular a reconstrução da estrada, assim con- eletricidade de motores a diesel (em adição à hi- tribuindo para os impactos associados. drelétrica de Samuel). A geração diesel nestes es- tados representava 23% da “Conta de Consumo de Mais controverso é o destino de energia a ser Combustível” (CCC), que era um subsídio para a transmitida para a rede nacional no centro-sul do compra de combustível fóssil por sistemas isolados Brasil. Além do uso por parte dos consumidores re- que foi pago pela cobrança de sobretaxas em todo sidenciais e toda a gama de usuários comerciais e o Brasil (Brasil, ELETROBRÁS, 2006). Deve ser de produção, essa energia também movimenta um lembrado que o plano no momento em que o licen- sector em expansão de indústrias “eletro-intensivas”, ciamento das barragens do rio Madeira estava em incluindo a fundição de alumínio. Em 2008, o Brasil andamento previa a ligação de Rondônia com a rede exportou 7,8% de sua eletricidade na forma de mer- nacional bem antes da entrada em operação das bar- cadorias eletro-intensivas, e a percentagem está au- ragens do rio Madeira, terminando assim o status mentando (Bermann, 2012, p. 32). da área como um “sistema isolado”. No entanto, os atrasos na construção da linha de transmissão resul- O LICENCIAMENTO AMBIENTAL taram em alguma geração de energia iniciando antes da conclusão da linha. O processo de licenciamento das barragens do rio Madeira fornece uma ilustração da suscetibilida- Outro benefício listado (Brasil, ELETROBRÁS, de do sistema à pressão política e estabelece prece- 2006) foi de remover a cidade de Manaus do CCC; dentes que enfraquecem as salvaguardas para futuras Manaus representava 44% da CCC. Obtenção des- barragens. Alguns dos efeitos já são evidentes no li- te benefício a partir das barragens do rio Madeira implica na construção de uma linha de transmissão cenciamento da polêmica barragem de Belo Monte, de Porto Velho a Manaus (850 km). No entanto, no rio Xingu (Fearnside, 2012). Manaus hoje tem energia gerada com gás natural O Ministério Público em Porto Velho realizou canalizado a partir dos campos de gás de Urucu e uma análise separada do EIA / RIMA para as bar- também tem uma linha de transmissão da hidrelé- ragens do rio Madeira, juntamente com as questões trica de Tucuruí, ambos concluídas em 2013 (em- complementares e respostas (COBRAPE, 2006). O bora faltam reparos na linha de transmissão para Ministério Público, que foi criado pela Constituição ter plena capacidade em 2014). Em 26 de julho de brasileira de 1988 como uma agência do Ministério 2012, o Ministro das Minas e Energia anunciou da Justiça, é menos sujeito a pressões políticas que que a CCC seria eliminado em todos os estados são órgãos como IBAMA. O Ministério Público do Brasil, eliminando, assim, com uma simples ca- tem tido um papel importante no processo de li- netada esse argumento para as linhas de transmis- cenciamento para projetos na Amazônia desde a são e as barragens em construção que tinham sido, Constituição de 1988 (ver Eve et al., 2000). Sobre As Barragens do Rio Madeira: 173 Um Revés para a Política Ambiental no Desenvolvimento da Amazônia Brasileira crescente pressão, o IBAMA aprovou o EIA/RIMA O Ministério das Minas e Energia (MME) para as barragens do rio Madeira em setembro de contratou consultores para contribuir com opiniões 2006, permitindo que as audiências públicas sejam sobre as principais áreas de o questionamento: se- realizadas (International Rivers, 2012). dimentos, peixes e mercúrio; “notas técnicas” pelos Em janeiro de 2007, o presidente Luiz Inácio consultores foram entregues ao IBAMA em 24 de Lula da Silva (conhecido como Presidente abril de 2007 (a maior parte das notas é reproduzida “Lula”) anunciou o “Programa de Aceleração do em FURNAS & CNO, 2007). As empresas propo- Crescimento” (PAC), que consistia em uma lista de nentes entregaram uma resposta 316 páginas para grandes projetos de infraestrutura, as barragens do as perguntas do IBAMA em 11 de abril de 2007 rio Madeira sendo o mais alta entre as prioridades (FURNAS & CNO, 2007). Na maioria dos casos, (Kepp, 2007). Ao longo de 2007, vários e projetos as respostas ou se recusaram a responder, alegan- não infraestruturais relacionados à saúde e educa- do que o IBAMA estava solicitando informações ção foram adicionados ao PAC, mas o ambiente tem além daquelas que correspondam a procedimen- sido notavelmente ausente das atividades planejadas. tos normais, ou, então, responderam no sentido Mais importante ainda, os esforços para abreviar o que as preocupações do IBAMA eram infundadas. processo de revisão ambiental têm sido uma parte Grande parte da longa resposta consistia em copiar importante do esforço para construir os projetos partes do EIA/RIMA (compare PCE et al., 2005 de infraestrutura, especialmente a barragens do rio e FURNAS & CNO, 2007). E, por vezes, foi adi- Madeira (e.g., Switkes, 2008). cionando corroboração dos consultores contratados (e.g., FURNAS & CNO, 2007, Anexos I - V). O Em 21 de março de 2007, como parte do pro- mais significativo, no entanto, são várias mudanças cesso de concessão da Licença Prévia, a equipe téc- nos planos que foram feitas sem alarde, permitin- nica do departamento de licenciamento do IBAMA do, assim, algumas das perguntas a serem respon- apresentou um parecer de técnica de 221 páginas didas no sentido de que não existia problema. Os oposto à aprovação da Licença Prévia (Deberdt et mais importantes foram as mudanças a 1) adotar al., 2007). O documento só foi tornado público em uma estratégia de “curva-guia” para a gestão do nível 23 de abril, depois da Ministra do Meio Ambiente de água no reservatório de Jirau que supostamen- já ter cedida à pressão presidencial para forçar a te evitaria a formação de um remanso superior que aprovação das barragens (Peixoto, 2007; Switkes, causaria inundação na Bolívia (FURNAS & CNO, 2008). Muitos dos pontos levantados foram obtidos 2007, Estudos Sedimentológicos, p. 6.32), e 2) a a partir da avaliação independente encomendada remoção das ensecadeiras que haviam sido plane- pelo Ministério Público de Rondônia (COBRAPE, jadas para serem deixadas no local como muros de 2006). O chefe do Departamento de Licenciamento retenção de sedimentos (ensecadeiras são diques foi imediatamente substituído, supostamente como temporários usados para manter o rio fora do local um sinal do descontentamento do governo com a de construção) (FURNAS & CNO, 2007, p. 20). O posição da equipe técnica (Faleiros, 2007). Mesmo que no seu despacho afirmou que “deixo de acolher” cenário oficial em que todos os sedimentos seriam o parecer negativo da equipe técnica, ele pediu estu- naturalmente carregados dos reservatórios tem sido dos posteriores em vez de autorizar imediatamente fortemente contestado (Fearnside, 2013b). a concessão da Licença Prévia (Kunz Júnior, 2007) O caso de licenciamento para as barragens do [Obs. Kunz Júnior foi removido do cargo pouco rio Madeira provocou a divisão do IBAMA em tempo depois.]. O parecer técnico feito pela equipe dois órgãos, paralisando grande parte da sua ativi- do Departamento de Licenciamento havia solicitado dade. Imediatamente depois de uma reunião duran- que um novo EIA/RIMA seja elaborado. A equipe te a qual o presidente Lula pressionou a ministra depois apresentou uma série de 40 perguntas a serem do Meio Ambiente Marina Silva para acelerar a respondidas pelos proponentes (Brasil, IBAMA, aprovação das barragens, a ministra anunciou que o 2007a,b,c). Um editorial no jornal O Estado de São IBAMA seria dividido em dois órgãos, o Instituto Paulo classificou o pessoal do IBAMA como se en- Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), que volver em “molecagem” no tratamento de um proje- iria lidar com as áreas protegidas, e o IBAMA, to tão importante, fazendo perguntas “com o obje- que lidaria com o restante das funções do antigo tivo transparente de rejeitar o licenciamento prévio” IBAMA, incluindo o licenciamento de projetos de (OESP, 2007). infraestrutura. A separação teria sido parte de um 174 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras acordo com o presidente Lula para acelerar a apro- do IBAMA com uma pessoa disposta a substituir vação das barragens do rio Madeira (e.g., Alencar, o pessoal técnico da agência foi repetida logo após 2007; Domingos, 2007; Switkes, 2007). Em 30 de em licenciar a polêmica hidrelétrica de Belo Monte abril, o chefe do Departamento de Licenciamento (Fearnside, 2012). Uma vez que este modelo é capaz do IBAMA foi trocado novamente. A partir do dia de garantir a aprovação de qualquer projeto, inde- 14 de maio, grande parte do pessoal do IBAMA em pendentemente dos impactos, tem implicações gra- todo o País entrou em greve em uma tentativa de bloquear a divisão. A divisão do IBAMA foi apro- ves para as muitas barragens que foram anunciadas vada pelo Congresso Nacional e, em 28 de agosto de para a construção ao longo da próxima década na 2007, foi assinada em lei. A greve terminou pouco Amazônia brasileira. depois. Embora as barragens do Madeira, aparen- O atual paradigma para as decisões de infraes- temente, provocaram a divisão do IBAMA, isso é trutura ainda é uma baseada em decretos políticos, algo que estava em consideração por um longo tem- onde os relatórios ambientais que são preparados po, como forma de reorganização do Ministério do depois servem apenas para legalizar uma decisão Meio Ambiente de tal forma que o Ministro teria que já foi feito (e.g., Fearnside & Laurance, 2012). mais poder sobre as funções da agência. O IBAMA tinha um orçamento muito maior do que o restante O caso das barragens do rio Madeira fornece um do MMA, e, de muitas maneiras, o “presidente” do exemplo concreto. Grandes projetos de desenvolvi- IBAMA ele tinha mais poder real do que o próprio mento, tais como hidrelétricas, invariavelmente têm ministro. Dividindo o órgão tem o efeito de restabe- grandes impactos e, geralmente (mas nem sempre), lecer o equilíbrio entre o rabo e o cão. No entanto, a também têm grandes benefícios. Decisões racionais maneira que a divisão foi imposta como um meio de exigem que os custos e benefícios de todas as op- aprovar as barragens do rio Madeira teve consequ- ções sejam avaliados de forma justa, e que os custos ências graves em desmoralizar os técnicos do órgão. e benefícios sejam cuidadosamente comparados an- A aprovação das barragens do rio Madeira en- tes de tomar uma decisão. Isto deve incluir consi- volveu uma série extraordinária de mudanças de derações financeiras ambientais e sociais. Práticas pessoal nos bastidores das agências reguladoras, de tomada de decisão estão evoluindo em direção a remoção de todos os indivíduos em posições de a este ideal, mas temos um longo caminho a per- autoridade que questionaram o projeto ou oferece- correr antes de uma sequência lógica tão básica se ram apoio para aqueles que o fizeram. “presidente” torna a norma na prática. O teste do sistema ocorre do IBAMA foi removido e um ex-chefe de gabi- quando as apostas são altas, como no caso das bar- nete da Ministra do Meio Ambiente foi indicado ragens do rio Madeira. Embora um mero afluente como “presidente” interino no dia 03 de maio de do rio Amazonas, o rio Madeira é um dos maiores 2007. Críticos das represas afirmam que a mudan- rios do mundo. A vazão média no local da barra- ça foi feita para “garantir” a aprovação das Licenças gem de Jirau (17.686 m3/s) é 24% maior do que Prévias (Switkes, 2008, p. 35). No entanto, quando ele mais tarde anunciou a aprovação da Licença, ele a do rio Yangtze na barragem das Três Gargantas, negou que tivesse sido coagido por qualquer tipo de na China, que tem a maior capacidade instalada do pressão política (Craide, 2007). mundo. As duas barragens em construção no rio Madeira (Santo Antônio e Jirau), terão uma ca- O chefe do Departamento de Licenciamento pacidade instalada somando 6.900 MW, enquanto do IBAMA foi trocado novamente pouco antes uma terceira barragem (Guajará-Mirim, também da aprovação da Licença Prévia em 09 de julho de 2007, e a mesma pessoa, posteriormente, foi promo- conhecida como Cachoeira Ribeirão) acrescentaria vida a chefiar o IBAMA como um todo, antes da mais 3.000 MW, e uma quarta represa, Cachuela aprovação da Licença de Instalação em 13 de agos- Esperanza, no rio Beni (um afluente do rio Madeira to de 2008 (veja International Rivers, 2012). Cinco na Bolívia) acrescentaria 600 MW (e possivelmente dias antes, a equipe técnica tinha apresentado um até 800 MW; HRW, 2008, p. 10), principalmente parecer formal se opondo à aprovação da Licença para exportação para o Brasil pelas empresas brasi- de Instalação devido às 33 condições associadas com leiras que esperam construir a barragem com finan- a Licença Prévia não terem sido cumpridas (Brasil, ciamento do Banco Nacional de Desenvolvimento IBAMA, 2008). O padrão de substituição do chefe Econômico e Social (BNDES). As Barragens do Rio Madeira: 175 Um Revés para a Política Ambiental no Desenvolvimento da Amazônia Brasileira A POLÍTICA ENERGÉTICA E AS DECISÕES Um exemplo emblemático das oportunidades DE DESENVOLVIMENTO para reduzir o consumo de energia elétrica são os chuveiros elétricos utilizados para o banho no O espectro de um apagão em grande escala Brasil. Trata-se de uma forma extremamente ine- (“apagão”) tem sido constantemente levantada como ficiente de aquecimento de água, já que a segunda justificativa para a prioridade extraordinária ligada lei da termodinâmica resulta em energia ser perdi- às barragens do Madeira. No entanto, o Brasil tem da a cada transformação entre, por exemplo, o gás muitas outras opções além de barragens, combustí- boliviano e um chuveiro em São Paulo. De acordo veis fósseis e energia nuclear (por exemplo, Moreira, com o Plano Nacional sobre Mudança Climática 2012). As opções incluem tanto maneiras de usar (PNMC), chuveiros elétricos consomem 5% de menos eletricidade como formas de gerar energia a toda a eletricidade do País (Brasil, CIMC, 2008, p. partir de fontes alternativas, como eólica e solar. 58). Isso é mais do que aquilo que as barragens do O governo brasileiro planeja um crescimento Madeira irão produzir. Água para chuveiros pode anual de 5% do produto interno bruto (PIB) a ser ser aquecida com aquecedores solares, sem necessi- sustentado por pelo menos uma década (Brasil, dade de eletricidade. ELETROBRÁS, 2006). Isso é muito maior do A tomada de decisão é feita em um vácuo de que a atual taxa de crescimento: o PIB do Brasil informação no que diz respeito aos impactos sociais cresceu a taxas anuais de aproximadamente 3,3% e ambientais. As barragens são anunciadas em pla- durante a maior parte da década passada - uma nos de desenvolvimento, muito antes que os estudos taxa considerada como insuficiente pelo governo. de impacto são iniciados, e muito menos concluídos. A suposição de que o crescimento do PIB pode ser Ao invés de contribuir para uma tomada de uma de- sustentado em 5% ao ano, inclui a suposição de que cisão inicial sábia, o máximo que estudos posteriores o Brasil vai continuar a exportar cada vez maio- podem contribuir são sugestões para minimizar os res quantidades de produtos intensivos em energia, impactos. Os próprios estudos ambientais dão pou- como o alumínio, e que altos níveis de ineficiência ca ideia do verdadeiro impacto das barragens, de- e desperdício continuarão. Crescendo a 5% ao ano vido ao viés inerente ao sistema de licenciamento. pode ser possível durante alguns poucos anos, mas As empresas que pagam os estudos de impacto são quando extrapolados para uma década ou mais, a os mesmos que esperam, posteriormente, ganhar os implicação da demanda astronômica por eletrici- contratos para a construção das barragens. Isso cria dade é uma consequência simples da matemática um conflito interno de interesses, onde a ênfase de de crescimento exponencial. Fatalmente, limites serão encontrados, tais como os impactos sociais e aspectos positivos e a minimização dos impactos ambientais de represar praticamente todos os rios negativos podem ser esperadas. Este tem sido um da Amazônia. Seria melhor enfrentar estes limites problema constante desde o início do EIA/RIMA antes que sejam atingidos. no Brasil em 1986, e ainda aguarda solução. O uso a ser feito da energia não tem sido objeto Uma das ironias do sistema de licenciamento é de debate aberto no Brasil. A fundição de alumínio que o conteúdo dos estudos de impacto e das au- para exportação é um dos casos mais extremos, for- diências públicas tem muito pouco efeito sobre as necendo apenas 2,7 empregos por GWh de eletrici- decisões em matéria de licenciamento dos proje- dade consumida (Bermann & Martins, 2000, p. 90). tos. No final, aqueles que escrevem os relatórios e Lingotes de alumínio representam essencialmente falam nas audiências podem dizer o que gosta e eletricidade em uma forma que pode ser carregada os projetos de infraestrutura vão em frente mesmo em um navio e levada embora. Fábricas de alumínio, assim. O único fato que importa é que as várias tais como aquelas em Barcarena, Pará, têm linhas etapas do processo foram realizadas, tais como a de transmissão diretas para Tucuruí e para a futura apresentação do EIA/RIMA, a resposta às pergun- hidrelétrica de Belo Monte (Fearnside, 1999, 2001, tas do IBAMA, e as audiências com as populações 2006a). O Sistema Interconectado Nacional (SIN), afetadas. O conteúdo é secundário. a que estas barragens e as barragens do rio Madeira Que as decisões políticas possam efetivamente são ligadas, contribuí ao fornecimento de energia passar por cima de praticamente qualquer preocu- para usinas de alumínio em Sorocaba (São Paulo), pação ambiental ou social dificilmente será novi- Volta Redonda (Rio de Janeiro) e em outros lugares. dade para aqueles que estão familiarizados com o 176 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras desenvolvimento na Amazônia. O Brasil precisa de infraestrutura exige que os impactos e benefícios um sistema de tomada de decisão ambiental fun- sejam avaliados e comparados antes de tomada da cionando que é capaz de analisar e julgar de forma decisão de fato. O paradigma de decisões por de- justa a vasta gama de impactos e benefícios asso- creto deve ser quebrado se a história das barragens ciados a esses projetos. O sistema precisa entregar do Madeira não é para ser repetida muitas vezes ao decisões que não sejam nem apresadas para pular longo das próximas décadas. A aprovação das bar- etapas necessárias, nem paralisadas até o ponto onde ragens do Madeira, por meio de pressão política e nenhuma infraestrutura pode ser construída, inde- substituição de funcionários-chave de licenciamen- pendentemente de quão grande são os benefícios em to, estabelece um precedente perigoso. Decisões relação aos impactos. precisam seguir uma sequência lógica de etapas. É Projetos variam muito nos seus impactos e be- preciso pesar todos os custos e benefícios e incluem nefícios. Um extremo ocorre quando os impactos alternativas distintas da proposta imediata, tais (sem omissões) são enormes e benefícios (defla- como a conservação de energia e a mudança de cionados de exageros) são mínimas. Exemplos in- políticas que incentivem e subsidiam o alumínio e cluem a hidrelétrica de Balbina e a rodovia BR-319 outras indústrias eletro-intensivas. Infelizmente, (Fearnside, 1989; Fearnside & Graça, 2006). Outros a discussão pública sobre a política energética mal têm benefícios reais, além de impactos substanciais, começou no Brasil. tais como a hidrelétrica de Tucuruí e a rodovia BR- 163 (Fearnside, 1999, 2001, 2007). As questões le- AGRADECIMENTOS vantadas por esses casos variam consideravelmente, mas uma característica comum é a separação da de- Apoio financeiro foi fornecido pelo Conselho cisão real sobre o projeto de construção do processo Nacional do Desenvolvimento Científico e formal de avaliação dos impactos ambientais e até Tecnológico (CNPq: Proc. 573810/2008-7, mesmo da avaliação dos custos e benefícios pura- 304020/2010-9), Instituto Nacional de Pesquisas da mente financeiros. Amazônia (INPA: PRJ15.125) e Ministério Público Federal do Estado de Rondônia. Agradeço a todos A questão importante é como o sistema pode ser aqueles que forneceram informações e que ajuda- modificado. Mudanças necessárias incluem assegu- ram com apoio logístico nos locais das barragens e rar a independência das pessoas que tomam decisões em Porto Velho, entre eles Francisco Pereira, Artur sobre o licenciamento. O exemplo das barragens do de Souza Moret, Wanderley Rodrigues Bastos, rio Madeira destaca questões sobre como as decisões Ronaldo Cavalcante de Oliveira, Iremar Antônio são tomadas e o peso relativo de considerações polí- Ferreira e Carolina Carneiro Fonseca, bem como ticas e técnicas. aqueles em órgãos federais, e residentes estaduais e municipais na região das barragens. Agradeço Paulo CONCLUSÕES M.L.A. Graça pelos comentários. Toda a responsa- bilidade pelo conteúdo do artigo recai sobre o autor. Os impactos ambientais e sociais das hidrelétri- Isto é uma tradução de Fearnside (2014c). cas no rio Madeira são substanciais, incluindo deslo- camento da população, o desmatamento, a perda dos meios de subsistência da pesca no Brasil, Bolívia e LITERATURA CITADA Peru, inundação em um trecho de remanso superior Alencar, K. 2007. Ministra se compromete com Lula a liberar na Bolívia, além do alagamento dos reservatórios em usinas. Folha de São Paulo, 27 de abril de 2007, p. A-5. si no Brasil, as emissões de gases de efeito estufa, a ARCADIS Tetraplan; FURNAS & CNO. 2005. Complexo metilação de mercúrio, e os impactos a jusante sobre Hidrelétrico do Rio Madeira: Avaliação Ambiental Estratégica. a reprodução de peixes e sobre residentes ribeirinhos Relatório Final. Rio de Janeiro, RJ: ARCADIS Tetraplan; das mudanças nos regimes de cheias e no movimen- FURNAS Centrais Elétricas, S.A. & Construtora Noberto to de sedimentos. Odebrecht, S.A. 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Carbon Management 4(6): 681-696. doi: 10.4155/CMT.13.57 182 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO diretrizes do MDL, e não a questão se este projeto em particular atende aos critérios atuais do MDL. Hidrelétricas tropicais são hoje um dos princi- pais destinos dos fundos no âmbito do Mecanismo O Protocolo de Quioto foi negociado em 1997 e de Desenvolvimento Limpo (MDL), do Protocolo entrou em vigor em 2005 com a finalidade de redu- de Quioto, com 1.482 barragens aprovadas para cré- zir as emissões globais líquidas de gases de efeito es- dito e 840 barragens no “pipeline” (“duto”) do MDL tufa, contribuindo assim para manter a concentração aguardando aprovação. Milhares de barragens estão atmosférica abaixo do nível que seria “perigoso” para o sistema climático. O primeiro período de compro- sendo construídas por países, tais como, China, Índia misso do Protocolo foi de 2008 a 2012, e as ativi- e Brasil, independentemente de qualquer subsídio dades de mitigação nos próximos períodos de com- adicional com base na mitigação do aquecimento promisso do Protocolo de Quioto ou sobre acordos global. Créditos de carbono concedidos a projetos que o substitui terá de se beneficiar da experiência que ocorreriam de qualquer maneira permitem que adquirida até hoje. Uma característica importan- os países que compram os créditos emitam gases de te do Protocolo de Quioto é o MDL, que permite efeito estufa que não são compensados. O dano ao que os países que aceitaram um limite máximo, ou clima global é ainda maior devido aos procedimen- “teto”, sobre as suas emissões nacionais (países do tos contábeis do MDL que subestimam os gases de Anexo-I) possam cumprir parte dos seus compro- efeito estufa emitidos por barragens tropicais. Mais missos de redução de emissões através de projetos danos ainda decorrem de fundos de mitigação limi- em países sem um teto nacional (países não-Ane- tados serem desperdiçados em projetos “não-adicio- xo I). Como os países anfitriões desses projetos não nais”, tais como barragens. Um exemplo que indica a têm limites nacionais, não há nenhuma salvaguarda necessidade de eliminar o crédito para hidrelétricas na contabilidade a nível nacional de emissões de ga- é fornecido pela usina de Jirau, atualmente em fase ses de efeito estufa para evitar danos ao clima, caso de conclusão, no rio Madeira, próximo da fronteira que os benefícios reivindicados em nível de projeto do Brasil com a Bolívia. A barragem tem impactos não reflitam as verdadeiras reduções de emissões lí- severos, além de contribuir ao aquecimento global. quidas. O Protocolo de Quioto exige, portanto, que O projeto foi aprovado (registrado) pelo Conselho todas as reduções de emissões do MDL sejam “adi- Executivo do MDL em 17 de maio de 2013. cionais” àquelas que teriam ocorridas na ausência do projeto. Isto dá origem ao termo “adicionalidade” Palavras-Chave: Amazônia; barragens; aquecimento glo- para descrever o grau em que a redução de emissões bal; efeito estufa; hidrelétricas; metano; mitigação não ocorreria sem essa ajuda. É importante manter uma distinção clara entre o INTRODUÇÃO que é “adicional” no espírito do Protocolo de Quioto Em 17 de maio 2013, o Conselho Executivo e o que é classificado como tal, pela aplicação dos (“Executive Board”) do Mecanismo de procedimentos operacionais adotados na imple- Desenvolvimento Limpo (MDL) aprovou o projeto mentação do MDL. Estes definitivamente não são a de Jirau para obtenção de crédito de carbono, tor- mesma coisa. A realização do objetivo do Protocolo nando-se o maior projeto de “energia renovável” do de Quioto na redução das emissões líquidas globais de gases de efeito estufa exige que os projetos de MDL até agora em termos de toneladas de CO2-eq MDL financiados deveriam, de fato, apenas ser rea- supostamente mitigada (GDF Suez, 2013). Isso faz lizados por causa da receita da venda de créditos de com que o exame deste exemplo seja especialmen- carbono. Isto é muito diferente de justificar a classi- te relevante, sendo que os problemas causados pela ficação como “adicional”, por meio do fornecimento concessão de créditos de carbono não podem ser de valores para a taxa interna de retorno (Internal descartados como aberrações que seriam eliminadas Rate of Return [IRR]), que, após uma série de ajustes pela validação e pelo processo de revisão do MDL. permitidos pela MDL, implica que as barragens, de Na verdade, a grande maioria das propostas é apro- outra forma, não seriam rentáveis. O presente tra- vada, e o processo de revisão do MDL não resulta balho usa o termo “adicional” no sentido do espírito em um portfólio de projetos aprovados que seria do Protocolo de Quioto, salvo indicação em con- sanado dos seus muitos problemas. O objetivo do trário. O foco do presente trabalho é sobre a ade- presente trabalho é um questionamento das próprias quação ou inadequação das atividades do MDL em Crédito para mitigação das mudanças climáticas 183 por barragens amazônicas: Brechas e impactos ilustrados peloprojeto da Hidrelétrica de Jirau subsidiar as hidrelétricas tropicais como um meio hidrelétricos listados pelo Centro Risoe como tendo de combater o aquecimento global - e não sobre se havido uma decisão (ou seja, tanto como tendo sido ou não o pedido de crédito de carbono pelo caso rejeitado ou que tenha passado pela fase de registro), exemplificado ( Jirau) está em conformidade com os apenas 14,2% havia sido rejeitado (UNEP, 2013). regulamentos atuais do MDL. Hidrelétricas, que se tornaram uma das formas dominantes de mitigação Para o período que termina em 2012, o mon- no MDL, raramente são adicionais, já que elas têm tante de CERs emitidas para a energia hídrica foi sido e continuam sendo construídas pelos países an- de 112,7 milhões de toneladas de CO2 equivalen- fitriões, sem recorrer à renda adicional de créditos te (CO2-eq, ou seja, a soma do impacto de todos de carbono. os gases de efeito estufa, como o metano, expressa como a quantidade de dióxido de carbono que teria O MDL tem um processo de três passos. Na o mesmo impacto no aquecimento global ao lon- primeira etapa, a equipe de projeto do MDL contra- go de um período de 100 anos). No entanto, para ta uma Entidade Operacional Designada (DOE), todos os projetos hidrelétricos aprovados e no “pi- que é uma entidade independente designada pelo peline” global, o número total anual de CERs para Conselho Executivo do MDL para realizar o tra- o período até 2012 deverá ser de 331,2 milhões de balho de validação. O segundo passo é a “validação” toneladas de CO2-eq (UNEP, 2013), o que equivale pela DOE, incluindo visitas ao local e entrevistas. O a 90,3 milhões de toneladas de carbono por ano. O andamento do projeto pode ser visto como parte do número de CERs esperado para o período 2013- “pipeline” (“duto”) de projetos que são monitorados 2020, a partir de projetos hidrelétricos aprovados até pelo Centro Risoe, do Programa das Nações Unidas 1 de dezembro de 2012, totaliza mais de 7 bilhões do Meio Ambiente (PNUMA) (UNEP, 2013). Este de toneladas de CO2-eq (UNEP, 2013). Para efei- monitoramento é baseado em informações coleta- to de comparação, o total de emissões dos Estados das de validadores, e é independente do Conselho Unidos a partir de combustíveis fósseis em 2010 foi Executivo do MDL. O terceiro passo é o pedido dos estimado em 6,8 bilhões de toneladas de CO2-eq desenvolvedores do projeto ao Conselho Executivo (UNFCCC, 2012, p. 14). para o “registro”, e a posterior revisão e aprovação pelo Conselho. Uma vez registrado, o projeto é ele- Pouco do carbono representado por CERs de hi- gível para receber créditos de carbono. A concessão drelétricas é adicional àquele que teria sido emitido real de crédito de carbono (Reduções Certificadas sem os projetos (por exemplo, Pottinger, 2008; Yan, de Emissões [CERs]), será feita depois de cada ano 2012; Fearnside, 2013a). Os países que compram as do projeto (ou outro período de tempo), momento CERs, portanto, emitem carbono para a atmosfera, em que outro DOE irá verificar se as reduções de sem qualquer compensação verdadeira das emissões emissões foram alcançados e, se o DOE achar que pelos projetos de MDL. Projetos hidrelétricos no as reduções ocorreram, o Conselho Executivo do MDL também consomem uma parte substancial do MDL concederá CERs como produto comerciali- dinheiro que o mundo tem para combater o aque- zável resultante. cimento global, a quantidade de crédito ao longo de 2012 (um total anual de 331,2 milhões de toneladas Até 1 de dezembro de 2012, o MDL havia emi- de CO2-eq para a aprovação e projetos no “pipeli- tido crédito para 586 projetos hidrelétricos. O nú- ne” valeria 8,5 bilhões de dólares dos EUA (US$), mero acumulado de projetos hidrelétricos inscritos considerando o preço do CER (cerca de US$ 25/ aumentou de 1.225 para 1.482 entre 3 de junho e 1 tonelada CO2-eq) de 2008 usado no Documento de de dezembro de 2012, o que representa uma taxa de Concepção de Projeto (Project Design Document = quase duas barragens por dia de aprovação. Outros PDD) de Jirau (ESBR & GDF Suez Energy Latin 896 projetos haviam sido registrados, mas ainda America Participações Ltda., 2013, p. 52). Note-se, sem emissão de crédito, e 840 barragens estavam no no entanto, que os preços dos CERs são altamente “pipeline” aguardando a conclusão do processo de voláteis: eles têm caído desde 2008, mas aumenta- aprovação para o financiamento do MDL (UNEP, riam drasticamente se as negociações internacionais 2013). A grande maioria dos projetos que entram alcançarem compromissos de redução substanciais na tubulação do “pipeline” são aprovados: a taxa de de emissões. O gasto de parte dos fundos disponíveis rejeição global do MDL é de 19,8% durante a fase para projetos de mitigação em projetos não adicio- de validação, após o qual 4,2% são rejeitadas pelo nais significa que projetos com benefícios climáticos Conselho Executivo (UNEP, 2013). Para projetos reais não serão realizados. As propostas hidrelétricas 184 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras representam 26% do total de créditos de carbono no em 17 de maio de 2013 é de efeito retroativo até “pipeline” do MDL (UNEP, 2013). A usina de Jirau, 26 de dezembro de 2012, assim permitindo o pro- no rio Madeira, na Amazônia brasileira, fornece um jeto vender créditos de carbono para o Esquema da exemplo que ilustra esses problemas. União Europeu de Comércio das Emissões (EU- ETS) (GDF Suez, 2013). A HIDRELÉTRICA DE JIRAU E O MDL As barragens do rio Madeira ( Jirau e a barragem adjacente de Santo Antônio) estão atualmente em O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, do fase de conclusão. O rio Madeira é um dos prin- Protocolo de Quioto, se destina a fornecer um meio cipais afluentes do rio Amazonas que drena partes pelo qual os projetos em países em desenvolvimento de Brasil, Bolívia e Peru (Figura 1). A sua vazão possam ser financiados através da venda de crédi- média em Jirau (17.686 m3/s) é 24% maior do que tos de carbono aos países desenvolvidos (países do o do rio Yangze, da China na barragem das Três Anexo I). Desta maneira, permitirá que os países de- Gargantas. As barragens do rio Madeira têm sido, senvolvidos atendam em as suas quotas (quantida- durante muitos anos, assunto de intensa oposição de des atribuídas) de emissões do Protocolo de Quioto, grupos preocupados com o meio ambiente e os di- de forma mais barata e, ao mesmo tempo, ajudem os reitos humanos (ver Switkes, 2008). Estas barragens países em desenvolvimento a alcançar o “desenvolvi- certamente não seriam consideradas como sendo mento sustentável”. Uma das partes mais polêmicas “desenvolvimento sustentável” na compreensão da do MDL tem sido projetos de hidrelétricas, espe- maioria das pessoas, desse termo muito flexível. No cialmente em áreas tropicais, como a Amazônia bra- entanto, a exigência do Protocolo de Quioto que to- sileira (por exemplo, Fearnside, 2005a; Fearnside & dos os projetos de MDL contribuam para o “desen- Pueyo, 2012). O registro (aprovação) do Conselho volvimento sustentável” (UNFCCC, 1997, Artigo Executivo do MDL do projeto de MDL para Jirau 12, § 2º) tem sido efetivamente neutralizada por Figura 1 - locais mencionados no texto. Crédito para mitigação das mudanças climáticas 185 por barragens amazônicas: Brechas e impactos ilustrados peloprojeto da Hidrelétrica de Jirau uma decisão de que cada país decide por si o que o estufa pela própria barragem, as emissões prove- é “desenvolvimento sustentável”, e qualquer projeto nientes do desmatamento induzido pela barragem, e apresentado ao MDL pela é Autoridade Nacional muitos impactos além do carbono na área ambiental Designada (DNA) do país anfitrião é presumido au- e social. O autor pode atestar que muitos dos pro- tomaticamente para representar o “desenvolvimen- blemas aqui analisados também se aplicam às outras to sustentável”. O projeto de Jirau já passou pelas três grandes hidrelétricas que apresentaram projetos várias etapas no processo de aprovação do MDL, de carbono para o MDL na região amazônica do culminando com a entrega de um “relatório de ava- Brasil (Santo Antônio, Teles Pires e Dardanelos). liação oficial” (Locher et al., 2013) em 17 de maio Esses problemas, incluindo a falta de uma verdadei- de 2013 e a aprovação do projeto no mesmo dia pelo ra adicionalidade, parecem ser comuns a muitos pro- Conselho Executivo do MDL. O relatório foi du- jetos de barragens em todo o mundo (por exemplo, ramente criticado durante o período de comentário Haya, 2012). público (Fearnside, 2013b), assim como foi criticado o PDD do projeto Jirau (Fearnside, 2012a; Molina Carpio, 2012). Um exame do caso Jirau revela a in- IMPACTOS AMBIENTAIS E SOCIAIS capacidade do atual sistema de avaliação de projetos Jirau e o desenvolvimento sustentável no MDL para impedir a aprovação de projetos que contrariam o objetivo global do Protocolo de Quioto O PDD de Jirau afirma que “A Empresa de e da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério Mudança do Clima (UNFCCC), conhecida como de Minas e Energia (MME) brasileiro, .... Considera a “Convenção de Clima”, por fazer mal ao clima aspectos económicos e sociais, bem como do meio global, além de causar impactos ambientais e sociais ambiente .... Neste contexto, a EPE também consi- notáveis no país anfitrião (e, neste caso, em dois pa- dera a inserção do Brasil em acordos internacionais íses vizinhos também). .... Esta visão implica que todos os custos e benefí- Localizada no Estado de Rondônia, próximo cios externos são avaliados de forma adequada para da fronteira com a Bolívia (9o 15’ 17,96” S; 64o 38’ identificar projetos mais benéficos e para maximi- 40,13” O), a hidrelétrica de Jirau está sendo cons- zar seus benefícios socioeconômicos e minimizar truída pela multinacional francesa GDF Suez, jun- seus impactos” (ESBR & GDF Suez Energy Latin tamente com a Energia Sustentável do Brasil SA, America Participações Ltda., 2013, p. 5). A ironia que é um consórcio formado pela GDF Suez (60%), dessa interpretação é aparente, dada a enorme acu- Eletrosul (20%) e Chesf (20%). Em 2 de julho de mulação de críticas da sociedade civil aos planos da 2013 o governo brasileiro aprovou a proposta de EPE, e das barragens do rio Madeira em particu- venda de uma participação de 20% pela GDF Suez lar, com base em seus impactos socioeconômicos e à empresa japonesa Mitsui. O início da produção ambientais (ver, por exemplo: Amigos da Terra – comercial de energia foi adiado várias vezes, e co- Amazônia brasileira & IRN, 2006; Monteiro, 2011, meçou em setembro de 2013, a capacidade instalada 2012; Ortiz et al., 2007; Switkes, 2008). Uma carta plena de 3.750 MW deverá entrar em operação até de 2010 ao presidente da GDF Suez, de 16 grupos 2015. O PDD para a proposta de crédito de carbono ambientais (Amigos da Terra – Amazônia brasileira (ESBR & GDF Suez Latin America Participações et al., 2010), descreve múltiplas deficiências em lidar Ltda., 2013) é semelhante a outras propostas de com os impactos ambientais e sociais em Jirau. Estes MDL para barragens. O Projeto Hidrelétrico Jirau problemas levaram a GDF Suez a ser eleita uma das concluiu a versão final do seu PDD em 12 de abril finalistas de 2010 para o prêmio “Public Eye”, que é de 2012, e o processo de validação começou em 24 concedido anualmente à empresa mais irresponsável de abril de 2012. Ressalto mais uma vez que o atu- do mundo (Public Eye Awards, 2010). al trabalho se destina a examinar a raciocínio para O PDD afirma que “... o HPP [projeto da usi- as regras atuais do MDL para concessão de crédito na hidrelétrica] Jirau está sendo desenvolvido de de carbono para usinas hidrelétricas (usando Jirau acordo com as melhores práticas e padrões técnicos como um exemplo), e não se o projeto de carbono de e ambientais” (ESBR & GDF Suez Energy Latin Jirau está em conformidade com as regras atuais do America Participações Ltda., 2013, p. 5). A popu- MDL. Os problemas incluem a falta de adicionali- lação local e os grupos da sociedade civil mencio- dade, subestimação das emissões de gases de efeito nados acima contestariam essa afirmação. Como o 186 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras jornal Folha de São Paulo o descreveu, o processo de de turbinas (ESBR & GDF Suez Energy Latin licenciamento foi uma “coletânea de erros” (Angelo, America Participações Ltda., 2013, p. 5). Os leitores 2011). O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) de do PDD não terá nenhuma ideia do grande impac- Jirau foi feito em conjunto com a hidrelétrica vizi- to esperado da barragem (junto com a hidrelétrica nha de Santo Antônio (FURNAS et al., 2005). A de Santo Antônio em construção imediatamente a licença prévia e a licença de instalação foram conce- jusante de Jirau) na eliminação da pesca dos bagres didas apesar do parecer negativo da equipe técnica gigantes do rio Madeira (Brachyplatatystoma rou- do órgão ambiental federal, o Instituto Brasileiro do xeauxii e Brachyplatystoma platynemum), não só na Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis parte brasileira do Madeira, mas também no Peru (IBAMA) (Deberdt et al., 2007; Fearnside, 2013c; e na Bolívia (por exemplo, Barthem & Goulding, International Rivers, 2012). 1997; Fearnside, 2009). Esses bagres foram, até ago- Todos os projetos de MDL devem contribuir ra, uma importante fonte de renda e de alimento para o “desenvolvimento sustentável” (UNFCCC, para a população local na Bacia do Madeira nestes 1997, Artigo 12, § 2º). O desenvolvimento susten- três países, e os projetos de barragens nem sequer tável é geralmente considerado como tendo três admitem, muito menos compensam, a perda dos pilares: social, ambiental e econômico. O PDD en- meios de subsistência. fatiza os benefícios sociais dos empregos gerados Inundação na Bolívia pelo projeto de construção, apontando que “mais de 70% dos trabalhadores são contratados localmen- A inundação na Bolívia é uma parte importante te” (ESBR & GDF Suez Energy Latin America da controvérsia em torno da represa de Jirau. Porque Participações Ltda., 2013, p. 6). No entanto, isso a extremidade superior do reservatório está prevista aparentemente deve significar que os trabalhadores para terminar justamente na fronteira Brasil/Bolívia “contratados localmente” incluem os trabalhadores (na cidade de Abunã), qualquer aumento do nível da migrantes que viajaram de outras partes do Brasil água inundará terras na Bolívia. A barragem pode para o canteiro de obras por conta própria antes causar a elevação do nível da água no rio a mon- de serem contratados. Uma comissão parlamentar tante de Abunã de duas maneiras. Uma delas é por do Congresso Nacional brasileiro está realizando um aumento proposital na gestão da água, onde o audiências para determinar se houve tráfico de se- nível da água junto à barragem é aumentado assim res humanos para trazer trabalhadores “escravos” estendendo o reservatório propriamente dito para para Jirau de outros estados (Amazonas em Tempo, dentro da Bolívia. A outra é a formação esperada de 2012). Os problemas sociais causados pela migra- um “remanso superior”, onde os sedimentos grossos ção em massa para o canteiro de obras e área cir- acumulam na extremidade superior do reservatório cundante seria melhor descrito como um impacto e este amontoado de sedimentos impedirá o fluxo negativo do que como um benefício do projeto (por de água fazendo com que o nível de água suba acima exemplo, Instituto Pólis, 2006; de Almeida, 2009). do seu nível natural no trecho do rio a montante Uma indicação de que as condições de trabalho no além daquilo que está definido oficialmente como local de construção não são tão ideais é dada pela “reservatório”. agitação trabalhista persistente em Jirau, incluindo Inundação na Bolívia não é mencionada como dois grandes incidentes de incêndio criminoso (por um impacto. O PDD afirma que os níveis de água exemplo, Romero, 2012). Embora o descontenta- em Abunã devem “seguir a sua variação sazonal na- mento com trabalho seja um fenômeno comum, as tural” (ESBR & GDF Suez Energy Latin America revoltas em Jirau se destacam entre todas as cente- Participações Ltda., 2013, p. 8), como exigido por nas de obras que foram estabelecidas no âmbito do uma decisão de 2006 da Agência Nacional de Águas Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). (ANA) (Resolução ANA 555/2006). A alegação de O bloqueio da migração de peixes que não iria ocorrer inundações na Bolívia tem sido contestada várias vezes (Fearnside, 2013c; Fearnside, Um dos principais impactos não mencionados 2006a; Molina Carpio, 2006; Molina Carpio et al., no PDD é o bloqueio da migração de peixes. O úni- 2008). A questão é delicada diplomaticamente. A co aspecto disto mencionado é que as turbinas bulbo sedimentação e a consequente elevação dos níveis de usadas na usina vai matar menos das larvas de peixes água no remanso superior devem resultar em inun- que descem o rio do que seria o caso de outros tipos dações em território boliviano, tanto ao longo do rio Crédito para mitigação das mudanças climáticas 187 por barragens amazônicas: Brechas e impactos ilustrados peloprojeto da Hidrelétrica de Jirau Madeira quanto do rio Abunã (afluente do Madeira, al., 2005, Tomo I , p. VII-13), e não existem meses que também faz parte da fronteira Brasil-Bolívia). em que o plano no PDD especifica níveis mais ele- Os impactos das inundações incluiriam efeitos sobre vados (Tabela 1). Além de mostrar a imprecisão da uma área protegida no lado boliviano do rio Madeira afirmação enfática no EIA de 2005 alegando que o acima da cidade de Abunã. Uma análise detalhada plano apresentado no referido documento não cau- da “controvérsia sedimentos” do rio Madeira está saria inundação na Bolívia (FURNAS et al., 2005, disponível em Fearnside, (2013c) e informações adi- Tomo A, p. VII-16), os níveis mais baixos implicam cionais estão disponíveis em Fearnside (2013d). em menos de geração de energia e em um aumento O EIA considera o reservatório a ser mais curto na “adicionalidade” calculada das reivindicações de em comprimento em qualquer nível de água duran- crédito de carbono. Mais importante ainda, qual- te o período de cheia do que durante o período da quer um dos planos de operação torna claro o im- vazante (FURNAS et al., 2005, Tomo A, p. VII-8). pacto muito significativo, na operação de Jirau, da Para evitar inundações na Bolívia, a operação pla- existência da fronteira internacional com a Bolívia nejada da barragem no PDD (ESBR & GDF Suez na extremidade superior do reservatório. Operar o Energy Latin America Participações Ltda., 2013, p. reservatório durante grande parte do ano a um nível 9) seria de manter o nível de água na barragem em de água abaixo da cota “máxima normal” de 90 m 90 m acima do nível do mar durante quatro meses implica em menor geração de eletricidade devido à (janeiro-abril), em 85 m por quatro meses (maio, queda mais baixa na represa. Embora a expectativa junho, novembro e dezembro), e em 82,5 m para inicial era que o reservatório de Jirau seria operado quatro meses (julho a outubro). O efeito é calculado com a cota do reservatório em 90 m ao longo do apenas para o comprimento do reservatório, por si ano todo (por exemplo, PCE et al., 2002, p. 2.155- só, e não para o remanso superior. A gestão plane- 2.167), o plano foi modificado em 2004, para adotar jada do nível da água não vai impedir a formação um nível variável do reservatório, a fim de evitar a de um monte de sedimentos na parte superior do inundação na Bolívia (PCE et al., 2004, Vol. 1, p. reservatório, e, consequente, a inundação na Bolívia 2.2). Isso levanta a possibilidade de que o consórcio pela água que é retida por este impedimento. O rio pode estar esperando que, em algum momento futu- Madeira tem uma das mais altas cargas de sedimen- ro, o Brasil poderá chegar a um acordo com a Bolívia tos no mundo, representando cerca da metade de para que o nível da água seja aumentado para 90 m todo o sedimento no rio Amazonas (Meade, 1994). (ou talvez até superior) ao longo do ano. O Brasil está negociando com a Bolívia sobre a hidrelétri- O plano de gestão de água apresentado no PDD ca binacional planejada de Guajira-Mirim (tam- para evitar inundação na Bolívia (ESBR & GDF bém conhecida como a hidrelétrica de Cachoeira Suez Energy Latin America Participações Ltda., Ribeirão ou como a hidrelétrica “Binacional”) a 2013, p. 9) especifica níveis de água mais baixos em montante de Jirau (FURNAS & CNO, 2003; 6 meses do ano, em comparação com o Estudo de Tavares & Fariello, 2013). Além de adicionar à Impacto Ambiental (EIA) de 2005 (FURNAS et inundação pelo reservatório de Jirau, elevar o nível Tabela 1: Planos de manejo do reservatório de Jirau EIA de 2005 cota PDD de 2012 cota Diferença Mês Vazão média mensal (m3/s) (m acima do nível médio do (m acima do nível médio do mar) (m) mar) Jan. 23.900 90 90 0 Fev. 29.100 90 90 0 Mar. 33.600 90 90 0 Abr. 30.200 90 90 0 Mai 22.700 89,5 85 4,5 Jun, 15.900 87 85 2 Jul, 10.600 85 82,5 2,5 Ago, 6.800 83 82,5 0,5 Set, 5.600 82,5 82,5 0 Out, 6.800 83 82,5 0,5 Nov, 10.400 85 85 0 Dez, 10.600 87,5 85 2,5 188 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras de água além do especificado no PDD poderia fazer causando emissões fora da área do projeto (ESBR o crédito de carbono que a usina de Jirau reivindicou & GDF Suez Energy Latin America Participações consideravelmente menos “adicional” do que os cál- Ltda., 2013, p. 59). Outro impacto do desmatamen- culos apresentados ao MDL implicam. to foi um desgazeteamento (desafetação) em 2009, Em 2 de julho de 2013 a Agência Nacional de de 140 mil ha da Reserva Estadual do Rio Verde Energia Elétrica (ANEEL), do Brasil, solicitou ao para acomodar Jirau. A Reserva Federal Rio Pardo Ministério das Minas e Energia (MME) para ini- tive sua área aumentada pelo mesmo montante ciar uma negociação com a Bolívia para permitir para compensar isso, mas apenas a metade da área o aumento do nível da água em Jirau (Tavares & acrescentada à reserva tinha floresta, o resto havia Fariello, 2013). É intrigante que a ANEEL fez esta sido desmatado e estava ocupada por 5.000 famílias solicitação apenas 46 dias depois que o Conselho (Futada & Rolla, 2010; International Rivers, 2012). Executivo do MDL aprovou o projeto de Jirau para Isto implica uma perda líquida de 70.000 ha de flo- o crédito de carbono. A receita de energia extra que resta protegida devido à barragem de Jirau. será gerada se a Bolívia permitir que seu território seja inundado pelo reservatório propriamente dito EMISSÕES DE E GASES DE EFEITO ESTUFA faria com que a afirmação do projeto de MDL que a barragem seria economicamente inviável sem Brechas no MDL crédito de carbono seja ainda menos crível. Pode- se argumentar que o PDD deve ter coberto essa O PDD classifica a barragem apenas como uma possibilidade, tanto na análise de investimentos “fonte de emissões menor” de metano (ESBR & como na descrição dos impactos do projeto, uma GDF Suez Energy Latin America Participações vez que o pedido para a Bolívia parece indicar a in- Ltda., 2013, p. 13), mas deixa claro que, oficialmen- tenção dos desenvolvedores do projeto para operar a te, as emissões são zero e que nenhuma medição ou barragem no nível de água mais elevado. monitoramento é necessário (ESBR & GDF Suez Latin America Participações Ltda., 2013, p. 58). Outros impactos Não há estudos técnicos são citados para substan- Vários outros impactos da barragem não es- ciar a alegação de que a barragem seria apenas uma tão mencionados no PDD, tais como a metilação fonte “menor” de metano. A afirmação baseia-se de mercúrio em baías ao longo das margens do rio na brecha no regulamento do MDL classificação (Forsberg & Kemenes, 2006), impactos sobre a bio- de barragens por densidade de potência, ou seja, a diversidade e vários impactos sociais. Um impacto razão entre a capacidade instalada e a área do re- não mencionado com relevância para as emissões de servatório. Barragens com reservatórios pequenos gases de efeito estufa é que a barragem está forne- e grandes capacidades instaladas são autorizados a cendo um elo para uma série de hidrovias planejadas alegar que eles não têm emissões. Na realidade, ter que promovem o avanço da soja em áreas de floresta um reservatório pequeno reduz, mas não elimina, as tropical no Brasil e especialmente na Bolívia, assim emissões a partir da superfície do reservatório (em causando emissões e outros impactos do desmata- adição às que resultam de emissões provenientes de mento (Killeen, 2007; Molina Carpio, 2005;Vera- outras fontes, incluindo desmatamento). Diaz et al., 2007). Os benefícios das hidrovias são A brecha na regulamentação do MDL que enfatizados no estudo da viabilidade da usina de permite barragens com altas densidades de potên- Jirau (PCE et al., 2004, Vol. 1, p. 1.21-1.24). As taxas cia reivindicar emissões zero especifica 10 W/m2 de desmatamento atuais têm aumentado considera- como limite para a isenção completa (ver Fearnside, velmente nas imediações de Jirau e da barragem ad- 2013a). Jirau reivindica uma densidade de 18,05 W/ jacente de Santo Antônio (Escada et al., 2013). Esta m2 de energia, permitindo que o PDD a concluir área foi o maior foco de desmatamento na Amazônia que “Portanto, .... as emissões do projeto podem em dezembro de 2010 (Angelo & Magalhães, 2011; ser negligenciadas” (ESBR & GDF Suez Energy Hayashi et al., 2011). Desmatamento substancial no Latin America Participações Ltda., 2013, p. 7). futuro pode ser esperado a montante para plantio de Regulamentos do MDL permitem ser calculada a soja em áreas a serem atendidas pelas hidrovias pla- densidade de potência não da maneira normal, como nejadas (Fearnside, 2014). O PDD, no entanto, afir- uma razão simples entre a capacidade instalada a ma que a barragem não terá nenhum “vazamento”, área do reservatório, mas usando o “aumento de área Crédito para mitigação das mudanças climáticas 189 por barragens amazônicas: Brechas e impactos ilustrados peloprojeto da Hidrelétrica de Jirau do reservatório” como o denominador. Isto significa benefícios climáticos da proposta barragem de Belo não contar o leito natural do rio, que as propostas Monte (Rosa et al., 1996); contestada por Fearnside de MDL tomam para incluir não só o canal do rio, (1996). Esta continua sendo uma controvérsia im- mas também a vasta área que fica temporariamen- portante até os dias de hoje (Fearnside, 2004, 2006b, te inundada no auge do período da cheia nos rios 2009; Rosa et al., 2004, 2006). amazônicos. Estas áreas de floresta de várzea possui uma vegetação adaptada para sobreviver à inunda- Emissões de Jirau ção durante vários meses, mas não às inundações O PDD cita repetidamente documentos ofi- permanentes, como ocorre quando essas árvores se ciais (por exemplo, ESBR & GDF Suez Energy tornam parte de um reservatório. O PDD Jirau uti- Latin America Participações Ltda., 2013, p. 18-19) liza um “aumento de área do reservatório” de 207,74 referindo-se a energia hidrelétrica como “limpa” km2 (ESBR & GDF Suez Energy Latin America ou como uma “fonte não-emissora” (por exemplo, Participações Ltda., 2013, p. 8), em vez da área total Brasil, CIMC, 2008; Brasil, MME, 2011). A su- de reservatório de 361,60 km2 (ESBR & GDF Suez posição de que a energia hidrelétrica é uma ener- Energy Latin America Participações Ltda., 2013, p. gia limpa tem sido contestada, especialmente para 9). Se a densidade de potência for calculada utili- as barragens da Amazônia (por exemplo, Fearnside zando a área do reservatório cheio e a configuração & Pueyo, 2012). Embora a alegação de que a ener- atual de 3.750 MW, o resultado seria de 10,4 W/ gia hidrelétrica é limpa tem sido repetida tantas m2, ou só um pouco acima do limite de 10 W/m2 vezes que a maioria das pessoas ficam surpresas para fazer uso da brecha para considerar as emissões ao saber de outro modo, tais alegações têm sido da barragem como sendo zero. Se as 3.300 MW de cientificamente insustentáveis há algumas décadas capacidade instalada originalmente planejada fosse (Fearnside, 2012b). Vários estudos indicam grandes utilizada, a densidade de potência teria sido 9,1 W/ emissões em represas tropicais (por exemplo, Abril m2, fazendo com que o projeto não seja elegível para et al., 2005; Fearnside, 2002; 2005b; Kemenes et al., reivindicar emissões zero. Acrescentar as seis turbi- 2007, 2008, 2011; Pueyo & Fearnside, 2011). A alta nas extras após a alteração da localização da barra- vazão de água através do reservatório de Jirau vai gem em 2009 dá uma dupla garantia de ser capaz de resultar em emissões mais baixas do que em outras aproveitar a brecha. represas amazônicas, mas as emissões não serão zero. O fato que o regulamento do MDL não consi- A questão de se a água do reservatório irá es- dera a área inteira do reservatório é, aparentemente, tratificar é importante para o potencial de emissões. baseado na suposição errônea de que a água sobre o Em grandes reservatórios, como o da barragem de leito natural do rio não emite metano (ver Fearnside, Tucuruí, no rio Tocantins, no Estado do Pará, a 2013a). O regulamento do MDL, que permite bar- água se divide em camadas, com água quente em ragens com densidades de potência superior a 10 uma camada de superfície de 2-10 m de espessura (o W/m2 reivindicarem emissões zero é baseado em epilímnio), que está em contato com o ar e contém uma “submissão” (relatório) por Marco Aurélio dos oxigênio, e água fria em uma camada inferior (o hi- Santos e Luiz Pinguelli Rosa (CDM Methodologies polímnio), onde o oxigênio é quase completamente Panel, 2006). Esta submissão também é a origem da ausente. A água anóxica na parte inferior significa baixa emissão de 100 g de CO2/kWh atribuído a que o CO2 não pode formar, e toda a decomposição barragens na faixa de 4-10 W/m2 (Nota, o limite da matéria orgânica nos sedimentos produz o meta- inferior de 4 W/m2 foi estabelecido em 2007; an- no (CH4) em vez do CO2. Vários estudos têm mos- teriormente o limite era 5 W/m2). Estes valores de trado altas emissões de CH4 em reservatórios tro- emissões presumidas ignoram as principais fontes picais estratificados (ver Fearnside & Pueyo, 2012). de liberação de metano na maioria das barragens (as O EIA para Jirau calcula que a água no reserva- turbinas e os vertedouros), bem como subestimam as tório não será estratificada, com base no tempo de emissões de superfície do reservatório devido a uma reposição e na equação de densidade de Froude que série de erros matemáticos (ver: Pueyo & Fearnside, relaciona a estratificação com a velocidade da água 2011; Fearnside & Pueyo, 2012). O limite de 10 (FURNAS et al., 2005, Vol. 7, p. 3.8). Os modelos W/m2 resulta de uma sugestão de Luiz Pinguelli unidimensionais utilizados no EIA foram criticados Rosa, ex-presidente da Eletrobrás, em 1996 (ou seja, por Forsberg e Kemenes (2006) como inadequados antes do Protocolo de Quioto) sobre os supostos para modelar a estratificação em um reservatório de 190 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras formato irregular, e esses autores esperam a estrati- ocorre a estratificação quando o nível da água for ficação ao longo das bordas do reservatório. A estra- de 90 m: aquelas associadas com os igarapés de tificação ocorreria nas baías e outras características Jirau e Caiçara (FURNAS & CNO, 2007, p 148). onde as velocidades da água são muito menores do O “Bolsão do Mutum” teria quase nenhum oxigê- que a média para o reservatório como um todo, utili- nio devido ao tempo de reposição muito lento, mas zada nos cálculos do EIA. A estratificação, com água é muito raso para estratificar (FURNAS & CNO, de fundo anóxica, pode ser esperada nas bocas inun- 2007, p. 235). De forma conservadora, considerando dadas de afluentes que entram no reservatório, como apenas os igarapés de Jirau e Caiçara e a média dos mostrado por simulações realizadas pelos proponen- fluxos dos dois fluxos medidos em Santo Antônio, as tes, a pedido do IBAMA (FURNAS & CNO, 2007, emissões de superfície desses afluentes do reservató- Anexo V). Os sedimentos anóxicos nestas áreas das rio de Jirau somariam 4.494 toneladas de CH4/ano, margens podem ser esperados para produzir meta- o que equivale a 94.372 t CO2-eq. Esta quantida- no, uma parte do qual seria emitida através da su- de de CO2-equivalente é calculada considerando o perfície. No entanto, ao contrário dos reservatórios valor do Potencial de Aquecimento Global (GWP) com estratificação mais generalizada, a maior parte de 21 para CH4 ainda utilizado pelo MDL (valores da porção do metano dissolvido que não alcança a de GWP mais recentes, tais como o valor de 28- superfície na forma de bolhas vai ser impedida de 34 para CH4 no Quinto Relatório de Avaliação atingir as turbinas. Isto é devido à presença de água do Painel Intergovernamental sobre Mudança com maior teor de oxigênio no canal principal, onde Climática (IPCC) para o mesmo horizonte tempo- a água está em movimento rápido. No entanto, me- ral de 100 anos (Myhre et al., 2013), implica um dições recentes no reservatório de Santo Antônio, maior impacto de barragens. O Quinto Relatório que é muito semelhante e está localizado imedia- de Avaliação apresenta também um valor GWP de tamente a jusante de Jirau, indicam fluxos elevados 86 para um horizonte temporal de 20 anos (Myhre de gás metano a partir da superfície da água nos et al., 2013), que é mais relevante às políticas para afluentes (Hällqvist, 2012, p. 25), sugerindo que os evitar um aumento de temperatura superior a 2° C, afluentes são estratificados, enquanto uma alta con- o que implica em uma quadruplicação do impacto centração de metano na água imediatamente abaixo das barragens. Se o “Bolsão do Mutum” emitirem no da barragem de Santo Antônio (Grandin, 2012, p. mesmo nível, essas emissões aumentariam em cerca 28) indica que nem todo o metano é oxidado antes de 50%. Estes valores de emissão presumem que o de atingir as turbinas. nível da água ficará em 90 m o ano todo, o que se Jirau terá quatro “bolsões”, ou baías rasas ao lon- aplicaria se as negociações com a Bolívia são bem go da margem oriental do reservatório (FURNAS sucedidas. Caso contrário, estes afluentes seriam & CNO, 2007, Anexo V). Estas estarão associadas a completamente estratificados por 8 meses do ano e dois riachos (igarapés) afluentes ( Jirau e Caiçara), o “intermitente” por mais de 3 meses (FURNAS & rio Mutum-Paraná (que é o maior afluente que en- CNO, 2007, p. 148). A operação no nível de 90 m tra no reservatório) e o “Bolsão do Mutum”, forma- durante o ano inteiro pode resultar na estratificação do pelo rio Cotia (um afluente do Mutum-Paraná). do rio Mutum-Paraná durante o período de baixa No nível da água de 90 m, as áreas destas baías serão vazão neste afluente (julho a dezembro). O perigo de de 9,84, 17,84, 22,27 e 18,24 km2, respectivamente estratificação do Mutum-Paraná foi destacado por (FURNAS & CNO, 2007, pp. 124-125). Uma vez Forsberg e Kemenes (2006), no contexto da metila- que o reservatório Jirau só começou foi enchido em ção de mercúrio. O consórcio ficou suficientemente 2013, ainda não há medições disponíveis de fluxos. preocupado com a possibilidade de emissões de ga- No entanto, foram feitas medições de fluxo, em fe- ses de efeito estufa no Mutum-Paraná que removeu vereiro de 2012, em dois afluentes do reservatório a vegetação com tratores de esteira na parte da área de Santo Antônio; os afluentes emitiam 16 e 39,6 a ser inundada e enterrou a biomassa em covas rasas mmol/m2/dia de CH , respectivamente (Hällqvist, (ver fotografias em Locher et al., 2013, p. 186-187). 4 2012, p. 25). No rio principal os fluxos foram mí- O CO2 será lançado pela decomposição aeróbia nimos: 0-0,5 mmol/m2/dia. Isso pode, pelo me- da vegetação alagada pelo reservatório de Jirau, in- nos, dar uma ideia da magnitude do fluxo de Jirau, clusive da floresta morta da várzea. Considerando as embora a incerteza é, obviamente, muito grande. áreas de cada tipo de vegetação (com o reservatório Em duas das quatro baías de Jirau é esperado que menor que teria sido criado com a barragem em sua Crédito para mitigação das mudanças climáticas 191 por barragens amazônicas: Brechas e impactos ilustrados peloprojeto da Hidrelétrica de Jirau localização inicialmente prevista) e as estimativas (22 de julho de 2008, conforme o PDD (ESBR & de biomassa (apenas acima do solo) para cada tipo GDF Suez Energy Latin America Participações de vegetação apresentado no EIA (FURNAS et al., Ltda., 2013, p. 24). O consórcio liderado pela GDF 2005, Tomo B, Vol. 7, Anexo 2), a decomposição Suez venceu a licitação de Jirau 19 de maio de 2008, dessa biomassa representa 2,7 milhões de toneladas e logo depois anunciou o plano para deslocar a bar- de emissões de CO2. Claro que, a desmatamento es- ragem 9,2 km a jusante para a Ilha do Padre, onde os timulado em outros locais pelo projeto hidrelétrico custos de construção seriam menores, supostamen- e pelas hidrovias associadas representa uma emissão te por R$ 1 bilhão, ou cerca de US$ 500 milhões de CO2 ainda maior. (Soares, 2008). O rio na Ilha do Padre é mais largo Em resumo, os afluentes estratificados e outras do que no local original em Cachoeira Jirau, per- fontes irão resultar em emissão de gases de efeito mitindo turbinas adicionais para aumentar a capa- estufa. Enquanto os valores podem parecer substan- cidade instalada. O plano original para a barragem ciais, eles são modestos em comparação com a maio- era ter 44 turbinas, totalizando 3.300 MW (o “caso ria dos outros projetos de hidrelétricas na Amazônia. base” utilizado no cálculo dos benefícios de carbono no PDD original, mais tarde revisto para 46 turbi- nas no PDD atual). Em março de 2010 os planos ADICIONALIDADE E CRÉDITO DE na Ilha do Padre evoluíram para um projeto com 50 CARBONO turbinas, totalizando 3.750 MW (ESBR & GDF Suez Energy Latin America Participações Ltda., Taxas internas de retorno 2013, p. 26). É evidente que o plano para a represa, O Protocolo de Quioto (Artigo 12, § 5°] exige com pelo menos 46 turbinas no local a jusante, foi o que as reduções de emissões reivindicadas por cré- cenário real previsto pelos desenvolvedores antes da dito do MDL devem ser “adicionais às que ocorre- data de início oficial do projeto de carbono, e que iria riam na ausência da atividade certificada de projeto”. desafiar a razão para não acreditar que este também Estabelecer “adicionalidade” exige um cenário hipo- não foi o plano antes da licitação, permitindo assim tético que representa o que teria acontecido sem o que o consórcio liderado pela GDF Suez vencesse a projeto de mitigação, e demonstrando que o projeto licitação com um lance para a tarifa de energia elé- (neste caso de construção da barragem) não teria trica 21% menor do que a proposta pelo consórcio ocorrido sem o financiamento do MDL. O ônus da rival liderado pela Odebrecht (Salomon & Medina, prova para estabelecer a adicionalidade cabe aos de- 2008). O Conselho Nacional do Meio Ambiente senvolvedores de projetos. (CONAMA) questionou a mudança para a Ilha do Padre, na sua reunião de 17-18 de junho de 2008, Regulamentos permitem que projetos de MDL dado que a mudança deveria ocorrer sem quaisquer para calcular uma taxa interna de retorno (IRR) e estudos ambientais complementares ou consultas compará-lo a um valor de IRR “ponto de referência” com os moradores locais, mas o IBAMA aprovou (“benchmark”), a fim de estabelecer que os fundos do a instalação da Licença Prévia para Jirau em 14 de MDL são necessários para tornar a barragem ren- novembro de 2008. tável. A IRR representa a maior taxa de desconto na qual um investimento do capital seria conside- Mais tarde, em resposta às críticas do projeto de rado rentável. A taxa de desconto é a percentagem carbono, o consórcio voluntariamente fez um cálcu- pelo qual os custos e benefícios são desvalorizados lo da IRR com as seis turbinas adicionais a serem para cada ano futuro para traduzir valores futuros instaladas na Ilha do Padre, a fim de mostrar que em seus equivalentes nos termos atuais (ou seja, o o projeto de carbono ainda seria considerado adi- valor presente líquido). Há muitos ajustes possíveis cional nos termos da regulamentação do MDL (ver utilizados para os valores IRR, com implicações im- ESBR, 2012, p. 62). Esta nova versão de 50 turbinas portantes para as decisões de investimento. do “cenário otimizado” (a versão anterior era com 46 turbinas) foi apresentado em uma versão revista A IRR de referência é calculada com base nos do PDD (versão 4.0, de 18 de abril de 2012), que custos esperados e as receitas previstas a partir da calculou uma IRR com base de patrimônio (equity geração de energia. No caso do projeto de carbono IRR) de 7,5%, em comparação para 6,8% em um Jirau, esses valores esperados foram baseados no pro- “caso base” reformulado com 46 turbinas (ESBR jeto oficial da barragem, na data de início do projeto & GDF Suez Energy Latin America Participações 192 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Ltda., 2013, p. 50). Nenhum recálculo deste tipo do MDL (CDM Executive Board, 2011, p. 38-39) é conhecido que considera o aumento do nível de indicam que, sendo um projeto registrado, Jirau já é água que é esperado, presumindo que a permissão é obrigada a apresentar uma nova PDD com a configu- obtida para o reservatório propriamente dito inun- ração de 50 turbinas e que, no futuro, teria de entregar dar na Bolívia. No entanto, o estudo de viabilidade uma outra revisão se o nível de água mais elevado for de 2004 havia calculado que o efeito da operação da aprovado. Os cálculos revisados da adicionalidade do barragem durante todo o ano com o nível de água projeto poderiam resultar na suspensão das CERs. mais elevado (90 m) seria de aumentar a geração em Projetos de MDL podem escolher entre dois ti- 12% (PCE et al., 2004, Tomo 1, Vol. 1, p. 1.1). O pos de IRR para os seus cálculos para demonstrar a valor de 12% é uma subestimativa do efeito da al- adicionalidade. Os desenvolvedores do projeto Jirau teração da atual proposta, uma vez que se baseia no usaram um modelo de Avaliação de Precificação de plano de gestão da água no estudo de viabilidade Capital (CAPM) para calcular a IRR de referência de 2004, e não nos níveis de água mais baixos pro- em termos de retorno líquido sobre o patrimônio. postos no PDD, além de estar baseado na menor Esta IRR é diferente do cálculo da IRR de projeto capacidade instalada com 44 turbinas (3.300 MW). com base no Custo Médio Ponderado de Capital A permissão para inundar na Bolívia tem sido visto (WACC), a opção utilizada, por exemplo, nos pro- como uma solução diplomática provável desde uma jetos de MDL para as barragens de Teles Pires e reunião dos presidentes do Brasil e da Bolívia em Santo Antônio. A IRR é calculada a partir do ponto janeiro de 2008, seis meses antes da data de início de vista do acionista, e geralmente tem um valor su- do projeto de carbono de Jirau (Época, 2008). Isto perior à IRR de projeto, que é a partir da perspectiva faria com que a hidrelétrica de Jirau fosse substan- do projeto como um todo. Os dois não podem ser cialmente mais rentável e menos propensa a ser con- comparados diretamente. siderada adicional. Os proponentes de um projeto de MDL tem O PDD enfatiza uma comparação entre os va- ampla liberdade na escolha de um valor de IRR para lores para a IRR de 6,8% e 7,5% (para as configura- usar como referência. Obviamente, há um interes- ções de 46 e 50 turbinas, respectivamente) com um se inerente em escolher um valor alto para que o valor de IRR específica do projeto de 15,7%, o que projeto hidrelétrico seja classificado como inviável implica que a barragem seria considerada economica- quando comparado com o índice de referência, tor- mente inviável por uma ampla margem em ambos os nando-se assim “adicional” e elegível para o crédi- casos (ESBR & GDF Suez Energy Latin America to de MDL. O marco de referência (“benchmark”) Participações Ltda., 2013, p. 50). No entanto, a de- “específico ao projeto” de 15,7% que o PDD enfa- cisão do MDL para conceder crédito de carbono foi, tiza para Jirau é calculado no PDD com base em aparentemente, com base na comparação, entre um vários fatores de correção (ESBR & GDF Suez valor de IRR calculado de 10,9%, e um “padrão de re- Energy Latin America Participações Ltda., 2013, p. ferência para as condições de base” de apenas 12,46% 35), incluindo o risco país (2,73%), prêmio de risco (i.e., ESBR, 2012, p. 60). Esta IRR de referência (“ben- (6,20%) e um multiplicador de 1,60 para o índice chmark”) foi calculada com base no valor de 50% para Beta ajustado da indústria (o índice beta indica a a alavancagem financeira, ao invés da alavancagem de relação entre o retorno de um investimento e o re- 70% usada para o valor muito maior da IRR especí- torno do mercado, e o índice “ajustado” é uma pon- fica do projeto. A alavancagem financeira padrão de deração entre seus indicadores históricos e futuros). 50% é exigido pela Orientação (“Guidance”) No. 18 A principal justificação para esta referência não é a de Análise de Investimentos (IA) (CDM Executive lógica por trás das correções aplicadas, mas sim a Board, 2011, Anexo 5), a pedido do validador do pro- citação da confirmação de um valor quase idêntico jeto (ESBR, 2012, p. 61), e resultou na revisão dos em um relatório do Banco Mundial (World Bank, valores de IRR em 2012. O resultado é que Jirau não 2008), que refere à Agência Nacional de Energia é mais indicada como sendo antieconômico por uma Elétrica (ANEEL) do Brasil como tendo dito [sem larga margem, e a barragem provavelmente seria clas- referência a qualquer documento] que “os investido- sificada como ”não-adicional” (e, portanto, inelegível res estão dispostos a investir em geração de energia para qualquer crédito de carbono) se as IRRs fossem elétrica somente quando as taxas de retorno forem calculadas com 50 turbinas e água durante todo o ano cerca de 15%” (ESBR & GDF Suez Energy Latin no nível de 90 m acima do nível do mar. As normas America Participações Ltda., 2013, p. 34). Este Crédito para mitigação das mudanças climáticas 193 por barragens amazônicas: Brechas e impactos ilustrados peloprojeto da Hidrelétrica de Jirau valor é repetidamente referido como uma estima- substitua capacidade existente de combustível fóssil tiva do Banco Mundial, e o “prestígio e experiência” e a outra é a “margem de construção” (build margin) do Banco são exaltou explicitamente para reforçar para ser usado quando a capacidade de “substituir” a credibilidade deste valor de IRR (ESBR & GDF um projeto que teria sido adicionada à grade na au- Suez Energy Latin America Participações Ltda., sência do projeto. No Brasil, a “margem de constru- 2013, p. 34). No entanto, a origem do número é uma ção” é geralmente energia hidrelétrica. No entanto, declaração não referenciada por um funcionário a ameaça de aumento da geração de combustíveis anônimo da ANEEL. fósseis é frequentemente utilizada pelas autorida- Emissões substituídas des como argumento para relaxar as barreiras de licenciamento ambiental para a construção de bar- O PDD afirma que “o deslocamento de ele- ragens (por exemplo, O Estado de São Paulo, 2013). tricidade ocorrerá na margem do sistema, ou seja, Nos casos das barragens de Jirau e Santo Antônio, geração termelétrica, principalmente de combus- em 2007, o então presidente Luiz Inácio Lula da tível fóssil, será substituída” (ESBR & GDF Suez Silva defendeu que o governo iria construir usinas Energy Latin America Participações Ltda., 2013, p. nucleares em vez dessas hidrelétricas, caso a minis- 15). No entanto, o Brasil planeja construir dezenas tra do Meio Ambiente Marina Silva, na época, não de outras barragens ao longo da próxima década, e aprovasse as licenças para a construção das barra- uma barragem subsidiada pelo MDL poderia, re- gens (O Globo, 2007). Como um país onde mais de almente, estar substituindo outra barragem menos 70% da eletricidade vem de hidrelétricas, e onde rentável (ao invés de combustíveis fósseis), especial- ainda existem muitos locais sem barragens com po- mente se a construção de barragens fosse inviável na tencial hidrelétrico, outras barragens representam a ausência de subsídios, como alega o PDD. É claro alternativa mais provável. Este seria o caso em uma que as prioridades futuras do Brasil em relação à sua escala de tempo de anos, mesmo se a geração por matriz energética poderiam ser diferentes daquelas termelétricas fosse aumentar temporariamente para de hoje: a barragem poderia muito bem estar substi- compensar deficiências de geração pontuais e atra- tuindo um futuro programa de eficiência energética sos na construção de barragens. Mesmo que as usi- ou um projeto de energia eólica, solar ou das marés. nas nucleares fossem realmente a alternativa a bar- Nestes casos, a justificativa para a reivindicação de ragens, como o presidente Lula afirmou, a “margem crédito de carbono para Jirau iria evaporar, mesmo de construção” não seria a queima de combustíveis se a barragem fosse realmente adicional. fósseis. Obviamente, a escolha de 100% de combus- Por outro lado, o deslocamento de eletricidade tíveis fósseis como a “margem operacional”, em vez pode não ocorrer de forma alguma. A linha de base de usar a “margem de construção”, para o cálculo de fundamental é, muitas vezes, concebida como aquela adicionalidade no PDD, implica muito mais crédi- em que fontes mais caras de energia serão “desliga- to de carbono e retorno financeiro para o projeto das” na medida em que mais hidrelétricas financia- MDL de Jirau. das pelo MDL começarem a gerar energia. Mas, no caso do Brasil, nada será “desligado”. Em vez disso, O efeito dos subsídios: “políticas E-menos” é esperado que instalações de geração de energia, A classificação como uma “política E-menos” tanto para energia hidrelétrica e gás, expandirão permite que o efeito de subsídios seja removido do enormemente ao longo da próxima década (Brasil, cálculo do IRR esperado do projeto, tornando o pro- MME, 2011). Ao invés de desligar algumas insta- jeto parecerem ser menos rentável e, portanto, mais lações existentes, as novas instalações continuarão a provável de ser considerado adicional. O Conselho ser adicionado ao sistema de produção existente. A Executivo do MDL decidiu que “Um cenário de ajuda adicional do MDL apenas subsidia o cresci- referência será estabelecido tendo em conta as re- mento que já está planejado. levantes políticas e circunstâncias nacionais e / ou Porque projetos de energia MDL são muitas setoriais, tais como .... planos de expansão do setor vezes construídos para ampliar a capacidade da de energia ...” (CDM Executive Board, 2005, Anexo rede em vez de substituir a capacidade existente de 3, § 4º). O governo brasileiro tem enormes planos energia, a Conselho Executivo do MDL tem dois para a expansão do setor de energia (Brasil, MME, métodos básicos: um é a “margem operacional” (ope- 2011), que se reflete em crédito subsidiado do ban- rating margin) no caso de um projeto de MDL que co de desenvolvimento do governo (BNDES). Em 194 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras comparação com uma IRR calculada com os subsí- BNDES para barragens, seja motivada pela redução dios existentes, uma IRR hipotética calculada sem os das emissões (CDM Executive Board, 2004, § 1º). subsídios seria muito menor. A questão de saber se A noção de que o apoio do governo brasileiro para o estes subsídios podem ser dispensados de considera- seu enorme programa de construção de barragens na ção depende se eles são motivados por preocupações Amazônia, inclusive Jirau, é motivado principalmen- com o clima, sendo que a Conselho Executivo do te pela preocupação com as emissões de gases de efei- MDL criou uma exceção para políticas que estimu- to estufa estica os limites da credulidade deste autor, lem as tecnologias menos intensivas em emissões mas, aparentemente, não a dos consultores que ela- (“políticas tipo E menos” ou “políticas E-menos”), boraram o PDD e o Relatório Oficial de Avaliação. que foram implantadas após o 11 de novembro de Se a intenção dos fundadores do MDL tem sido 2001 (CDM Executive Board, 2005, Anexo 3, § 6º reinterpretado ou não ao longo dos anos é de pou- & § 7bº). O sub-parágrafo do regulamento específi- ca importância. O que é evidente é que projetos de co para “as políticas E-menos” não inclui a frase “mo- barragens estão sendo aprovados o para crédito de tivada por” (CDM Executive Board, 2005, Anexo 3, carbono em grande escala, apesar do fato de que eles § 6º), mas a decisão original da criação desta cate- são subsidiados pela maioria dos governos por mo- goria (CDM Executive Board, 2004, Anexo 3, § 1º), tivos não relacionados às mudanças climáticas, por como um de quatro tipos, o termo “motivado por” exemplo, visando o aumento da autonomia ener- explicitamente é usado para distinguir dois deles de gética e a promoção da industrialização. É seguro políticas que são implementadas por outros motivos dizer que a maioria dessas barragens estão sendo e que são apenas “por acaso” benéficas para a mu- construídas pelos países para aumentar a sua oferta dança climática, deixando claro que a motivação cli- total de eletricidade, não para substituir usinas ter- mática foi o fator orientador na criação das exceções. moelétricas existentes. Porque a eletricidade a partir As decisões do Conselho Executivo devem refletir de hidrelétricas no Brasil é muito mais barato do que a intenção do Protocolo de Quioto, e no Protocolo a energia de usinas termelétricas (desde que os cus- é muito claro em afastar projetos de MDL para os tos ambientais e sociais das barragens sejam ignora- desenvolvimentos que aconteceriam de qualquer dos), a expansão da energia hidrelétrica continuaria maneira. Isso faz com que o critério “motivado por” à taxa máxima possível, sem recorrer a um subsídio seja essencial para a manutenção da integridade dos com base em supostos benefícios climáticos. esforços globais para mitigar a mudança climática. As hidrelétricas recebem condições de financia- O PDD de Jirau cita o fato que os benefícios da mento favoráveis do BNDES. Estas incluem taxas de energia hidrelétrica para o clima são mencionados em juros menores, em parte por uma mudança na política documentos oficiais recentes como prova de que os do BNDES em 2007 para oferecer grandes projetos subsídios para barragens do BNDES são motivadas hidrelétricos taxas calculadas a partir de um “spread por preocupações com o clima, tornando-os subsídios básico” de apenas 0,5%, contra 1,8% para a gera- “políticas E- menos” e, portanto, dispensados de in- ção com combustíveis fósseis (ESBR & GDF Suez clusão na IRR linha de base. O Plano Nacional so- Energy Latin America Participações Ltda., 2013, p. bre Mudança do Clima (Brasil, CIMC, 2008) é dada 47). “Spread básico” refere-se à diferença entre as ta- como justificação para considerar o financiamento xas de juros de um banco para empréstimos e depósi- preferencial para barragens como sendo motivado tos. É irônico que o valor de 0,5% para “spread básico” por preocupações com o clima (ESBR & GDF Suez cobrado aos grandes projetos hidrelétricos seja muito Energy Latin America Participações Ltda., 2013, p. inferior aos 0,9% cobrado à energia eólica (ESBR 46-47). No entanto, o Brasil tem subsidiado barra- & GDF Suez Energy Latin America Participações gens fortemente durante muitos anos antes de 2008 Ltda., 2013, p. 47), levantando dúvidas sobre se a através de uma série de medidas em constante evo- generosa concessão à hidrelétricas é realmente mo- lução. A prática também se estende desde muito an- tivada por preocupações de mitigação climática. O tes da aprovação dos Acordos de Marraqueche em subsídio maior para a energia hídrica em relação à 11 de novembro de 2001, que é a data limite para eólica é supostamente devido à maior carga de juros que os subsídios sejam qualificados como “políticas para a energia hídrica que resulta de um longo pe- E-menos” CDM Executive Board, 2005. A classifi- ríodo de construção. No entanto, se a energia eólica cação como “política E-menos” deve significar que pode ser viabilizada com menos subsídio do governo, a política, neste caso o financiamento subsidiado do por que não promover energia eólica em preferência à Crédito para mitigação das mudanças climáticas 195 por barragens amazônicas: Brechas e impactos ilustrados peloprojeto da Hidrelétrica de Jirau energia hidrelétrica? Outro bônus para a energia hí- regras atuais do MDL, sendo que crédito retroativo drica é uma disposição em vigor desde 2006 por um é permitido para as iniciativas que foram iniciadas período de amortização de 20 anos, em comparação como projetos de MDL. No entanto, o fato básico é aos 14 anos para usinas de energia movidas a gás na- que a barragem está em construção, e as firmas não tural (ESBR & GDF Suez Energy Latin America iriam abandonar o projeto na ausência de fundos do Participações Ltda., 2013, p. 48). MDL. O PDD calcula um valor de 9,7% para a IRR A oferta do Brasil de condições de empréstimo com base de patrimônio após os impostos e em ter- mais favoráveis do seu banco de desenvolvimento mos reais (ou seja, depois de descontada a inflação) governamental (BNDES) para hidrelétricas, dife- sob os termos reais do empréstimo ao projeto con- rente das usinas de energia movidas à gás (ESBR cedido pelo Banco Nacional do Desenvolvimento & GDF Suez Energy Latin America Participações Econômico e Social (BNDES) (i.e., não sob um Ltda., 2013, p. 45-47), não é motivada pela cenário hipotético), e sem crédito do MDL (ESBR preocupação com o aquecimento global sozinho. & GDF Suez Energy Latin America Participações Em 2006, o governo de Evo Morales, na Bolívia, na- Ltda., 2013, p. 53). Este não é um mau negócio, em cionalizou as instalações da Petrobrás naquele país e comparação com a maioria das aplicações. Enquanto gerou uma turbulência no governo brasileiro (Folha uma IRR de 9,7% foi calculada para o caso sem cré- de São Paulo, 2006). O Brasil importava 50% do seu dito do MDL, no caso com crédito elevaria o re- gás da Bolívia em 2006, um percentual que conse- torno a 16,7% (ESBR & GDF Suez Energy Latin guiu reduzir para 36% até 2012 (Ordoñez, 2012). A America Participações Ltda., 2013, p. 53). A dife- crise boliviana motivou o Brasil a instituir um pro- rença representaria um enorme lucro inesperado grama forte para promover a produção de energia para GDF Suez e, dificilmente, poderia ser conside- doméstica, através do desenvolvimento de energia rado um uso sábio dos fundos para mitigação. hidrelétrica, por uma razão que é independente de É possível que os desenvolvedores de projetos qualquer suposta vantagem da energia hidrelétri- hidrelétricos possam contar com futuras receitas ca para a mudança climática. É claro que outros de carbono se o risco do projeto de MDL não ser fatores também podem estar favorecendo proje- aprovado for percebido como pequeno. No entan- tos de barragens, já que a indústria da construção to, do ponto de vista da definição de políticas para representa uma das maiores fontes de contribuições o MDL e para a mitigação em geral, seria impru- para campanhas políticas (Scofield Jr., 2011; Gama, dente supor que as decisões sobre projetos hidrelé- 2013). O Brasil está atualmente envolvido em um tricos sejam baseados em créditos de carbono. Isto esforço maciço para construção de barragens, com significa que as decisões do Conselho Executivo do uma média de uma grande barragem a ser concluí- MDL não devem ignorar a manifestação física mais da na Amazônia Legal a cada quatro meses durante óbvia da decisão real dos desenvolvedores de proje- a próxima década (Brasil, MME, 2011, p. 285 ). O tos de barragens, ou seja, que as barragens estão em retrato do subsídio do governo para isso como uma construção, com investimentos maciços, antes que contribuição generosa para os esforços globais para créditos de carbono sejam solicitados, muito menos combater a mudança climática ultrapassa os limites concedidos. É a finalidade do Protocolo de Quioto da credibilidade. Em outras palavras, a aplicabili- no combate à mudança climática que é importan- dade do regulamento MDL permitindo um valor te, e não o vasto labirinto de decisões, orientações e IRR de referência para ser usado com base em um esclarecimentos do Conselho Executivo que tenha cenário hipotético, sem os subsídios das “políticas sido erguido desde então. E-menos” é uma questão em aberto. Comportamento dos investidores e da “AR QUENTE” E AS MUDANÇAS adicionalidade CLIMÁTICAS O simples fato de que a barragem de Jirau já A quantidade de “ar quente” (créditos de carbo- está em construção é uma forte evidência de que no concedidos sem um benefício real para o clima) o projeto não é adicional, no sentido pretendido a ser gerada pelo projeto é grande. Em média anu- pelo Protocolo de Quioto (distinto do sentido das al, as reduções de emissões alegadas para Jirau são regras atuais do MDL). Iniciar a construção antes 6.180.620 t de CO2-eq/ano, o que é equivalente a da apresentação do projeto de MDL não viola as 1,69 milhões t C/ano. Ao longo do projeto de sete 196 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras anos os créditos terão um total de 43,3 milhões de climáticas. O contraste entre esses impactos e as afir- toneladas de CO2-eq, ou 11,8 milhões de toneladas mações da empresa dramatiza a necessidade de uma de carbono, o que é aproximadamente igual à emis- reorientação básica, não só das empresas, mas tam- são da cidade de São Paulo em um ano. Esta quanti- bém da autoridade designada nacional (DNA) bra- dade de carbono que será emitida em outro lugar do sileira, o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, mundo, nos países que compram os créditos CERs o Conselho Executivo do MDL, e da Convenção- concedidos pelo MDL. Uma vez que a barragem Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do teria sido construída de qualquer maneira, não há Clima (UNFCCC) como um todo. Os problemas da mitigação real para compensar as emissões autoriza- proposta MDL de Jirau são, na sua essência, comuns das pelos créditos. O fato que o projeto de Jirau está a muitas outras propostas de carbono para barragens. permitindo a emissão de um total de 43 milhões de A lição que isto significa é que os fundos para mitigar toneladas de “ar quente” ao longo de sete anos pelos o aquecimento global deveriam ser usados para ou- países compradores é um impacto significativo em tros tipos de projetos, e não para barragens. si mesmo: para fins de comparação, toda a gasoli- na utilizada no Brasil em 2005 emitiu 39,1 milhões de toneladas de CO2 (Brasil, MCT, 2010, p. 159). PERSPECTIVA FUTURA E CONCLUSÃO A importância global de créditos de carbono para a Jirau ilustra como as reduções de emissões e o energia hídrica é muito maior, com 331 milhões de crédito de carbono para projetos de hidrelétricas toneladas de CO2-eq no “duto” (“pipeline”) do MDL pode deixar de ser adicionais, em comparação com (UNEP, 2013). o que ocorreria sem o financiamento do Mecanismo Espera-se que as receitas dos CERs de Jirau de Desenvolvimento Limpo (MDL), do Protocolo (ESBR & GDF Suez Energy Latin America de Quioto. Ao invés disso, os cálculos financeiros no Participações Ltda., 2013, p. 52), em média, alcan- documento de concepção de projeto (PDD), argu- çam R$ 250 milhões por ano, considerando a taxa de mentando que a barragem é adicional nos termos da câmbio na data de início do projeto em 22 de julho regulamentação do MDL, indicam que os regula- de 2008, ou US$ 158.000.000 por ano. Ao longo de mentos atuais do MDL estão prejudicando o clima 7 anos, um total de US$ 1,11 bilhões seriam desvia- e devem ser modificados. Crédito concedido às bar- dos da mitigação real do aquecimento global. Note- ragens que seriam construídas de qualquer maneira se que os preços dos CERs (em US$) diminuíram permite que os países que compram créditos podem em cerca de 90% entre junho de 2008 e dezembro emitir gases de efeito estufa sem uma verdadeira de 2012, o que reduziria o total de 7 anos para US$ compensação correspondente. Mais danos ainda são 110 milhões. No entanto, como é o caso para qual- gerados pelo fato de que hidrelétricas tropicais emi- quer mercadoria, os preços de carbono são regidos tem mais gases de efeito estufa do que são reconhe- pelo equilíbrio entre oferta e demanda, e pode-se cidos nos procedimentos de MDL. O problema de supor que a demanda (e consequentemente o preço) crédito sem merecimento (não adicional) para pro- aumentaria substancialmente se os países do mundo jetos hidrelétricos é bastante geral, fazendo com que se comprometessem a grandes cortes nas emissões. Se a única solução prática é de eliminar completamente é para conter o aquecimento global, será necessário o crédito para hidrelétricas no âmbito do MDL. A fazer cortes muito maiores nas emissões globais do possibilidade teórica do crédito ser negado a algum que os negociadores internacionais têm contemplado raro projeto individual que seja realmente adicional até hoje (e.g., Meinshausen et al., 2009). As medidas é insignificante quando comparado com o estrago necessárias serão muito caras, e não podemos dar ao que o crédito hidrelétrico está fazendo para os esfor- luxo de desperdiçar o dinheiro destinado a este fim. ços globais em combater a mudança climática. Os parágrafos iniciais do PDD descrevem GDF O objetivo do MDL, e da Convenção de Clima Suez como sendo dedicada ao “crescimento respon- como um todo, é ajudar a conter o aquecimento glo- sável” e “respeitando o meio ambiente” (ESBR & bal. Não é para distribuir os subsídios que os países GDF Suez Energy Latin America Participações e as empresas percebem como se fossem direitos. A Ltda., 2013, p. 3). Infelizmente, além dos muitos lógica de julgar projetos de mitigação é diferente de, outros impactos da barragem (e.g., Switkes, 2008]), por exemplo, um tribunal de direito. Em um siste- o projeto de MDL Jirau representa um duro golpe ma jurídico, aqueles em julgamento são considera- para os esforços globais para conter as mudanças dos inocentes até que se prove sua culpa além de Crédito para mitigação das mudanças climáticas 197 por barragens amazônicas: Brechas e impactos ilustrados peloprojeto da Hidrelétrica de Jirau uma dúvida razoável, o corolário de que criminosos também serão sentidos. Nada disto é mencionado acusados são, frequentemente, absolvidos mesmo na proposta para crédito de carbono. que eles sejam, de fato, culpados é visto como um preço razoável para a sociedade pagar em compara- Emissões de gases de efeito estufa ção com a alternativa de punir injustamente alguns daqueles que são inocentes. Para a mitigação da mu- Vários estudos indicam grandes emissões de dança climática é o inverso: os projetos devem ser represas tropicais. Uma brecha no regulamento do presumidos como não adicionais até que se provem MDL permite que barragens com altas densidades ser adicionais. O resultado de que alguns projetos de potência reivindicassem emissões zero. A alta va- verdadeiramente adicionais são recusados, de for- zão de água através do reservatório de Jirau resultará ma alguma, justifica qualquer outro procedimento. A mesma lógica que se aplica a projetos individuais em emissões mais baixas do que em outras represas se aplica também a classes inteiras de projetos (tais amazônicas, mas as emissões não serão zero. como barragens): cada classe de projetos precisa ter um efeito líquido que seja adicional, o que só pode Adicionalidade e crédito de carbono ser alcançado se a aprovação de crédito para proje- tos não adicionais for muito rara. No caso das hi- O fato de que a barragem de Jirau já esteja em drelétricas, embora possa haver algumas barragens construção não suporta a reivindicação da adicionali- que são, de fato, adicionais, um sistema que aprova dade do projeto, mesmo que sob as regras do MDL o um grande número de barragens não adicionais tem crédito retroativo é permitido para as iniciativas que consequências muito graves para o mundo como um foram iniciadas como projetos de MDL. A razão é todo, e, portanto, este autor acredita que isso não que o PDD não demonstra de maneira convincente deva ser permitido continuar. que o projeto só poderia ser iniciado devido à conces- são de credito do MDL. Os regulamentos permitem RESUMO EXECUTIVO que projetos de MDL calculem uma taxa interna de retorno (IRR) e a compare a um valor de IRR “de re- Barragens e crédito de carbono ferência”, a fim de estabelecer que os fundos de MDL Até 1 de dezembro de 2012, haviam sido apro- sejam necessários para tornar a barragem rentável. As vados 586 projetos hidrelétricos de crédito de carbo- cifras são escolhidas de várias maneiras para justificar no de MDL, totalizando 112,7 milhões de toneladas um cenário de dependência do MDL. de CO2-equivalente. Ao mesmo tempo, haviam 896 barragens “aprovadas” (registradas), mas ainda sem “Hot Air” e mudanças climáticas concessão de crédito, além de 840 barragens no “duto” (“pipeline”) aguardando a conclusão do processo de Em média anual, as reduções de emissões rei- aprovação do MDL. Muito pouco desse carbono é vindicadas são equivalentes a 1,69 milhões de tone- adicional em relação àquele emitido sem os projetos. ladas de carbono por ano. Ao longo do projeto de sete anos este totaliza 11,8 milhões de toneladas (ou A barragem de Jirau seja, cerca da emissão da cidade de São Paulo de um ano). Uma vez que a barragem teria sido construí- A barragem de Jirau, que está em fase de conclusão da de qualquer maneira, não há mitigação real para no rio Madeira, foi aprovada (registrada) para obtenção compensar as emissões autorizadas pelos créditos. de crédito de carbono no âmbito do MDL. A proposta é semelhante a outras no âmbito do MDL para barra- gens e serve como um alerta para o dano causado por TERMOS-CHAVE crédito de carbono para usinas hidrelétricas em geral. Adicionalidade Impactos ambientais e sociais O benefício de carbono calculado pela subtração A barragem tem diversos impactos ambientais e das emissões observadas das emissões de referência. sociais que provocaram intensa polêmica no Brasil, Essa diferença é considerada “adicional” ao que teria bem como na Bolívia e no Peru, onde os impactos ocorrido sem o projeto de mitigação. 198 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Linha de Base SA (ESBR) e da Universidade Federal de Rondônia (UNIR) para obter informações durante visitas a Um cenário hipotético para o cálculo das emis- Porto Velho em janeiro de 2008, maio de 2008 e em sões futuras, sem um projeto ou atividade de miti- agosto e novembro de 2012. A Secretaria do Meio gação. As emissões nesse cenário serão comparadas Ambiente de Porto Velho prestou assistência du- com as emissões reais, determinadas a partir do mo- rante uma visita a focos de desmatamento perto de nitoramento do projeto de mitigação. Jirau em maio de 2012. Agradeço também à equipe da ESBR, aos autores do EIA-RIMA, funcionários IRR do IBAMA e aos muitos acadêmicos e funcionários de ONGs que contribuíram com informações so- Taxa interna de retorno, ou a maior taxa de des- bre o projeto ao longo dos anos. Agradeço especial- conto na qual um investimento de capital seria con- mente a população local para a assistência. P.M.L.A. siderado rentável. Graça e quatro revisores anônimos forneceram co- mentários úteis. Esta pesquisa foi apoiada pelo IRR de referência Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico O valor da taxa interna de retorno (Internal Rate e Tecnológico (CNPq: Proc. 305880/2007-1, of Return) usado para estabelecer que os fundos do 304020/2010-9, 573810/2008-7, 575853/2008- MDL são necessários para tornar o projeto lucrativo. 5) e Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA: PRJ13.03). Esta é uma tradução de Fearnside (2013e). CO2-eq CO2 equivalente, ou a soma de todos os gases, tais LITERATURA CITADA como metano, expressos como a quantidade de dió- xido de carbono que teria o mesmo efeito no aqueci- Abril, G., F. Guérin, S. Richard, R. Delmas, C. Galy-Lacaux, mento global ao longo de um período de 100 anos. P. Gosse, A. Tremblay, L. Varfalvy, M.A. dos Santos & B. Matvienko. 2005. Carbon dioxide and methane emissions and the carbon budget of a 10-years old tropical reservoir PDD (Petit-Saut, French Guiana). 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Disponível em: http://www.amazonia.org.br/ “Ar Quente” (“Hot Air”) arquivos/341098.pdf Amigos da Terra-Amazônia Brasileira & International Rivers Crédito de carbono concedido sem benefício Network. 2006. Estudos Não Confiáveis: 30 Falhas No Eia- real para o clima. O termo deriva do trocadilho no Rima do Rio Madeira. Amigos da Terra-Amazônia Brasileira, idioma inglês, em que implica tanto a temperatu- São Paulo, SP. 17 p. Disponível em: www.irn.org/pdf/madeira/ ra mais elevada do aquecimento global quanto um AmazonStudy2006.pdf “blá-blá-blá” de conversa sem sentido. Angelo, C. 2011. Processo de licenciamento para a obra foi coletânea de erros. Folha de São Paulo, 23 de março de 2011, p. B-6. AGRADECIMENTOS Angelo, C. & J. C. Magalhães. 2011. Hidrelétricas do rio Madeira Agradeço a André Pereira pela assistência du- fazem desmatamento voltar a crescer. Folha de São Paulo, 23 de fevereiro de 2011. 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Hidrelétricas na Amazônia 203 Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Capítulo 11 Hidrelétricas no mecanismo de desenvolvimento limpo: A barragem de Santo Antônio como um exemplo da necessidade de mudança Philip M. Fearnside Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) Av. André Araújo, 2936 - CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil. E-mail: pmfearn@INPA.gov.br Tradução de: Fearnside, P.M. 2015. Hydropower in the Clean Development Mechanism: Brazil’s Santo Antônio Dam as an exam- ple of the need for change. Climatic Change doi: 10.1007/s10584 204 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO hidrelétricas são uma forma cada vez mais impor- tante de mitigação no contexto do MDL, repre- As barragens tropicais emitem gases de efeito sentando 10% dos créditos emitidos até agora, mas estufa em quantidades substancialmente maiores do atualmente, representando 26% da emissão de cré- que são reconhecidas nos procedimentos de conta- ditos esperada de projetos no “pipeline” (duto) de fi- bilidade do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo nanciamento (UNEP Risø Centre, 2013). O “pipe- (MDL) do Protocolo de Quioto. Hidrelétricas em line” do MDL é um banco de dados on-line (http:// países tropicais são hoje um dos principais destinos cdmpipeline.org/cdm-projects-type.htm) em pro- para fundos no âmbito do MDL. Essas barragens jetos (ambos registrados e não) com as informa- estão sendo construídas a um ritmo acelerado como ções coletadas da Convenção-Quadro das Nações parte de programas nacionais de desenvolvimento Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) pelo que têm pouco ou nada a ver com preocupações so- Centro Risø do Programa Ambiental das Nações bre clima. Quando o crédito é concedido para proje- Unidas (UNEP). O Centro Risø é independente tos que ocorreriam independentemente de qualquer da UNFCCC em seu mecanismo (o MDL) para subsídio baseado na mitigação do aquecimento glo- financiamento de projetos de mitigação nos países bal, estes geram crédito de carbono (não-adicional) em desenvolvimento (países não-anexo I). A par- indevido, sem um benefício real para o clima. Os tir de 13 de julho de 2013, 1943 projetos hidrelé- países que compram o crédito gerado por barragens tricos haviam sido “registrados” (aprovados) pelo podem emitir mais gases de efeito estufa sem que Conselho Executivo do MDL, totalizando 235,9 essas emissões sejam compensadas por uma mitiga- milhões Reduções Certificadas de Emissões, ou ção genuína. Os fundos limitados disponíveis para CERs [toneladas de CO e, ou “CO -equivalente”, mitigação são desperdiçados em subsidiar barragens 2 2o total de todos os gases de efeito estufa, tais como que seriam construídas de qualquer maneira. A hi- o metano (CH4), expresso em quantidade de dióxi-drelétrica de Santo Antônio, atualmente em cons- do de carbono (CO ) que teria o mesmo impacto trução no Rio Madeira, fornece um exemplo con- 2 creto, indicando a necessidade de reforma das regras sobre o aquecimento global, neste caso, ao longo de do MDL, eliminando o crédito para hidrelétricas um período de 100 anos; toneladas = Mg)] (UNEP tropicais. Como uma grande barragem a fio d’água, Risø Centre, 2013). A maioria (83,4%) dos projetos espera-se que a usina de Santo Antônio tenha me- apresentados é aprovada no final: entre 2330 pro- nores emissões por kWh do que muitas barragens. jetos que havia recebido uma decisão ou que havia No entanto, as mensurações disponíveis indicam sido retirado, 83,4% haviam sido registrados (apro- emissões significativas. A falta de adicionalidade e vados), 0,4% havia sido retirado, 14,5% haviam sido os altos impactos sociais e ambientais, fora a parte rejeitados pelo validador (a “entidade operacional das emissões de carbono, fazem com que essa barra- designada”, ou DOE) e apenas 1,7% havia sido re- gem seja uma ilustração apta de como o subsídio do jeitado pelo Conselho Executivo (2,0% daqueles MDL para hidrelétricas prejudica os esforços para que chegaram ao Conselho Executivo para decisão). mitigar a mudança climática e para promover o de- O pipeline de MDL (não contando projetos senvolvimento sustentável. rejeitados) totaliza 2049 barragens, que alega redu- Palavras-chave: Amazônia; barragens; aquecimento glo- ções de emissões totalizando 115 milhões de CREs bal; efeito estufa; hidrelétricas; metano; mitigação (UNEP Risø Centre, 2013). A China é o país líder no pipeline de energia hidrelétrica de MDL com Barragens no Mecanismo de Desenvolvimento projetos totalizando 59,7 milhões de CREs anual- Limpo (MDL) mente em 1374 barragens, seguido pela Índia com O papel das hidrelétricas no MDL 12,7 milhões de CREs em 243 barragens e Brasil com 12,6 milhões de CREs em 111 barragens. As As hidrelétricas são subsidiadas pela ven- “grandes” barragens (capacidade instalada > 15 MW da de crédito de carbono com base na suposição pela definição do MDL) representaram 50,1% dos de que substituem as termelétricas que queima- projetos e 86,4% das CREs até março de 2013 e riam combustíveis fósseis se não tivesse o subsídio o montante anual do crédito de carbono esperado à hidrelétrica pela venda de crédito de carbono totalizaram 381,9 milhões de CREs por ano (Chu, autorizada pelo Mecanismo de Desenvolvimento 2013). Esta quantidade de CO2-equivalente repre- Limpo (MDL) do Protocolo de Quioto. As senta 104,2 milhões de toneladas de carbono por Hidrelétricas no Mecanismo de Desenvolvimento 205 Limpo: A Barragem de Santo Antônio como exemplo da necessidade de mudança ano, ou aproximadamente igual à emissão anual do fósseis, que liberam essencialmente apenas CO2 Brasil a partir de combustíveis fósseis. (Fearnside, 1997). O metano tem um grande im- pacto de forma instantânea, mas, em média, a mo- Emissões de barragens tropicais lécula deste gás permanece apenas na atmosfera A água em reservatórios tropicais normalmen- durante aproximadamente 10 anos, enquanto que o te estratifica, no todo ou em parte, deixando água CO2 tem um impacto modesto instantâneo, mas a anóxica no fundo, tal que a matéria orgânica em molécula média permanece durante um pouco mais sedimentos forma metano (CH ) ao invés de CO . de 100 anos. O horizonte de tempo utilizado para a 4 2 As emissões são muito mais elevadas nos trópicos comparação (e/ou qualquer desconto pelo tempo), úmidos do que em outras regiões (St Louis et al., portanto, afeta o peso relativo atribuído ao meta- 2000; Duchemin et al., 2002; Barros et al., 2011; no na conversão para “CO2-equivalentes” (CO2e). Demarty & Bastien, 2011). As emissões são gran- Várias retroalimentações atmosféricas incluídas (ou des nos primeiros anos após a formação de um re- não) nos modelos climáticos também afetam essa servatório (por exemplo, Galy-Lacaux et al., 1997, comparação. Até 2012 o MDL usava o valor de 21 1999; Abril et al., 2005). Barragens antigas conti- como o potencial de aquecimento global (GWP) de nuam a emitir gases de efeito estufa a um nível me- metano, significando que cada tonelada deste gás nor (por exemplo, Duchemin et al., 2000; Kemenes tem o mesmo efeito sobre o aquecimento global do et al., 2007, 2011). As emissões têm sido subesti- que 21 toneladas de CO2 em um horizonte de tem- madas e deturpadas com frequência por várias ra- po de 100 anos, sem nenhum desconto por tempo. zões (Fearnside & Pueyo, 2012). Muitas estimativas Isto foi baseado no segundo relatório de avaliação omitem a grande fonte de CO da decomposição do IPCC de 1995 (Schimel et al., 1996). O CDM 2 das árvores mortas pela inundação (veja Fearnside, adotou o valor de 25 como o GWP do metano para 1995; Abril et al., 2013) e também é comum omitir uso no período de 2013 até 2017, baseado no quarto a emissão de metano a partir de água que passa atra- relatório de avaliação do IPCC (Forster et al., 2007). vés das turbinas e vertedouros. O quinto relatório de avaliação, lançado em se- Sendo que as turbinas e vertedouros normal- tembro de 2013, contém alterações substanciais que mente retiram água abaixo da termoclina que divi- afetam o impacto de barragens. Enquanto o GWP de a coluna de água em camadas, a água entrando do metano aumenta apenas de 25 para 28, se cal- nas turbinas e vertedouros têm uma alta concentra- culado da mesma forma como em relatórios ante- ção de CH e a alta pressão hidrostática. Quando riores, ou seja, com um horizonte de tempo de 100 4 esta água é lançada abaixo da represa, a pressão cai anos e sem retroalimentações nos modelos de clima, abruptamente e o gás é liberado para a atmosfera. mesmo que a existência dessas retroalimentações na Muitas estimativas das emissões hidrelétricas omi- atmosfera real seja bem conhecida, esse GWP au- tem as emissões de turbinas e vertedouros com- menta para 34 se as retroalimentações são incluídas; pletamente, enquanto outros consideram apenas además, se um horizonte temporal de 20 anos é usa- o fluxo de gás que pode ser medido da superfície do em vez de 100 anos, esse valor aumenta para 86 a alguma distância da água a jusante da barragem (Myhre et al., 2013). Esse último valor efetivamente (ou seja, depois que muito do CH já escapou para a quadruplica o impacto das barragens em compara-4 atmosfera). Emissões substanciais das turbinas têm ção com praticamente todas as estimativas publica- sido medidas diretamente na hidrelétrica de Balbina das (incluindo as deste autor). O horizonte temporal no Brasil e na hidrelétrica de Petit Saut na Guiana de 20 anos é fundamental para políticas que visem Francesa (Abril et al., 2005; Kemenes et al., 2007, conter o aquecimento global dentro do limite de 2011). Grandes emissões foram calculadas com base 2° C acima da temperatura pré-industrial, que foi em medições de concentrações de CH em outras adotado em Copenhague em 2009 pela UNFCCC 4 barragens da Amazônia, como Tucuruí, Samuel e como a definição de interferência “perigosa” com o Curuá-Una (Fearnside, 2002a, 2005a,b). sistema climático (Decisão 2/CP.15). Não temos 100 anos para tomar medidas eficazes para conter O metano tem maior impacto no aquecimen- o aquecimento global, e a rápida redução das emis- to global por cada tonelada em relação ao CO2, e o sões de metano é uma parte necessária de qualquer peso relativo atribuído ao metano afeta o impacto estratégia para permanecer dentro do limite de 2° C das hidrelétricas em comparação aos combustíveis (Shindell et al., 2012). As opções de mitigação, tais 206 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras como as represas tropicais, que têm fortes impactos liberação de metano: as turbinas e vertedouros (e.g., no aumento da temperatura global nas próximas dé- Fearnside, 2004; Fearnside & Pueyo, 2012). A sub- cadas, não podem ser consideradas opções “verdes”, missão de dos Santos e Rosa, intitulada “Opções mesmo se elas mostram um benefício quando calcu- para Monitoramento de Emissões de GEE: lado do ponto de vista de um século no futuro. Fornecendo Limiares e Critérios para Reservatórios Hidrelétricos”, citada na decisão do MDL, não apa- Subestimação das emissões de hidrelétricas no rece no site da UNFCCC. O Conselho Executivo MDL do MDL se recusou a divulgar o documento, ale- Um regulamento do MDL permite que as emis- gando que “não está totalmente aprovado e apenas sões sejam consideradas como zero se a densidade alguns dos seus elementos que foram usados”, mas sugeriu que o relatório poderia ser obtido dos auto- de potência (a razão entre a capacidade instalada 2 res, “se” não estivessem sob um acordo de confiden-para a área do reservatório) for mais de 10 W/m cialidade (Siqueira, 2014). Enquanto isso, os autores (EB23, Anexo 5). No entanto, uma alta densidade se recusaram a divulgar o relatório, alegando que de potência não resulta em emissões zero. Uma alta o mesmo havia sido contratado sob um acordo de densidade de potência significa que a área do reser- confidencialidade justamente do próprio Conselho vatório é pequena em comparação com a capacidade Executivo do MDL. A resposta dos autores (dos instalada; a pequena área significa que as emissões Santos, 2014) foi transcrita como segue: através da superfície do reservatório (de ebulição e difusão) serão menores do que em um reservatório grande, mas não zero. O fluxo de água em usinas Prezado Prof. Fearnside, hidrelétricas “a fio d’água” pode ser suficiente para evitar a estratificação na parte principal dos seus re- Na realidade esta citação não é um paper e servatórios relativamente pequenos. No entanto, os sim um relatório encomendado pelo CDM afluentes e baías podem estratificar, resultando em Executive Board ao nosso grupo de pesquisa. algumas emissões de metano (e.g., o exemplo da hi- Por ter sido um documento produzido a drelétrica de Santo Antônio discutido neste artigo). partir de um contrato de prestação de servi- Países com elevados ganhos potenciais de pro- ços foi exigido confidencialidade. jetos de MDL têm desempenhado um papel des- O que eles colocaram no site do CDM re- proporcional nas decisões do Conselho Executivo presenta a análise deles, baseada no nosso (Flues et al., 2008). O Brasil desempenhou um pa- relatório. pel fundamental na decisão do MDL para permitir Atenciosamente, que barragens com densidades de potência acima de 10 W/m2 reivindiquem emissões iguais à zero. A de- Marco Aurélio cisão foi baseada em uma submissão não publicada de Marco Aurélio dos Santos e Luiz Pinguelli Rosa, este último, o ex-presidente da ELETROBRÁS Apesar dessas recusas, há pouca dúvida quanto (CDM Methodologies Panel, 2006). Esta submissão ao conteúdo do relatório, já que as mesmas questões também propôs a baixa emissão de 100 g de CO / são cobertas em várias publicações contemporâne-2 kWh seja atribuída às barragens no intervalo de 5-10 as desses autores. Pode-se deduzir que a submissão W/m2. Essa mesma submissão também foi a chave de 2006 não incluia as emissões a jusante (ou seja, para abaixar de 5 para 4 W/m2 o limite de elegibilida- aquelas partir das turbinas ou do rio a jusante), sen- de para barragens receberem crédito de carbono atra- do que os autores omitiram todas tais emissões nas vés do MDL, e também para a redução de 100 para suas outras estimativas (por exemplo, dos Santos et 90 g de CO /kWh a emissão presumida em barragens al., 2009; Veja Fearnside, 2011). Da mesma forma, 2 na faixa de 4-10 W/m2 de densidade de potência. também se pode deduzir que as emissões da super-fície do reservatório (a única fonte de emissões que Tanto o valor de 100 como o valor de 90 g de teria sido incluída) foram baseadas em erros mate- CO2/kWh se referem apenas a ebulição e difu- máticos que reduziram as estimativas por um fator são da superfície do reservatório, e são subestima- de três (por exemplo, dos Santos et al., 2008; Ver tivas grosseiras do impacto de hidrelétricas, por- Pueyo & Fearnside, 2011). A sessão do Conselho que esses valores ignoram as principais fontes de Executivo (Executive Board = EB) que aprovou essas Hidrelétricas no Mecanismo de Desenvolvimento 207 Limpo: A Barragem de Santo Antônio como exemplo da necessidade de mudança alterações foi descrita por um participante da seguinte 1997, Artigo 12, no. 5). A “adicionalidade” signifi- forma: “Na sessão EB, porém, José Miguez do Brasil ca que um projeto, como uma represa, existe apenas (o novo chefe do EB) sugeriu que estes valores eram por causa da venda de créditos de carbono. Como muito conservadores e que 4 W/m2 e 90 g/kWh ain- já mencionado, os projetos hidrelétricos no “pipeli- da seriam muito conservadores. Jean-Jacques Becker, ne” do MDL totalizam 381,9 milhões de toneladas/ o chefe do Painel de Metodologias [do MDL] (de ano de CO2e. Se o crédito concedido para barragens saída), fez um trabalho bastante pobre de defender não for adicional, os projetos hidrelétricos no MDL os números do Painel de Metodologias, ninguém permitirão que essa quantidade de dióxido de car- mais tinha alguma experiência, então a sugestão de bono seja emitida para a atmosfera pelos países que Miguez foi adotada” (Sterk, 2006). comprarão as CREs, sem que haja qualquer com- Outro regulamento favorecendo a aprovação de pensação real das emissões por projetos do MDL. barragens envolve o cálculo da área do reservatório Estes projetos também iriam consumir uma parcela para fins de computação de densidade de potência, crescente do dinheiro que o mundo tem para com- que é a capacidade instalada em Watts dividido pela bater o aquecimento global; o crédito para barragens área em metros quadrados. Um esclarecimento de no pipeline de MDL deverá valer mais do que US$ 1 junho de 2004, aprovado pelo Conselho Executivo bilhão por ano, considerando o preço para CREs em (EB15), permite que uma área de reservatório me- meados de 2008 de US$ 3,65 por tonelada de CO2e nor seja usada para calcular a densidade de potência (Ecopart, 2011). Note-se, no entanto, que os preços (W/m2) para fins de tirar proveito de um critério de CERs já caíram devido à falta de progresso nas do MDL, permitindo que a emissão zero seja pre- negociações sobre o regime pós-Quioto e devido ao sumida se a densidade de potência for superior a excesso de liberação de licenças no regime de comér- 10 W/m2. A suposição é que a água sobre o “curso cio de emissões da União Europeia (EU Emissions do rio” (i.e., o canal principal) não emite metano. Trading Scheme), que tem uma forte influência so- Infelizmente, esta água pode também emitir meta- bre o preço de CREs gerados pelo MDL (Barrieu no, como foi mostrado por numerosos estudos que & Fehr, 2011). É preciso presumir que os países fu- mediram fluxos de superfícies de reservatórios em turamente vão assumir compromissos substanciais uma variedade de pontos de monitoramento em de redução das emissões no âmbito da UNFCCC, reservatórios amazônicos (ver publicações citadas criando a demanda por crédito de carbono e fazendo acima). Quando o leito de um rio é inundado por com que os preços se recuperem. Se os fundos forem um reservatório, a profundidade da água aumenta e dados aos projetos que não são adicionais, o resulta- a sua velocidade diminui, o que pode permitir que do lógico é que menos projetos de mitigação sejam a coluna de água estratifique termicamente, criando executados de outros tipos que tenham um benefício condições anóxicas no fundo, resultando na produ- real para o clima. ção de metano. A água estratificada, rica em metano, Projetos de MDL justificam suas alegações de nas baías e afluentes também pode se deslocar para que os projetos seriam financeiramente atraentes a área sobre o canal principal, com o metano sendo usando “testes de adicionalidade” em uma das duas liberado através da superfície lá. Isto é verdade tanto categorias permitidas sob as regras do MDL: “tes- do ponto de vista da definição de senso comum de tes de investimento” e “testes de barreira”. Os tes- “o curso do rio” ser o leito do rio que é coberto por tes de investimento comparam o projeto proposto água durante todo o ano, assim como também por uma definição relaxada (usada no projeto de carbo- com outros projetos mais carbono-intensivos para no da hidrelétrica de Santo Antônio) que acrescenta mostrar que o projeto proposto é financeiramente a isso a várzea que é normalmente inundada apenas menos atraente do que investimentos concorrentes durante o período de cheia. na ausência de CREs. Os testes de barreira visam mostrar que algum impedimento, tais como um Adicionalidade obstáculo tecnológico ou uma prática predominan- te, que, a não ser que seja superado com renda da As CREs do MDL contribuem para o aqueci- venda das CREs, impediria a implementação do mento global se o crédito é concedido para projetos projeto proposto, mas não bloquearia a implementa- de mitigação que não são “adicionais” com relação ção de pelo menos uma alternativa (por exemplo, du àquilo que teria acontecido sem os projetos, confor- Monceau & Brohé, 2011). Os testes de barreira per- me exigido pelo protocolo de Quioto (UNFCCC, mitiram que muitos projetos não-adicionais fossem 208 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras aprovados, particularmente na Índia (por exemplo, como “validadores”, inspecionam os projetos e ates- Michaelowa & Purohit, 2007; Schneider, 2007; du tam a validade dos créditos, incluindo as contribui- Monceau & Brohé, 2011). Os testes de investimen- ções para o desenvolvimento sustentável. Isto não to, como aquele usado por Santo Antônio, permitem impediu a aprovação de projetos com grandes im- projetos reivindicar a adicionalidade, mostrando que pactos, e a usina de Jirau fornece um exemplo recen- a taxa interna de retorno (IRR) calculado é inferior te do Brasil (Fearnside, 2013a). A contribuição do a um valor “benchmark” (mínimo aceitável) de IRR MDL para o desenvolvimento sustentável é contro- escolhido pelo projeto. O IRR é a taxa de desconto versa. No caso do Brasil, projetos de MDL propos- que resulta no valor presente líquido do projeto ser tos, na prática, não estão sujeitos a qualquer triagem zero. Enquanto cálculos de IRR podem ser facil- eficaz com base no desenvolvimento sustentável mente manipulados (Fearnside, 2013a), o compor- tamento dos investidores oferece uma demonstra- Projetos hidrelétricos têm impactos ambientais ção inequívoca de não-adicionalidade que todas as sociais muito severos além das emissões de carbono pessoas podem entender, incluíndo as que não têm (por exemplo, Fearnside, 1989a, 1999, 2001, 2005a; o conhecimento ou a paciência para acompanhar os Switkes, 2008; WCD, 2000). Os impactos de Santo cálculos de IRR. A crença do Conselho Executivo Antônio são revistos no livro intitulado Águas do MDL de que construir uma barragem antes que Turvas (Switkes, 2008), em alguns capítulos na revi- o apoio do MDL seja obtido não é evidência de falta são do EIA pelo Ministério Público (Brasil, MPE- de adicionalidade tem a aparência de revelar um viés RO, 2006) e em outras fontes sobre os impactos da em favor de aprovar projetos independentemente da barragem (por exemplo, Vera-Diaz et al., 2007). sua verdadeira adicionalidade. Note-se que o ônus A contribuição para o desenvolvimento sus- da prova para adicionalidade é dos proponentes: não tentável é vista por muitos observadores como um há nenhuma necessidade de “provar” que um projeto fracasso notável do MDL como um todo; uma pes- não é adicional. O dano de ignorar o comportamen- quisa até constatou que menos de 1% dos projetos to que o investidor faz para a credibilidade do MDL do MDL, contribuiu, na verdade, para o desenvolvi- tem um custo para os esforços globais de mitigação mento sustentável (Sutter & Pereira da Silva, 2007), da mudança climática que ultrapassa o impacto das e outras avaliações mostram as dificuldades que en- emissões que ocorrem devido ao crédito de carbono frentam os esforços para assegurar uma contribui- não-adicional vendido pelo projeto. ção para o desenvolvimento sustentável (Lecocq & Ambrosi, 2007; Olhoff et al., 2004; Tewari, 2012). Desenvolvimento sustentável Por outro lado, fortes benefícios para o desenvol- Embora o Artigo 12 do Protocolo de Quioto, vimento sustentável são apontados em um estu- que criou o MDL, especifique que todos os projetos do encomendado pela UNFCCC (TERI, 2012) e devam contribuir para o “desenvolvimento susten- por um painel de “diálogo político” da UNFCCC tável” (UNFCCC, 1997), esta salvaguarda potencial composta por indivíduos de alto nível, tais como o contra consequências ambientais e sociais de projetos presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento de mitigação foi reduzida por uma decisão posterior Econômico e Social (BNDES), do Brasil (CDM de que o “desenvolvimento sustentável” seria defini- Policy Dialogue, 2012; UNFCCC, 2011, 2012a,b). do e julgado por cada país por si mesmo, ao invés de Um regulamento interno do Brasil exige que os seguir um padrão internacional. Qualquer projeto comentários públicos sejam solicitados para proje- que receber uma carta de aprovação (LoA) da auto- tos propostos de MDL, e que as propostas incluam ridade designada nacional (DNA do país anfitrião) uma seção (“Anexo III”) que descreva as implica- é presumido que represente o “desenvolvimento sus- ções para o desenvolvimento sustentável. Um estudo tentável”. Os negociadores do Brasil foram uma for- dos elementos sociais em projetos hidrelétricos do ça fundamental nessa decisão: a prioridade do Brasil MDL no Brasil descobriu que a revisão da DNA em Quioto em 1997, e durante vários anos, depois de submissões do Anexo III e todas as respostas disso, foi focada em defender “o direito ao desenvol- aos comentários convidados são relegadas a «uma vimento” e em fazer escolhas internas relacionadas avaliação qualitativa ad hoc relativamente ‘branda’” e com medidas de sustentabilidade ambiental” (Cole, que não há nenhuma “indicação que qualquer pro- 2012). Depois da submissão ao MDL, as entidades jeto tenha sido recusado ou obrigado a reforçar seus operacionais designadas (DOEs), mais conhecidas benefícios sobre SD [desenvolvimento sustentável]” Hidrelétricas no Mecanismo de Desenvolvimento 209 Limpo: A Barragem de Santo Antônio como exemplo da necessidade de mudança (Cole & Roberts, 2011, p. 366). Embora a DNA do com consequências negativas para os atuais e futuros Brasil para o MDL teria trabalhado muito mais do esforços para atenuar a mudança climática global. que a maioria para garantir que projetos do MDL contribuissem para o desenvolvimento sustentável Um exemplo concreto: A hidrelétrica de Santo (Friberg, 2009), isto obviamente não se estende em Antônio rejeitar propostas com alta prioridade política, tais como aquelas que estão alinhadas com o esforço do O projeto hidrelétrico de Santo Antônio governo brasileiro para expandir centrais hidrelé- A hidrelétrica de Santo Antônio, em constru- tricas na Amazônia. Na verdade, a DNA do Brasil ção desde 2008, está em fase de conclusão no Rio tem “apenas uma autoridade questionável para re- Madeira, no Estado de Rondônia na porção sudoes- jeitar um projeto de MDL proposto, a menos que te da Amazônia brasileira (8° 48’ 4,0” S; 63° 56› 59,8» seja contrária à legislação brasileira existente ou O) (Figura 1). A barragem está sendo construída e regulamentos com força de lei” (Cole & Liverman, operada pela Santo Antônio Energia, um consór- 2011, p. 148). Em setembro de 2013, o atual chefe cio de FURNAS, Odebrecht, CEMIG, Andrade da DNA brasileira disse a este autor que o Brasil não Gutierrez e Caixa FIP. O Rio Madeira é um dos tem nenhuma definição operacional de desenvolvi- principais tributários do Rio Amazonas, drenando mento sustentável que lhe permita a rejeitar projetos, partes do Brasil, Bolívia e Peru. Quando concluída, alegando que eles não cumprem os critérios; o que em sua configuração inicialmente aprovada, a barra- existe é uma lista geral de áreas, tais como que um gem terá uma capacidade instalada de 3.150,4 MW projeto deve criar emprego, mas que mesmo se um com 44 turbinas bulbo; a primeira turbina começou projeto alega criar apenas um único posto de traba- a operação comercial em fevereiro de 2012 e as tur- lho o projeto não poderia ser rejeitado. Ele ofereceu binas restantes estão sendo instaladas em uma taxa o exemplo do Rio Madeira: mesmo se as barragens de aproximadamente uma por mês. A configuração fossem afirmar nos seus projetos de MDL que os atual está prevista para ser concluída em 2015, a bagres gigantes do Rio Madeira seriam eliminados, um custo de US$ 9,3 bilhões (HydroWorld, 2012). o projeto não poderia ser rejeitado com base em não Embora a barragem seja considerada para ser a fio cumprir os critérios de desenvolvimento sustentável. d’água, a barragem sobe a uma altura de 55 m acima Os subsídios de venda de créditos de carbono para do leito do rio. Inicialmente (antes de perdas de se- barragens com fortes impactos ambientais e sociais dimentação), a água no reservatório tinha uma pro- corroem a imagem pública da Convenção do Clima, fundidade de 46,3 m junto à barragem. Figura 1. Locais mencionados no texto. 210 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Em 02 de julho de 2013 foi concedida a permis- documentos do governo brasileiro que oferecem são para elevar o nível de água em mais 0,8 m (de 70,5 suporte à promoção de hidrelétricas como for- m para 71,3 m acima do nível do mar; a proposta ori- ma de mitigação das emissões de gases do efeito ginal era para um nível de água de 70 m); O nível de estufa. Apesar das emissões por kWh de Santo 71,3 m permitiria a instalação de seis turbinas adicio- Antônio possam ser esperadas como significativa- nais totalizando 420 MW (Tavares & Fariello, 2013). mente mais baixas do que no caso das barragens Isto torna a suposta mitigação da barragem ainda até então existentes na Amazônia, essas emissões menos provável de ser adicional, já que o nível de água não serão zero como é alegado pelo projeto. Apesar mais alto significa que a barragem geraria mais ener- do documento usar o valor de zero como a emis- gia, tornando-a mais rentável sem o MDL do que são para o projeto no seu cálculo dos benefícios seria sob as especificações utilizadas no Documento do clima, uma tabela foi incluída (Santo Antônio de Concepção de Projeto (PDD) da proposta para o Energia S.A., 2012, p. 10) na qual admite-se que MDL. No entanto, mesmo com o nível atual de 70,5 a barragem produziria metano, embora as quan- m, uma vazão recorde em 2014 causou enchentes se- tidades não sejam mencionadas. A mesma tabe- veras ao longo das margens do reservatório, incluindo la também afirma que as emissões de dióxido de o rompimento da rodovia BR-364, que liga o Estado carbono e óxido nitroso (N O) são zero, cada um do Acre com o resto do Brasil. Esta inundação late- 2desses gases, sendo apenas uma “fonte menor de ral teria sido agravada pelo reservatório, sendo que o emissão”. No entanto, criar um reservatório mata aumento do nível da água começou a partir de uma árvores da floresta na área inundada; algumas per- altitude maior do que teria sido o caso no rio natu- maneceram com as partes projetadas fora da água ral (Fearnside, 2014a). Os impactos da inundação de (como na maioria das barragens da Amazônia), 2014 fazem com que seja menos provável que a Santo enquanto outras foram retiradas da área do reser- Antônio Energia será capaz de elevar o nível do re- vatório; em ambos os casos, a madeira decomporá servatório para 71,3 m sem enfrentar uma oposição na presença de oxigênio, assim produzindo o CO . política significativa. Os impactos sociais e ambien- 2As maiores emissões ocorrem na primeira década. tais da barragem levaram a oposição intensa de gru- O óxido nitroso também é emitido por reservató- pos ambientalistas e de direitos humanos durante e rios tropicais (Guérin et al., 2008; de Lima et al., após o processo de licenciamento (Fearnside, 2014b). 2002). As emissões da construção da barragem e O projeto de carbono de Santo Antônio foi linha de transmissão não estão incluídas nos cál- aprovado (registrado) pelo Conselho Executivo do culos no PDD. MDL, em novembro de 2013, retroativo a 28 de de- Com exceção das baías e afluentes ao longo das zembro de 2012; a data oficial retroativa faz com bordas do reservatório, a água do reservatório de que o crédito de carbono seja válido para o Regime Santo Antônio se move rápida o suficiente para de Comércio de Emissões da União Europeia (EU evitar a estratificação. Tanto os cálculos com base Emissions Trading Scheme), que havia estabelecido no tempo de residência como aqueles com base na como limite o final de 2012. A concessão de CREs densidade de Froude não indicaram nenhuma es- de Santo Antônio no contexto do MDL permitirá tratificação no reservatório principal (FURNAS et que os compradores desses certificados liberem 51 al., 2005, Tomo B, Vol. 7, Anexo II, p. 3.8-3.9). No milhões de toneladas de CO2-equivalente (CO2e) entanto, em áreas de borda, onde as velocidades da para a atmosfera em outro lugar no mundo. A fi- nalidade da presente análise do projeto de Santo água são muito inferiores à média para o reserva- Antônio é extrair lições deste exemplo em matéria tório como um todo, espera-se a presença de água de regulamentação do MDL referente a projetos hi- anóxica no fundo do reservatório, com resultado drelétricos, não para julgar se este projeto específico de formação do metano nos sedimentos (Forsberg esteja em conformidade com as normas vigentes. & Kemenes, 2006). Em resposta às demandas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos As emissões da hidrelétrica de Santo Antônio Naturais Renováveis (IBAMA), os proponentes realizaram em maio de 2007 simulações da quali- O Documento de Concepção de Projeto dade da água nos afluentes. As simulações indica- (PDD) da proposta da hidrelétrica de Santo ram que a água estratificadaria o ano todo em dois Antônio para crédito de carbono do MDL (Santo afluentes que hoje já foram convertidos em ramos Antônio Energia S.A., 2012) refere-se a vários do reservatório de Santo Antônio. Uma parte do Hidrelétricas no Mecanismo de Desenvolvimento 211 Limpo: A Barragem de Santo Antônio como exemplo da necessidade de mudança metano produzido nas áreas estratificadas seria Uma estimativa das emissões do projeto lançada através de difusão e ebulição, mas a maior Santo Antônio parte do metano dissolvido que não alcança a su- Emissões do desmatamento perfície seria impedida de atingir as turbinas porque o metano poderia ser oxidado quando a água destes As emissões de CO2 da decomposição da bio- afluentes se mistura com a água rica em oxigênio massa podem ser calculadas em relação ao peso seco no canal principal. As emissões de metano, portan- da biomassa presente, presumindo o teor de carbono to, serão menores do que em represas amazônicas de 50%, adotado no EIA. As estimativas no EIA típicas onde o corpo principal do reservatório es- são apenas para biomassa acima do solo, e a suposi- tratifica. Uma medição elevada do fluxo de metano ção otimista feita aqui que não há nenhuma emis- da superfície da água em dois afluentes entrando são da decomposição das raízes, o que aumentaria no reservatório de Santo Antônio (Hällqvist, 2012, o total em pouco mais de 20%. O EIA inclui uma p. 25) indica que a água nesses locais é, de fato, es- estimativa dos estoques de liteira fina, mas é incer- tratificada, enquanto uma concentração elevada de to sobre se as suas estimativas de biomassa incluem metano no ar, 3 km abaixo da barragem de Santo árvores com menos de 10 cm de diâmetro na altura Antônio (Grandin, 2012, p. 28), indica que nem do peito, componentes não-arbóreos (lianas, figuei- todo o CH4 é oxidado em CO2 antes de chegar às ras estranguladoras, etc.) e árvores mortas, seja em turbinas e aos vertedouros. pé ou caídas. Aqui é conservadoramente presumido que esses componentes foram incluídos. Do outro O PDD para o projeto de MDL da usina de lado, a estimativa de biomassa acima do solo, dada Santo Antônio calcula a área do reservatório para no EIA para o tipo de floresta predominante (flo- fins de computação da densidade de potência, que é resta ombrófila aluvial) parece ser alta, com 364,67 a capacidade instalada em Watts dividido pela área t/ha em peso seco (FURNAS et al., 2005, Tomo B, em metros quadrados. A área do reservatório usa- Vol. 3, p. IV-522). Uma estimativa para este tipo de do é calculada como área no nível de água máximo floresta com base em 146 parcelas de um hectare normal de 70,5 m (354,4 km2), menos 164,0 km no levantamento do Projeto RADAMBRASIL in- ², descrito como o “curso do rio”, deixando a área dica uma biomassa acima do solo de 298,4 ± 60,7 inundada como sendo de apenas 190,40 km² (Santo t/ha (Nogueira, 2008). O levantamento do Projeto Antônio Energia S.A., 2012, p. 6). RADAMBRASIL foi realizado antes que muita O PDD afirma que as emissões do reservatório floresta fosse degradada pela exploração madeireira, são iguais a zero, com base na densidade de potên- e, portanto, a biomassa média hoje seria um pou- cia calculada. A superfície do reservatório é a única co menor. A Tabela 1 apresenta uma estimativa das via de emissões atualmente considerada pelas me- emissões do desmatamento. todologias do MDL. As emissões provenientes de O EIA contém estimativas das áreas de cada outras fontes, tais como a decomposição de árvores tipo de vegetação e uso do solo, bem como as es- mortas no reservatório, a jusante das emissões e a timativas de biomassa para os diferentes tipos de construção da barragem e da linha de transmissão vegetação. Estes valores podem ser usados, junta- não são consideradas. mente com informações complementares, para cal- A quantidade de emissões de gases de efeito es- cular o estoque de carbono na área inundada. O pe- tufa de Santo Antônio é muito incerta, uma vez que ríodo do projeto de dez anos é um tempo razoável um estudo completo ainda não foi feito (especial- para supor que esta biomassa iria decompor, libe- mente das emissões a jusante). No entanto, algumas rando o carbono como CO2 (por exemplo, Barbosa medidas dos fluxos de CH4 e das concentrações no ar & Fearnside, 1996). A empresa enterrou parte da e água foram feitas em fevereiro de 2012 (Grandin, biomassa das árvores em covas rasas. Isso retardaria 2012; Hällqvist, 2012). O estudo de impacto am- a liberação de carbono, mas provavelmente não im- biental (EIA) contém informações relevantes para pediria sua ocorrência em uma escala de tempo de a emissão de CO2 da biomassa na área inundada e décadas. Além das emissões a jusante, os cálculos da construção da barragem e a linha de transmissão, no presente trabalho indicaram o desmatamento que é usada na próxima seção para produzir estima- como o componente maior do impacto das emis- tivas das emissões de gases do efeito estufa durante sões do projeto, com um pouco mais da metade do o período de dez anos do projeto carbono. total sem incluir emissões a jusante. 212 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Tabela 1. Emissões a partir de desmatamento Biomassa Estoque Carbono Área Referência Referência Barragem peso seco. carbono (t/ha) (ha) biomassa área (t/ha) (t) Floresta ombrófila aluvial (Fal) Árvores 364,7 182,3 9.077,0 1.654.730,0 (a) (b) Serapilheira 15,0 7,5 9.077,0 68.168,0 (c) (b) Formações pioneiras (várzea) (Fpv) 18,0 9,0 1.371,7 12.345,0 (d) (b) Pasto 1,5 0,8 1.698,7 1.274,0 (e) (b) Ocupação humana riberinha, áreas urbanas e desmatamento 5,0 2,5 107,6 269,0 (f) (g) Desmatamento estimulado no entorno da barragem Não incluído Total para a barragem 21.332 1.736.786 CO2e (h) 6.368.215 Linha de transmissão Floresta cortada para a linha de transmissão 259,0 129,5 531,0 68.765,0 (i) (j) CO2e (h) 252.137,0 (a) FURNAS et al., 2005, Tomo B, Vol. 3, p. IV-522. (b) FURNAS et al., 2005, Tomo B, Vol. 3, p. IV-267 (c) FURNAS et al., 2005, Tomo B, Vol. 7, Anexo II, p. 4.4. (d) Schöngart et al., 2010. (e) Fearnside, 1989b, p. 45: média em dois pastos em Ouro Preto d’Oeste, Rondônia para novembro, o mês em que ocorreu o enchimento de Santo Antônio. (f) FURNAS et al., 2005, Tomo B, Vol. 7, Anexo II, p. 4.12. (g) biomassa para ocupação humana ribeirinha, zonas urbanas e o desmatamento é uma suposição. (h) presume que todo o carbono é liberado em forma de CO2. Conversão de carbono em CO2e é feito multiplicando pelo peso molecular de CO2 (44), dividindo pelo peso atômico de carbono (12) e multiplicando pelo GWP de CO2 (1 por definição). (i) Fearnside et al., 2009 para florestas de Rondônia. (j) Bragança, 2012. Emissões de reservatório acima da barragem velocidades da água são suficientes para evitar a es- As emissões de metano da superfície do reserva- tratificação, pelo menos, considerando valores mé- tório podem ser estimadas com base em medições de dios por cada mês e trecho do rio. A velocidade da fluxo existentes em Santo Antônio. A água no canal água na estação de vazante (com vazão de 5.000 m 3/s) principal do reservatório libera muito pouco metano, em diferentes trechos do reservatório estão na faixa 3 mas, a situação é diferente nos afluentes, e em massas de 0,11 a 0,27 m/s, para a vazão média (18.000 m /s) de macrófitas (plantas aquáticas) a emissão é muito variam de 0,38 a 0,90 m/s e em condições de cheia alta. Medições das concentrações de CH no ar e (48.600 m3/s) variam de 1,01 a 2,45 m/s (FURNAS 4 em águas superficiais em Santo Antônio fornecem & CNO, 2007, Anexo 1, p. 12-16). uma indicação de um substancial fluxo de metano. A emissão do canal principal do reservatório Normalmente, a concentração na água é muito maior com base no fluxo médio de CH4 em quatro estações do que a concentração no ar, sendo que o CH4 libe- de medição, nesta parte do reservatório é de 0,16± rado no ar é rapidamente misturado com o grande 0,33 mmole/m2/dia (Grandin, 2012, p. 31). Isso é volume de ar que é soprado pelo vento das áreas de equivalente a 2,52 × 10-3 g/m2/dia e a área de 236,8 influência do reservatório. A diferença de concentra- km2 no qual isso se aplica no nível de água operacio- ção (em base molar no ar no headspace – espaço livre) nal de 70 m acima do nível do mar, portanto, liberta- resultará na difusão da água para o ar. As medições ria 217,8 t/ano de metano. O nível de operação a 70 em Santo Antônio (Grandin, 2012; Hällqvist, 2012) m acima do nível do mar é especificado no Estudo indicam a concentração no ar pelo menos 10 vezes de Viabilidade e no Estudo de Impacto Ambiental menor do que na água em todas as sete estações de (EIA) para a represa; o nível usado no Documento amostragem no reservatório e seus afluentes. de Concepção de Projeto (PDD) para o projeto de A emissão total aproximada da superfície do carbono foi 70,5 m. Com o aumento recentemente reservatório pode ser calculada como a seguir. O aprovado para 71,3 m acima do nível do mar, a área canal principal produz poucas emissões porque as iria ser 272,2 km2 com base nas informações do EIA Hidrelétricas no Mecanismo de Desenvolvimento 213 Limpo: A Barragem de Santo Antônio como exemplo da necessidade de mudança (FURNAS et al., 2005, Tomo A, Vol. 1, p. VII-54; no décimo ano (de Lima et al., 2000). Em Santo FURNAS & CNO, 2007, p. 125-126), e a emissão Antônio, um sobrevoo do reservatório logo após en- seria 250,4 t/ano. chimento revelou uma cobertura muito extensa de As áreas mencionadas acima não foram ajusta- macrófitas (Francisco Pereira, comunicação pessoal, das pela perda da área do reservatório quando o local 2012). É em afluentes e baías pouco profundas ao da barragem de Jirau foi deslocado 9 km rio abaixo, longo das bordas do reservatório que as macrófitas mas a diferença de emissão seria muito pequena em persistiriam mais depois de passar a explosão inicial comparação com outras fontes. Note que o PDD da cobertura de macrófitas, e também é nesses lo- para o projeto de carbono de Santo Antônio, que cais onde as macrófitas são principalmente do tipo foi apresentado depois que o local da barragem de enraizado. Medições de fluxos de metano de uma Jirau já havia sido movido, apresenta 354,4 km2 para mancha de macrófitas em um afluente ao reserva- a área do reservatório no nível de água de 70,5 m tório de Santo Antônio (Rio Jaci-Paraná), em fe- (Santo Antônio Energia S.A., 2012, p. 35), ou seja, vereiro de 2012, indicaram uma taxa de emissão de 2 22,7% maior do que a área a este nível de água apre- 127,12 mmol CH4/m /dia, considerando a concen- sentado no EIA. O reservatório estava operando em tração na câmara de fluxo 20 minutos após a sua 70,5 m a partir de abril de 2014, e as 17 turbinas instalação (Nota: concentrações de CH4 em câmaras que tinham sido instaladas até então não exigiriam a de fluxo aumentam ao longo de uma sequência pa- altura adicional do nível de 71,3 m. drão de 30 minutos de medição, mas, no caso desta medida, a concentração na câmara voltou a um nível Os afluentes são uma fonte muito maior de correspondente a 36,44 mmol CH /m2/dia durante emissões do que o corpo do reservatório. Ao con- 4o próximo intervalo de 10 minutos devido a uma trário do canal principal do rio, cálculos feitos pelos provável ruptura na vedação entre a água e a câmara: proponentes da barragem indicaram que os afluentes Grandin, 2012, p. 28; Hällqvist, 2012, p. 39). A me- seriam estratificados durante todo ou parte do ano dição comparável para uma amostra adjacente sem (FURNAS & CNO, 2007, p. 150-151). As áreas macrófitas foi de 7,56 mmole/m2/dia. A diferença dos três afluentes são: Igarapé Mucuim (Teotônio) de 119,56 mmole/m2/dia, representando a emissão 4,55 km2 para o nível de água de 70 m, 4,92 km2 em das macrófitas, é 16 vezes maior do que a emissão da 70,5 m e 5,43 km2 em 71,3 m; Igarapé Jatuarana superfície da água. 11,11 km2 em 70 m, 11,53 km2 em 70,5 m e 12,28 km2 em 71,3 m; Rio Jaci-Paraná 18,51 km2 em 70 Se for feita a suposição conservadora de que m, 20,11 km2 em 70,5 m e 28,16 km2 em 71,3 m apenas 20% da área dos afluentes está coberta com (FURNAS & CNO, 2007, p. 125-126). Estas áreas macrófitas (ou seja, 2,5% do reservatório como um totalizam 34,17 km2 em 70 m, 38,56 km2 em 70,5 m todo com a 70 m, 2,4% no nível de 70,5 m ou 2,9% a e 45,87 km2 em 71,3 m. A percentagem desta área nível de 71,3 m), então a emissão medida de 127,12 2 que estará coberta com macófitas será um fator cha- mmol CH4/m /dia em macrófitas, descritas acima, ve na determinação das emissões. implica na emissão de 5.073,4 t/ano a nível de 70 m, 5.725,2 t/ano em 70,5 m e 6810.5t/ano em 71,3 m. Macrófitas enraizadas representam uma fonte Os 80% restantes da superfície dos afluentes emi- importante de emissões de metano, já que o xile- tindo em 21,1 mmole/m2/dia (df = 16,6, n = 3 esta- ma nos seus caules fornece um canal direto para a ções) (Grandin, 2012, p. 31) implica uma emissão de transferência de gás dos sedimentos anóxicos para 3.367,9 t/ano no nível de 70 m, 3.800,6 no nível de a atmosfera. Reservatórios tropicais normalmen- 70,5 m e 4.521,0 t/ano no nível de 71,3 m. te sofrem explosões de populações de macrófitas (tanto enraizadas como não) nos primeiros anos Emissões a jusante da barragem após o represamento, em Brokopondo no Suriname No caso de uma estação de amostragem, loca- (Leentvaar, 1966), Balbina, no Estado do Amazonas lizada a aproximadamente 3 km rio abaixo da bar- (Walker et al., 1999) e Tucuruí no Estado do Pará ragem (Hällqvist, 2012, p. 18), a concentração no ar (de Lima et al., 2000). Em Tucuruí, por exemplo, foi de 8,4 ppmv, ou 5,5 vezes maior do que a con- uma sequência de imagens de satélite indica que centração encontrada na água (Grandin, 2012, p. 39% do reservatório estavam cobertos por macró- 28). As concentrações foram também medidas em fitas dois anos após o represamento, e que a cober- duas estações de amostragem muito mais a jusante, tura diminuiu e estabilizou em 11% do reservatório com resultados mistos. Numa estação cerca de 29 214 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras km abaixo da barragem a concentração no ar era a respiração da vegetação à noite, tornando-o dife- apenas 2 ppmv, enquanto que na água foi de 17,5 rente de um pulso único de emissão como no caso vezes maior, ou similar às concentrações em afluen- do CH4 liberado de desgaseificação nas turbinas e tes de Santo Antônio. A outra estação, localizada a vertedouros. A concentração a 30 cm de altura não aproximadamente 100 km abaixo da barragem, ti- pode ser extrapolada até uma altura de 51 m. No nha concentrações similares às da estação localizada entanto, pode-se fazer uma suposição conservadora, a 3 km abaixo da barragem, com uma concentração como a que, em média, a coluna de ar contém esta no ar de 13,3 ppmv, ou 8,6 vezes maior do que a concentração até uma altura de 5 m (ou seja, 10% concentração na água. da altura aproximada na qual a massa de ar pode ser A emissão imediatamente abaixo da barragem presumida subir à noite). é de um tipo de emissão diferente daquela da su- O rio Madeira logo abaixo da represa tem uma perfície da água em afluentes dentro do reservatório. largura de 2,2 km, estreitando para 1,4 km em frente No caso dos afluentes, a emissão é contínua, com a de Porto Velho e a 0,8 km abaixo da cidade (medida água de superfície tendo altas concentrações de CH4 do Google Earth). Se for suposto que a massa de ar que é continuamente alimentada pela decomposição que contém o metano permanece no rio ao longo anaeróbica em sedimentos no fundo, e no ar à altura de 6 km (ou seja, duas vezes a distância da primeira de 30 cm acima da água tem uma concentração de estação de amostragem abaixo da barragem, o me- CH4 muito inferior à da água. Na estação de amos- tano medido acima da primeira estação de amostra- tragem a 3 km abaixo da barragem, no entanto, a re- gem, portanto, representa o ponto a meio caminho lação é inversa, com uma concentração de CH4 bas- em um presumível declínio linear a partir da bar- tante reforçada no ar, mas pouco CH4 na água. Isso ragem) e considerando a largura de rio de 1,4 km indica que, em vez de um fluxo contínuo de CH4 (correspondente na estação de medição 3 km abaixo através da coluna d’água e difusão pela superfície, o da barragem) como mais relevante para a dissipa- gás foi lançado em uma única explosão (presumivel- ção da emissão inicial da água que passa através da mente na forma de bolhas) quando a água emerge barragem, o volume da massa de ar que contém o das turbinas e dos vertedouros. O gás permanece no metano é de 4,20 × 107 m3. Considerando a tempe- ar sobre o rio para uma distância considerável a ju- ratura média do ar de 33° C nos locais de medição sante, mas a taxa de fluxo na superfície enquanto a no reservatório (Grandin, 2012, p. 31), a altitude da água continua a fluir a jusante seria pequeno, muito superfície do rio de 55,3 m acima do nível do mar menos do que seria necessária para explicar a eleva- (FURNAS et al., 2005, Tomo A, Vol. 1, p. VII-50), da concentração de CH4 a 30 cm de altura. a densidade do ar nesta altitude e temperatura é Mesmo se a água no trecho logo a jusante da 0,68% inferior à densidade em condições normais barragem não tenha condições para medições de de temperatura e pressão, que é equivalente a 0° C ao fluxo direto com câmaras, as medições nos diria nível do mar (Engineering Toolbox, 2014). pouco sobre a quantidade de CH4 que teria sido A concentração média no ar em quatro locais emitida no surto inicial. Da mesma forma, se dados sobre o reservatório principal de 1,4 ppmv CH estivessem disponíveis sobre a componente vertical 4 do movimento do ar, a emissão total não poderia ser (Hällqvist, 2012, p. 27) pode ser tomada como a calculada a partir da concentração no ar porque a concentração de referência para o cálculo de enri- emissão, neste caso, não é um fluxo contínuo. No en- quecimento. As medições de concentração no ar fo- tanto, uma ideia muito aproximada pode ser adqui- ram feitas ao nível da parte superior das câmaras de rida de um valor mínimo para esse fluxo. É conhe- flutuação, ou a aproximadamente 30 cm acima da cido a partir de estudos de perfis de concentração de água (Hällqvist, 2012, p. 12-13). CO2 na coluna de ar sobre pastagens na Amazônia, Na temperatura e a altitude em Porto Velho, que durante a noite, se o ar estiver sem movimento um mol de gás ocupa 22,55 litros, e a massa de ar (o que impossibilita a medição), a concentração do acima do rio contém 1,86 × 109 moles de ar. O en- gás é aproximadamente constante até a altura da ca- riquecimento de metano de 8,4 – 1,4 = 7,0 ppmv mada limite, que, com base em dois métodos de es- corresponde a 1,30 × 104 moles de metano na massa timativa, está, em média, a 51 m acima da superfície de ar, ou 208,6 kg de gás metano. No mês de fe- (Acevedo et al., 2004, p. 893). Isto se refere a um gás vereiro, quando as medições de metano foram fei- (CO2) proveniente de uma fonte contínua, ou seja tas, os ventos predominantes no local são do Norte Hidrelétricas no Mecanismo de Desenvolvimento 215 Limpo: A Barragem de Santo Antônio como exemplo da necessidade de mudança (Cortez, 2004, p. 17), ou seja, que o vento tem um significa que o enriquecimento de metano do ar não ângulo de ataque de 35° em relação ao eixo do rio, é explicado pela liberação de metano transportado que (ignorando irregularidades) flui em uma direção conforme o cálculo da concentração de superfície e, aproximadamente nordeste neste trecho em um ân- portanto, a liberação de metano deve ser a partir da gulo de 35° (Google Earth). A velocidade média do água com maior concentração, na parte inferior do vento no momento da medição na estação de amos- rio. No momento da medição, quase todo o fluxo tragem a 3 km abaixo da barragem foi de 2,3 m/s do rio estava passando pelos vertedouros, que tiram (Hällqvist, 2012, p. 35). Ao longo do ano, a veloci- água do fundo da coluna de água e que produzem dade média do vento em Porto Velho é de 1,4 m/s forte turbulência abaixo da barragem. Um lança- (Cortez, 2004, p. 16). A velocidade do vento medida mento desta magnitude, portanto, não parece razoá- em cada local e a direção presumida implicam que o vel, mas a incerteza é elevada. vetor que representa o movimento de um lado para o outro lado do rio tinha uma velocidade de 1,3 m/s. Outra verificação é a porcentagem das emissões O ar sobre o rio, portanto, estava sendo renovado a totais de metano que é estimada para ocorrer a ju- cada 18 minutos, e a quantidade total de CH4 emiti- sante, neste caso 34,5% para o nível de água de 70,5 do correspondia a 27 t/dia ou 1,67 × 104 t/ano. m. Essa percentagem é bem inferior aos percentuais em outras barragens na América do Sul tropical: A emissão total estimada de fluxos acima e abai- Balbina na idade de 18 anos emitia 52,7% do seu xo da barragem é de 1.48 × 104 t/ano para o nível CH a jusante (Kemenes et al., 2007), Petit Saut de água (cota) de 70 m, 1,59 × 104 t/ano no nível de 4na idade de 9 anos emitia 78,6% a jusante (Abril 70,5 m e 1,77 × 104 t/ano no nível de 71,3 m. Deste et al., 2005) e Tucuruí na idade de 6 anos emitia total, 41,3% representam emissões a jusante no nível 70 m, as percentagens correspondentes sendo 38,3% 88,2% a jusante (Fearnside, 2002a). Estas outras em 70,5 m e 34,5% em 71,3 m. A emissão a jusan- barragens apresentam diferenças significativas em te é, provavelmente, em grande parte o resultado de relação à Santo Antônio, incluindo áreas de reserva- liberação imediata, na hora que a água passa através tório substancialmente maiores que levariam a uma da barragem, e presume-se que não continuaria a um menor importância esperada das emissões a jusante, nível significativo a partir da superfície da água além quando expressa como uma percentagem do total. A do ponto de medição 3 km abaixo da barragem. maior vazão do Rio Madeira, em comparação com os rios em outras barragens sul-americanas, também Algumas verificações da realidade são factíveis faria o percentual esperado de emissões a jusante ser com base na quantidade de metano que iria ser maior em Santo Antônio. A menor percentagem de transportado através da barragem em diferentes emissão a jusante calculada para Santo Antônio é, concentrações possíveis. Considerando o escoamen- portanto, uma característica que sugere que a esti- to médio anual de 18.806 m3/s no período 1931- mativa das emissões a jusante é conservadora. 2005, as emissões calculadas a jusante de 175.024 t de CH 64 representam 15,4% dos 1,14 × 10 t/ano de Enfatizo que a estimativa apresentada acima metano transportado através da barragem, se a água para Santo Antônio é um cálculo muito grosseiro, contém a alta concentração média encontrada em mas dá uma idéia da magnitude envolvida com base águas superficiais nos afluentes. Porém, representa- nas melhores informações disponíveis. A estimati- ria um percentual impossível de 410% do metano va acima contém vários pressupostos conservadores. que passaria pela barragem (42.730 t/ano) se a água Talvez o maior seja que a concentração de metano contivesse a concentração medida em águas super- no ar de uma medição feita cerca de 3 km abaixo ficiais no rio principal na estação de medição mais da barragem representa o valor a ser aplicado para próxima acima da barragem. No entanto, as concen- a massa de ar acima do rio. Sendo que a maior par- trações de metano medidas na superfície não repre- te das emissões normalmente ocorre muito rapi- sentam a concentração média da coluna de água, damente quando a água passa através da barragem especialmente se a água for estratificada, uma vez (veja Fearnside & Pueyo, 2012), o valor usado aqui é que as concentrações de metano na parte inferior do provavelmente subestimado, porque muito do meta- reservatório sob essas condições são muito maiores no do surto inicial de emissão teria já sido deslocado do que na superfície. A concentração na água de su- lateralmente pelos ventos, levando o metano para perfície abaixo da barragem, uma vez sendo essen- longe do rio antes de chegar ao ponto de medida 3 cialmente igual à concentração acima da barragem km abaixo da barragem. 216 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Emissões da construção da barragem e da Na estimativa para a linha de transmissão, as emis- linha de transmissão sões na produção das 63.000 t de alumínio utiliza- As emissões da construção da barragem e da li- das nos cabos, sem dúvida, é subestimada, uma vez nha de transmissão são mostradas na Tabela 2. A que as emissões do processo de energia-intensivos estimativa das emissões da construção da barragem de produção de alumínio são calculadas a partir de é conservadora, sendo que a falta de informação re- estimativas da Associação Brasileira do Alumínio sultou na não inclusão de várias fontes de emissão, (ABAL, 2011) que considera a energia hidrelétrica tais como o uso de diesel combustível e eletricidade. como energia “verde”, livre de emissões. Tabela 2. Emissões da construção da barragem de Santo Antônio e da linha de transmissão Emissão Emissão Nº de Quantidade Total Referência Referênci Categoria Item Unidades por unidade total Itens por item quantidade quantidade Emissão (t de CO2e) (t de CO2e) Aço Vergalhões reforçados 167.837 t (a) Turbinas 44 899,36 39.572 t (a) Geradores 44 234,53 10.319 t (a) Comportas do vertedouro 21 234,53 4.925 t (b) Outros itens de aço 2.500 t (b) Aço total 225.153 t 2.200 495.336 ( c ) Concreto Concreto convencional 3.311.150 t (a) Concreto rolo-comprimido 408.000 t (a) Total de concreto 3.719.150 t Areia e cascalho em concreto 2.769.688 t 0,009 25.758 (d) (e) Cimento 949.462 t 1,004 953.545 (a) (e) Escavação e preenchimento Escavação comum 74.364.110 m3 (a) (d, f) Rocha acima da água 21.554.760 m3 (a) (d, f) Rocha abaixo da água 400.000 m3 (a) (d, f) Preenchimento de terra 6.164.780 m3 (a) (d, f) Preenchimento de rocha 5.852.870 m3 (a) (d, f) Rip-rap 1.534566 m3 (a) (d, f) Total de preenchimento e escavação 109.871.086 m3 0,0006 68.197 (f) Subtotal de barragem 1.542.836 Linha de transmissão Aço 52.000 t 2,200 114.400 (g) ( c ) Alumínio 63.000 t 4,250 267.750 (g) (h) Total da linha de transmissão 382.150 Fração da linha de transmissão atribuída à Santo Antônio 0,5 Subtotal da linha de transmissão atribuído à Santo Antônio 191.075 Total atribuído à Santo Antônio 1.733.911 (a) FURNAS & CNO, 2008. (b) baseado em Belo Monte (Fearnside, 2009). (c) Van Vate, 1995. (d) concreto menos cimento. (e) Marheineke, s/d [1996]. (f) As emissões para “terra transportada”, aplicadas a todas as escavações e operações de preenchimento. (g) Moreira, 2013. (h) ABAL, 2011, p. 38. Hidrelétricas no Mecanismo de Desenvolvimento 217 Limpo: A Barragem de Santo Antônio como exemplo da necessidade de mudança As emissões da construção de barragem po- decisão política e ética, não uma decisão cientí- dem ser estimadas a partir das quantidades de aço, fica. A indústria hidrelétrica está ansiosa para cimento e outros materiais (Tabela 2). As quan- ter todas as comparações feitas em uma base de tidades de materiais utilizados na construção de 100 anos sem nenhum desconto por tempo (por uma usina hidrelétrica são muito maiores do que exemplo, Fearnside, 1996, Goldenfum, 2012); isto aquelas para uma usina termoelétrica a gás equi- faria as hidrelétricas aparecerem relativamente valente. Uma estimativa para uma usina terme- mais atraentes, por vários motivos, mas vai con- létrica a gás equivalente é incluída com base no tra os interesses da sociedade em evitar níveis aço nas turbinas (Tabelas 3 & 4). As emissões da perigosos de aquecimento global (e.g., Fearnside, construção representam 14% do impacto de Santo 2002b). As emissões estimadas de Santo Antônio Antônio, excluindo as emissões a jusante (Tabela (incluindo as emissões a jusante) são comparadas 4). A escolha de um horizonte de tempo pressu- com as emissões de linha de base na Tabela 3. A põe que dez anos é um tempo razoável sobre o Tabela 4 faz a mesma comparação omitindo as qual alocar as emissões de construção. Esta é uma emissões a jusante por serem muito incertas. Tabela 3. Estimativa das emissões de Santo Antônio (reservatório em 70,5 m + a jusante) em comparação com as emissões da linha de base Emissões da Energia a Emissão estimada de Sto. Antônio linha de base ser gerada CH4 GWP = 25 GWP = 34 GWP = 86(t de CO2e) (a) (MWh) (t/ano) (t de CO2e) (t de CO2e) (t de CO2e) Emissões de CO2 da construção da barragem (Tabela 2) 1.542.836 1.542.836 1.542.836 Emissões de CO2 do desmatamento para o reservatório (Tabela 2) 6.368.215 6.368.215 6.368.215 Emissões de CO2 da construção da linha de transmissão atribuídas à Santo Antônio (Tabela 2) 191.075 191.075 191.075 Emissões de CO2 do desmatamento para a linha de transmissão (Tabela 1) 252.137 252.137 252.137 Emissões de gás CO2 da construção da usina 2.157,8 (b) 0 2012 518.205 1.893.741 15.911 397.782 540.984 1.368.371 1 2013 2.720.189 9.940.726 15.911 397.782 540.984 1.368.371 2 2014 4.953.586 18.102.507 15.911 397.782 540.984 1.368.371 3 2015 5.830.126 21.305.757 15.911 397.782 540.984 1.368.371 4 2016 5.846.099 21.364.129 15.911 397.782 540.984 1.368.371 5 2017 5.830.126 21.305.757 15.911 397.782 540.984 1.368.371 6 2018 5.830.126 21.305.757 15.911 397.782 540.984 1.368.371 7 2019 5.830.126 21.305.757 15.911 397.782 540.984 1.368.371 8 2020 5.846.099 21.364.129 15.911 397.782 540.984 1.368.371 9 2021 5.830.126 21.305.757 15.911 397.782 540.984 1.368.371 10 2022 2.429.219 8.877.398 15.911 397.782 540.984 1.368.371 Total 51.466.185 188.079.300 175.024 12.729.868 14.305.086 23.406.345 Perda em transmissão até São Paulo (c) 10.293.237 (d) 37.615.860 Energia transferida até São Paulo 41.172.948 150.463.440 Emissão por MWh entregue ao São Paulo (t CO2e/MWh) 0,27 0,08 0,10 0,16 (a) Emissões de linha de base (Santo Antônio Energia, S.A., 2012, p. 35) baseiam-se no fator de emissões de margem combinada de 0,31, que é 50% do fator de emissões operacionais de margem da rede (0,4796) e 50% do fator de emissões de construção de margem da rede (0,1404) (Santo Antônio Energia S.A., 2012, p. 34). (b) Com base em turbinas a gás Alstom GT24 a 230-t, considerado o estado-da-arte; Esta turbina de 700 MW de capacidade opera com um fator de potência de 60% (Wheeler, 2012). Isto forneceria um total de 62.362.000 MWh durante um período de 10 anos, e 4,1 destas turbinas supriria a eletricidade que a Santo Antônio vai entregar para São Paulo. (c) Pressupõe perda de transmissão de 20%, que é a média para perdas brasileiras (Rey, 2012). Isto é uma percentagem conservadora para uma linha desta extensão. (d) Apesar de centrais a gás serem construídas onde a eletricidade é usada, evitando assim a perda de transmissão, a quantidade de eletricidade usada para o cálculo das emissões da linha de base no PDD é baseada na energia entregue à rede em um ponto localizado a 5 km da hidrelétrica de Santo Antônio. 218 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Tabela 4. Cálculo das emissões de Santo Antônio (apenas do reservatório; nível da água =70,5 m) em comparação com as emissões da linha de base Emissões de Energia a Emissão estimada de Sto. Antônio linha de base ser gerada CH4 GWP = 25 GWP = 34 GWP = 86(t CO2e) (a) (MWh) (t/ano) (t de CO2e) (t de CO2e) (t de CO2e) Emissões de CO2 da construção da barragem (Tabela 2) 1.542.836 1.542.836 1.542.836 Emissões de CO2 do desmatamento para o reservatório (Tabela 2) 6.368.215 6.368.215 6.368.215 Emissões de CO2 da construção da linha transmissão atribuídas à Santo Antônio (Tabela 2) 191.075 191.075 191.075 Emissões de CO2 do desmatamento para a linha de transmissão (Tabela 1) 252.137 252.137 252.137 Emissões de gásde CO2 da construção da usina 2.157,8 (b) 0 2012 518.205 1.893.741 9.816 245.409 333.756 844.207 1 2013 2.720.189 9.940.726 9.816 245.409 333.756 844.207 2 2014 4.953.586 18.102.507 9.816 245.409 333.756 844.207 3 2015 5.830.126 21.305.757 9.816 245.409 333.756 844.207 4 2016 5.846.099 21.364.129 9.816 245.409 333.756 844.207 5 2017 5.830.126 21.305.757 9.816 245.409 333.756 844.207 6 2018 5.830.126 21.305.757 9.816 245.409 333.756 844.207 7 2019 5.830.126 21.305.757 9.816 245.409 333.756 844.207 8 2020 5.846.099 21.364.129 9.816 245.409 333.756 844.207 9 2021 5.830.126 21.305.757 9.816 245.409 333.756 844.207 10 2022 2.429.219 8.877.398 9.816 245.409 333.756 844.207 Total 51.466.185 188.079.300 107.980 11.053.763 12.025.583 17.640.543 Perda em transmissão para São Paulo (c) 10.293.237(d) 37.615.860 Energia transferida para São Paulo 41.172.948 150.463.440 Emissão por MWh entregue a São Paulo (t CO2e/MWh) 0,27 0,07 0,08 0,12 (a) Emissões de linha de base (Santo Antônio Energia, S.A., 2012, p. 35) baseiam-se o fator de emissões de margem combinada de 0,31, que é 50% do fator de emissões operacionais de margem da rede (0,4796) e 50% do fator de emissões de construção de margem da rede (0,1404) (Santo Antônio Energia S.A., 2012, p. 34). (b) Com base em turbinas a gás Alstom GT24 a 230-t, considerado o estado-da-arte; Esta turbina de 700 MW de capacidade opera com um fator de potência de 60% (Wheeler, 2012). Isto forneceria um total de 62.362.000 MWh durante um período de 10 anos, e 4,1 destas turbinas supriria a eletricidade que Santo Antônio vai entregar para São Paulo. (c) Pressupõe perda de transmissão de 20%, que é a média para perdas brasileiras (Rey, 2012). Isto é conservadora para uma linha desta extensão. (d) Apesar de centrais a gás serem construídas onde a eletricidade é usada, evitando assim a perda na transmissão, a quantidade de eletricidade usada para o cálculo das emissões da linha de base no PDD é baseada na energia entregue à rede em um ponto a 5 km da hidrelétrica de Santo Antônio. As emissões de construção da linha de trans- 2.362 km que foi construída para servir às repre- missão podem ser estimadas conservadoramente sas do Rio Madeira. O projeto considera a perda com base nos materiais utilizados, ignorando outras de transmissão até a junção com o SIN sendo de fontes de emissão (Tabela 2). Apenas metade das apenas 3,2% (Santo Antônio Energia S.A., 2012, emissões de construção é atribuída à empresa Santo p. 34). No entanto, a perda média na transmissão Antônio, a outra metade sendo imputáveis à Jirau. no Brasil é de 20% (Rey, 2012), e a linha de trans- O projeto de carbono conta a eletricida- missão muito longa até São Paulo, uma das mais de produzida no ponto onde entra o Sistema longas do mundo (Moreira, 2013), sugere que as Interconectado Nacional (SIN), em uma junção, perdas seriam maiores que a média nacional. Não localizada apenas a 5 km da barragem. Na realidade, só é a linha de transmissão que é omitida dos cál- a grande maioria da eletricidade será usada em São culos de emissão no PDD, mas isso também afeta Paulo depois de passar pela linha de transmissão de a quantidade de crédito de carbono reivindicado. Hidrelétricas no Mecanismo de Desenvolvimento 219 Limpo: A Barragem de Santo Antônio como exemplo da necessidade de mudança Porque o PDD alega crédito com base no núme- de emissões do projeto hidrelétrico estaria numa ro de megawatts-hora no ponto de entrega para o faixa de 30% a 59% das emissões do cenário de li- SIN, a quantidade de eletricidade chegando em nha de base, dependendo do valor do GWP usado São Paulo seria, na realidade, pelo menos 20% para converter CH4 em CO2e (Tabela 3). Ambas menos. Se usinas termelétricas a gás fossem usa- as estimativas a jusante e a montante presumem das para substituir a barragem, seriam construídas que os valores usados, que foram medidos no pri- perto da cidade onde a eletricidade é usada, assim meiro ano do reservatório após o enchimento, apli- eliminando perda de transmissão. As emissões de cam-se ao período total de 10 anos. Isto é incerto, CO2 de uma usina a gás que teoricamente está sen- sendo que reservatórios têm emissões que oscilam do eliminada pela barragem seriam, portanto, pelo ao longo do ciclo anual e sendo que, geralmente, menos 20% menos do que alegado no PDD. há uma tendência para que as emissões diminuam As medições de fluxo logo a jusante da barra- ao longo dos primeiros dez anos (por quantidades gem não são possíveis devido à turbulência exces- amplamente variáveis). Uma característica positiva siva para o uso das câmaras de flutuação. No en- é o plano de manejo de Santo Antônio com um tanto, é possível uma estimativa muito aproximada nível de água constante, embora sujeito a variações, de emissão, baseado no enriquecimento de CH tais como as inundações de 2014. Um fator nega-4 observado do ar. A estimativa envolve informa- tivo é a grande quantidade de carbono alóctone no ções incertas sobre as dimensões da massa de ar ao Rio Madeira. Um resumo das emissões de Santo qual se aplicam os valores do enriquecimento de Antônio em relação ao fornecimento da mesma concentração e a direção do vento que, juntamen- quantidade de energia para São Paulo a partir de te com a velocidade do vento, determina a taxa na centrais térmicas a gás é apresentado na Tabela 5. qual se renova o ar sobre o rio. Estes são baseados Mesmo se não se fossem consideradas as em valores médios e poderiam ter sido diferentes emissões a jusante devido à alta incerteza, o total no momento da medição. A medição em si pode- das emissões restantes variariam entre 27% e 43% ria sempre ser atípica. No entanto, o raciocínio da das emissões do cenário de linha de base para pro- melhor informação disponível, a jusante as emis- duzir a mesma quantidade de eletricidade (Tabela sões representam 34,5% do total se calculado com 4). A emissão, portanto, não é «insignificante», o nível de água em 70,5 m. Com emissões a jusante mesmo quando uma das principais fontes de me- incluídas a este nível da água, o impacto da gama tano é ignorada. Tabela 5. Resumo das emissões estimadas de Santo Antônio em comparação com as emissões da linha de base Emissão estimada GWP = 25 GWP = 34 GWP = 86 Fonte (t CO2e) (t CO2e) (t CO2e) Emissões de CO2 da construção da barragem 1.542.836 1.542.836 1.542.836 Tabelas 1 e 3 Emissões de CO2 do desmatamento para o reservatório 6.368.215 6.368.215 6.368.215 Tabelas 1 e 3 Emissões de CO2 da construção da linha de transmissão a 191.075 191.075 191.075 Tabelas 1 e 3 Emissõesde CO2 do desmatamento da linha de transmissão 252.137 252.137 252.137 Tabelas 1 e 3 Emissões de metano barragemb 12.729.868 14.305.086 23.406.345 Tabela 3 Total do projeto de Santo Antônio 21.084.131 22.659.349 31.760.608 Tabela 3 Construção de base de gás 2.158 2.158 2.158 Tabela 3 Operação de base de gás 51.464.027 51.464.027 51.464.027 Tabela 3 Total de gás da linha de base 51.466.185 51.466.185 51.466.185 Tabela 3 Emissão de Santo Antônio por MWh (t CO2-e) c 0,08 0,10 0,16 Tabela 3 Emissão de gás de base por MWh (t CO2-e) 0,27 0,27 0,27 Tabela 3 a Parte atribuída à Santo Antônio apenas. b Emissão a montante+ a jusante, total dos 10 anos de projeto. c Emissão por MWh entregue a São Paulo. 220 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Carbono não adicional Wd =peso da dívida “tipicamente observado” no se- tor da energia hidrelétrica: 50% O PDD calcula um benefício de 51.464.028 t de CO2e ao longo dos 10,5 anos do projeto, de ju- KD = o custo da dívida no mercado de energia hi- nho de 2012 a dezembro de 2022 (Santo Antônio drelétrica; isto inclui ajustes para os benefícios fis- Energia S.A., 2012, p. 35). A venda deste montante cais de contrair dívidas. KD é calculado a partir da de crédito de carbono contribuirá para mais mudan- Equação 2. ças climáticas, se não for adicional. O PDD justifica a alegação de adicionalidade KD = [1 + (a + b + c) × (1-t)] / [(1+d) -1] (Eq. 2) calculando a taxa interna de retorno (IRR) do pro- jeto sem as receitas da venda de crédito de carbo- Onde: no, e então comparando esse valor com um valor de referência que supostamente representa uma IRR (a) = custo financeiro: 9.28% mínima que poderia ser considerada rentável. O (b) = taxa BNDES: 0,90% projeto de Santo Antônio optou pelo método Custo (c) = spread (diferença entre os preços de compra e Médio Ponderado de Capital (WACC), que é a mé- venda): 2,00% dia entre o custo de dívida e o custo de capital. O (a + b + c) = pré-custo de dívida: 12,18% WACC é um dos dois índices admissíveis para tes- (t) = Taxa de imposto marginal: 34.00% tes de investimento. O WACC é uma referência que (d) = previsão de inflação: 4,50% representa a IRR do projeto ao invés da IRR de ca- Da Equação 2, o custo de dívida após impostos pital próprio (“equity IRR”), que é representado pelo (Kd) é de 3,39% ao ano. outro método permitido, o Modelo de Avaliação de Preços de Capital (CAPM), que foi usado, por exem- Ke (custo de capital próprio) representa a taxa plo, para o projeto de MDL da hidrelétrica de Jirau. de retorno de investimentos de capital. Com base no O valor de referência (WACC) calculado para Santo PDD (Santo Antônio Energia, S.A., 2012, p. 14), Antônio foi de 10,35% e a IRR calculada sem crédi- como esclarecido a partir de planilhas, estima-se to de carbono foi de 5,63% (Santo Antônio Energia, com a Equação 3: SA, 2012, p. 14 & 16). A metade do valor do Custo Médio Ponderado Ke = ((Rf + (β × Rm) + Rc)) × (I / d) (Eq. 3) de Capital (WACC) é representada pelo custo da dívida (calculado para ser 3,39%) e a outra metade Onde: é o custo de capital, que é calculado em 17,31%, ajustando uma taxa livre de risco de 4,88% apli- (Rf ) = taxa livre de risco: 4,88% cando um “prêmio” para o risco líquido patrimonial (Rm) = prêmio de risco do capital próprio = 6,57% de 6,57%, que é aumentada pela multiplicação por (Rc) = prêmio de risco de país estimado = 6,06% um valor do risco setorial (β) de 1,34%, um “prê- (β) = Risco setorial = 1,34 mio” para o “risco país” de 6,06% e um percentual (I) = inflação esperada nos EUA: 2,39% de inflação esperada nos EUA de 2,39% (Santo (d) = previsão de inflação brasileira: 4,50% Antônio Energia, S.A., 2012, p. 14). Da equação 3 é o custo de capital próprio com o O PDD (Santo Antônio Energia, S.A., 2012, risco-país brasileiro: p. 13-14) calcula o WACC do setor hidrelétrico de 2007 usando a Equação 1. Ke = (0,0488 + (1,34 × 0,0657) + 0,0606) × (0,0239 / 0,0450) = 0,1731 ou 17,31% ao ano. WACC = (Wd × Kd) + (We × Ke) (Eq. 1) Da Equação 1, o Custo Médio Ponderado de Onde: Capital (WACC) é: We =peso do capital próprio “tipicamente observa- do” no setor da energia hidrelétrica: 50% WACC = (50% × 3,39%) + (50% × 17,31%) = 10,35% Hidrelétricas no Mecanismo de Desenvolvimento 221 Limpo: A Barragem de Santo Antônio como exemplo da necessidade de mudança Alguma dose de bom senso é necessária. A Licenciamento ambiental metade do valor calculado no PDD WACC é o custo da dívida (calculado para ser 3,39%) e a ou- O PDD do licenciamento ambiental diz que tra metade é o custo de capital, que é calculado em “este processo consistia em 64 reuniões públicas 17,31%. Este último valor representa um IRR de com a participação de 2.000 pessoas das comuni- capital próprio (equity IRR) que serve como uma dades locais que habitam a área de influência di- indicação da rentabilidade do empreendimento reta da usina hidrelétrica” (Santo Antônio Energia do ponto de vista de um investidor. Poucas em- S.A., 2012, p. 46-47). Esqueceu-se de mencionar o presas ou investidores podem esperar para obter conteúdo dessas reuniões, ou seja, que praticamente um retorno sobre o investimento de 17% ao ano, 100% do que foi dito foram duras críticas à barra- depois de descontado os impostos, para além da gem (e.g., Baraúna & Marin, 2011). Os meios de inflação e mantido ao longo de um período de dez subsistência da população local eram pesadamente dependentes dos extraordinários recursos pesquei- anos. A justificativa para permitir a alegação de ros do Rio Madeira, que hoje foram sacrificados, em que um retorno tão alto é necessário para tornar grande parte, para as barragens de Santo Antônio e Santo Antônio atraente se baseia em uma série Jirau (veja Fearnside, 2014b). de ajustes, representando supostos riscos como o “risco Brasil”. Enquanto a série de ajustes nos O formulário do PDD solicita “conclusões e cálculos pode legitimar a prática em termos le- todas as referências para apoiar a documentação de gais sob a atual regulamentação do MDL, não uma avaliação de impacto ambiental realizada em conduzem a decisões que fazem sentido do ponto conformidade com os procedimentos conforme exi- de vista da luta contra o aquecimento global. Se gido pela parte anfitriã” (Santo Antônio Energia o valor de referência for muito alto, projetos que S.A., 2012, p. 47). O PDD de Santo Antônio res- aconteceriam de qualquer forma serão classifica- ponde a isso afirmando que “o projeto tem todas dos como “adicionais” e será concedido crédito de as licenças ambientais necessárias emitidas pelo carbono sem merecimento. IBAMA” e listando as licenças. Não são mencio-nadas as muitas irregularidades no processo de li- O indicador mais evidente que o compor- cenciamento. A irregularidade mais grave foi a tamento de empresas que investem no projeto, substituição do chefe do setor de licenciamento do não coincide com a rendibilidade calculada do IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e empreendimento sem crédito de carbono é o fato Recursos Naturais Renováveis) logo antes da licença de que as empresas estavam dispostas a investir so- prévia ser aprovada (o chefe anterior do setor havia mas enormes, antes mesmo que o projeto de car- apoiado seu pessoal técnico se recusando a aprovar bono fosse entregue ao MDL, muito menos apro- a licença). O novo chefe do departamento de licen- vado. A probabilidade de um projeto de MDL de ciamento foi promovido para ser o presidente do energia hidráulica ser rejeitado, se calculado a par- IBAMA como um todo e aprovou a licença de ins- tir da primeira apresentação, é de 16,6% (ver Seção talação nessa função. Estas aprovações passaram por 1.1), o que seria um alto risco de perder as somas cima da equipe técnica do IBAMA, que havia to- investidas. Além disso, o mercado para CREs caiu, mada posição formal contra a aprovação de ambos, com os preços caindo em mais de 70%, antes que a licença prévia (Deberdt et al., 2007) e a licença muitos dos grandes investimentos sejam feitos, in- de instalação (Brasil, IBAMA, 2008). O licencia- dicando que o risco adicional de que o preço não mento e os impactos das barragens do Rio Madeira iria recuperar até os valores de 2008 usados no foram revisados em detalhe em outras publicações PDD. Isso representaria outro fator inibidor im- (Fearnside, 2013b, 2014b,c). portante se o projeto fosse realmente tão pouco rentável como alega o PDD sem as receitas de ven- Impactos ambientais e sociais da de CREs. A conclusão da “navalha de Occam” Os leitores da seção do PDD sobre os impac- é que as empresas estavam investindo no projeto tos ambientais e sociais (Santo Antônio Energia com plena expectativa de obter lucro sem qualquer S.A., 2012, p. 42-47) terão pouca idéia da severi- ajuda adicional do MDL, e que nenhuma das 51 dade dos impactos de Santo Antônio. O PDD afir- milhões de toneladas de CO2-equivalente de cré- ma ainda que “o projeto terá um impacto global dito de carbono reivindicado é adicional. positivo sobre os ambientes locais e globais” (Santo 222 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Antônio Energia S.A., 2012, p. 47). Infelizmente, a inclusive na China e na Índia (Yan, 2013). Um barragem terá vários impactos negativos, incluindo estudo de projetos de MDL na China e na Índia bloqueio da migração dos bagres gigantes do Rio tem mostrado várias maneiras que os “benchmarks” Madeira (Brachyplatatystoma rouxeauxii e platy- têm sido manipulados para permitir a aprovação de nemum Brachyplatystoma), que, até agora, têm sido projetos não adicionais (Haya, 2009). um recurso econômico vital, não só no Brasil em Rondônia, mas também no Peru e na Bolívia (e.g., As decisões às quais esta informação é relevante Barthem & Goulding, 1997). Antes das barragens, são decisões de política. Como tal, são decisões que estes peixes subiam o Rio Madeira na piracema (mi- precisam ser tomadas, e isso é feito com base nas gração em massa) cada ano para procriarem nas ca- melhoes informações disponíveis, ao invés de ape- beceiras dos afluentes formadores do Rio Madeira nas em informações que atendem um critério como no Peru e na Bolívia; as larvas, então, desciam o Rio o de ter uma significância estatística a nível de 5%. Madeira à deriva para crescerem até a fase adulta no Na verdade, a maioria das decisões de política, tais Rio Amazonas. As passagens de peixe instaladas nas como a escolha de medidas econômicas para conter barragens de Santo Antônio e Jirau não foram bem a inflação ou para aumentar o emprego, são basea- sucedidas em atrair os bagres adultos que ascendem das em informações com níveis de incerteza muito o rio, uma vez que o instinto dos peixes é de seguir maiores do que as informações sobre os benefícios a correnteza principal do rio. A barragem de Santo climáticos (ou a falta desses benefícios) associados Antônio também afetará os lagos de várzea que são à concessão de crédito de carbono para represas tro- importantes locais de reprodução de outras espécies picais. Atrasar a ação sobre a suspensão desse tipo de peixes a jusante da barragem (não incluído no de crédito em razão da excessiva incerteza é, na EIA). O reservatório irá liberar mercúrio metilado e verdade, um endosso da prática. Todos os dias que destruir os meios de subsistência da população hu- nada mudou, uma decisão está sendo feita para não mana que tem sido tradicionalmente dependente do fazer nada. A possibilidade teórica de algumas bar- Rio Madeira (Fearnside, 2014b). As barragens do ragens serem adicionais não justifica a continuação Rio Madeira, incluindo o Santo Antônio, certamen- da concessão de créditos pelo MDL para barragens te estão entre os projetos hidrelétricos mais contro- tropicais (Fearnside, 2013a). A hidrelétrica de Santo versos atualmente no mundo por causa de seus im- Antônio, sendo uma grande represa a fio d’água, re- pactos e por causa da história do licenciamento. presenta uma boa escolha que deveria ser um projeto modelo a partir do ponto de vista das emissões por MWh, mas, em uma análise mais aprofundada, este O significado global de Santo Antônio benefício encontra-se menor do que foi alegado. O caso do projeto de carbono de Santo Cada barragem tropical não precisa ser não-a- Antônio tem implicações importantes para o mun- dicional para que a melhor decisão seja de parar do. Claramente é “apenas” uma represa, mas é adi- a concessão de crédito de carbono para barragens cionado aos casos documentados onde projetos de tropicais. O crédito de carbono é uma ferramenta carbono para barragens tropicais foram aprovados na luta contra o aquecimento global, não um direi- pelo MDL apesar de ser de adicionalidade questio- to a qual as empresas ou os governos têm qualquer nável. Pela sua natureza, a questão de se “todas” as tipo de direito moral. Se, na prática, a concessão barragens tropicais são não-adicionais, e também de crédito para barragens está fazendo mais mal a questão mais relevante de se as represas tropi- do que bem, ou mesmo se barragens verdadeira- cais devem ser tratadas como se todas fossem não- mente adicionais fossem frequentes o bastante para adicionais, é abordada através de raciocínio indu- resultar em um benefício líquido modesto, mas tivo – não por dedução a partir de um princípio utilizando os fundos para subsidiar barragens que universal. Os dois outros projetos de carbono para tivessem menos ganho para o clima do que seria hidrelétricas examinadas na Amazônia: Teles Pires o caso gastando esse dinheiro em uma categoria (Fearnside, 2012) e Jirau (Fearnside, 2013a) são diferente de medida de mitigação, então o crédito não-adicionais. Ativistas ambientais têm compila- para barragens deve ser descontinuado imediata- do informações menos detalhadas sobre uma lon- mente. O projeto de carbono de Santo Antônio ga lista de barragens em todo o mundo, sugerin- adiciona mais um caso que aponta para isso como do que a não adicionalidade é muito generalizada, a conclusão lógica. Hidrelétricas no Mecanismo de Desenvolvimento 223 Limpo: A Barragem de Santo Antônio como exemplo da necessidade de mudança CONCLUSÕES Baraúna, G.M.Q., Marin, R.E.A. 2011. O “fator participativo” nas audiências públicas das hidrelétricas de Jirau, Santo As regras do Mecanismo de Desenvolvimento Antônio e Belo Monte. In: Zhouri, A. (ed.) As Tensões do Limpo (MDL), na prática, concedem crédito às Lugar: Hidrelétricas, Sujeitos e Licenciamento ambiental. barragens que não são adicionais àquelas que seriam Editora UFMG, Belo Horizonte, Minas Gerais. p. 93-125. construídas sem o subsídio. O crédito concedido Barbosa, R.I., Fearnside, P.M. 1996. Pasture burning in para tais barragens, portanto, permite que os paí- Amazonia: Dynamics of residual biomass and the storage ses que compram o crédito emitam gases de efeito and release of aboveground carbon. Journal of Geophysical Research (Atmospheres) 101(D20): 25.847-25.857. estufa sem que haja uma compensação real corres- doi:10.1029/96JD02090 pondente de emissões evitadas. Além disso, as hi- Barthem, R., Goulding, M. 1997. The Catfish Connection: drelétricas tropicais emitem mais gases de efeito es- Ecology, Migration, and Conservation of Amazon Predators. tufa do que são reconhecidas nos procedimentos do Columbia University Press, New York, NY, E.U.A. 184 p. MDL. O exemplo de Santo Antônio adiciona uma Barrieu, P., Fehr, M. 2011. Integrated EUA and CER price evidência à conclusão de que a prática de concessão modeling and application for spread option pricing. 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Environmental Management 38(1): 16-27. doi: 10.1007/s00267-005-00113-6 232 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO enormes, até mesmo pelos padrões amazônicos. O maior desses reservatórios é a represa de Babaquara, Barragens hidrelétricas representam grandes recentemente renomeada de “Altamira”, num esfor- investimentos e fontes importantes de impactos ço aparentemente com o propósito de escapar do ambientais e sociais. Grandes interesses econômi- ônus da crítica que os planos para Babaquara atraí- cos cercam o processo de tomada de decisão sobre ram ao longo das últimas duas décadas (o inventário investimentos públicos relativo às várias opções inicial para a obra começou em outubro de 1975) para geração e conservação de eletricidade. A pro- (veja por exemplo, Chernela, 1988; Fisher, 1994; posta da hidrelétrica de Belo Monte (antigamente Goodland et al., 1993; Sevá, 1990). Kararaô) e a sua contrapartida rio acima, a hidrelé- trica de Altamira (mais conhecida por seu nome an- Em 1987 um plano volumoso foi produzido pela terior: Babaquara) está no centro das controvérsias ELETROBRÁS, o órgão responsável pelo desen- sobre o processo de tomada de decisão para grandes volvimento de energia sob o Ministério das Minas e projetos de infra-estrutura na Amazônia. Energia. O plano, conhecido como o “Plano 2010”, contém informações sobre barragens que eram espe- A hidrelétrica de Belo Monte por si só teria uma radas então que fossem construídas em todo o País área de reservatório pequena (516 km2) e capacida- até o ano 2010, e também contém uma listagem de de instalada grande (11.233 MW), mas a represa de outras barragens planejadas independente da data Babaquara que regularizaria a vazão do rio Xingu esperada de conclusão (Brasil, ELETROBRÁS, (aumentando assim a geração de energia de Belo 1987). O Plano 2010 vazou ao público e subse- Monte), inundaria uma vasta área (6.140 km2). O quentemente foi liberado oficialmente em dezem- impacto de represas provê uma razão poderosa para bro de 1987. O plano lista 297 barragens no País o Brasil reavaliar as suas atuais políticas, que alocam como um todo, das quais 79 seriam na Amazônia, grandes quantidades de energia na rede nacional independente da data planejada de construção. Na para o beneficiamento de alumínio, uma indústria de Amazônia, seriam inundados 10 milhões de hec- exportação subsidiada. O caso de Belo Monte e das tares (Brasil, ELETROBRÁS, 1987, pág. 153) que cinco represas adicionais planejadas rio acima (in- representa 2% da Amazônia Legal ou 3% da área clusive a hidrelétrica de Altamira/Babaquara) indica originalmente florestada na região. Mapas das bar- a necessidade de reformar o sistema de avaliação e ragens planejadas (CIMI et al., 1986; Fearnside, licenciamento ambiental para incluir os impactos de 1995) faça evidencia o enorme impacto global do projetos interdependentes múltiplos. plano. Seriam represados todos os afluentes princi- Palavras-Chave: Altamira, Amazônia, Babaquara, Belo pais do rio Amazonas, com a exceção dos rios Purus, Monte, EIA, Hidrelétricas, Impacto ambiental, Represas, Japurá e Javarí, que estão nas áreas planas da porção Reservatórios, Xingu. ocidental da região. Seguindo a recepção negativa do Plano 2010, as autoridades do setor de energia nunca mais liberaram listagens completas ou outras O RIO XINGU E AS BARRAGENS MAIS informações sobre a extensão global dos planos para CONTROVERSAS DA AMAZÔNIA construção de barragens. Ao invés disso, documen- A proposta da hidrelétrica de Belo Monte, no tos públicos são limitados a listas curtas de represas rio Xingu (um afluente do rio Amazonas no Estado para construção ao longo de períodos de tempo li- do Pará: Figura 1), é o foco de intensa controvérsia mitados, tais como o Plano 2015 e os vários Planos devido à magnitude e à natureza dos seus impactos. Decenais (Brasil, ELETROBRÁS, 1993, 1998). A hidrelétrica de Belo Monte ficou conhecida pela O Plano 2010 inclui Kararaô [Belo Monte] ameaça que representa aos povos indígenas por faci- para construção até 2000 e Babaquara [Altamira] litar uma série de represas planejadas rio acima em para construção até 2005 (Brasil, ELETROBRÁS, áreas indígenas (por exemplo, Santos & de Andrade, 1987, p. 153-154). Tal cronograma veloz era, pro- 1990; Sevá, 2005). As represas a montante aumen- vavelmente, irreal mesmo naquela época, quando tariam substancialmente a produção elétrica de Belo autoridades do setor de energia elétrica presumiram Monte, regularizando a vazão do rio Xingu, que é um crescimento contínuo da economia brasileira e altamente sazonal. O reservatório de Belo Monte da habilidade consequente para pagar por barragens, é pequeno, relativo à capacidade de suas duas casas um processo de construção essencialmente desim- de força, mas os cinco reservatórios rio acima seriam pedido por exigências de licenciamento ambiental, Barragens na Amazônia: 233 Belo Monte e o Desenvolvimento Hidrelétrico da Bacia do Rio Xingu Figura 1. A Hidrelétrica de Belo Monte e os locais mencionados no texto. e a disponibilidade fácil de empréstimos dos bancos Começando com essa resolução, um Estudo de multilaterais de desenvolvimento sem praticamen- Impacto Ambiental (EIA), e um documento mais te nenhum questionamento feito sobre assuntos breve para distribuição pública (o Relatório sobre ambientais. A criação do Departamento do Meio Impacto Ambiental-RIMA), se tornaram obriga- Ambiente do Banco Mundial só foi anunciada em tórios para projetos grandes de infra-estrutura, tais março de 1987, e ainda era incipiente em dezem- como barragens hidrelétricas. O sistema brasileiro bro de 1987 quando o Plano 2010 foi completado. de licenciamento ambiental, ainda incipiente, esta- As próprias exigências do governo brasileiro para va sendo testado por tentativas de construir grandes estudos ambientais, embora criadas em lei em 31 projetos sem nenhum estudo ambiental, inclusive as de agosto de 1981 (Lei 6938), apenas tinham en- usinas de ferro-gusa de Carajás e a Ferrovia Norte- trado em vigor após a regulamentação da lei no dia Sul, ambos em construção na ocasião sem EIA 23 de janeiro 1986 (CONAMA Resolução 001). e RIMA em violação flagrante da lei (Fearnside, 234 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras 1989a,b). A suposição de muitos era que projetos opinião que isto deveria ter sido feito foi sugerido prioritários, na prática, seriam construídos sem obe- reservadamente em várias ocasiões). decer as exigências ambientais. Embora, até certo ponto, esta situação ainda se aplique hoje (inclusive A região do rio Xingu tem uma diversidade no caso de Belo Monte), era muito mais evidente extraordinária de culturas indígenas. Como fre- durante os primeiros anos de licenciamento am- quentemente apontado pelo antropólogo Darrell biental no Brasil. Posey (falecido em 2001), as represas planejadas lá não só ameaçam povos indígenas, ameaçam grupos A história dos estudos ambientais para as re- de quatro troncos linguísticos diferentes. Entre os presas do Xingu revela muitos problemas que são grupos ameaçados está o Kaiapó (ou “Caiapó”) que comuns à avaliação do impacto ambiental e aos pro- tem uma maneira extrovertida e altamente afirma- cedimentos de licenciamento em toda a Amazônia tiva de interagir com a sociedade brasileira predo- brasileira. Uma primeira versão dos estudos para minante. Isto dá aos eventos no Xingu uma visi- Kararaô e Babaquara foi preparada por CNEC bilidade muito maior do que seria o caso se tribos (Consórcio Nacional de Engenheiros Consultores), mais submissas estivessem envolvidas. Em feverei- uma firma de consultoria sediada em São Paulo ro de 1989, os Kaiapós foram fundamentais na or- (CNEC, 1980). A coleta de dados sobre muitos ganização do encontro de Altamira para protestar dos tópicos específicos foi subcontratada para ins- contra as represas planejadas. O clímax do evento tituições de pesquisa, inclusive o INPA (Instituto foi quando a Tuíra (Tu-Ira), uma mulher Kaiapó, Nacional de Pesquisas da Amazônia). O controle colocou o seu facão contra o rosto do represen- editorial dos relatórios e das suas conclusões perma- tante da ELETRONORTE, José Antônio Muniz necia com a empresa de consultoria. Além de pre- Lopes, para enfatizar a reivindicação do Encontro parar os relatórios, o CNEC apresentou o caso de para que as barragens não fossem construídas. A Belo Monte a uma audiência pública em Altamira. série de represas afetaria um total calculado em A audiência foi realizada no pequeno cinema local, 37 etnias (Pontes Júnior & Beltrão, 2004). A pa- com um número significante dos assentos ocupados lavra “Xingu” leva uma carga emocional pesada no por autoridades locais e pelos seus convidados, com Brasil, sendo associada com povos indígenas, a sua o resultado que muitas das pessoas que questiona- proteção e as suas lutas. ram a barragem foram excluídas por falta de espaço. Como é frequente em tais audiências, a efetividade Duas das represas planejadas inundariam parte da participação da população local foi impedida por do Parque Indígena do Xingu (Figura 2). O Parque falta de informação sobre os planos para o projeto foi criado pelos irmãos Villas Bôas para acolher e por falta de pessoas com os conhecimentos técni- várias tribos cujas populações sobreviventes foram cos apropriados (veja Eve et al., 2000; Fearnside & transportadas para lá no final da década de 1950 e Barbosa, 1996a,b). no início da década de 1960, para os salvar de um fim violento, já que as suas terras foram tomadas Enquanto os estudos ambientais estavam em por uma variedade de pretendentes cruéis (Davis, andamento, o CNEC foi comprado pela Camargo 1977, p. 54-61). Corrêa S.A., que é a empresa de construção espe- rada para ganhar subseqüentemente os contratos O Encontro de Altamira foi um ponto decisivo para construir as barragens. Na prática, os dife- na evolução dos planos para as barragens do Xingu. rentes afluentes do rio Amazonas são divididos por Como forma de concessão aos povos indígenas, a esferas de influência entre as empresas de constru- ELETRONORTE mudou o nome da primeira ção específicas (veja Fearnside, 1999; Pinto, 1991). barragem de Kararaô para Belo Monte (“kararaô” Além disso, o grupo Camargo Corrêa possuiu uma é uma palavra Kaiapó com significação religio- usina de sílica metalúrgica em Breu Branco, Pará, sa que a tribo não quis que fosse aproveitada pela que se beneficia de preços subsidiados da energia de ELETRONORTE para promover uma represa que Tucuruí (Corrente Contínua, 1989, pág. 11) (também estimularia a construção de uma série de reservató- construída por Camargo Corrêa S.A.) e a rede que rios rio acima no território tribal). seria alimentada por energia das barragens do rio À mesma altura, a ELETRONORTE anunciou Xingu. As várias formas de conflito de interesse não que removeria as represas a montante de Belo Monte levaram a ELETRONORTE a mudar a empresa do Plano 2010 e empreenderia um “relevantamen- de consultoria para os estudos do Xingu (embora a to da queda” no rio Xingu. Isto frequentemente tem Barragens na Amazônia: 235 Belo Monte e o Desenvolvimento Hidrelétrico da Bacia do Rio Xingu Figura 2. Áreas indígenas afetadas pelas barragens na bacia do rio Xingu. sido apresentado, insinuando que as represas rio aci- Seguindo o Encontro de Altamira, de 1989, a ma, especialmente a maior (Babaquara), não seriam menção das cinco barragens planejadas rio acima de construídas. Até 1995, vários líderes indígenas ainda Belo Monte desapareceu abruptamente do discurso tiveram esta interpretação errônea das intenções da público da ELETRONORTE. Em 1998, Babaquara ELETRONORTE (observação pessoal). No entan- reapareceria de repente, com um nome novo (a hi- to, a ELETRONORTE nunca prometeu deixar de drelétrica de Altamira), quando foi listado no plano construir estas represas ou represas semelhantes, tal- decenal da ELETROBRÁS para 1999-2008 em vez em locais ligeiramente diferentes e com nomes uma tabela de barragens importantes para futura construção, indicando que esta obra seria comple- diferentes. Um “relevantamento da queda” recorre a tada em 2013 (Brasil, ELETRONORTE, 1998, re-medir a topografia ao longo do rio, possivelmente pág. 145). Desde então, a hidrelétrica de Altamira, alterando a localização, altura, e outras característi- de 6.588 MW, entrou sem alarde nas apresentações cas de engenharia de cada barragem, mas de nenhu- oficiais dos planos (por exemplo, Brasil, MME- ma maneira implica que não seriam inundadas as CCPESE, 2002; Santos, 2004). Estão ausentes de mesmas áreas de floresta e de terra indígena. discussão pública as outras quatro barragens: Ipixuna 236 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras (1.900 MW), Kakraimoro (1.490 MW), Iriri (770 FADESP também tinha produzido um EIA/RIMA MW) e Jarina (620 MW). No entanto, a atividade para a hidrovia Tapajós-Teles, onde a passagem da continuada de engenheiros da ELETRONORTE obra por uma reserva indígena é uma das principais nos locais em questão é uma indicação de que esta preocupações, mas o relatório foi rejeitado por “com- falta de visibilidade não significa que os planos foram pleta inconsistência” (Pinto, 2001). Nada disto pres- abandonados. Ao contrário, indica a sofisticação cres- sagia bem os estudos ambientais da FADESP para cente do setor elétrico em guiar a discussão pública Belo Monte, onde assuntos indígenas é uma parte para minimizar o questionamento dos planos. [A alta fundamental das controvérsias que cercam a obra. probabilidade de construir uma ou mais barrragens a montante de Belo Monte em nada mudou com o O processo de EIA/RIMA para represas hidrelé- anúncio em 2008 de que teria apenas uma barragem tricas sofreu um retrocesso em 2001, quando as regiões (Belo Monte) no rio Xingu. Veja Capítulo 13.] não-amazônicas do País foram sujeitas a racionamen-to de eletricidade e a blecautes repetidos (o “Apagão”) Um segundo estudo para Belo Monte foi com- devido à falta de água nos reservatórios na região pletado em 2002 numa “versão preliminar” pela Central-Sul (Fearnside, 2004). O “Apagão” também Universidade Federal do Pará (UFPa) (Brasil, ocorreu devido a uma série de decisões erradas no ELETRONORTE, s/d [2002]). A escolha da planejamento e administração de eletricidade (Rosa, UFPa também era altamente controversa, e a seleção 2003). O Brasil tem um uso altamente ineficiente de foi feita em setembro de 2000 sem licitação. A expli- energia (veja por exemplo, Goldemberg et al., 1985) e cação dada era que a UFPa era extensamente conhe- há muitas oportunidades ainda não aproveitadas para cida pela sua excelência técnica. Infelizmente, ape- provisão de energia de baixo impacto (Bermann, 2002; sar da reputação acadêmica forte da Universidade Ortiz, 2002). Em 18 de maio de 2001 o presidente como um todo, a organização civil de interesse pú- Fernando Henrique Cardoso emitiu uma medida pro- blico (OCIP) associada à Universidade (FADESP: visória que estabeleceu um tempo máximo de seis me- Fundação de Amparo e Desenvolvimento de ses para conceder aprovação ambiental para projetos Pesquisa), criada para obter contratos de consultoria de energia (Gazeta Mercantil, 2001). Belo Monte era o como esse, não desfrute a mesma reputação (Pinto, objetivo mais proeminente desta medida, que fez uso 2002a,b). O EIA para Belo Monte, que custou máximo da reação pública ao racionamento nos prin- R$3,8 milhões (aproximadamente US$2 milhões cipais centros populacionais, tais como São Paulo e Rio na época), foi rejeitado pela justiça federal em maio de Janeiro. Porém, os estudos ambientais não puderam de 2001. Uma limiar de outro tribunal permitiu o ser completados no prazo impossível de seis meses, e estudo continuar, assim completando versões preli- até lá a crise tinha sido aliviada com a chegada da esta- minares dos relatórios (Brasil, ELETRONORTE, ção chuvosa para reencher os reservatórios hidrelétri- s/d[2002]), antes da liminar ser derrubada em 2002. cos na região Centro-Sul. A medida provisória expirou Quando a FADESP foi escolhida para fazer os desde então sem ter sucesso em forçar uma aprovação estudos ambientais, este grupo tinha produzido um abreviada de Belo Monte. Pressões para uma aprova- EIA/RIMA para a hidrovia Tocantins/Araguaia ção veloz continuaram desde 2003 sob a administração que havia sido rejeitado pelo Instituto Brasileiro do presidencial de Luis Inácio Lula da Silva: em março de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis 2004 o Presidente Lula chamou os seus ministros para (IBAMA) como deficiente (Carvalho, 1999), e a exigir que eles achassem modos para contornar impe- construção da hidrovia estava sob embargo judicial dimentos ambientais e outros para concluir projetos de por causa de “fraude” no estudo (Switkes, 2002). A infraestrutura protelados ao longo do País, incluindo “fraude” se refere à seção do relatório sobre os im- 18 barragens hidrelétricas (Amazonas em Tempo, 2004). pactos prováveis da hidrovia nos povos indígenas que Em 13 de julho de 2005 o Congresso Nacional habitam a ilha do Bananal: a conclusão de que os im- aprovou em tempo recorde a construção de Belo pactos seriam severos tinha sido retirada do relatório Monte mesmo sem um EIA/RIMA aprovado, e logo a pedido dos proponentes do projeto, o que levou os em seguida várias ONGs entraram com uma represen- antropólogos que tinham redigido a seção iniciar uma tação na Procuradoria Geral da República contestando ação para ter o texto restabelecido. Falhas múltiplas a decisão, e a Procuradaria da República no Estado do no estudo de impacto ambiental (FADESP, 1996) Pará pediu uma Ação Direta de Inconstitucionalidade levaram a uma ordem judicial em junho de 1997 sus- contra o Decreto Legislativo (no. 788), feito sem con- pendendo as obras nessa hidrovia (Switkes, 1999). sulta às populações afetadas, entre outras falhas. Barragens na Amazônia: 237 Belo Monte e o Desenvolvimento Hidrelétrico da Bacia do Rio Xingu O estado do EIA/RIMA para Belo Monte se (o “Reservatório da Calha”) a montante da conflu- tornou altamente ambíguo. Em outubro de 2003, ência do rio Bacajá. A consequência principal disto a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afir- era evitar a inundação de parte da Área Indígena mou que a Ministra de Energia (Dilma Rousseff ) Bacajá, que, de acordo com o Artigo 231, Parágrafo tinha concordado que o estudo inteiro seria refei- 3 da constituição brasileira de 1988, significaria que to “a partir do zero” (O Globo, 2003). Porém, em o projeto requereria uma votação no Congresso setembro de 2004, Walter Fernandes Santos, da Nacional. Uma votação no Congresso implicaria ELETRONORTE, declarou que apenas detalhes em uma demora significante e, provávelmente que a burocráticos secundários estavam faltando resolu- discussão pública dos impactos da Represa e as suas ção, sendo uma questão de “encaminhamento” do implicações necessariamente se tornaria muito mais processo pelo procedimento de licenciamento, e que ampla, não necessariamente com um resultado favo- a aprovação final era iminente (Santos, 2004). rável para o desenvolvimento hidrelétrico do Xingu. O contexto social da terra que seria inundada A demora na construção de Belo Monte e a revi- pelas represas do rio Xingu está mudando rapida- são dos planos tinham o efeito benéfico de melhorar mente. Além das áreas indígenas, a área hoje se tor- as vantagens técnicas da represa substancialmente. Em nou uma fronteira de “faroeste” que é notável pela lugar de uma configuração tradicional com a usina de sua falta de lei, mesmo nos padrões amazônicos. A força localizada ao pé da barragem, como no plano área hoje conhecida como a “Terra do Meio”, situa- de 1989 para Kararaô [Belo Monte], o plano de 2002 da entre os rios Xingu e Iriri, é cenário de grilagem para Belo Monte tiraria proveito do local, sem igual, (fraude de terra) e conflitos violentos sobre reivin- para desviar lateralmente a água por uma série de ca- dicações rivais (tais como o massacre de outubro de nais e leitos de igarapés inundados (o “Reservatório 2003, dentro (ou muito perto) da área que seria inun- dos Canais”) para a usina de força principal a uma dada pela represa de Ipixuna). A área é notória por elevação mais baixa, a jusante da grande volta do rio atividades ilegais como tráfico de drogas, lavagem de Xingu, beneficiando da queda em elevação à grande dinheiro e trabalho escravo (veja Greenpeace, 2003; volta, assim requerendo a construção de uma barra- Pontes Júnior et al., 2004). gem menor (o Sítio Pimentel). Além disso, a demora permitiu a descoberta de erros técnicos importantes na Um fato marcante foi o assassinato, em 25 de cartografia topográfica da área que aumentaram consi- agosto de 2001, de Ademir Alfeu Federicci, conhe- deravelmente as estimativas da quantidade (e custo) da cido como “Dema”, um líder de resistência contra escavação necessária para o canal de adução e para os os planos de construção das barragens. Dema en- vários canais de transposição dentro do Reservatório cabeçava o Movimento pelo Desenvolvimento dos Canais. As estimativas da quantidade de escava- da Transamazônica e do Xingu (MPDTX). Ele é ção que estaria em pedra sólida também aumentaram considerado na área como um mártir que foi morto (Brasil, ELETRONORTE, 2002, Tomo I, pág. 8-22). por causa das suas críticas francas às represas (ISA, 2001). No entanto, como é frequente em assassina- Uma revisão adicional se sucedeu visando prover tos levados a cabo por pistoleiros contratados, evi- justificativa para derrubar o embargo judicial que im- dências suficientes não podiam ser juntadas para pedia a ELETRONORTE de proceder com a barra-gem. O plano alternativo reduziria a capacidade ins- trazer o caso ao julgamento. talada, pelo menos em uma fase inicial. Configurações estão sendo consideradas com 5.500, 5.900 e 7.500 OS PLANOS EM EVOLUÇÃO PARA BELO MW (Pinto, 2003). Deveria se lembrar que uma MONTE evolução contínua dos planos representa uma tática comum em projetos de desenvolvimento amazônico, Foram feitas mudanças importantes na configu- assim permitindo que os proponentes possam res- ração da hidrelétrica de Belo Monte entre o primei- ponder a qualquer crítica que seja levantada, dizendo ro plano (1989) e o segundo (2002). O reservató- que os críticos estão desinformados sobre os planos rio foi reduzido de 1.225 para 440 km2 [Obs.: O atuais. No entanto, os projetos costumam avançar EIA de 2009 aumentou a área estimada para 516 para produzir essencialmente os mesmos impactos km2, com o reservatório no mesmo nível, o que in- como os que foram desde o princípio questionados. dica que a estimativa do EIA de 2002 estava errada. Quase nenhuma informação foi liberada sobre a “ter- Veja Capítulo 13.], colocou o reservatório principal ceira versão” de Belo Monte. [Obs.: O plano depois 238 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras voltou para ter a casa de força principal com 11.000 quantidades grandes de energia para um produto de MW, e a casa de força suplementar aumentou de 181 exportação (Bermann & Martins, 2000, pág. 90). para 233 MW, no EIA de 2009. Veja Capítulo 13.] A hidrelétrica de Belo Monte propriamente dita é apenas a “ponta do iceberg” do impacto do projeto. BELO MONTE E OS IMPACTOS DAS O impacto principal vem da cadeia de represas rio aci- REPRESAS RIO ACIMA ma, presumindo que o embalo político iniciado pela Belo Monte aniquilaria o sistema de licenciamento “Barrageiros”, ou construtores de barragens, repre- ambiental, ainda frágil, do Brasil. Este é o quadro sentam uma classe a parte na sociedade brasileira (veja provável da situação para a maioria dos observado- Fearnside, 1989, 1990). A barragem de Belo Monte res não ligados à indústria hidrelétrica. Das represas tem um lugar especial na cultura dos barrageiros. rio acima, o reservatório de Babaquara, com duas ve- Um dos engenheiros envolvidos no planejamento da zes a área inundada da barragem de Balbina, seria o barragem explicou a natureza especial da obra assim: primeiro a ser criado. Autoridades do setor elétrico “Deus só faz um lugar como Belo Monte de vez em se esforçam para separar o projeto Belo Monte pro- quando. Este lugar foi feito para uma barragem”. Com priamente dito do seu impacto principal, que é o de 87,5 m de queda e uma vazão média de 7.851 m3/se- incentivar as megabarragens planejadas a montante. gundo (média no período de 1931 a 2000), outro local como Belo Monte é difícil de se encontrar. Apesar da Embora estudos iniciais, completados em 1989, variação sazonal alta no fluxo d’água, que diminui o tenham analisado o projeto para Belo Monte com in- potencial de energia que o local (por si só) pode ofe- clusão dos benefícios da regularização da vazão por re- recer, a questão principal levantada pela hidrelétrica de presas rio acima, a dificuldade em obter uma aprovação Belo Monte é mais profunda que os impactos diretos rápida logo ficou patente às autoridades do setor elé- no local do reservatório: é o sistema pelo qual as deci- trico. Um estudo novo foi elaborado, então, para Belo Monte sem a presunção da regularização da vazão por sões sobre construção de barragens acontecem. Em um represas a montante. O estudo revisado afirmou: Brasil ideal, Belo Monte poderia produzir, pelo menos em grande parte, os benefícios que seus promotores re- O estudo energético em questão considera apenas a tratam. Mas no Brasil real de hoje, em lugar disso, a existência do Complexo Hidrelétrico Belo Monte no obra levaria a impactos sociais e ambientais desastrosos rio Xingu, o que acarreta que o mesmo não aufira em troca do pouco benefício para a população brasilei- qualquer benefício de regularização a montante. ra. A existência de Belo Monte forneceria a justificati- va técnica para a construção de represas rio acima que Embora os estudos de inventário hidrelétrico do rio inundariam vastas áreas de terra indígena, praticamen- Xingu realizados no final da década de 70 tivessem te todas sob floresta tropical. Inundação anual de uma identif icado 5 aproveitamentos hidrelétricos a área de deplecionamento de 3.580 km2 a Babaquara montante de Belo Monte, optou-se por não considerá- proveria uma fonte de carbono permanente para uma los nas avaliações aqui desenvolvidas, em virtude emissão significativa de metano, um gás poderoso de da necessidade de reavaliação deste inventário efeito estufa (Fearnside, 2009; veja Fearnside, 2002). sob uma nova ótica econômica e sócio-ambiental. Os benefícios sociais obtidos em troca destes impactos Frisa-se, porém, que a implantação de qualquer são muito menos que as declarações oficiais insinuam empreendimento hidrelétrico com reservatório de porque muito da energia seria usada para subsidiar os regularização a montante de Belo Monte aumentará lucros de companhias multinacionais de alumínio que o conteúdo energético dessa usina. empregam uma mão-de-obra minúscula no Brasil. Por exemplo, a usina de Albrás, em Barcarena, Pará empre- (Brasil, ELETRONORTE. s/d [C. 2002]a, p. gava em 1989 apenas 1.200 pessoas, mas usava mais 6-82). eletricidade do que a cidade de Belém com uma po- Em outras palavras, embora uma decisão polí- pulação de 1,2 milhões (Fearnside, 1999; também veja: tica tenha sido tomada para restringir a análise ofi- Brasil, ELETRONORTE, 1987a, pág. Amazonas-32 cial somente à Belo Monte como uma conveniên- & Pará-12). O setor de alumínio no Brasil emprega cia necessária para obter a aprovação do projeto, as apenas 2,7 pessoas por GWh de eletricidade consumi- vantagens técnicas de construir também as represas da, triste recorde apenas superado pelas usinas de fer- rio acima (especialmente Babaquara) permanecem ro-liga (1,1 empregos/GWh), que também consomem as mesmas. Na realidade, nem a ELETRONORTE Barragens na Amazônia: 239 Belo Monte e o Desenvolvimento Hidrelétrico da Bacia do Rio Xingu nem qualquer outra autoridade governamental pro- ambiental em 1998 (veja Fearnside, 2001). O racio- meteram deixar de construir essas barragens, mas cínio era que a obra não teria nenhum impacto am- apenas adiar uma decisão sobre elas. Este é o ponto biental porque o nível máximo operacional normal crucial do problema. da água no reservatório permaneceria inalterado em Todo mundo já ouviu o provérbio do “came- 72 m sobre o nível médio do mar (Indriunas, 1998). lo-na-barraca”: um beduíno acampado no deserto No entanto, enquanto a construção estava em an- pode ser tentado a deixar o seu camelo pôr a cabeça damento, a decisão foi mudada discretamente para dentro da barraca, à noite, para se proteger de uma elevar o nível d’água até 74 m, como era o plano tempestade de areia. Mas ao acordar na manhã se- original. A represa está sendo operada neste nível guinte, com certeza o homem encontrará o camelo desde 2002, também sem justificativa. de corpo inteiro dentro da barraca. Esta é exatamen- Essa estratégia também é visível no próprio caso te a situação com Belo Monte: uma vez que a Belo de Belo Monte. O estudo de viabilidade admite que Monte comece, nós, provavelmente, vamos acordar e encontrar Babaquara já instalada. “...os serviços de infra-estrutura (acessos, cantei-ros, sistema de transmissão, vila residencial, alojamen- O cenário do “camelo-na-barraca” já aconteceu tos) terão início tão logo a sua licença de instalação com projetos da ELETRONORTE em pelo menos seja aprovada, o que deve ocorrer separadamente da duas ocasiões paralelas. A primeira ocorreu durante o aprovação da licença para as obras civis principais, no enchimento do reservatório de Balbina. Em setem- decorrer do denominado ano ‘zero’ de obra.” (Brasil, bro de 1987, menos de um mês antes do começo do ELETRONORTE, 2002, Tomo II, p. 8-155). enchimento do reservatório, a ELETRONORTE emitiu um “esclarecimento público” declarando que Isto significa que o estudo ambiental e o proces- o reservatório seria enchido somente até a cota de 46 so de licenciamento para a barragem de Belo Monte m sobre o nível médio do mar (abaixo do nível origi- eram vistos como uma mera formalidade burocrá- nalmente planejado de 50 m). Uma série de estudos tica para legalizar uma decisão que já foi tomada. ambientais seria realizada durante vários anos para Se o licenciamento ambiental fosse visto como uma monitorar a qualidade da água antes de tomar uma contribuição essencial à própria decisão sobre se o decisão separada sobre o enchimento do reservató- projeto deveria ou não ir adiante, então não have- rio até a cota de 50 m (Brasil, ELETRONORTE, ria razão para começar o trabalho de infra-estrutura 1987b). Porém, quando o nível d’água alcançou a complementar enquanto o projeto principal (a bar- cota de 46 m, o processo de enchimento não parou ragem) continua sob consideração. durante um único segundo para os estudos ambien- Estes exemplos são indicações pouco favoráveis tais planejados, e o enchimento continuou sem in- para o futuro do Xingu. Eles sugerem que, embora terrupção até a cota de 50 m e até mesmo além deste as autoridades possam dizer agora o que bem quise- nível (veja Fearnside, 1989, 1990). Na realidade, o rem sobre planos para Belo Monte operar com uma plano em vigor durante todo o processo de encher única barragem, quando, no decorrer do tempo, che- a represa indicava enchimento direto até o nível de gar a hora para começar o trabalho na segunda barra- 50 m (Brasil, ELETRONORTE, 1987c). Hoje a gem (Babaquara), é provável que a obra vá adiante de represa é operada, sem nenhuma justificativa, com qualquer maneira. Isto significa que os impactos de um nível máximo operacional de 51 m. represas a montante devem ser considerados, e, se estes O segundo exemplo é a expansão em 4.000 MW impactos forem julgados inaceitáveis, então qualquer da capacidade instalada em Tucuruí (i.e., Tucuruí-II). decisão para construir Belo Monte deveria ter sido Um estudo de impacto ambiental estava sendo ela- acompanhada de um mecanismo confiável para garan- borado para o projeto de Tucuruí-II, já que a lei exi- tir que as barragens rio acima não serão construídas. gia um EIA para qualquer hidrelétrica com 10 MW Se a Belo Monte é realmente economica- ou mais de capacidade instalada [Obs. Mais tarde mente viável sem Babaquara, como afirma a este limite foi aumentado de 10 para 30 MW, per- ELETRONORTE, isto não diminuiria o perigo mitindo grande proliferação de Pequenas Centrais da história se desdobrar para produzir os desas- Hidrelétricas (PCHs) sem EIA-RIMA.]. Porém, tres ambientais e sociais implícitos no esquema o EIA foi truncado quando a ELETRONORTE de Babaquara. Isto porque, depois da conclusão começou a construir o projeto sem um estudo de Belo Monte, o processo de tomada de decisão 240 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras sobre a construção de Babaquara seria dominado gerado. No caso de grandes represas amazônicas, por argumentos de que a Babaquara seria altamen- não é necessariamente verdade que, ao deixar de te lucrativa como meio de aumentar o potencial construir uma barragem, uma quantidade equiva- elétrico de Belo Monte. lente de combustível fóssil seria queimada no seu Porém, a Belo Monte poderia conduzir a um re- lugar. Isto porque pouco da energia gerada é usada sultado diferente. Antes de se decidir sobre a cons- para propósitos essenciais que seriam de difícil redu- trução de Belo Monte, o sistema de tomada de de- ção, tais como no consumo residencial e indústrias cisão sobre barragens hidrelétricas deveria ter sido que atendem o mercado doméstico. Ao invés disso, mudado radicalmente. Devem ser enfrentadas as uma porcentagem significativa e crescente da ener- perguntas básicas sobre o que é feito com a energia, gia da rede nacional brasileira é destinada para in- assim como também a questão de quanta energia dústrias eletro-intensivas, tais como as que fabricam realmente é necessária. O governo brasileiro deveria o alumínio. O Brasil exporta grandes quantidades deixar de encorajar a expansão de indústrias inten- de alumínio barato, e altamente subsidiado (espe- sivas de energia. Além disso, estas indústrias, es- cialmente para o Japão). pecialmente a de alumínio, deveriam ser fortemente O alumínio que o Brasil exporta é beneficiado penalizadas, cobrando-as pelo dano ambiental que o usando eletricidade de hidrelétricas que são cons- uso intensivo de energia implica. Ademais, o gover- truídas com o dinheiro dos contribuintes e dos no brasileiro precisa desenvolver uma base institu- consumidores residenciais brasileiros. Se menos cional confiável, por meio da qual um compromisso hidrelétricas fossem construídas, o resultado pro- possa ser feito para não se construir nenhuma das vável seria diminuir o subsídio financeiro e am- barragens planejadas a montante de Belo Monte. biental dado ao Mundo como um todo, em lugar Devido à série de precedentes na história recente de de continuar suprindo energia a uma indústria de construção de barragens no Brasil, onde o resultado exportação de alumínio com base no aumento de oposto aconteceu, uma estrutura institucional reque- geração de energia a partir de combustíveis fósseis. reria alguns testes reais antes de ganhar credibilidade Companhias de alumínio que atendem o mercado adequada para controlar um caso como Belo Monte, internacional (distinto do consumo doméstico bra- onde as tentações para voltar atrás em qualquer pro- sileiro) teriam que se deslocar para outro país ou, no messa desse tipo são extraordinariamente poderosas. final das contas, teriam que produzir menos alumí- Esperar a evolução das instituições ambientais para nio e explorar outros materiais de menor impacto. O poder lidar com a Belo Monte não implicava a perda preço do alumínio subiria para refletir o verdadeiro do seu potencial futuro: se nenhuma barragem fos- custo ambiental desta indústria muito esbanjadora, se construída no local de Belo Monte nos próximas e o consumo global diminuiria a um nível mais bai- anos, a opção de se construir uma barragem lá ainda xo. Acrescentar mais uma usina hidrelétrica à rede permaneceria aberta. nacional apenas posterga ligeiramente o dia quan- do o Brasil e o Mundo enfrentarão esta transfor- Também são necessárias mudanças para conter mação fundamental. Um dia a contabilidade destes o papel das empresas de construção em influenciar custos ambientais será feita e considerada antes de as prioridades de desenvolvimento no favorecimen- tomar decisões, tais como transações para ampliar to de grandes obras de infraestrutura. A grande atra- as indústrias eletro-intensivas no Brasil. A onda em tividade que a Belo Monte tem para a comunidade transações industriais com a China, após uma visita de barrageiros, poderia servir, potencialmente, como presidencial àquele país em 2004, fornece um exem- um bom motivo para induzir todas estas reformu- plo altamente pertinente. Essas incluem a usina de lações. Porém, os perigos são múltiplos, e o risco de capital chinês e brasileiro para produzir alumina construir Babaquara paira como uma espada pendu- em Barcarena, Pará, a maior do mundo a partir da rada em cima de todas as discussões de Belo Monte. sua instalação em 2005 (Pinto, 2004). Quando são feitos acordos que demandam grandes quantidades POLÍTICA DE ENERGIA adicionais de eletricidade, então os estudos de im- pacto ambiental e o processo de licenciamento para O debate sobre fornecimento de energia e subs- as várias barragens planejadas tendem a se tornar tituição de combustível fóssil precisa ir além de cál- meros enfeites decorativos para uma série de obras culos simples de combustível consumido por kWh predeterminadas. Barragens na Amazônia: 241 Belo Monte e o Desenvolvimento Hidrelétrico da Bacia do Rio Xingu CONCLUSÕES LITERATURA CITADA Os planos para construção de barragens na Amazonas em Tempo [Manaus]. (2004). Lula quer a retomada de Amazônia implica em impactos ambientais e so- obras paralisadas. 21 de março de 2004. p. A-7. ciais significativos, e coloca um desafio ao sistema Bermann, C., & Martins, O. S. (2000). Sustentabilidade energética de licenciamento ambiental do País. no Brasil: Limites e Possibilidades para uma Estratégia Energética Sustentável e Democrática. Rio de Janeiro, RJ: A proposta hidrelétrica de Belo Monte é par- Projeto Brasil Sustentável e Democrático, Federação dos ticularmente controversa porque cinco represas Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE), 151 planejadas teriam impactos especialmente sérios p. (Série Cadernos Temáticos No. 1). rio acima de Belo Monte, inclusive a barragem Bermann, C. (2002). O Brasil não precisa de Belo Monte. de Altamira/Babaquara, de 6.140 km2, cujos im- São Paulo, SP: Amigos da Terra-Amazônia Brasileira, 4 pactos incluem a inundação de terra indígena, p. (http://www.amazonia.org.br/opiniao/artigo_detail. destruição de floresta tropical e emissão de ga- cfm?id=14820). ses de efeito estufa. A existência de Belo Monte Brasil, ELETROBRÁS. (1987). Plano 2010: Relatório Geral, aumentaria grandemente a atratividade financeira Plano Nacional de Energia Elétrica 1987/2010 (Dezembro das represas a montante. de 1987). Rio de Janeiro, RJ: Centrais Elétricas Brasileiras Os casos de Belo Monte e das outras barragens (ELETROBRÁS), 269 p. do rio Xingu ilustram a necessidade absoluta de se Brasil, ELETROBRÁS. (1993). Plano Nacional de Energia considerar as interligações entre projetos diferen- Elétrica 1993-2015: Plano 2015. Rio de Janeiro, RJ: tes de infraestrutura e incluir estas considerações Centrais Elétricas Brasileiras (ELETROBRÁS). (http://www.eletrobras.gov.br/mostra_arquivo.asp?id=http://www. como uma condição prévia para construir ou au- eletrobras.gov.br/downloads/EM_Biblioteca/volume1. torizar quaisquer dos projetos. Adiar a análise dos pdf&tipo=biblioteca_publicacoes) projetos mais controversos não é uma solução. Brasil, ELETROBRÁS. (1998). Plano Decenal 1999-2008. Rio de Uma estrutura institucional precisa ser criada Janeiro, RJ: Centrais Elétricas Brasileiras (ELETROBRÁS). por meio do qual podem ser feitos compromissos Brasi l , ELETRONORTE. (1987a). Contribuição da para não construir projetos de infraestrutura es- ELETRONORTE para Atendimento das Necessidades Futuras de pecíficos que são identificados como danosos, um Energia Elétrica da Amazônia. Brasília, DF: Centrais Elétricas critério que provavelmente incluiria a hidrelétrica do Norte do Brasil (ELETRONORTE). Paginação irregular. de Altamira/Babaquara e as outras represas pla- Brasil, ELETRONORTE. (1987b). Esclarecimento Público: nejadas a montante de Belo Monte na bacia do Usina Hidrelétrica Balbina. Modulo 1, Setembro 1987. rio Xingu. Brasília, DF: Centrais Elétricas do Norte do Brasil (ELETRONORTE), 4 p. O alto custo ambiental e social de barragens hidrelétricas indica a necessidade do País reava- Brasil, ELETRONORTE. (1987c). 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Brasília, DF, Brazil: Ministério das Barbosa, Paulo Maurício L.A. Graça, Glenn Minas e Energia, Comité Coordinador do Planejamento da Switkes e ao seu sogro pelos comentários. Este Expansão dos Sistemas Elétricas (MME-CCPESE), 75 p. trabalho é traduzido de Fearnside (2006); a maior Carvalho, R. (1999). A Amazônia rumo ao “ciclo da soja.” Amazônia parte faz parte de uma discussão mais ampla sobre Papers No. 2, São Paulo, SP: Programa Amazônia, Amigos da as barragens no rio Xingu (Fearnside, 2005). Terra, 8 p. (disponível de: http://www.amazonia.org.br). 242 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Chernela, J. M. (1988). Potential impacts of the proposed (Kararaô) e Altamira (Babaquara).pp. 204-241 In: Sevá Altamira-Xingu Hydroelectric Complex in Brazil. Latin Filho, A.O. (ed.) 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GWF Discussion Paper 1210, Global Water Forum, Canberra, Australia. 6 pp. http://www.globalwaterforum. org/wp-content/uploads/2012/04/Belo-Monte-Dam-A-spearhead-for-Brazils-dam-building-attack-on- Amazonia_-GWF-1210.pdf 246 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras A hidrelétrica de Belo Monte atualmente está têm sido realizados de forma a evitar qualquer con- em construção no rio Xingu, apesar de suas mui- sideração destes impactos. O plano original para o tas controvérsias. O governo brasileiro lançou uma rio Xingu previa cinco represas adicionais a mon- campanha sem precedentes para represar afluen- tante de Belo Monte (Santos & Andrade, 1990; tes do rio Amazonas, e Belo Monte é a ponta de Sevá Filho, 2005; Fearnside, 2006). Essas barragens, lança para os seus esforços. O plano de expansão especialmente a hidrelétrica de Babaquara (agora energética 2011-2020 prevê a construção de 48 rebatizada como a hidrelétrica de “Altamira”), de grandes barragens adicionais no País, das quais 30 6,140 km2, seria para armazenar água que poderia estariam na Amazônia Legal (Brasil, MME, 2011). ser liberada durante o período de baixa vazão do rio Construir 30 represas em 10 anos significa uma taxa Xingu para manter em funcionamento as turbinas média de uma barragem a cada quatro meses na em Belo Monte. Amazônia brasileira até 2020. É claro, o relógio não para em 2020, e o número total de barragens plane- O Xingu tem uma grande oscilação anual no jadas na Amazônia brasileira ultrapassa 70 (Brasil, fluxo de água, com até 60 vezes mais água na época ELETROBRÁS, 1987; Fearnside, 1995) de alto fluxo, em comparação com o período de bai-. xo fluxo. Durante o período de baixo fluxo a vazão A hidrelétrica de Belo Monte em si tem impac- não regulada do rio não é suficiente para abastecer tos substanciais. O projeto é incomum em não ter uma única turbina na casa de força principal de a sua principal usina localizada no pé da barragem, 11.000 MW de Belo Monte (Molina Carpio, 2009). onde permitiria que a água que emergisse das turbi- Uma vez que a barragem de Belo Monte em si será nas continuasse fluindo no rio abaixo da barragem. essencialmente “a fio d’agua”, sem armazenar água Em vez disso, a maior parte do fluxo do rio será des- em seu reservatório relativamente pequeno, a análise viada do principal reservatório através de uma série econômica sugere que a hidrelétrica por si só não de canais interligando cinco afluentes represados, será economicamente viável (Sousa Júnior & Reid, deixando a “Volta Grande” do rio Xingu, abaixo da 2010; Sousa Júnior et al., 2006). barragem, com apenas uma pequena fração de seu fluxo anual normal. O cenário oficial para o rio Xingu mudou em julho de 2008, quando o Conselho Nacional de O que é conhecido como o “trecho seco” de 100 Política Energética (CNPE) declarou que Belo km entre a barragem e a casa de força principal in- Monte seria a única barragem nesse rio. No entanto, clui duas reservas indígenas, além de uma população o CNPE tem a liberdade para reverter essa decisão de ribeirinhos amazônicos tradicionais. Uma vez a qualquer momento. Altos funcionários elétricos que não é o normal o impacto sobre essas pessoas considerou a decisão do CNPE uma manobra po- pela inundação de um reservatório, elas não foram lítica que é tecnicamente irracional (OESP, 2008). classificadas como “diretamente impactadas” no A atual presidente do Brasil bloqueou a criação de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e não tiveram uma reserva extrativista a montante de Belo Monte, as consultas e as compensações que as pessoas di- alegando que isso prejudicaria a construção de “bar- retamente impactadas teriam direito. A Comissão ragens, em adição a Belo Monte” (Angelo, 2010). O de Direitos Humanos da Organização dos Estados fato de que o governo brasileiro e várias empresas Americanos (OEA) considerou a falta de consulta estão dispostas a investir grandes somas em Belo aos povos indígenas uma violação dos acordos in- Monte pode ser uma indicação de que eles não espe- ternacionais dos quais o Brasil é signatário, e, por ram que a história seguirá o cenário oficial de apenas sua vez, o Brasil retaliou cortando seus pagamen- uma barragem (Fearnside, 2011a). tos dívidas junto à OEA. A barragem também terá impactos mais conhecidos através da inundação de Além de seus impactos sobre as florestas tropicais aproximadamente um quarto da cidade de Altamira, e os povos indígenas, essas barragens fariam o Xingu bem como as áreas rurais povoadas que serão inun- uma fonte de emissões de gases de efeito estufa, es- dadas pelo reservatório. pecialmente de metano (CH4), que se forma quando plantas mortas decompõem no fundo de um reserva- O que é mais extraordinário é o impacto em po- tório, onde a água não contém oxigênio (Fearnside, tencial do projeto em vastas áreas de terras indígenas 2002, 2004). A variação vertical de 23 m no nível da e da floresta tropical a montante do reservatório, mas água da barragem de Babaquara, expondo e inundan- os estudos de impacto ambiental e o licenciamento do anualmente a zona de deplecionamento de 3.580 Belo Monte: 247 A ponta de lança da construção de barragens na Amazônia? km2, faria o complexo uma “fábrica de metano”. A pela substituição do funcionário chave também abre inundação pelo reservatório da vegetação macia que um precedente que permite os projetos avançarem, cresce na zona de deplecionamento converte o carbo- sem considerar a magnitude dos seus impactos. no do CO2 retirado da atmosfera pela fotossíntese em Recomenda-se ver o novo chefe da agência na sua CH4, com um impacto muito maior sobre o aqueci- entrevista muito reveladora à televisão australiana mento global (Fearnside, 2008, 2009, 2011b). (Campanhaxinguvivo, 2011). É o papel de Belo Monte no processo de tomada Na época em que a licença de instalação de Belo de decisão e licenciamento que tem as consequências Monte foi aprovada, 12 processos judiciais sobre de maior alcance para a Amazônia. A Constituição irregularidades no processo de licenciamento esta- Brasileira de 1988, que foi promulgada quando os vam pendentes (atualmente são 20 processos)(ver: planos para Belo Monte e as outras barragens do Movimento Xingu Vivo para Sempre, 2010). Xingu estavam em pleno andamento, aumentou a proteção para os povos indígenas, exigindo apro- O que de dinheiro vai acontecer se algum desses vação pelo Congresso Nacional para barragens que casos foi decidido contra Belo Monte após o gasto afetam terras indígenas. Isso levou ao redesenho de de vastas somas na construção da barragem? Será Belo Monte em si, para evitar inundações direta- que o governo simplesmente desistirá e irá embora? mente em terra indígena, e a uma política de facto de O palco parece montado para quebrar o sistema simplesmente não mencionar as barragens a mon- de licenciamento ambiental no Brasil ainda mais, tante. Depois, em 2005, Belo Monte foi subitamen- abrindo o caminho para as muitas outras barragens te aprovada pelo Senado em 48 horas sob o regime controversas planejadas na Amazônia. ‘urgente-urgentíssimo’ sem debate e sem as consul- tas constitucionalmente exigidas com as tribos. Isso abriu o caminho para a consideração de várias bar- REFERÊNCIAS ragens que afetam os povos indígenas, incluindo as Angelo, C. 2010. “PT tenta apagar fama ‘antiverde’ de Dilma.” barragens a montante no rio Xingu. Folha de São Paulo, 10 de outubro de 2010, p. A-15. Em fevereiro de 2010, foi concedida a Belo Brasil, ELETROBRÁS. 1987. Plano 2010: Relatório Geral. Plano Monte uma licença “parcial” para permitir a insta- Nacional de Energia Elétrica 1987/2010 (Dezembro de 1987). lação do canteiro de obras, sem completar a aprova- Centrais Elétricas do Brasil (ELETROBRÁS), Brasília, DF, Brasil. 269 p. ção ambiental do projeto como um todo. Licenças parciais não existem na legislação do Brasil, e este Brasil, MME (Ministério de Minas e Energia). 2011. Plano dispositivo representa um passo para permitir que Decenal de Expansão de Energia 2020. MME, Empresa de projetos de barragens tornem-se fatos consumados Pesquisa Energética (EPE). Brasília, DF, Brasil. 2 vols. http://www.epe.gov.br/PDEE/20111229_1.pdf independentemente dos seus impactos. A licença prévia foi concedida em janeiro de 2011 com 40 Campanhaxinguvivo. 2011. Belo monte de asneiras, por Curt “condicionantes” que teriam de ser cumpridas antes Trennepohl. http://www.youtube.com/watch?v=EUp- de uma licença de instalação ser concedida para a Mn4UkmQ&noredirect=1 construção da barragem. Fearnside, P.M. 1995. Hydroelectric dams in the Brazilian Amazon as sources of ‘greenhouse’ gases. Environmental Muito pouco foi feito nos meses seguintes para Conservation 22(1): 7-19. doi: 10.1017/S0376892900034020 atender aos requisitos, e apenas cinco dos 40 ha- viam sido cumpridos, em junho de 2011, quando, Fearnside, P.M. 2002. Greenhouse gas emissions from a hydroelectric reservoir (Brazil’s Tucuruí Dam) and the energy de repente, a licença de instalação foi concedida. A policy implications. Water, Air and Soil Pollution 133(1-4): aprovação veio depois que o chefe do órgão ambien- 69-96. doi: 10.1023/A:1012971715668 tal ter sido forçado a demitir-se: ele havia apoiado Fearnside, P.M. 2004. Greenhouse gas emissions from a sua equipe técnica, que se opunha à aprovação da hydroelectric dams: controversies provide a springboard for licença sem cumprir os requisitos. Um novo chefe rethinking a supposedly “clean” energy source. Climatic Change da agência foi indicado, que aprovou a licença sem 66(2-1): 1-8. doi: 10.1023/B:CLIM.0000043174.02841.23 o cumprimento das condicionantes, abrindo o ca- Fearnside, P.M. 2006. Dams in the Amazon: Belo Monte and minho para a aprovação de projetos de barragens, Brazil’s hydroelectric development of the Xingu River Basin. estradas e outras infraestruturas que aguardam cum- Environmental Management 38(1): 16-27. doi: 10.1007/ primento de requisitos semelhantes. A aprovação s00267-005-00113-6 248 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Fearnside, P.M. 2008. Hidrelétricas como “fábricas de metano”: Movimento Xingu Vivo para Sempre. 2010. Questões jurídicas. O papel dos reservatórios em áreas de floresta tropical na http://www.xinguvivo.org.br/2010/10/14/questoes-juridicas/ emissão de gases de efeito estufa. Oecologia Brasiliensis 12(1): OESP. 2008. 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O Calcular as emissões de gases de efeito estufa de impacto sobre o aquecimento global de represas é barragens hidrelétricas é importante no processo de uma indicação da necessidade de o País reavaliar as tomada de decisão em investimentos públicos nas suas políticas atuais, que alocam grandes quantias de várias opções para geração e conservação de energia energia da rede nacional para uma indústria subsi- elétrica. A proposta da hidrelétrica de Belo Monte diada de exportação de alumínio. (antigamente Kararaô) e sua contrapartida rio aci- ma, a hidrelétrica de Altamira (mais conhecida por Palavras-Chave: Aquecimento global, Barragens, Efeito seu nome anterior: Babaquara) está no centro das estufa, Hidrelétricas, Metano, Represas, Reservatórios controvérsias sobre como deveriam ser calculadas as emissões de gases de efeito estufa de represas. A INTRODUÇÃO hidrelétrica de Belo Monte por si só teria uma área de reservatório pequena (440 km2) e capacidade ins- A proposta da hidrelétrica de Belo Monte, no rio talada grande (11.181,3 MW) [Obs.: alterado para Xingu (um afluente do rio Amazonas no Estado de 11.233 MW e 516 km2 no EIA de 2009], mas a re- Pará), é o foco de intensa controvérsia devido à mag- presa de Babaquara que regularizaria a vazão do rio nitude e à natureza dos seus impactos. A hidrelétrica Xingu (aumentando assim a geração de energia de de Belo Monte ficou conhecida pela ameaça que re- Belo Monte) inundaria uma vasta área (6.140 km2). presenta aos povos indígenas por facilitar uma série Está previsto que, em cada ano, o nível d’água em de represas planejadas rio acima em áreas indígenas. Babaquara vai variar em 23 m, expondo assim repe- O impacto de Belo Monte sobre o efeito estufa pro- tidamente uma área de 3.580 km2 (a zona de deple- vém das represas rio acima, projetadas para aumentar cionamento), onde cresceria rapidamente uma vege- substancialmente a produção elétrica de Belo Monte tação herbácea, de fácil decomposição. Belo Monte e para regularizar a vazão do rio Xingu, altamente sa- e Babaquara representam um desafio ao ainda prin- zonal. O reservatório de Belo Monte é pequeno re- cipiante sistema brasileiro de avaliação de impacto lativamente à capacidade de suas duas casas de força, ambiental e licenciamento de obras. O procedimen- mas os cinco reservatórios rio acima seriam grandes, to atual considera cada projeto de infra-estrutura até mesmo pelos padrões amazônicos. O maior desses isoladamente, em lugar de avaliar a gama completa reservatórios é a represa de Babaquara, recentemente de impactos que o conjunto como um todo provoca- renomeada de “Altamira”, num esforço aparentemen- ria. Neste caso, as características excepcionalmente te com o propósito de escapar do ônus da crítica que favoráveis (em certos aspectos) da primeira barra- os planos para Babaquara atraíram ao longo das últi- gem (Belo Monte) são altamente enganadoras como mas décadas (o inventário inicial para a obra começou indicações das consequências ambientais de uma em outubro de 1975). decisão para construir aquela obra. Os impactos A ELETRONORTE (Centrais Elétricas do principais serão provocados pelos reservatórios mui- Norte do Brasil) primeiro propôs a hidrelétrica de to maiores rio acima, começando pelo de Babaquara Kararaô (agora chamada de “Belo Monte”) com cál- e, possivelmente, outras quatro represas planejadas culos de geração de energia que presumiram a re- na bacia do Xingu, que inundariam grandes áreas gularização da vazão a montante por, pelo menos, de floresta tropical e terra indígena, além de emitir uma represa (Babaquara)(CNEC 1980). A série de gases de efeito estufa. A presente análise indica que represas no rio Xingu teria consequências sérias para o complexo Belo Monte/Babaquara não teria um os povos indígenas e para as grandes áreas de flores- saldo positivo, em termos de emissões de gases de ta tropical que os reservatórios inundariam (Santos efeito estufa, comparado ao gás natural, até 41 anos & de Andrade 1990, Sevá 2005). Dificuldades na após o enchimento da primeira represa. Isto, na for- obtenção de aprovação ambiental levaram à formu- ma de cálculo mais favorável para hidrelétricas, com lação de um segundo plano para Belo Monte, com zero de desconto para os impactos no aquecimento cálculos que não presumiram nenhuma regulariza- global, essencialmente como se o impacto pesado ção da vazão rio acima (Brasil, ELETRONORTE nos primeiros anos fosse um empréstimo sem juros. 2002). O estudo de viabilidade para o segundo pla- A aplicação de qualquer taxa de desconto acima de no deixou claro que a necessidade para uma análi- 1,5% ao ano resulta no complexo não ter um sal- se sob da suposição de vazão não regularizada ori- do positivo, comparado ao gás natural, até o final ginou “da necessidade de reavaliação deste inventário As Hidrelétricas de Belo Monte e 251 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa sob uma nova ótica econômica e sócio-ambiental” (i.e., os planos anteriores (Brasil, ELETRONORTE, s/d devido a considerações políticas), e que “a implan- [C. 1988]). Belo Monte não pode ser considerado so- tação de qualquer empreendimento hidrelétrico com re- zinho sem levar em conta os impactos das represas servatório de regularização a montante de Belo Monte a montante, especialmente a Babaquara (Altamira). aumentará o conteúdo energético dessa usina” (Brasil, Entre os muitos impactos das represas a montante ELETRONORTE 2002, pág. 6-82). que devem ser avaliados, um é o papel delas na emis- Mais tarde, dificuldades na obtenção de apro- são de gases de efeito estufa. Na presente análise, vação ambiental levaram a ELETRONORTE a serão apresentadas estimativas preliminares para as iniciar uma terceira análise com várias possíveis ca- emissões de Belo Monte e de Babaquara. Se as outras pacidades instaladas menores: 5500, 5900 e 7500 quatro barragens planejadas forem construídas, elas MW (Pinto, 2003). A potência menor seria mais teriam impactos adicionais a serem considerados. compatível com a hipótese de ter uma única barra- gem (Belo Monte) no rio Xingu, que tem um vazão HIDRELÉTRICAS E EMISSÕES DE GASES altamente sazonal que deixaria muitas das turbinas DE EFEITO ESTUFA ociosas durante a maior parte do ano no caso de ter mais de 11 mil MW instalados. No entanto, a A Belo Monte está no centro das controvérsias elaboração de planos mais modestos não implica- em curso sobre a magnitude do impacto no aque- vam de nenhuma maneira que uma decisão foi to- cimento global das represas hidrelétricas e sobre a mada para não construir a barragem de Babaquara maneira apropriada deste impacto ser quantifica- (Altamira) a montante de Belo Monte. Pelo con- do e considerado no processo de tomada de deci- trário, preparações para a construção de Babaquara são. Quando os primeiros cálculos de emissão de (Altamira) foram incluídas no Plano Decenal 2003- gases de efeito estufa das represas existentes na 2012 do setor elétrico (Brasil, MME-CCPESE, Amazônia brasileira indicaram impacto significa- 2002) e planos para a represa foram apresentados tivo (Fearnside, 1995a), esta conclusão foi atacada, por ELETRONORTE como progredindo normal- apresentando um caso hipotético que correspondeu mente rumo à construção (Santos, 2004). à Belo Monte, com uma densidade energética de mais de 10 Watts de capacidade instalada por m2 de Após a aprovação pelo Congresso Nacional da área de superfície de reservatório (Rosa et al., 1996). construção de Belo Monte, em 2005, os desenhos Além de a metodologia adotada provocar cálculos revisados com potências mais modestas para Belo hipotéticos que subestimem o impacto sobre emis- Monte foram abandonados, com o plano atual até são de gases de efeito estufa, o problema principal ultrapassando um pouco a potência prevista no é omitir as emissões da hidrelétrica de Babaquara, plano de 2002, ficando em 11.233,1 MW (Brasil, com 6.140 km2 rio acima de Belo Monte (Fearnside, ELETROBRÁS, 2009). A pequena diferença da 1996a). Este problema básico permanece hoje, mes- potência no plano de 2002 é devido ao aumento da mo depois de muitos avanços em estimativas de capacidade instalada da usina suplementar (que tur- emissões de gases de efeito estufa. bina água destinada para a vazão sanitário na Volta Grande do Rio Xingu) de 181,3 para 233,1 MW. A área relativamente pequena da hidrelétrica de Belo Monte, sozinha, indica que as emissões de O cenário de uma só barragem retratado no gases de efeito estufa da superfície do reservatório estudo de viabilidade de Belo Monte (Brasil, serão modestas, e quando estas emissões são divi- ELETRONORTE, 2002) e nos dois estudos de didas pelos 11,181 MW de capacidade instalada da impacto ambiental (Brasil, ELETRONORTE, s/d barragem, o impacto parece ser baixo em compara- [C. 2002]a, Brasil, ELETROBRÁS, 2009) parece ção aos benefícios. Esta é a razão de se usar a “densi- representar uma ficção burocrática que foi traçada dade energética” (Watts de capacidade instalada por com a finalidade de ganhar a aprovação ambiental metro quadrado de área d’água) como a medida do para Belo Monte (Fearnside, 2006). O cenário usado, impacto de uma represa sobre o aquecimento global. então, no atual trabalho se aparece bem mais provável Apresentando a Belo Monte como uma represa ide- como uma representação do impacto real do projeto, al sob uma perspectiva de aquecimento global, Luis com Belo Monte sendo construída de acordo com Pinguelli Rosa e colaboradores (1996) calcularam o estudo de viabilidade (Brasil, ELETRONORTE, esta relação como excedendo ligeiramente 10 W/ 2002), seguido por Babaquara (Altamira), conforme m2, baseado na área do reservatório originalmente 252 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras planejada de 1.225 km2 (o índice seria de 25 W/m2 possível nos seus níveis d’água. Afinal de contas, se sob as mesmas hipóteses, quando considerada a área estas barragens fossem usadas “a fio d’água” (i.e., sem atualmente planejada de 440 km2). oscilações do nível d’água no reservatório) o resul- Os regulamentos do Mecanismo de tado não seria nada melhor que o rio sem a vazão Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de regulada, do ponto de vista de aumentar a produ- Kyoto atualmente permitem crédito de carbono ção de Belo Monte. É esta flutuação no nível d’água para grandes represas sem restrições, más foi pro- que faz das represas rio acima fontes potencialmente posto pelo conselho executivo do MDL, reunindo grandes de gases de efeito estufa, especialmente a de em Buenos Aires em dezembro de 2004, que estes Babaquara. É esperada uma variação no nível d’água créditos sejam restritos a barragens com densida- do reservatório de Babaquara de 23 m ao longo do des energéticas de pelo menos 10 W/m2 de área de curso de cada ano (Brasil, ELETRONORTE, s/d reservatório (UNFCCC, 2004, p. 4), coincidente- [C. 1989]). Para fins de comparação, o nível d’água mente a marca alcançada para Belo Monte segun- no reservatório de Itaipu varia em apenas 30-40 cm. do o calculo de Rosa et al. (1996). A possibilidade Cada vez que o nível d’água em Babaquara atingisse de reivindicar crédito de carbono para Belo Monte seu nível mínimo operacional normal, seria exposto 2 foi levantada em várias ocasiões tanto por funcioná- um vasto lamaçal de 3.580 km (aproximadamen- rios do governo brasileiro como do Banco Mundial. te o tamanho do reservatório de Balbina inteiro!). Uma densidade energética tão alta quanto 10 W/m2 Vegetação herbácea, de fácil decomposição, cresceria para Belo Monte requer que esta barragem seja con- rapidamente nesta zona, conhecida como a zona de siderada independente da represa de Babaquara que “deplecionamento”, ou de “drawdown”. Quando o regularizaria a vazão em Belo Monte, armazenan- nível d’água subisse subseqüentemente, conseqüen- do água rio acima. A configuração de 2002 para as temente a biomassa se decomporia no fundo do re- duas barragens juntas, com 11.000 + 181,3 + 6.274 = servatório, produzindo metano. 17.455 MW de capacidade instalada, e 440 + 6.140 = 6.580 milhões de m2 de área de reservatório é de CARACTERÍSTICAS DAS BARRAGENS DE 2,65 W/m2 de reservatório. Isto não é muito melhor BELO MONTE E BABAQUARA que a densidade energética de Tucuruí-I (1,86 W/ m2), e muito inferior a 10 W/m2. Posteriormente, o Belo Monte limite para credito para hidrelétricas no Mecanismo A configuração do reservatório de Belo Monte é de Desenvolvimento Limpo foi fixado em 4 W/m2, altamente incomum, e os cálculos de gases de efeito também um valor bem acima da densidade energé- estufa deveriam ser desenvolvidos especificamente tica para as duas barragens juntas. para estas características. O reservatório é dividido No caso de Belo Monte, duas razões fazem com em duas partes independentes. O “Reservatório da que este índice seja altamente enganador como me- Calha do Rio Xingu” ocupa o curso do rio Xingu dida do impacto do projeto sobre o efeito estufa. acima da barragem principal, localizada em Sitio Primeiro, as emissões de superfície (que são propor- Pimentel (Figura 1). O vertedouro principal tira cionais à área do reservatório) representam apenas água deste reservatório, assim como uma pequena “casa de força complementar” (181,3 MW de capa- uma parte do impacto de aquecimento global de cidade instalada no plano de 2002, aumentado para projetos hidrelétricos: as quantidades de metano li- 233,1 MW no plano de 2009) que, em períodos de beradas pela passagem da água pelas turbinas (e ver- alta vazão, fará uso de parte da água que não pode tedouros) dependem muito dos volumes de água que ser usada pela casa de força principal. Quantidade atravessam estas estruturas. O volume deste fluxo maior da água será desviada a partir da lateral do pode ser grande, até mesmo quando a área do reser- Reservatório da Calha, por meio de canais de adu- vatório é pequena, como em Belo Monte. A segunda ção, até o Reservatório dos Canais, ao término do razão é que o maior impacto do projeto global é das qual se encontram as tomadas d’água para as tur- represas rio acima. Para cumprir o papel de arma- binas na casa de força principal (11.000 MW). O zenamento e liberação da água para abastecer Belo Reservatório dos Canais também dispõe de pequeno Monte durante a estação seca, as represas a mon- vertedouro para casos de emergência. São apresenta- tante devem ser manejadas com a maior oscilação das as características dos reservatórios na Tabela 1. As Hidrelétricas de Belo Monte e 253 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa Figura 1. A.) Babaquara (Altamira) Reservatório; B.) Reservatórios de Belo Monte da Calha e dos Canais. Fontes: Babaquara: Brasil, ELETRONORTE s/d[C. 1988]; Belo Monte: Brasil, ELETRONORTE s/d[C. 2002]a. 254 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Tabela 1. Características Técnicas das Represas de Belo Monte (Kararaô) e Babaquara (Altamira) Belo Monte (Kararaô) Total Babaquara Item Unidades Reservatório Reservatório Nota Belo Monte (Altamira) da Calha dos canais Área do reservatório no nível máximo operacional normal km2 333 107 440 6.140 Área do reservatório no nível mínimo operacional normal km2 333 102 438 2.560 Área de deplecionamento km2 0 5 5 3.580 Variação do nível d’água m 0 1 23 Volume no nível máximo operacional normal Bilhão de m3 2,07 1,89 3,96 143,5 Volume no nível mínimo operacional normal Bilhão de m3 2,07 1,79 3,86 47,16 Volume de armazenamento vivo Bilhão de m3 0 0,11 0,11 96,34 Profundidade média m 6,2 17,7 9,0 23,4 Tempo de residência média dias 3,1 2,8 5,8 211,6 (a) Comprimento do reservatório km 60 87 147 564 Comprimento do perímetro da margem km 361 268 629 2.413 (b) Número de turbinas Número 7 20 27 18 Produção de máximo por turbina MW 25,9 550 -- 348,6 Capacidade instalada MW 181,3 11.000 11.181,3 6.274 Consumo de água por turbina m3/s 253 695 -- 672 Consumo de água total m3/s 1.771 13.900 15.671 12.096 Vazão médio m3/s 7.851 7.851 (c) Elevações Nível máximo operacional normal m sobre o mar 97 97 -- 165 Nível mínimo operacional normal m sobre o mar 97 96 -- 142 (d) Nível do vertedouro m sobre o mar 76 79,52 -- 145 (e) Nível do canal de adução m sobre o mar -- 84 -- -- Eixo da entrada das turbinas m sobre o mar 80 65 -- 116,5 Outros parâmetros Área de drenagem km2 447.719 Evaporação anual mm 1.575 Precipitação anual mm 1.891 Latitude 03o 26 ‘ S 3o 7 ‘ 35 “ S 3o 18 ‘ 0 “ S Localização Longitude 51o 56 ‘ O 51o 46 ‘ 30 “ O 52o 12’30”O (a) Presume que toda a água é usada pela casa de força principal em Belo Monte. (b) Presume-se que Babaquara tem a mesma a relação entre o perímetro da margem e o comprimento que em Belo Monte. (c) Vazão é a média para 1931-2000 calculada no EIA para Belo Monte. Um vazão “sintético” mais alto “ de 8.041 m3/s foi calculado por Maceira & Damázio (s/d) para Babaquara. (d) O Reservatório dos Canais terá um manejo de água incomum, com o nível mantido em 96 m durante a estação de alto fluxo e 97 m durante a estação de baixo fluxo (Brasil, ELETRONORTE 2002). (e) Solteira do vertedouro de Babaquara presumida a ser 20 m abaixo do nível operacional normal. Para abastecer as turbinas da principal casa de um rio e seus afluentes, a água no Reservatório dos força, com capacidade de turbinar 13.900 m3/segun- Canais estará fluindo por uma série de vales perpen- do, água entrando nos canais fluiria numa velocida- diculares à direção normal de fluxo d’água. A água de média de 7,5 km/hora num canal de 13 m de pro- passará entre cinco bacias diferentes, na medida em fundidade, levando aproximadamente 2,3 horas para que atravessa os cursos dos igarapés que terão sido percorrer os 17 km do Reservatório da Calha até o inundados, passando por gargalos rasos quando a Reservatório dos Canais. Isto será semelhante a um água cruza cada um dos antigos interfluvios. Cada rio, ao invés de um reservatório. O Reservatório dos uma destas passagens, algumas das quais serão em Canais, pelo qual a água levará, em média, 1,6 dia canais escavados como parte do projeto de constru- para passar, é de uma forma talvez sem igual na his- ção, oferecerá a oportunidade para quebrar qualquer tória de construção de barragens. Em vez do habi- termoclina que possa ter-se formado nos fundos de tual vale inundado, onde a água flui pelo reservató- vale. É possível que só água da superfície, relativa- rio que segue a topografia descendente natural de mente bem oxigenada e de baixo teor de metano, As Hidrelétricas de Belo Monte e 255 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa fará a passagem por estes gargalos, deixando cama- no Reservatório dos Canais de Belo Monte até 23 das relativamente permanentes de água rica em me- m em Babaquara, indica que um modelo explícito tano no fundo de cada vale. Portanto, o Reservatório dos estoques de carbono e da sua decomposição é dos Canais, de 60 km de comprimento, é uma cadeia necessário, em lugar de uma extrapolação simples de cinco reservatórios, cada um com um diferente de medidas de concentrações de CH4 e emissões tempo de reposição, sistema associado de “braços em outras represas. O modelo desenvolvido para mortos” e potencial para estratificação. Quando este propósito é descrito nas seções seguintes. a água alcançar o trecho final antes das tomadas d’água das turbinas, permanecerá lá apenas durante As relações entre a concentração de metano um tempo curto. a profundidades diferentes e a concentração a 30 metros dependem da idade do reservatório. Estas relações são derivadas separadamente (Fearnside, Babaquara (Altamira) 2008). Podem ser usadas as concentrações calcula- Em contraste com o volume pequeno do reser- das à profundidade unificada de 30 m para calcular vatório e tempo curto de reposição dos dois reserva- às emissões de ebulição e de difusão, que apresen- tórios de Belo Monte, o reservatório de Babaquara tam relações regulares com a concentração a 30 m. tem várias características que o fazem excepcional- Também podem ser calculadas as concentrações mente nocivo como fonte de metano. Uma é a sua aos níveis do vertedouro e da tomada d’água das área enorme, do tamanho de Tucuruí e Balbina jun- turbinas. Após a construção de Babaquara, a água tos. Outra é a área de deplecionamento extraordina- que entra no reservatório de Belo Monte vai ter riamente grande que será alternadamente inundada saída diretamente das turbinas de Babaquara, e, e exposta: 3.580 km2 (Brasil, ELETRONORTE, portanto, conterá quantidades apreciáveis de CH4. s/d [C. 1989]). É presumida que o manejo de água em O reservatório de Babaquara é dividido em Babaquara segue uma lógica baseada em fornecer, dois braços, um dos quais terá um tempo de repo- anualmente, para Belo Monte a quantidade máxi- sição muito lento. O reservatório inundará os vales ma possível de água, dentro das limitações posadas dos rios Xingu e Iriri. Medidas grosseiras das áre- por: 1) o ciclo sazonal de vazões do rio, 2) o máximo as do reservatório (a partir de um mapa no Brasil, que pode ser usado pelas turbinas em Babaquara, e ELETRONORTE s/d. [C. 1988]) indicam que 3) o volume de armazenamento vivo do reservató- 27% da área de reservatório, aproximadamente, se rio de Babaquara. Isto resulta na esperada subida e encontra na bacia do rio Xingu abaixo da conflu- descida anual do nível d’água. Durante cada mês ência dos dois rios, outros 27% na bacia do Xingu ao longo de um período de 50 anos um cálculo é acima do ponto de confluência e 26% na bacia do feito da área da zona de deplecionamento que per- rio Iriri. A vazão média (1976-1995) do rio Iriri é maneceu exposta durante um mês, dois meses, e de 2.667 m3/segundo (Brasil, ANEEL 2001), en- assim sucessivamente até um ano, e uma categoria quanto a vazão no local da barragem de Babaquara separada é mantida para área de deplecionamen- (i.e., abaixo da confluência) é de 8.041 m3/segundo to exposta durante mais de um ano. A área que é (Maceira & Damázio, s/d). Presumindo que a por- submersa em cada classe de idade é calculada para ção do reservatório abaixo da confluência (a porção cada mês. Isto permite um cálculo da quantidade mais próxima à represa) é três vezes mais funda, de biomassa macia que é inundada, baseado em su- então, em média, com os outros dois segmentos, o posições relativo à taxa de crescimento da vegeta- tempo de residência no reservatório de Babaquara ção na zona de deplecionamento. A categoria para da água que desce o rio Xingu é de 164 dias e de vegetação com mais de um ano de idade contém 293 dias para a água que desce do rio Iriri. Embora biomassa menos macia, já que o crescimento de- o tempo de residência seja muito longo em ambos pois do primeiro ano é, em grande parte, alocado os casos, tempo bastante para acumular uma gran- para a produção de madeira em lugar de para ma- de carga de metano, o tempo para a parte no Iriri terial mais macio (a biomassa foliar da floresta é quase alcança o do tempo de residência de 355 dias usada para esta categoria). da notória represa de Balbina! A tremenda diferen- A fração do CH4 dissolvido que é liberado, en- ça entre Babaquara e Belo Monte, com oscilações tretanto, em transcurso de água pelo vertedouro e verticais em níveis d’água que variam desde zero pelas turbinas dependerá da configuração dessas 256 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras estruturas. No caso do vertedouro em Babaquara, provavelmente afundará imediatamente para o hipo- a queda de 48 m depois de emergir das comportas límnio quando entra no reservatório de Belo Monte. (Tabela 1) deveria garantir uma liberação pratica- Seu conteúdo de CH4 seria, então, parcialmente mente completa. No caso das turbinas, no entanto, preservado, e este metano estaria sujeito à liberação alguma parte do conteúdo de CH4 provavelmente quando a água emergir posteriormente das turbinas será repassada para o reservatório de Belo Monte, de Belo Monte. localizado imediatamente a jusante de Babaquara. O reservatório da calha de Belo Monte é planeja- do a se encostar contra a barragem de Babaquara, FONTES DE CARBONO E CAMINHOS DE fazendo com que a água que emerge das turbinas de LIBERAÇÃO DE GASES DE EFEITO ESTUFA Babaquara será injetada diretamente no reservatório Gás carbônico de Belo Monte, em lugar de fluir em um trecho de rio normal antes de entrar no reservatório. Porque Parâmetros para a dinâmica e decomposição ae- a água puxada de fundo da coluna d’água do reser- róbica da biomassa acima d’água são apresentados vatório de Babaquara estará de baixa temperatura, na Tabela 2. Tabela 2. Parâmetros para a emissão gases da biomassa acima da água no reservatório de Babaquara Parâmetro Valor Unidades Fonte Fração acima do solo 0,759 Fearnside, 1997b, pág. 337 Suposição, baseado em deterioração de Profundidade médio de zona de água de superfície 1 metro madeira comercial, Taxa de decomposição de folhas na zona sazonalmente inundada -0,5 Fração/ano Suposição. Presumido mesmo como floresta derrubada Taxa de decomposição acima d’água (0-4 anos) -0,1680 Fração/ano (Fearnside, 1996b, pág.611)(*) Presumido mesmo como floresta derrubada Taxa de decomposição acima d’água (5-7 anos) -0,1841 Fração/ano (Fearnside, 1996b, pág. 11) Presumido mesmo como floresta derrubada Taxa de decomposição acima d’água (8-10 anos) -0,0848 Fração/ano (Fearnside, 1996b, pág. 611) Presumido mesmo como floresta derrubada Taxa de decomposição acima d’água (>10 anos) -0,0987 Fração/ano (Fearnside, 1996b, pág, 611) Conteúdo de carbono na madeira 0,50 Fearnside et al., 1993 Revilla Cardenas (1988) para biomassa acima Biomassa total médio de floresta a Babaquara 244 Mg/ha do solo; Fração acima do solo como acima. Profundidade média da água ao nível mínimo operacional normal 18,4 metros A 142 m sobre o mar Profundidade média da água ao nível operacional normal 23.4 metros A 165 m sobre o mar Calculado de biomassa total e de Fearnside Biomassa inicial presente: folhas 4.1 Mg/ha (1995a, pág. 12), Calculado de biomassa total e de Fearnside Biomassa inicial presente: madeira acima d’água 138,8 Mg/ha (1995a, pág. 12), Calculado de biomassa total e de Fearnside Biomassa inicial presente: abaixo do solo 58,8 Mg/ha (1995a, pág. 12), Liberação de metano por térmitas em floresta 0,687 kg CH4/ha/ano Martius et al., 1996, pág. 527 Liberação de metano por térmitas em biomassa acima d’água por Mg C 0,0023 Mg CH se deteriorado por térmitas 4 Martius et al., 1993 Por cento de decomposição mediado por térmitas acima do nível d’água Martius et al., 1996, pág. 527 para biomassa 4,23 % máximo operacional normal derrubada Por cento de decomposição mediado por térmitas abaixo da linha 0 % Baseado em Walker et al., 1999. d’água do nível máximo operacional normal Área total do reservatório ao nível operacional normal 6.140 km2 Área do leito fluvial 136 km2 Revilla-Cardenas, 1988, pág. 87 As Hidrelétricas de Belo Monte e 257 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa Tabela 2. Continuação Parâmetro Valor Unidades Fonte Área desmatada antes de inundar (zona de inundação permanente) 0 km2 Área total de floresta inundada 6.004 km2 Calculado por diferença Área da zona, menos o leito fluvial e a área Área de floresta original na zona de inundação permanente 2.424 km2 previamente desmatada Calculado por diferença entre a área de Área de floresta original de zona de deplecionamento 3.580 km2 floresta e a área total Fração do Taxa de quebra de troncos na altura da linha d’água para árvores > 25 0,063 estoque Baseado em Walker et al., 1999, pág. 245 cm DAP original/ano Fração do Taxa de troncos que quebram na linha de água para árvores < 25 cm 0,113 estoque Baseado em Walker et al., 1999, pág. 245 DAP original/ano Fração do Taxa de queda de galhos (e presumida queda de troncos acima do 0,094 estoque Baseado em Walker et al., 1999, pág. 245 primeiro galho) original/ano Por cento da biomassa acima do solo de madeira viva em galhos e Fearnside, 1995a, pág. 12 baseado em Klinge 30,2 % troncos acima do primeiro galho & Rodrigues, 1973 Fearnside, 1995a, pág. 12 baseado em Klinge Por cento da biomassa de madeira acima do solo em troncos 69,8 % & Rodrigues, 1973 Por cento de biomassa de troncos > 25 cm DAP 66,0 % Calculado abaixo 10-25 cm DAP como por cento de biomassa de fuste total em árvores 22 % Brown & Lugo, 1992, vivas > 10 cm DAP 0-10 cm DAP como por cento de biomassa viva total acima do solo 12 % Jordan & Uhl, 1978, Baseado no fator de expansão de biomassa Fuste como por cento de biomassa viva total acima do solo em árvores de 1,74 para biomassa de fuste > 190 Mg/ 57,47 % vivas > 10 cm DAP ha em árvores vivas > 10 cm DAP (Brown & Lugo, 1992). Biomassa viva acima do solo < 10 cm DAP 22,2 Mg/ha Calculado a partir de informações acima . Galhos como porcentagem de biomassa viva de fuste 51,4 % Baseado em Brown & Lugo, 1992 Biomassa de galhos 55,9 Mg/ha Calculado a partir de informações acima Biomassa acima do solo de floresta 185,3 Mg/ha Calculado de total e fração acima do solo Biomassa total, menos o peso das folhas e da Biomassa de madeira viva acima do solo 155,5 Mg/ha biomassa morta Biomassa de madeira morta acima do solo 25,6 Mg/ha Klinge, 1973, pág. 179 Biomassa viva de fuste 108,6 Mg/ha Partilha baseada em Brown & Lugo, 1992 Biomassa viva de fuste 10-25 cm DAP 23,9 Mg/ha Partilha baseada em Brown & Lugo, 1992 Biomassa viva de fuste < 10 cm DAP 13,0 Mg/ha Jordan & Uhl, 1978 Biomassa viva de fuste 0-25 cm DAP 36,9 Mg/ha Somado de acima Biomassa viva de fuste > 25 cm DAP 71,7 Mg/ha Partilha baseada em Brown & Lugo, 1992 Distribuição vertical interpolada de Klinge & Biomassa viva de fuste: acima da linha d’água 96,4 Mg/ha Rodrigues, 1973 Distribuição vertical interpolada de Klinge & Biomassa viva de fuste: 0-25 cm DAP: acima da linha d’água 32,8 Mg/ha Rodrigues, 1973 Distribuição vertical interpolada de Klinge & Biomassa viva de fuste: > 25 cm DAP: acima da linha d’água 63,6 Mg/ha Rodrigues, 1973 Richard Bruce, comunicação pessoal 1993; Fração das árvores que flutuam 0,4 Fração veja Fearnside, 1997a, pág. 61 Fração de galhos originais em árvores restantes que caem por ano 0,094 Fração Calculado de Walker et al., 1999. Estimativa aproximada baseado no nível do Fração média da área de deplecionamento exposta anualmente 0,5 Fração reservatório em 2000 em Balbina. 258 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras As emissões de biomassa acima d’água consi- Emissões de Ecossistema de Pre-represa deradas aqui são conservadoras por duas razões. Uma é que elas estão baseadas na vazão média do As áreas dos ecossistemas naturalmente inun- rio em cada mês e na suposição de que o manejo dados e não inundados são apresentadas na Tabela da água respeite o limite do nível mínimo nor- 3. Os tipos de floresta sazonalmente inundados são mal previsto para o reservatório. Nenhuma con- considerados como pertencendo à “área inundada”. sideração foi feita quanto à possibilidade de que No entanto, isto pode representar uma superestimati- o nível da água poderia ser abaixado além deste va da extensão verdadeira “área inundada”, sendo que nível mínimo em anos extremamente secos, como imagens de radar do Satélite de Recursos da Terra em eventos de El Niño. A outra suposição con- Japonês ( JERS) indicam que praticamente nada da servadora é que a biomassa na zona de deplecio- área do reservatório planejado tem inundação abaixo namento nunca se queima. Queimar é um evento da cobertura da floresta (veja Melack et al., 2004). No ocasional, mas afeta quantidades significativas de entanto, deveria ser lembrado que lagos temporários biomassa quando isso acontecer. Durante a seca ao longo dos rios Xingu e Iriri existem: mapas anali- do El Niño de 1997-1998, os reservatórios de sados por de Miranda et al. (1988, p. 88) indicam de Balbina e de Samuel atingiram cotas muito in- 28 a 52 lagos na área a ser inundada por Babaquara, feriores aos níveis de operação oficialmente ti- dependendo do mapa usado na análise. dos como “mínimos”, e áreas grandes das zonas Os parâmetros para emissões de metano pela flo- de deplecionamento expandidas se queimaram. resta não inundada (floresta de terra firme) são apre- Embora seja provável que tais emissões às vezes sentados na Tabela 4. Estes indicam um efeito míni- acontecerão em Babaquara, elas não foram consi- mo sobre o metano, com a perda de um sumidouro derados nesta análise. pequeno no solo quando inundado. Emissões de Tabela 3. Área e Biomassa de vegetação ao Belo Monte e Babaquara(a) BABAQUARA BELO MONTE Biomassa Biomassa Tipo de vegetação Área acima do solo(b) Área acima do solo(b) 2 Por cento 2 Por cento (km ) (Mg/ha peso (km ) (Mg/ha peso seco) seco) Vegetação não inundada Floresta aberta de terra firme [floresta aberta mista 3.565,3 58,0 175,2 (FA)+floresta aberta submontana (FS)] Floresta aberta de terra firme sobre revelo acidentado 205,7 46,7 125,27 Floresta aberta de terra firme sobre revelo ondulado 11,9 2,7 201,9 Floresta secundária latifoliada 10.9 0,2 20.0(c) 11,0 2,5 20,0 Vegetação inundada Floresta densa ciliar estacionalmente 2.421,9 39,3 201,2 191,5 43,6 121,2 inundável ou Floresta Densa Ciliar (FC) Floresta Aberta ciliar estacionalmente submersa 5,6 0,1 60,0 (Formações pioneiras aluviais campestres) Nenhuma vegetação (canal de rio) Áreas sem cobertura vegetal 136,3 2,4 0,0 20,0 4,5 0,0 Totais Total de vegetação não inundada 3.576,3 58,2 228,5 51,9 Total de vegetação inundada 2.427,5 39,4 191,5 43,6 Vegetação total 6.003,7 97,6 185,3 420,0 95,5 122,8 Reservatório total 6.140,0 100,0 440,0 100,0 (a) Dados de Revilla Cardenas (1987, p.55; 1988, p.87), com áreas ajustadas em proporção à estimativa de área de reservatório atual (6.140 km2 para Babaquara; 440 km2 para Belo Monte). (b) Valores incluem Biomassa morto (liteira e madeira morta), cipós, e o tapete de raízes. (c) Valor para biomassa de floresta secundária acima do solo é aquele usado por Revilla Cardenas (1988) para Babaquara, baseado em dados de Tucuruí. As Hidrelétricas de Belo Monte e 259 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa óxido nitroso (N2O) em solo florestado não inunda- Cálculos de óxido nitroso para floresta não inundada do são pequenas: 0,0087 Mg de gás/ha/ano (Verchot e para áreas inundadas são apresentados na Tabela 5. et al., 1999, p. 37), ou 0,74 Mg/ha/ano de carbono Os cálculos incluem o efeito da formação de poças CO2-equivalente, considerando o potencial de aque- temporárias em áreas de terra firme durante eventos cimento global de 310 (Schimel et al., 1996, p. 121). periódicos de chuva pesada (Tabela 5). Tabela 4. Fluxo evitado de metano da perda de floresta em Babaquara Item Valor Unidades Fonte ABSORÇÃO PELO SOLO EM FLORESTA NÃO INUNDADA Absorção anual média de CH4 em florestas não inundadas -3,8 kg CH4/ha/ano Potter et al. (1996) de 22 estudos 2 Baseado na área de reservatório de 6.140 km 2 e Área total de floresta inundada por reservatório 6.004 km leito do rio de Revilla Cardenas, 1988, pág. 87, Área de floresta ribeirinha inundada por reservatório 2.427 km2 Revilla Cardenas, 1988, pág. 87 Área de floresta de terra firme inundada por reservatório 3.576 km2 Calculado por diferença Fração de ano que floresta ribeirinha inunda naturalmente 0,17 Fração presumido ser 2 meses, em média Absorção por ha por ano em floresta ribeirinha -3,17 kg CH4/ha/ano Proporcional ao tempo não inundado Absorção por ano em floresta ribeirinha -768,70 Mg CH4/ano Absorção por ha X área de floresta ribeirinha Absorção por ano em floresta de terra firme -1.358,98 Mg CH4/ano Absorção por ha X área de floresta de terra firme Absorção total por ano -2.127,68 Mg CH4/ano Somado por tipo de floresta Mg gás de CO2 equivalente Potencial de efeito estufa (GWP) de CH4 21 Schimel et al., 1996/ Mg gás de CH4 Milhões de Mg CO2 - C Calculado de emissão de CH4, GWP, peso CO2 carbono equivalente/ano -0,012 equivalente /ano atômico de C (12) e peso molecular de CO2 (44) EMISSÃO ATRAVÉS DE TÉRMITAS DE FLORESTA Emissão/ha/ano 0,5 kg CH4/ha/ano Fearnside, 1996b, Milhões de equivalentes Equivalentes de Ha-ano de floresta 0,6 Calculado a partir de informações acima de ha-ano Emissão/ano 317,0 Mg CH4/ano Calculado a partir de informações acima Milhões de Mg CO CO2 carbono equivalente/ano 0,0018 2 Calculado como acima equivalente/ano EMISSÕES DE INUNDAÇÃO NATURAL DE FLORESTA INUNDADA PRE-REPRESA mg CH 2 Emissão de metano de floresta inundada durante inundação 4/m /dia. Media de 103,8 natural cinco estudos em floresta (Wassmann & Martius, 1997, pág. 140) em várzea de água branca Dias inundados por ano 59,4 dias, Suposição como acima. Emissão anual por km2 6,2 Mg CH4/ano/km 2 Calculado a partir de informações acima Emissão natural anual através de floresta inundada 14.961 Mg CH4/ano. Calculado a partir de informações acima Milhões de Mg CO – C CO2 carbono equivalente/ano 0,086 2 Calculado a partir de informações acima equivalente /ano Considerando a emissão por ciclo (2 meses vs Emissão anual ajustada para comprimento de ciclo Mg CH4/ano 6 meses) Milhões de Mg CO - C CO2 carbono equivalente/ano 2 Calculado acima equivalente /ano EMISSÕES DE EVENTOS PERIÓDICOS DE FORMAÇÃO DE POÇAS EM FLORESTA DE TERRA FIRME Calculado de área, 5% que inundam por evento Formação de poças em florestas de terra firme 1.801 km2-dias/ano. (baseado em Mori & Becker, 1991) e presumiu freqüência de 5-ano e duração de 30 dias 2 Presumido ser o mesmo que a floresta de Emissão quando inundado ou com formação de poças 103,8 mg CH4/m /dia. várzea (como acima). Emissão natural anual através de formação de poças 187,0 Mg CH4/ano Calculado a partir de informações acima Milhões de Mg CO - C CO2 carbono equivalente/ano 0,001 2 Calculado a partir de informações acima. equivalente /ano TOTAIS 43.259 Emissão total de metano Mg CH Calculado partir de informações acima, 4/ano. incluindo a ajuste para comprimento do ciclo. Milhões de Mg CO CO carbono equivalente/ano 0,248 2 - C 2 Calculado a partir de informações acima.equivalente /ano 260 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Tabela 5. Emissão evitada de óxido nitroso de perda de floresta em Babaquara Item Valor Unidades Fonte EMISSÕES DE FLORESTA NÃO INUNDADA Emissão anual média de N2O do solo em florestas 8,7 kg N2O/ha/ano Verchot et al., 1999, pág. 37não inundadas 2 Baseado em 6.140 área de reservatório de km 2 e leito Área total de floresta inundada por reservatório 6.004 km fluvial de Revilla Cardenas, 1988, pág. 87, Área de floresta inundada submersa pelo 2.427 km2 Revilla Cardenas 1988, pág. 87 reservatório Área de floresta de terra firme inundada por 3.576 km2 Calculado por diferença reservatório Fração do ano que floresta inundada é submersa 0,17 Fração Assumido 2 meses em média naturalmente Emissão por ha por ano em floresta inundada 7,23 kg N2O/ha/ano Proporcional ao tempo não inundado Emissão por ano em floresta ribeirinha 1.755,6 Mg N2O/ano Emissão por ha X área de floresta inundada Emissão por ano em floresta de terra firme 3.103,7 Mg N2O/ano Emissão por ha X área de floresta de terra firme Emissão total por ano 4.859,3 Mg N2O/ano Somado por tipo de floresta Mg CO2 gás equivalente / Potencial de efeito estufa (GWP) de N2O 310 Schimel et al., 1996Mg gás de N2O Milhões de Mg CO2 - C Calculado de área e da emissão por hectare, peso Carbono CO2 equivalente/ano 0,411 equivalente /ano atômico de C (12) e peso molecular de CO2 (44) EMISSÕES DE INUNDAÇÃO Calculado de área e a presunção de 6 meses de Inundação de floresta inundada 404,6 km2-dias/ano inundação em médio Calculado da área, 5% inundados por evento (baseado Emissão de formação de poças em florestas de 1.801,1 km2-dias/ano em Mori & Becker, 1991) e presumindo freqüência de 5 terra firme anos e uma duração de 30 dias 7,6 mg N O/m2/dia (médias dos reservatórios de Tucuruí Emissão quando inundada 7,6 kg de N 2 22O/km -dia e Samuel: de Lima et al., 2002) Emissão de inundação de floresta inundada 3,1 Mg N O/ano Inundando (km2/dia) X emissão/km22 /dia Emissão de formação de poças em florestas de 13,7 Mg N2O/ano Formação de poças (km 2-dias) X Emissão/km2/dia terra firme Emissão total de inundação 16,8 Mg N2O/ano Soma de emissões de inundação. Milhões de Mg CO C Carbono CO2 equivalente/ano 0,001 2 Calculado do GWP como acima. equivalente /ano EMISSÃO TOTAL Soma de floresta de não inundada, formação de poças e Emissão total de perda de floresta 4.876,0 Mg N2O/ano emissões inundando Milhões de Mg CO C/ CO2 carbono equivalenteano 0,412 2 Calculado de GWP como acima. ano equivalente Presumindo as mesmas taxas de emissão como toneladas de carbono CO2-equivalente se este resul- as medidas nos estudos de várzea de água branca (o tado for multiplicado por três para aproximar o efeito Xingu é considerado um rio de água clara, mais se- da estação de enchente mais curta (2 meses contra 6 melhante à água branca do que água preta), a emissão meses). Os ajustes resultantes para o efeito dos ecos- anual seria equivalente a apenas 0,043 milhões de to- sistemas pré-represa são muito pequenos, como será neladas de carbono equivalente a carbono de CO2 em mostrado mais adiante quando serão calculadas as Babaquara em uma base diária, ou 0,248 milhões de emissões líquidas para as duas represas. As Hidrelétricas de Belo Monte e 261 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa EMISSÕES DE CONSTRUÇÃO 2,6 vezes mais cimento por MW de capacidade instalada do que a Belo Monte. Represas, obviamente, requerem muito mais materiais, como aço e cimento, do que instalações É esperado que a quantidade de diesel usa- 3 equivalentes movidas a combustível fóssil, como as da para Belo Monte seja 400 × 10 Mg (Brasil, usinas termoelétricas a gás que estão sendo constru- ELETRONORTE, 2002, Tomo II, p. 8-145). ídas atualmente em São Paulo e em outras cidades Isto inclui um ajuste das unidades (como infor- no Centro-Sul brasileiro. São calculadas as quanti- mado no estudo de viabilidade) para trazer os dades de aço usadas na construção de Belo Monte valores dentro da faixa geral de uso de combus- baseado nos pesos dos itens listados no estudo de tível em outras barragens (por exemplo, Dones viabilidade (Brasil, ELETRONORTE, 2002). Para & Gantner, 1996 calcularam um uso médio de Babaquara, supõe-se que a quantidade de aço usa- 12 kg diesel/TJ para barragens na Suíça). O es- da em equipamento eletromecânico é proporcional tudo de viabilidade contém várias inconsistên- à capacidade instalada, enquanto presume-se que a cias internas nas unidades, que presumivelmente quantidade de aço em concreto armado é proporcio- resultaram de erros tipográficos. A Belo Monte nal ao volume de concreto (dados de: da Cruz, 1996, exige uma quantidade bastante grande de esca- p. 18). São calculadas as quantidades em Babaquara vação por causa da necessidade para cavar o canal proporcionalmente às quantidades usadas em Belo de adução que conecta o Reservatório da Calha Monte. Uso de aço calculado em Belo Monte to- ao Reservatório dos Canais, e várias escavações taliza 323.333 Mg, enquanto o uso em Babaquara menores são projetadas nos gargalos dentro do totaliza 303.146 Mg. Reservatório dos Canais. A quantidade esperada de escavação para estes canais aumentou substan- A quantidade de cimento usada em cada barra- cialmente entre a versão do estudo da viabilidade gem é estimada em 848.666 Mg, baseado no total de 1989 e a de 2002 porque foram descobertos dos itens listados no estudo de viabilidade (Brasil, erros na cartografia topográfica da área (Brasil, ELETRONORTE, 2002). Para Babaquara, uso ELETRONORTE, 2002, Tomo I, p. 8-22). Para de cimento é calculado em 1.217.250 Mg baseado Babaquara presume-se que o uso de diesel será no volume de concreto (dados de: da Cruz, 1996, proporcional à quantidade de escavação planejada p., 18) e a média de conteúdo de cimento presumi- do de 225 kg/m3 de concreto (Dones & Gantner, naquela represa (da Cruz, 1996, p. 18). 1996). A Belo Monte é excepcionalmente modes- As estimativas de materiais para construção de ta no uso de cimento porque o local permite que a represas e linhas de transmissão são apresentadas barragem principal (Sitio Pimentel) seja constru- na Tabela 6. Os totais resultantes (0,98 milhões ída em um local que é mais alto em elevação que de Mg C para a Belo Monte e 0,78 milhões de a casa de força principal (o Sitio Belo Monte). Mg C para Babaquara) são muito pequenos com- A barragem principal tem uma altura máxima de parado às emissões posteriores dos reservatórios. apenas 35 m (Brasil, ELETRONORTE, 2002, Não foram deduzidas destes totais as emissões da Tomo I, pág. 6-33), enquanto a casa de força construção das termoelétricas a gás equivalentes. principal aproveita uma queda de referência de A emissão de construção de instalações de gás 87,5 m (Brasil, ELETRONORTE, 2002, Tomo natural é mínima: uma análise de ciclo de vida I, pág. 3-52). A maioria dos projetos hidrelétricos, de usinas a gás de ciclo combinada em Manitoba, como Babaquara ou Tucuruí, tem a casa de força Canadá indica emissões de CO2 de construção de localizada ao pé da própria barragem, e portanto apenas 0,18 Mg equivalente/GWh (McCulloch só gera energia de uma queda que corresponde à & Vadgama, 2003, p. 11). altura da barragem menos uma margem pequena para borda livre ao topo. Tucuruí, que é até agora a “campeã” de todas obras públicas brasileiras em EMISSÕES CALCULADAS DA BELO MONTE termos de uso de cimento, usou três vezes mais E BABAQUARA cimento do que a quantidade prevista para Belo O cálculo das emissões de gases de efeito estu- Monte (Pinto, 2002, pág. 39). A Babaquara usaria fa requer um cenário realista para o cronograma do 262 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Tabela 6. Emissões de gás de efeito estufa de represa e construção de transmissão-linha Belo Monte Babaquara Emissão por unidade Emissão Emissão Item Unidades Referência (kg CO -C No. de (milhões de No. de (milhões de2 Nota Referência Nota Referência equivalente) unidades Mg CO2-C unidades Mg CO2-C equivalente) equivalente) Construção de represa Aço Mg 600,0 (a) (b) 323.333 (c) 0,194 (a) 303.146 (c) 0,182 Cimento kg 0,207 (a) (c) 848.666.000 (e) 0,176 (a) 1.217.250.000 (e) 0,252 milhões Diesel 863.280 (d) 135,1 (f) 0,117 76,8 (f) 0,066 de kg Eletricidade TWh 139.903.200 (g) 3,15 (h) 0,441 1,79 (h) 0,251 Sub-total de construção de represa 0,928 0,751 Construção de linha de transmissão km-MW 1,9 (i) 29.596.901 (j) 0,055 (a) 17.046.458 (j) 0,032 instalado Total de projeto 0,983 0,783 (a) Van Vate, 1995. (b) Usa GWPs de 100 anos de IPCC 1994: CO2=1, CH4=24,5, N2O=320 (Albritton et al., 1995). (c) Baseado em proporções relativos a Belo Monte (veja texto). (d) Usa GWPs de 100 anos de IPCC 1995 [valores do Protocolo de Kyoto]: CO2=1, CH4=21, N2O=310 (Schimel et al., 1996). (e) Baseado e volume de concreto (da Cruz, 1996, pág. 18)(veja texto). ( f) Uso de diesel em Babaquara considerado proporcional à escavação planejada. (g) Baseado em substituição de gás de ciclo combinado em São Paulo (veja texto). (h) Uso de eletricidade na construção baseado em 280 kWh de eletricidade por TJ (Dones & Gantner, 1996). Emissões de eletricidade consideram o baseline de geração de gás natural em São Paulo (veja texto). ( i) Média em Québec, Canadá (Peisajovich et al., 1996). ( j) A linha de transmissão de Belo Monte até a rede do centro-sul brasileiro vai para três destinos com uma distância má de 2647 km: Cachoeira Paulista-SP (2.662 km), Campinas-SP (2.599 km) e Ouro Preto-MG (2.680 km) (Brasil, MME-CCPESE, 2002). Babaquara tem 70 km adicionais de linha. enchimento e da instalação das turbinas em Belo pronta para uso, como planejado no Plano Decenal Monte e Babaquara, e para as políticas de mane- de ELETROBRÁS (Brasil, MME-CCPESE, jo de água nas duas represas. Aqui se presume que 2002). O cenário de referência do Plano Decenal Babaquara será enchida sete anos após Belo Monte 2003-2012 estimou o começo de operação da casa (i.e., que Belo Monte opera usando a vazão não re- de força complementar para fevereiro de 2011 e da gularizada do rio antes deste tempo). Este cronogra- casa de força principal para março de 2012. ma corresponde ao cenário menos-otimista no pla- no original (veja Sevá, 1990). As turbinas em ambas Os resultados de um cálculo de 50 anos das fon- as represas serão instaladas a uma taxa de uma a cada tes de carbono em formas facilmente degradadas para três meses, ritmo (talvez otimista) previsto no estu- cada reservatório são apresentados na Figura 2. É evi- do de viabilidade (Brasil, ELETRONORTE, 2002, dente que todas as fontes são muito mais altas nos Tomo II, pág. 8-171). primeiros anos do que nos anos posteriores. Os esto-ques de carbono instável do solo, biomassa de madei- O presente cálculo segue os planos para enchi- ra acima d’água e árvores mortas ao longo da margem mento do reservatório indicados no estudo de viabi- diminuem, reduzindo assim as emissões destas fontes. lidade. O Reservatório dos Canais será enchido pri- As macrófitas diminuem, mas não desaparecem, pro- meiro até um nível de 91 m sobre o nível médio do vendo assim uma fonte a longo prazo que, nos anos mar. Isto será feito depois que a primeira enchente posteriores, é de maior importância relativa, embora passar pelo vertedouro (Brasil, ELETRONORTE, de menor em termos absolutos. O recrescimento da 2002, p. 8-171). Presume-se que isto aconteça no vegetação na zona de deplecionamento representa mês de julho. A casa de força complementar será uma fonte estável a longo prazo de carbono de fácil usada, então, a este nível reduzido do reservatório degradação que aumenta em importância relativa à durante um ano antes da casa de força principal estar medida que as outras fontes declinem. As Hidrelétricas de Belo Monte e 263 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa Figura.2. Fontes de carbono decomposto anaerobicamente: A.) Babaquara (Altamira) reservatório; B.) Belo Monte Reservatório da Calha; C.) Belo Monte Reservatório dos Canais. 264 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras São mostradas as concentrações de metano São mantidos os picos grandes em concentração calculadas a uma profundidade padronizada de 30 de metano em Babaquara, seguido por uma di- m para cada reservatório na Figura 3. Estas con- minuição das concentrações durante o resto de centrações calculadas seguem a tendência geral de cada ano. Os picos altos são mantidos porque o oscilação sazonal e declínio assintótico observada carbono vem da inundação de vegetação de de- em valores medidos em Petit Saut (Galy-Lacaux plecionamento quando a água sobe. Os picos de et al., 1999, p. 508). As oscilações são muito concentração resultam em emissões significativas grandes em Babaquara depois que as diferentes porque estes períodos correspondem a períodos fontes de carbono da vegetação de depleciona- de fluxo alto de turbina para maximizar produção mento diminuíssem em importância (Figura 3a). de energia. Figura 3. Metano calculado a 30 m de profundidade: A.) Reservatório de Babaquara (Altamira); B.) Belo Monte Reservatório da Calha. As Hidrelétricas de Belo Monte e 265 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa Figura 3 (Continuação). Metano calculado a 30 m de profundidade: C.) Belo Monte Reservatório dos Canais. As emissões por diferentes caminhos para o mostram que, mesmo ao longo de um horizonte de complexo Belo Monte/Babaquara como um todo tempo de 50 anos, o impacto sobre o aquecimento são mostradas na Figura 4. Biomassa acima d’água global de uma represa como Babaquara é significa- e mortalidade de árvores na margem diminuem até tivo. A manutenção de picos anuais de concentração níveis insignificantes ao longo do período de 50 de metano, como na Figura 3a, tem sido corrobo- anos, mas a grande magnitude das emissões de bio- rado pela evolução da concentração de metano ob- massa acima d’água nos primeiros anos dá para esta servada no reservatório de Petit Saut (Abril et al., fonte um lugar significativo na média de 50 anos. 2005, Delmas et al., 2004), diferente do declínio ini- Cinqüenta anos geralmente são o período de tempo cialmente antecipado em Petit Saut (Galy-Lacaux adotado pela indústria hidrelétrica em discussões da et al., 1997). “vida útil” de represas, e cálculos são feitos freqüen- temente, financeiro e ambiental, neste horizonte de São apresentadas médias a longo prazo de emis- tempo, como nos regulamentos aplicáveis em estu- sões líquidas de gases de estufa na Tabela 7 para ho- dos de viabilidade para represas no Brasil (Brasil, rizontes de tempo diferentes. São apresentadas mé- ELETROBRÁS & DNAEE, 1997). As represas dias a longo prazo de emissões líquidas de gases de amazônicas existentes, particularmente Tucuruí, efeito estufa na Tabela 7 para horizontes de tempo Balbina e Samuel, eram relativamente jovens em diferentes. Emissões estão separadas naquelas con- 1990, o ano padrão mundial de referência para os sideradas sob a rubrica de represas hidrelétricas nos inventários dos gases de efeito estufa, designados inventários nacionais que estão sendo preparados pe- pela Convenção Quadro das Nações Unidas sobre los países sob a Convenção de Clima (UNFCCC), e Mudanças do Clima e o ano usado para vários cál- os outros fluxos que também são parte do impacto e culos anteriores de emissões de gases de efeito estufa benefício líquido da represa, incluindo emissões evi- (Fearnside, 1995a, 1997b, 2002a, 2005a,b, 2008). As tadas. O impacto total calculado para Belo Monte emissões em 1990 eram então bastante altas, e a in- e Babaquara é, em média 11,2 milhões de carbono dústria hidrelétrica frequentemente tem contestado CO2-equivalente por ano ao longo do período de que estas estimativas dão um quadro negativo de- 1-10 anos, diminuindo para 6,1 milhões de Mg por mais ao papel de hidrelétricas no efeito estufa (por ano como média para o período de 1-20 anos -1.4 exemplo, IHA, s/d [C. 2002]). Os cálculos atuais milhões de Mg para o período de 1-50 anos. 266 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Figura 4. Emissões por caminho para o complexo Belo Monte/Babaquara (Altamira). O complexo começa a reembolsar sua dívida de emissões de gás de efeito estufa após o 15º ano depois de encher o primeiro reservatório. Tabela 7. Médias a longo prazo de emissão líquida de gases de efeito estufa para o complexo Belo Monte/Babaquara Emissões de todas as fontes (milhões de Mg C CO2-equivalente/ano) Anos 1-10 Anos 1-20 Anos 1-50 média de 10 anos média de 20 anos média de 50 anos Emissões de inventário Emissões de superfície 1,0 0,8 0,4 Turbinas 2,6 3,8 2,8 Vertedouro 1,6 1,0 0,6 Canal de adução 0,2 0,4 0,3 Gargalos 0,01 0,01 0,01 Emissões de inventário totais 5,3 6,0 4,1 Outros fluxos Substituição de fóssil-combustível -3,7 -3,9 -4,1 Fluxos de ecossistema pre-represa -0,3 -0,5 -0,6 Biomassa acima d’água 9,6 7,2 3,8 Decomposição no perímetro da magem 0,07 0,04 0,01 Outros fluxos totais 5,9 0,1 -5,5 Impacto total 11,2 6,1 -1,4 Impacto total como múltiplo da emissão de referência de combustível fóssil 4,0 2,5 0,7 As Hidrelétricas de Belo Monte e 267 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa INCERTEZAS FUNDAMENTAIS Testes de sensitividade para parâmetros selecionados de entrada são apresentados na Tabela 8, mostrando o Um cálculo como o do presente estudo para o efeito de um aumento de 10% em cada parâmetro de complexo Belo Monte/Babaquara envolve muita in- entrada. Efeitos são simétricos para uma diminuição certeza. Não obstante, o cálculo precisa ser feito, e as de 10% em cada parâmetro (não mostrado na tabela). melhores informações disponíveis devem ser usadas São apresentados os efeitos em termos da mudança para cada um dos parâmetros requeridos pelo mo- no impacto total das represas (expresso em porcenta- delo. Na medida em que pesquisas nesta área proce- gem) como médias anuais para os períodos de 1-10 dem, estimativas melhores para estes parâmetros se anos, 1-20 anos e 1-50 anos. Isto quer dizer que os tornarão disponíveis, e o modelo poderá interpretar resultados representam a discrepância, em porcenta- rapidamente estas informações em termos do resul- gem, dos valores do cenário de referência para estas tado delas sobre as emissões de gases de efeito estufa. médias que foram apresentados na Tabela 7. Para to- Embora um conjunto completo de testes de dos os três períodos, as variáveis para as quais o im- sensitividade não tenha sido administrado ainda, o pacto total é muito sensível são a biomassa da floresta comportamento do modelo fornece várias indica- original e as porcentagens do metano exportado que ções sobre quais parâmetros são os mais importantes. é emitido às turbinas e aos vertedouros. Tabela 8. Testes de sensitividade para parâmetros selecionados de entrada Valor do Mudança percentual no impacto total em resposta a um parâmetro no aumento de 10% no parâmetro de entrada Parâmetro de entrada Unidades cenário de Média de 10 Média de 20 Média de 50 referência anos anos anos Proporção do CH4 liberada nas turbinas (ponto Proporção 0,55 médio entre cenários alto e baixo) Mudança percentual % 2,03 5,18 -16,17 Proporção do CH4 liberada no vertedouro Proporção 1 Mudança percentual % 1,22 1,37 -3.67 Taxa de crescimento da vegetação da zona de Mg/ha/ano 10 deplecionamento peso seco Mudança percentual % 0,02 0,46 -3,33 Mg/ha de macrófitas Biomassa de macrófitas, anos 1-6 11,1 peso seco Mudança percentual % 0,23 0,26 -0,54 Biomassa de macrófitas, anos 7-50 Mg/ha de macrófitas 1,5 Mudança percentual % 0,003 0,10 -0,48 Macrófitas não encalhadas fração por mês 0,144 (morte+decomposição) Mudança percentual % 0,23 0,34 -0,92 Zona de deplecionamento inundada (taxa de fração por mês 0,656 decomposição sub-aquática) Mudança percentual % 0,02 0,48 -0,04 Taxa de decomposição de macrófitas encalhadas fração por mês 0,314 Mudança percentual % -0,001 -0,01 0,04 Biomassa acima do solo Mg/ha peso seco 176,1 Mudança percentual % 2,95 5,02 -11,91 Percentual de emissão nos canais de adução % 15,3 Mudança percentual % 0,02 0,08 -0,26 Percentual de oxidação nos canais de adução % 66,5 Mudança percentual % -0,50 -2,49 7,90 Percentual de emissão nos gargalos % 2,1 Mudança percentual % 0,01 0,004 0,002 Percentual de oxidação nos gargalos % 9,2 Mudança percentual % -0,01 -0,07 -0,04 Percentual de mortalidade de árvores na margem do reservatório % 81,7: 0-100 m (média ponderada) Mudança percentual % 0,06 0,07 -0,04 268 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Nos primeiros anos depois de encher o reser- mais velhos estão disponíveis para calibrar esta parte vatório, emissões são dominadas pelo CO2 liberado da análise. O declínio em áreas de macrófita reduz pela decomposição da biomassa situada acima da a importância da incerteza relativa a esta fonte para água. Estas emissões, embora sujeitas à incerteza, as emissões a longo prazo. O que predomina para são fundadas nos melhores dados disponíveis sobre o complexo como um todo é a biomassa da zona decomposição em áreas desmatadas. Embora sejam de deplecionamento em Babaquara. Isto resulta em valiosas medidas específicas de árvores em reser- picos sazonais grandes na concentração de CH4 no vatórios, uma mudança radical no resultado não é reservatório de Babaquara (Figura 3a). Uma parte esperada. As presunções sobre mortalidade da flo- deste metano é repassada para os dois reservatórios resta a diferentes distâncias da margem são apenas de Belo Monte (Figura 3b e 3c). A taxa de cres- suposições, mas neste caso a quantidade de carbono cimento da vegetação na zona de deplecionamen- envolvido é insuficiente para fazer qualquer diferen- to é, então, crítica, e nenhuma medida atual disto ça significativa no resultado global. existe. A suposição feita é de que este crescimento Os anos iniciais também incluem uma emissão acontece linearmente, acumulando 10 Mg de maté- significativa da liberação de metano pelo transcurso ria seca em um ano. O valor usado para o conteúdo da água pelas turbinas. Para a porcentagem do me- de carbono desta e das outras formas de biomassa tano dissolvido que é liberado no cenário de baixas macia é de 45%. A taxa de crescimento presumida é emissões adota-se os valores derivados de medidas extremamente conservadora, quando comparada às em Petit Saut (Galy-Lacaux et al., 1997, 1999). Por taxas de crescimento anuais medidas de plantas her- causa de diferenças entre Petit Saut e as represas báceas para o período de três meses de exposição em brasileiras, a faixa usada é muito larga (21-89,9%) áreas de várzea ao longo do rio Amazonas perto de (Veja a discussão em Fearnside, 2002a). As estima- Manaus: em 9 medidas por Junk & Piedade, 1997, tivas de emissões aqui apresentadas são os pontos p. 170) estas plantas acumularam, em média, 5,67 médios entre os extremos dos resultados produzi- Mg/ha de peso seco (DP=1,74, variação=3,4-8,7). dos para a porcentagem emitida junto às turbinas. O valor proporcional para um ano de crescimento Acredita-se que este valor médio seja conservador. linear seria 22,7 Mg/ha, ou mais que o dobro do valor presumido para a zona de deplecionamento Deve ser lembrado que, quando Belo Monte e de Babaquara. Uma medida da biomassa acima do Babaquara entrarem em operação, haverá uma cer- solo de gramíneas até 1,6 mês após a exposição de ta compensação entre as duas represas que reduz o terras de várzea no Lago Mirití indica uma taxa de efeito global da incerteza relativo à porcentagem de acúmulo de matéria seca equivalente a 15,2 Mg/ha/ metano dissolvido que é liberado junto às turbinas. ano (P.M. Fearnside, dados não publicados). A ferti- Quando for usada uma baixa estimativa para este lidade do solo nas zonas de sedimentação de várzea parâmetro, a emissão em Babaquara fica reduzida, é maior do que em zona de deplecionamento de um mas o CH4 não liberado é repassado para a Belo reservatório, mas uma suposição da ordem de meta- Monte, onde por conseguinte aumentam as emis- de da taxa de crescimento da várzea parece segura. sões por outros caminhos (emissões de superfície e Não obstante, este é um ponto importante de incer- emissões no canal de adução e nos gargalos). teza no cálculo. As fontes de carbono para emissões de CH4 Taxas de decomposição também são importan- nos primeiros anos são dominadas por liberação de tes, e medidas sob condições anaeróbicas em reser- carbono instável do solo (Figura 2). Embora faltem vatórios não são disponíveis. Acredita-se que a de- medidas desta liberação para qualquer reservatório, composição da vegetação herbácea na várzea oferece a evolução dos valores para emissão aos valores para um paralelo adequado. Em medidas sob condições concentração de CH4 aos 30 m de profundidade, inundadas em várzea de água branca, a decompo- usando valores observados nesta faixa nos primeiros sição de três espécies (Furch & Junk, 1997, p. 192, anos, especialmente em Petit Saut, resulta em uma Junk & Furch, 1991) e uma experiência em um tan- trajetória realística de concentrações de CH4 e de emissões desta fonte. que de 700 litros com uma quarta espécie (Furch & Junk, 1992, 1997, p. 195) indicaram a fração de Mais importantes são as incertezas relativas peso seco perdida depois de um mês de submersão, à emissão de CH4 depois que o pico inicial passe. em média, de 0,66 (DP = 0,19 variação=0,425-0,9). Muito menos dados de reservatórios amazônicos O valor mais baixo (0,425) é da espécie medida na As Hidrelétricas de Belo Monte e 269 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa experiência no tanque, onde a anoxia da água foi produz um pulso grande e renovável de CH4 dissol- constatada depois de aproximadamente um dia. Se vido em reservatórios, não há dúvida. Um caso rele- as medidas sob condições naturais incluíssem algu- vante é a experiência na hidrelétrica de Três Marias, ma decomposição aeróbia, a taxa média para con- no Estado de Minas Gerais, onde uma flutuação ver- dições totalmente anóxicas poderia ser um pouco tical de 9 m no nível da água resultou na exposição abaixo da média para as quatro espécies usadas aqui. e inundação periódica de uma zona de depleciona- As taxas de decomposição aeróbica para macró- mento grande, com um pico grande subseqüente de fitas encalhadas determinam o quanto dessa biomas- emissões de metano pela superfície do lago (Bodhan sa ainda esteja presente se o nível d’água fosse subir Matvienko comunicação pessoal, 2000). Até mesmo novamente antes da decomposição ser completa. na idade muito avançada de 36 anos, o reservató- Uma medida de macrófitas mortas no Lago Mirití rio de Três Marias emite metano por ebulição em até 1,6 mês após o encalhamento indica uma per- quantidades que excedem em muito as emissões de da de 31,4% do peso seco por mês (P.M. Fearnside, superfície de todos os outros reservatórios brasilei- dados não publicados). O número de observações é ros que foram estudados, inclusive Tucuruí, Samuel mínimo (três parcelas de 1 m2). e Balbina (Rosa et al., 2002, p. 72). O manejo da água em Babaquara também é im- Uma fonte adicional de incerteza é o destino portante para determinar a quantidade de emissão da carga dissolvida de CH4 quando a água atraves- da zona de deplecionamento. Quanto mais tempo o sa os 17 km do canal de adução de Belo Monte e reservatório seja mantido a um nível baixo, mais vege- pelos quatro conjuntos de gargalos que separam as tação cresce na zona de deplecionamento. A liberação pequenas bacias hidrográficas inundadas que com- subsequente de CH põem o Reservatório dos Canais. Parte do metano 4 quando a zona de depleciona- mento for inundada mais que compensa para o efeito é emitida, parte é oxidada, e o resto é passado para na direção oposta que os baixos níveis d’água têm na o Reservatório dos Canais. Os parâmetros usados redução da profundidade até a entrada da turbina em para isto estão baseados na suposição de que o canal Babaquara, e, portanto, na concentração de CH na (largura na superfície de aproximadamente 526 m, 4 3 água que passa pelas turbinas. As presunções para uso com um fluxo em plena capacidade de 13.900 m / d’água utilizadas no cálculo resultam em três meses segundo) é semelhante ao trecho do rio Sinnamary, de níveis baixos de água, quatro meses de níveis altos na Guiana francesa, abaixo da barragem de Petit e cinco meses de níveis intermediários. Saut (onde a largura média do rio é 200 m e a vazão média é apenas 267 m3/segundo). Galy-Lacaux et al. A magnitude dos picos sazonais altos de CH4 (1997) calcularam concentrações de metano e fluxos depende da relação entre a quantidade de carbono ao longo de 40 km de rio abaixo da barragem de Petit que degrada e o estoque (e concentração) de CH4 Saut e calcularam as quantidades emitidas e oxida- quando estas variáveis estavam em níveis altos nos das no rio. Os resultados deles indicam que, para o primeiros anos em Petit Saut (i.e., dados de Galy- CH4 dissolvido que entra do rio oriundo da represa, Lacaux et al., 1997, 1999). A natureza da fonte de são liberados 18,7% e são oxidados 81,3% (média de carbono em Petit Saut durante este tempo era di- medidas em três datas, com a porcentagem liberada ferente (acredita-se ter sido principalmente carbo- variando de 14 a 24%). Praticamente toda a libera- no do solo). A verdadeira quantidade de carbono ção e oxidação acontecem dentro nos primeiros 30 degradada anaerobicamente em Petit Saut durante quilômetros. No rio Sinnamary, depois de uma ex- este tempo é desconhecida, e o escalamento que tensão inicial de 4 km onde um processo de mistura empresta confiança aos resultados durante os anos acontece, a concentração de CH4 na água e o fluxo iniciais depois de reservatório encher, quando as da superfície diminuem linearmente, chegando a fontes de carbono eram do mesmo tipo, não dá tan- zero a 30 km abaixo da barragem (i.e., ao longo de ta confiança a estes resultados para os anos posterio- uma extensão de rio de 26 km). Considerando o es- res. Quantificar a relação entre a produção de CH4 toque a cada ponto ao longo do rio, pode-se calcular e a quantidade de decomposição de biomassa macia que, nos primeiros 17 km de rio, são liberados 15,3% (como as macrófitas e especialmente a vegetação da do CH4 e são oxidados 66,5%. No cálculo para Belo zona de deplecionamento) deveria ser uma priori- Monte presume-se que estas porcentagens se apli- dade para pesquisa. No entanto, o resultado geral, cam ao canal de adução, e que o metano restante é isto é, que a vegetação da zona de deplecionamento repassado para o Reservatório dos Canais. 270 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Estimativas para emissão nos gargalos foram a reduzir estas incertezas. No entanto, o presente derivadas a partir de informações sobre o compri- cálculo representa a melhor informação atualmente mento deles e as porcentagens de emissão e oxida- disponível. Estes resultados fornecem um compo- ção que aconteceram ao longo de uma extensão de nente necessário para a atual discussão dos impactos rio de mesmo comprimento abaixo da barragem de potenciais destas represas. Petit Saut. Baseado em um mapa do reservatório (Brasil, ELETRONORTE, s/d [C. 2002]b), o pri- meiro compartimento é conectado ao segundo por COMPARAÇÃO COM COMBUSTÍVEIS três passagens com comprimento médio de 1,6 km, o FÓSSEIS segundo e terceiro compartimento estão conectados Comparações sem descontar por duas passagens com comprimento médio de 1,7 km, o terço e quarto compartimentos estão conecta- As emissões anuais de gases de efeito estufa dimi- dos por duas passagens com comprimento médio de nuem com tempo, mas ainda se estabilizam num nível 1,3 km, e os quarto e quinto compartimentos estão com impacto significativo. A evolução temporal dos conectados por uma passagem larga (embora indubi- impactos de gases de efeito estufa, com emissões con- tavelmente rasa na divisa entre as bacias) que pode ser centradas nos primeiros anos da vida de uma represa, considerada como uma passagem de 0 km de com- é uma das diferenças principais entre represas hidrelé- primento. Supõe-se que as porcentagens de metano tricas e geradoras a combustíveis fósseis em termos de dissolvido liberadas e oxidadas nestes gargalos sejam efeito estufa (Fearnside, 1997b). Dando maior peso aos proporcionais às porcentagens de liberação e oxidação impactos a curto prazo aumenta o impacto das hidrelé- que aconteceram ao longo deste mesmo comprimen- tricas em relação às de combustíveis fósseis. to de rio abaixo da barragem de Petit Saut (baseado nos dados de Galy-Lacaux et al., 1997). A incerteza O carbono deslocado de combustível fóssil pode neste caso é muito maior do que no caso dos valo- ser calculado baseado na suposição de que a alternativa res para estas porcentagens calculadas para o canal de é geração a partir de gás natural. Esta é uma suposição adução porque os gargalos curtos estão dentro da ex- mais razoável do que o petróleo como referência, já que tensão inicial do rio onde um processo mistura estava a expansão atual da capacidade geradora em São Paulo acontecendo. As porcentagens usadas (que são todas e em outras partes da rede elétrica no Centro-Sul do muito baixas) também presumem que o processo pára Brasil está vindo de usinas termoelétricas movidas a ao término do gargalo, em lugar de continuar ao lon- gás e abastecidas pelo novo gasoduto Bolívia-Brasil. O go de alguma distância no próximo compartimento gasoduto já existe e não é considerado como parte das do reservatório. O resultado líquido é que os gargalos, emissões de construção das usinas termoelétricas a gás. considerados em conjunto, só emitem 2,1% do meta- Deslocamento de combustível fóssil é mostrado na no, enquanto são oxidados 9,2% e 88,7% são transmi- Figura 5 em uma base anual. O complexo começa a tidos até o final do reservatório. ganhar terreno em compensar pelas suas emissões de- Assim como no caso das turbinas de Babaquara, pois do ano 15. O saldo líquido de emissões de gases há alguma compensação no sistema para incerteza de efeito estufa em uma base cumulativa é mostrado na nas porcentagens liberadas no canal de adução e nos Figura 6. O complexo somente terá um saldo positivo gargalos. Se forem superestimadas as emissões do em termos de seu impacto no aquecimento global 41 canal de adução e/ou dos gargalos, então a emissão anos depois do enchimento da primeira represa. nas turbinas da casa de força principal de Belo Monte Quanto mais longo é o horizonte de tempo, será subestimada. Observa-se que isto só se aplica aos mais baixo é o impacto médio. Durante os primeiros valores para a porcentagem emitida, não aos valores dez anos o impacto líquido é 4,0 vezes o da alter- usados para a porcentagem de oxidação nestes canais: nativa de combustível fóssil. Depois de vinte anos qualquer erro para cima ou para baixo na porcenta- o impacto líquido ainda é 2,5 vezes maior que o do gem oxidada não seria compensado por uma mudan- combustível fóssil, enquanto para o horizonte de ça na direção oposta nas emissões das turbinas. tempo completo de 50 anos o projeto repaga a sua Em resumo, incertezas múltiplas existem no dívida de aquecimento global (presumindo que é cálculo atual. Pesquisa futura, especialmente se for sem juros, isto é, calculada com desconto zero), com direcionada aos parâmetros para os quais o mo- a média de impacto total a longo prazo sendo 70% a delo indica que o sistema é mais sensível, ajudará da alternativa de combustível fóssil. As Hidrelétricas de Belo Monte e 271 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa Figura 5. Emissões anuais e substituição de combustível fóssil. Figura 6. Impacto de aquecimento global líquido cumulativo do complexo Belo Monte/Babaquara (Altamira) (sem descontar). O complexo só consegue um saldo positivo depois de 41 anos. 272 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras O efeito do tempo taxa de desconto positiva pesará contra a opção hi- drelétrica (Fearnside 1997b). O papel do tempo é uma parte essencial no debate sobre represas hidrelétricas e na questão do A evolução temporal das emissões de gases de efeito estufa em geral. A maioria das decisões, tais efeito estufa aumenta mais o impacto da represa como uma decisão para construir uma hidrelétrica, quando são contadas as emissões do cimento, aço é baseada em cálculos financeiros de custo/benefício e combustível fóssil usados na construção da obra. que dão um valor explícito ao tempo, aplicando uma As emissões de construção da barragem vêm anos taxa de desconto a todos os custos e benefícios futu- antes de qualquer geração de eletricidade. Uma aná- ros. A taxa de desconto é essencialmente o oposto de lise de “cadeia completa de energia”, ou FENCH, uma taxa de juros, como por exemplo, o retorno que incluiria todas estas emissões. Porém, as emissões de um investidor poderia ganhar em uma caderneta de construção são uma parte relativamente pequena do poupança em um banco. Com uma poupança, quan- impacto total. São mostradas as emissões líquidas to mais tempo se espera, maior a quantia monetária anuais descontadas a taxas de até 3% na Figura 7. na conta, já que o saldo é multiplicado por uma por- Se apenas o equilíbrio instantâneo é considerado, o centagem fixa ao término de cada período de tempo complexo substitui por mais carbono equivalente do e os juros resultantes são acrescentados ao saldo para que emite começando no ano 16, independente da o próximo período. Com uma taxa de desconto, o taxa de desconto. Depois disso o complexo começa valor atribuído a quantidades futuras diminui, em a pagar a sua dívida ambiental referente às grandes lugar de aumentar, por uma porcentagem fixa em emissões líquidas dos primeiros 15 anos. cada período de tempo. Se um projeto como uma As emissões cumulativas descontadas chegam a barragem hidrelétrica produz grandes impactos nos um pico no ano 15, mas não alcançam o ponto de primeiros anos, como o tremendo pico de emissões ter um saldo positivo até pelo menos 41 anos depois de gás de efeito estufa mostrado aqui, enquanto os que o primeiro reservatório esteja cheio (Figura 8). benefícios pela substituição de combustível fóssil so- Aplicar uma taxa de desconto alonga substancial- mente se acumulam a longo prazo, então qualquer mente o tempo necessário para alcançar este ponto. Figura 7. Emissões líquidas anuais descontadas. Em uma base anual, o complexo começa a reembolsar suas emissões iniciais depois do ano 15, independente de taxa de desconto. As Hidrelétricas de Belo Monte e 273 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa Figura 8. Emissões cumulativas descontadas. Descontando estende o tempo precisado para o complexo para conseguir um saldo positivo em termos de seu impacto acumulado. O efeito de taxas de desconto anuais diferen- de temperatura seria essencialmente permanente, au- tes é mostrado na Figura 9. Com desconto zero, o mentando as probabilidades de secas e de outros im- impacto líquido médio representa um ganho anual pactos ambientais. Qualquer adiamento nas emissões de 1,4 milhões de Mg C (a média de 50 anos na de gases de efeito estufa, e do aumento conseqüente Tabela 7), mas o impacto relativo atribuído à opção da temperatura, então representa um ganho das vi- hidrelétrica aumenta muito quando o valor tempo das humanas e outras perdas que teriam acontecido é considerado. No caso do complexo Belo Monte/ caso contrário ao longo do período do adiamento. Babaquara, qualquer taxa de desconto anual supe- Isto dá para o tempo um valor que é independen- rior a 1,5% resulta ao projeto um impacto maior te de qualquer perspectiva “egoísta” da geração atual. sobre o efeito estufa do que a alternativa de com- Apesar dos benefícios de dar valor ao tempo para fa- bustível fóssil. São mostradas taxas de desconto de vorecer decisões que adiam o efeito estufa, chegar a até 12%. Embora este autor não defenda o uso de um acordo político sobre os pesos apropriados para taxas de desconto tão altas como estas (Fearnside, o tempo é extremamente difícil. O curso de menor 2002b,c), um contingente importante nos debates resistência nas primeiras rodadas de negociações so- sobre a contabilidade de carbono (por exemplo, o bre o Protocolo de Kyoto foi de usar um horizonte Instituto Florestal Europeu) defende o uso das de tempo de 100 anos, sem descontar ao longo deste mesmas taxas de desconto para carbono como para período, como o padrão para comparações entre os dinheiro, e as análises financeiras para Belo Monte diferentes gases de efeito estufa (i.e., o potencial de usam uma taxa de desconto de 12% para dinheiro aquecimento global de 21 adotado para metano, ou (Brasil, ELETRONORTE, 2002, Tomo I, p. 6-84). ainda mais com o valor de 25 adotado no relatório Em termos de efeito estufa, uma série de ar- mais recente do IPCC: Forster et al., 2007, p. 212). gumentos fornece uma razão para dar um valor ao Se formulações alternativas são usadas que dão um tempo nos cálculos sobre emissões de gases de efeito peso ao tempo, o impacto do complexo Belo Monte/ estufa (Fearnside, 1995b, 1997b, 2002b,c, Fearnside Babaquara aumentaria, e, mais importante ainda, au- et al., 2000). O efeito estufa não é um evento pontual, mentaria o impacto de hidrelétricas comparadas a como uma erupção vulcânica, já que uma mudança outras possíveis opções para provisão de energia. 274 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Figura 9. Efeito de taxa de desconto em emissões líquidas anuais médias ao longo de um horizonte de tempo de 50 anos. Se for usado uma taxa de desconto anual de 1,5% ou mais, o complexo tem um impacto maior sobre o efeito estufa do que a alternativa de combustível fóssil. IMPLICAÇÕES PARA A POLÍTICA DE que o quadro que é retratado freqüentemente por DESENVOLVIMENTO proponentes de projeto. A eletricidade produzida é para uma rede que apóia um setor rapidamente cres- A conclusão do atual estudo de que as barragens cente de indústrias electro-intensivas subsidiadas, propostas de Belo Monte e Babaquara (Altamira) tais como o beneficiamento de alumínio para expor- produziriam emissões líquidas significativas de ga- tação. Apenas 2,7 pessoas são empregas por GWh ses de efeito estufa durante muitos anos é uma con- de eletricidade consumida no setor de alumínio no sideração importante para os debate em curso no Brasil, recorde apenas ultrapassado por usinas de Brasil e em outros países que enfrentam decisões ferro-liga (1,1 emprego/GWh), que também conso- semelhantes. A emissão adicional de gás de efeito mem quantias grandes de energia para um artigo de estufa de 11,2 milhões de Mg de carbono CO2- exportação (Bermann & Martins, 2000, p. 90). Uma equivalente por ano durante os primeiros dez anos discussão nacional sobre o uso que é feito da eletri- representa mais que a emissão atual de combustível cidade do País deveria ser uma condição prévia para fóssil queimado na área metropolitana de São Paulo, qualquer decisão grande para aumentar capacidade com 10% da população do Brasil. A tomada racional geradora, como no caso da construção de barragens de decisões sobre propostas para represas hidrelé- no rio Xingu. O contraste entre os custos sociais de tricas, como é o caso com qualquer projeto de de- barragens e os benefícios escassos que elas provê- senvolvimento, requer uma avaliação abrangente dos em por meio das indústrias eletrointensivas é parti- impactos e dos benefícios das propostas, de forma cularmente pertinente aos planos para o rio Xingu que os prós e contras podem ser comparados e pu- (Bermann, 2002, Fearnside, 1999). blicamente debatidos antes de tomar decisões sobre a construção do projeto. Gases de efeito estufa re- Do ponto-de-vista de gases de efeito estufa, presentam um impacto que, até agora, tem recebido o fato que energia é usada para uma indústria de pouca consideração nestas decisões. exportação subsidiada significa que a linha de base contra a qual são comparadas as emissões hidrelé- No caso de Belo Monte e Babaquara (Altamira), tricas deveria incluir a opção de simplesmente não é importante reconhecer que o lado de benefício do produzir parte da energia esperada das barragens, em equilíbrio seja consideravelmente menos atraente do lugar da linha de base usada aqui de gerar em cheio As Hidrelétricas de Belo Monte e 275 Altamira (Babaquara) como Fontes de Gases de Efeito Estufa o equivalente da energia das barragens por meio de aumentaria mais o impacto calculado para hidrelé- combustíveis fósseis. Porque o Brasil poderia esco- tricas em comparação com geração com combustí- lher não se expandir ou manter as suas indústrias de veis fósseis. O valor de 41 anos para uma emissão exportação eletrointensivas, uma linha de base alter- de gases de efeito estufa desta magnitude é até mes- nativa desse tipo faria com que os resultados sobre mo significativo a zero desconto. O complexo Belo emissões fossem até mesmo menos favoráveis para a Monte/Babaquara não terá um saldo positivo até o energia hidrelétrica do que os resultados calculados final do horizonte de tempo de 50 anos com taxas de no atual trabalho. desconto anuais superiores de 1,5%. As barragens do rio Xingu representam um desa- Os casos de Belo Monte e das outras barragens fio ao sistema de licenciamento ambiental por causa do Xingu ilustram a necessidade absoluta de se con- da grande diferença entre o impacto a primeira bar- siderar as interligações entre projetos diferentes de ragem (Belo Monte) e o das represas subsequentes, infra-estrutura e incluir estas considerações como especialmente a Babaquara (Altamira). O sistema de uma condição prévia para construir ou autorizar licenciamento ambiental atualmente só examina os quaisquer dos projetos. Adiar a análise dos projetos impactos de um projeto de cada vez, não o impacto mais controversos não é uma solução. combinado de projetos interdependentes como estes. Porque os maiores impactos (inclusive emissões de gases de efeito estufa) de uma decisão para construir AGRADECIMENTOS a Belo Monte seria causado pela represa ou represas O Conselho Nacional de Desenvolvimento que seriam construídas por conseguinte rio acima, o Científico e Tecnológico (CNPq AI 470765/01-1) sistema de licenciamento deve ser reformado para e o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia contender com este tipo de situação. (INPA PPI 1-3620) contribuíram com apoio finan- ceiro. A maior parte do trabalho foi atualizado de par- CONCLUSÕES te de uma discussão mais ampla sobre as barragens no rio Xingu (Fearnside, 2005c). Agradeço a Neusa A complexa hidrelétrica Belo Monte/Babaquara Hamada, Reinaldo Barbosa, Glenn Switkes e ao seu (Altamira) teria um impacto significativo sobre o sogro pelos comentários. Esta é uma republicação de efeito estufa, embora a quantidade grande de ener- Fearnside (2009). gia produzida compensaria eventualmente as emis- sões iniciais altas. As hipóteses usadas aqui indicam que 41 anos seriam necessários para o complexo LITERATURA CITADA chegar a ter um saldo positivo em termos de impac- ABRIL, G.; GUÉRIN, F.; RICHARD, S.; DELMAS, R.; to sobre o aquecimento global no cálculo mais favo- GALY-LACAUX, C.; GOSSE, P.; TREMBLAY, A.; rável a hidrelétricas, sem aplicação de nenhuma taxa VARFALVY, L.; dos SANTOS, M.A. & MATVIENKO, de desconto. Apesar de incerteza alta sobre vários B. 2005. Carbon dioxide and methane emissions and the parâmetros fundamentais, a conclusão geral parece carbon budget of a 10-years old tropical reservoir (Petit-Saut, ser robusto. Isto é, que o complexo teria impacto French Guiana). Global Biogeochemical Cycles, 19: GB 4007, significativo, e que o nível de impacto a longo pra- doi: 10.1029/2005GB002457. zo, embora muito mais baixo do que nos primeiros ALBRITTON, D.L.; DERWENT, R.G.; ISAKSEN, I.S.A.; anos, seria mantido em níveis apreciáveis. LAL, M; WUEBBLES & D.J. 1995. Trace gas radiative forcing indices. p. 205-231 In: J.T. Houghton, L.G. Meira A presente análise inclui várias suposições Filho, J. Bruce, Hoesung Lee, B.A. Callander, E. Haites, N. conservadoras relativo às porcentagens de metano Harris & K. Maskell, (eds.). Climate Change 1994: Radiative emitidas por caminhos diferentes. Valores mais al- Forcing of Climate Change and an Evaluation of the IPCC IS92 tos para estes parâmetros estenderiam ainda mais o Emission Scenarios. Cambridge University Press, Cambridge, Reino Unido, 339p. tempo necessário para o complexo ter um saldo po- sitivo em termos de aquecimento global. BERMANN, C. 2002. 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Hidrelétricas na Amazônia 279 Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras Capítulo 15 Gases de Efeito Estufa no EIA-RIMA da Hidrelétrica de Belo Monte Philip M. Fearnside Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). Av. André Araújo, 2936 - CEP: 69.067-375, Manaus, Amazonas, Brasil. E-mail: pmfearn@inpa.gov.br Publicação original: Fearnside, P.M. 2011. Gases de Efeito Estufa no EIA-RIMA da Hidrelétrica de Belo Monte. Novos Cadernos NAEA 14(1): 5-19. 280 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO ambiental, Metano, Tomada de decisão, Represas, Reservatórios O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da hi- drelétrica de Belo Monte, proposta pelo Governo A proposta hidrelétrica de Belo Monte é con- Federal para construção no rio Xingu, no Pará, mos- siderada pelo Governo Federal como sendo de tra quão pouco o processo de avaliação ambiental alta prioridade no Programa de Aceleração do no Brasil avançou desde 1986, quando o EIA ficou Crescimento (PAC). É fundamental o debate sobre obrigatório para barragens e outros projetos de in- esta obra: de como ela se insere em questões maio- fraestrutura. O documento evita completamente os res sobre o desenvolvimento da Amazônia; o uso da impactos principais que a barragem teria induzindo energia do País para exportação de alumínio e ou- a destruição de áreas muito mais extensas a mon- tros produtos de alto impacto ambiental; e a maneira tante da represa, criando uma “crise planejada” que com que são tomadas as decisões. Entre os impactos proveria a justificação para criar reservatórios muito de Belo Monte e de outras barragens amazônicas é a maiores rio acima, particularmente a barragem de emissão de gases de efeito estufa. Qualquer decisão Babaquara, ou “Altamira”, que inundaria 6.140 km2, racional precisa ser baseada numa avaliação dos reais tudo em floresta tropical e a maior parte em terra benefícios e os reais custos da obra, inclusive o seu indígena. O relatório também subestima grosseira- papel no aquecimento global. mente as emissões de gases de efeito estufa da re- presa, alegando que as emissões de metano seriam A BELO MONTE COMO INDUTORA DA mínimas baseado em uma estimativa que ignora DESTRUIÇÃO DO XINGU completamente os estudos na literatura científi- ca que indicam emissões significantes da água que Nunca se deve perder de vista a questão das barra- atravessa as turbinas de hidrelétricas. O documento gens planejadas a montante de Belo Monte. O plano considera apenas as emissões relativamente peque- original para o rio Xingu compunha um total de seis nas que ocorrem por meio de bolhas e de difusão barragens, a maior sendo a hidrelétrica de Babaquara pela superfície do próprio reservatório. Porque a com 6.140 km2, extensão duas vezes maior que vazão do rio Xingu é altamente sazonal, a eletrici- Balbina ou Tucuruí (BRASIL, ELETROBRÁS, dade que pode ser produzida por Belo Monte (sem 1987). As cinco barragens acima de Belo Monte, as represas, não mencionadas, rio acima) é insufi- sendo em grande parte em terras indígenas, foram ciente para justificar o custo da barragem, as linhas vistas como politicamente inviáveis a partir de ou- de transmissão, subestações e outra infraestrutura. O tubro de 1988, quando a nova Constituição exigiu EIA focaliza exclusivamente na própria barragem, a aprovação do Congresso Nacional para qualquer assim ignorando a inviabilidade econômica do pro- hidrelétrica em área indígena (Artigo 231, Parágrafo jeto global e as implicações disto para a construção 3). E, sobretudo a partir de fevereiro de 1989, quan- de represas altamente prejudiciais rio acima. Muito do a manifestação de Altamira deixou claro o grau da eletricidade a ser gerada será usada para produ- de resistência local a esses planos. Após a manifes- ção de alumina e alumínio para exportação, que é tação de Altamira, menções às barragens a montan- um dos usos com o menor benefício possível para a te de Belo Monte sumiram do discurso público da população brasileira, devido à quantidade extrema- ELETRONORTE, retornando em 1998, quando mente pequena de emprego criado por cada GWh a hidrelétrica de Babaquara reapareceu repentina- de energia. Uma discussão nacional sobre como a mente, com um novo nome (barragem de Altamira), energia elétrica é usada no País nunca aconteceu, e listada no Plano Decenal de ELETROBRÁS para agora deveria ser uma condição prévia para quais- o período 1999-2008 (BRASIL, ELETROBRÁS, quer dos projetos de construção de barragens pla- 1998, p. 145). A sua conclusão foi indicada como nejadas na Amazônia. Uma vez tomadas decisões prevista para 2013, ou seja, sete anos após a conclu- racionais sobre o uso de energia, os custos e benefí- são prevista, na época, para Belo Monte. cios ambientais e sociais de cada barragem proposta Um estudo de viabilidade e um Estudo de devem ser avaliados de modo justo e aberto, o que Impacto Ambiental (EIA) e um Relatório de Impacto não foi o caso com Belo Monte até agora. Ambiental (RIMA) foram preparados para Belo Palavras-Chave: Alumínio, Aquecimento global, Monte em 2002 (BRASIL, ELETRONORTE, Barragens, Efeito estufa, Emissões de gás de efeito es- 2002, s/d [2002]). No entanto, decisões judiciais tufa, Hidrelétricas, Impacto ambiental, Licenciamento impedirem que essa versão do EIA-RIMA fosse Gases de Efeito Estufa no 281 EIA-RIMA da Hidrelétrica de Belo Monte oficialmente entregue para aprovação pelo Instituto sete anos após a construção de Belo Monte. Assim, Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais há necessidade de uma ferramenta jurídica para que Renováveis-IBAMA. As versões de 2002, diferente compromissos deste tipo (de não fazer determinadas dos planos dos anos 1980, excluíram do texto cálculos obras) sejam feitos de forma realmente irrevogável. que incluíssem as barragens a montante. No entan- to, o texto incluiu a menção explícita de que qual- A história recente do setor hidrelétrico na quer barragem a montante a Belo Monte aumentaria Amazônia não é promissora. Há dois casos docu- bastante a produção de energia da usina (BRASIL, mentados onde as autoridades desse setor diziam ELETRONORTE, s/d [2002], p. 6-82). Os auto- não dar continuidade à determinada obra devido res dos 36 volumes do atual EIA-RIMA (BRASIL, ao impacto ambiental, mas na realidade, quando ELETROBRÁS, 2009) não mencionaram este de- chegou a hora no cronograma, fizeram exatamente talhe, que diz respeito ao assunto mais básico da o que haviam prometidos não fazer. De fato, o que discussão sobre Belo Monte: se esta seria, de fato, a aconteceu seguiu os planos originais, sem nenhuma única barragem no rio Xingu. Os planos em 2002 modificação resultante das promessas feitas por pre- foram para uma capacidade instalada de 11.181,3 ocupações ambientais. Um caso foi o enchimento MW, mas no próximo ano foram consideradas con- de Balbina, que era para permanecer durante vários figurações da barragem com 5.500, 5.900 e 7.500 anos na cota de 46 m acima do nível do mar, mas MW, para serem mais razoáveis com a vazão natu- foi diretamente enchido, além da cota originalmente ral do rio Xingu, sem a regulação da vazão por meio prevista de 50 m (FEARNSIDE, 1989). O outro de Babaquara/Altamira (Pinto, 2003). No entanto, a caso foi Tucuruí-II, onde a construção foi iniciada barragem de Babaquara/Altamira continuou a ser in- em 1998, sem um EIA-RIMA, baseado no argu- cluída em apresentações dos planos do setor elétrico mento (duvidoso) de que sua construção não ocasio- (e.g., BRASIL, MME-CCPESE, 2002; SANTOS, naria impacto ambiental, por não aumentar o nível 2004), e verbas foram incluídas no orçamento federal da água acima da cota de 70 m de Tucuruí-I, mas, de 2005 para um estudo de viabilidade melhorado da na realidade, a partir de 2002 o reservatório sim- barragem de Altamira/Babaquara. plesmente foi operado na cota de 74 m conforme o plano original (ver FEARNSIDE, 2001, 2006a). Em 2005, o Congresso Nacional subitamente Estes casos (Balbina e Tucurui-II) são paralelos a aprovou a construção de Belo Monte, sem debate atual situação de Belo Monte e a promessa de não e muito menos com consultas aos povos indígenas, construir Babaquara/Altamira. como mencionado na Constituição. A facilidade com que a proteção da Constituição foi rompi- da no caso de Belo Monte levantou a possibilida- ESTRATÉGIA DE AVESTRUZ NA QUESTÃO de de contar com a regulação do rio Xingu com DE “ENERGIA LIMPA” Babaquara/Altamira. Embora nenhuma conexão Hidrelétricas emitem metano, um gás de efeito com Babaquara/Altamira seja admitida pelo setor, estufa com 25 vezes mais impacto sobre o aqueci- a evolução dos planos para Belo Monte seguiu exa- mento global por tonelada de gás do que o gás car- tamente como este autor previu (FEARNSIDE, bônico, de acordo com as o quarto relatório do Painel 2006a): os desenhos revisados com potências mais Intergovernamental de Mudanças do Clima (IPCC) modestas para Belo Monte foram abandonados, (FORSTER et al., 2007). Estudos mais recentes, com o plano atual até ultrapassando um pouco a potência prevista no plano de 2002, ficando em que incluem efeitos indiretos não incluídos no valor 11.233,1 MW. do IPCC, indicam um impacto 34 vezes o de CO2, considerando o mesmo escala de tempo de 100 anos O Conselho Nacional de Política Energética (SHINDELL et al., 2009). O EIA-RIMA de Belo (CNPE) divulgou em 17 de julho de 2008 uma re- Monte afirma que “uma das conclusões principais solução dizendo que não seriam construídas mais dos estudos realizados até o momento indica que, em hidrelétricas no rio Xingu, além de Belo Monte geral, as UHEs [Usinas Hidrelétricas] apresentam (OESP, 2008). Trata-se de uma notícia muito bem menores taxas de emissão de GEE [Gases de Efeito vinda, mas que pode ser revertida quando chegar o Estufa] do que as Usinas Termelétricas (UTEs) com a momento no cronograma para construir Babaquara/ mesma potência” (BRASIL, ELETROBRÁS, 2009, Altamira. Se for seguir o cronograma previsto no Vol. 5, p. 47). Infelizmente, pelo menos para a época Plano Decenal 1999-2008, este momento chegaria dos inventários nacionais sob a Convenção de Clima 282 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras (1990), todas as “grandes” hidrelétricas na Amazônia BAMBACE et al., 2007; RAMOS et al., 2009), nem brasileira (Tucuruí, Samuel, Curuá-Una e Balbina) os estudos do grupo na Universidade de Quebec, no tinham emissões bem maiores do que a geração da Canadá, que também estudou barragens amazônicas mesma energia com termelétricas (FEARNSIDE, (DUCHEMIN et al., 2000), nem os estudos do la- 1995, 2002, 2005a,b). O EIA-RIMA afirma que “o boratório de Bruce Forsberg, no Instituto Nacional trabalho realizado no rio Xingu, na área do futuro re- de Pesquisas da Amazônia-INPA (KEMENES et servatório do AHE [Aproveitamento Hidrelétrica] al., 2006, 2007, 2008; KEMENES & FORSBERG, Belo Monte, aponta para a estimativa de emissão 2008), e, tão pouco, as minha próprias contribui- de metano de 48 kg/km2/dia, da mesma ordem de ções a essa área, também no INPA (FEARNSIDE, grandeza que os reservatórios de Xingó e Miranda” 1995, 1996, 1997, 2002, 2004a,b, 2005a,b,c, 2006b,c, (BRASIL, ELETROBRÁS, 2009, Vol. 5, p. 47). 2007, 2008a,b). Os resultados de todos esses grupos Xingó e Miranda são duas hidrelétricas não amazôni- contradizem, de forma esmagadora, o teor da EIA- cas que os autores calculam ter um impacto bem me- RIMA em sugerir que hidrelétricas têm pequenas nor do que uma termoelétrica do tipo mais eficiente emissões de metano. (BRASIL, ELETROBRÁS, 2009, Vol. 5, p. 48). A conclusão do grupo que assina a parte do Os autores calculam essas baixas emissões de EIA-RIMA sobre emissões supostamente modestas metano das hidrelétricas por ignorar duas das prin- de metano pelas hidrelétricas tem sido desacreditada cipais rotas para emissão desse gás: a água que passa por observadores independentes no meio acadêmi- pelas turbinas e pelos vertedouros. Essa água é tirada co, devido às obvias omissões da emissão pelas turbi- de uma profundidade suficiente para ser isolada da nas e vertedouros (CULLENWARD & VICTOR, camada superficial do reservatório, e tem uma alta 2006). As Organizações Não Governamentais concentração de metano dissolvido. Quando a pres- (ONGs) vão mais longe, com acusações explícitas são é subidamente reduzida ao sair das turbinas ou de conflito de interesse (McCULLY, 2006). dos vertedouros, muito desse metano é liberado para a atmosfera, como tem sido medido em hidrelétri- A essa altura, o grupo que assina a parte do EIA- cas como Balbina, no Amazonas (KEMENES et al., RIMA sobre emissões não tem a menor desculpa para 2007) e Petit Saut, na Guyana Francesa (ABRIL et omitir as emissões das turbinas e vertedouros, sendo al., 2005; Richard et al., 2004). O EIA-RIMA con- que o primeiro autor dessa parte do EIA-RIMA tem sidera apenas o metano emitido na superfície do sido presente em múltiplas reuniões, onde resultados próprio lago, e nem menciona as emissões das turbi- que contradizem as suas conclusões foram apresenta- nas e vertedouros. dos, incluindo o evento da UNESCO em dezembro de 2007, ocorrido em Foz de Iguaçu, que é mencio- A revisão da literatura incluída nos EIA-RIMA nando no EIA (BRASIL, ELETROBRÁS, 2009, sobre emissões de gases por hidrelétricas está res- Vol. 5, p. 50). Ele até tem o seu nome incluído na trita aos estudos dos grupos ELETROBRAS e lista de autores de um trabalho sobre as emissões em FURNAS, como se o resto do mundo não existisse Petit Saut no qual os dados desmentem frontalmen- (ver BRASIL, ELETROBRÁS, 2009, Vols. 5 & 8). te as conclusões dos grupos da ELETROBRÁS e A revisão é tão seletiva que não há a menor chance de ser explicado por omissões aleatórias. Apenas são FURNAS (ABRIL et al., 2005). mencionados trabalhos que não desmentem a crença Fingir que emissões apenas ocorrem pela super- dos autores do EIA-RIMA, de que as emissões de fície do lago, sem considerar a água passando pelas hidrelétricas são muito pequenas. Não é menciona- turbinas e vertedouros, é uma distorção ainda mais do o corpo volumoso de pesquisa na hidrelétrica de grave no caso de Belo Monte do que para outras Petit Saut, na Guyana Francesa, onde há uma série barragens, uma vez que a área do reservatório da de monitoramento de metano bem mais completa Belo Monte é relativamente pequena, porém, com do que em qualquer barragem brasileira (GALY- grande volume de água passando pelas turbinas. No LACAUX et al., 1997, 1999; DELMAS et al., caso de Belo Monte junto com Babaquara/Altamira, 2004; RICHARD et al., 2004; ABRIL et al., 2005; as emissões das turbinas são enormes, especialmen- GUÉRIN et al., 2006). Também não são mencio- te nos primeiros anos, e esse conjunto de barragens nados os trabalhos do grupo que estuda o assunto levaria 41 anos para começar a ter um saldo positivo no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais-INPE em termos do efeito estufa (FEARNSIDE, 2005c). (de LIMA, 2002; de LIMA et al., 2002, 2005, 2008; Concentrar as análises de emissões das hidrelétricas Gases de Efeito Estufa no 283 EIA-RIMA da Hidrelétrica de Belo Monte apenas na superfície dos reservatórios, como foi fei- medida em que ficou óbvio que o custo de linhas to no EIA-RIMA, é igual a não observar um elefan- de transmissão até São Paulo seria excessivo, sendo te no meio de uma pequena sala, por fixar os olhos que a produção em plena capacidade de Belo Monte em um dos cantos da sala. (sem Babaquara) é de apenas 2-3 meses ao ano. O resto do tempo a linha de transmissão teria que ficar O CUSTO DE BELO MONTE com energia reduzida, e durante vários meses ficaria sem energia alguma. O custo de Belo Monte é um fator essencial no A solução encontrada é de ter uma linha de trans- realismo, ou na falta de realismo, do cenário oficial missão para a região Sudeste, com capacidade menor de ter apenas uma barragem (Belo Monte) no rio (e cujos detalhes e custos são ainda indefinidos). A Xingu. Estimativas atuais do custo para a imple- mudança não só diminua o benefício social da ener- mentação de Belo Monte variam de R$7 bilhões gia, mas também aumenta o impacto ambiental. O (estimativa do governo), a R$20-30 bilhões (estima- plano original de transmitir o grosso da energia para tiva de CPFL Energia) e R$30 bilhões (estimativa o Sudeste casaria com o ritmo anual de geração de de Alstom) (CANAZIO, 2009). Vale à pena men- energia nas hidrelétricas daquela região, que é o in- cionar que há uma longa tradição em obras hidrelé- verso do ritmo do rio Xingu. Quando as usinas do tricas, assim como em outros tipos de grandes obras, Sul-Sudeste produzem pouco, a diferença seria pre- de ter custos reais muito além das previsões iniciais. enchida pela energia recebida de Belo Monte, assim No caso de Belo Monte, grande parte da discussão evitando os custos e as emissões de gases de efeito omite muitos dos custos evidentemente necessários: estufa com geração com combustíveis fósseis. Porém, linhas de transmissão, subestações, etc. com a opção de usar a geração altamente sazonal de Um estudo do Fundo de Estratégia de Belo Monte para abastecer usinas de alumina e alumí- Conservação mostra a inviabilidade de Belo Monte nio, a Belo Monte acaba justificando a construção de sozinha, com apenas 2,8% de chance de compen- grandes usinas termoelétricas em Jurití e Barcarena, sar o investimento se forem consideradas as esti- para suprir energia às indústrias do setor de alumínio mativas dos vários riscos, e um máximo de apenas durante o resto do ano. Assim as emissões de gases de 35,5% de chance de ser financeiramente viável se for efeito estufa aumentam ainda mais, além de consumir usada no cálculo uma série de presunções otimistas ainda mais dinheiro brasileiro. (SOUSA JÚNIOR et al., 2006, p. 72-74). O estudo O grande beneficiário seria a China. Em negocia- conclui que o projeto anda em direção a uma “crise ções decorrentes de uma visita presidencial a China planejada”, onde, uma vez construído a Belo Monte, em 2004, foi acordada a implementação de uma usi- a necessidade de também construir a Babaquara/ na sino-brasileira para alumina em Barcarena (PA), Altamira vai ser subitamente descoberta, e essa obra que se espera ser a maior do mundo quando finali- muito mais danosa vai, então, se concretizar. O mes- zada (PINTO, 2004). A usina sino-brasileira (ABC mo cenário tem sido previsto por este autor há déca- Refinaria) espera produzir 10 milhões de toneladas das (FEARNSIDE, 1989, 1999, 2001, 2006a). de alumina anualmente, um marco originalmente previsto para ser atingido em 2010. Isto seria maior O USO DA ENERGIA que a produção anual de sete milhões de toneladas da empresa Nipo-brasileira (Alunorte) no mesmo local A questão de qual uso vai ser feito da energia — um aumento enorme quando comparado à pro- produzida deve ser a primeira pergunta a ser res- dução atual de Alunorte de 2,4 milhões de toneladas pondida, antes de se propor uma hidrelétrica. Neste anuais (PINTO, 2005). Além disso, a empresa Alcoa, caso, este aspecto não foi discutido e vem sendo dos Estados Unidos, planeja usar energia transmiti- apresentado de forma enganosa, implicando que a da de Belo Monte para produzir 800 mil toneladas usina irá fornecer energia para os lares da população de alumina anualmente em uma usina nova em Jurití brasileira. De fato, o plano tem evoluído ao longo do (na margem do rio Amazonas em frente à foz do rio planejamento da obra. Inicialmente, uma boa parte Trombetas). A produção anual de alumínio da usina da energia gerada seria transmitida para São Paulo, nipo-brasileira (Albrás) aumentaria de 432 para 700 incluída à rede de distribuição nacional. Os planos mil toneladas (PINTO, 2005) [Obs.: O controle de passaram a destinar a maior parte da energia para Albrás foi vendido a Norsk Hydro, da Noruega, em usinas de alumina e alumínio no próprio Pará, na 2010.]. Também são previstas expansão das usinas 284 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras da Alcoa/Billiton (Alumar) no Maranhão e da usi- empregos) para o resto do mundo. Enquanto isso, po- na CAN (Companhia Nacional de Alumínio) em deriam ser realizadas aquelas discussões ainda inexis- Sorocaba, São Paulo. tentes ou escassas sobre o desenvolvimento econômico O setor de alumínio no Brasil emprega apenas 2,7 da Amazônia, o uso da energia do País, e a maneira pessoas por cada GWh de energia elétrica consumida, com que são tomadas as decisões. um saldo infeliz que apenas perde para as usinas de fer- ro-liga (1,1 emprego/GWh), que também consomem AGRADECIMENTOS grandes quantidades de energia para um commodity de exportação (BERMANN & MARTINS, 2000, p. O Conselho Nacional do Desenvolvimento 90). Diferentemente de produzir metais para o consu- Científico e Tecnológico (CNPq: Proc. 305880/2007- mo dos próprios brasileiros, produzir para exportação é 1; 573810/2008-7; 304020/2010-9), e Instituto essencialmente sem limites em termos das quantidades Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA: que o mundo possa querer comprar. Portanto, não há PRJ13.03) forneceram apoio financeiro. Este trabalho limites sobre o número de hidrelétricas “necessárias” foi atualizado de um parecer preparado para o Painel para essa exportação, a não ser que o País tome uma de Especialistas para Análise crítica do EIA Belo decisão soberana sobre quanto quer exportar desses Monte (FEARNSIDE, 2009), e de textos divulgados produtos, se é que quer exportar uma quantidade qual- no site http://colunas.globoamazonia.com/philipfear- quer. Até hoje, o assunto não foi discutido pela socie- nside. Agradeço à Sheyla Couceiro pelos comentários. dade brasileira. Essencialmente, o resto do mundo está Esta é uma republidação de Fearnside (2011). exportando os impactos ambientais e sociais do seu consumo para o Brasil, país que não só aceita, mas até subsidia e facilita a destruição que isto implica. LITERATURA CITADA A atual história da indústria de alumínio deve dei- ABRIL, G.; GUÉRIN, F.; RICHARD, S.; DELMAS, R.; xar revoltado qualquer brasileiro que tenha um mínimo GALY-LACAUX, C.; GOSSE, P.; TREMBLAY, A.; VARFALVY, L.; dos SANTOS, M. A.; MATVIENKO, de senso patriótico (e.g., PINTO, 1997; BERMANN, B. Carbon dioxide and methane emissions and the carbon 2003; CICCANTELL, 2005; MONTEIRO & budget of a 10-years old tropical reservoir (Petit-Saut, French MONTEIRO, 2007). O suprimento de energia para Guiana). Global Biogeochemical Cycles, v. 19, art. GB 4007, doi: essa indústria de exportação, que é a principal razão de 10.1029/2005GB002457, 2005. ser de Belo Monte, causa os mais variados impactos BAMBACE, L. A. W.; RAMOS, F. M.; LIMA, I. B. T.; ROSA, ambientais e sociais através da construção de hidrelé- R. R. Mitigation and recovery of methane emissions from tricas, além de requerer pesados subsídios de várias tropical hydroelectric dams. Energy, v. 32, 2007, p. 1038-1046. formas, especialmente a construção das barragens com BERMANN, C. Energia no Brasil: Para Quê? Para Quem? Crise e o dinheiro dos contribuintes brasileiros, deixando as Alternativas para um País Sustentável. 2ª Ed. São Paulo, SP: Editora conhecidas faltas de recursos financeiros para saúde, Livraria da Física & Rio de Janeiro, RJ: Federação dos Órgãos educação e outros serviços governamentais. para Assistência Social e Educacional (FASE), 139p., 2003. O aumento da capacidade geradora com a constru- BERMANN, C.; MARTINS, O. S. Sustentabilidade energética no ção de hidrelétricas é sempre apresentado como uma Brasil: Limites e Possibilidades para uma Estratégia Energética “necessidade”, fornecedora de energia para lâmpadas, Sustentável e Democrática. (Série Cadernos Temáticos No. 1) Projeto Brasil Sustentável e Democrático, Rio de Janeiro, RJ: televisores, geladeiras e outros usos nos lares do povo Federação dos Órgãos para Assistência Social e Educacional do País (e.g., BRASIL, MME, 2009). Mal se mencio- (FASE), 151p., 2000. na que grande parte da energia vai para alumínio e ou- BRASIL, ELETROBRÁS. Plano 2010: Relatório Geral, Plano tros produtos eletro-intensivos para exportação, e que a Nacional de Energia Elétrica 1987/2010 (Dezembro de energia já exportada anualmente em forma de lingotes 1987). Rio de Janeiro, RJ: Centrais Elétricas Brasileiras de alumínio excede em muito a produção de qualquer (ELETROBRÁS), 269p., 1987. uma das obras atualmente em discussão. O cenário de BRASIL, ELETROBRÁS. Plano Decenal 1999-2008. referência, ou “linha de base”, para a hipótese de não Rio de Janeiro, RJ: Centrais Elétricas Brasileiras ter a hidrelétrica é sempre apresentado como sendo a (ELETROBRÁS), 1998. geração da mesma energia com petróleo, nuclear, ou BRASIL, ELETROBRÁS. Aproveitamento Hidrelétrico Belo outra fonte indesejável. Mas no caso de Belo Monte, Monte: Estudo de Impacto Ambiental. Fevereiro de 2009. Rio de a alternativa real seria simplesmente não gerar a ener- Janeiro, RJ: Centrais Elétricas Brasileiras (ELETROBRÁS). gia e ficar com menos exportação de alumínio (e de 36 vols., 2009. Gases de Efeito Estufa no 285 EIA-RIMA da Hidrelétrica de Belo Monte BRASIL, ELETRONORTE. Complexo Hidrelétrico Belo Monte: Conservation Strategy Fund (CSF), 90p. (disponível em: Estudos de Viabilidade, Relatório Final. Brasília, DF: Centrais http://www.conservation-strategy.org), 2006. Elétricas do Norte do Brasil (ELETRONORTE), 8 vols., 2002. DUCHEMIN, E.; LUCOTTE, M.; QUEIROZ, A. 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A Midiatização da Ciência: Cenários, Desafios, Possibilidades, Editora da Universidade Estadual da Paraíba (EDUEPB), Campina Grande, PB. 288 p. 288 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras RESUMO geral do público e todos que são difíceis de explicar em uma frase simples. A mídia tem tido um grau de êxito misto em explicar problemas científicos ao público. Enquanto Uma das áreas que melhor ilustra isto é a das hi- alguns assuntos têm sido bem explicados, vários drelétricas na Amazônia. O assunto é quase sempre grandes temas ilustram barreiras no processo de co- apresentado com o enquadramento adotado pelos municação. Uma das áreas que melhor ilustra isto é proponentes das obras, ou seja, uma decisão entre a a das hidrelétricas na Amazônia, inclusive o caso de hidrelétrica e o desenvolvimento do País, ou, então, Belo Monte. Esta barragem, junto com outras que a única alternativa contra um a apagão ou o sacrifico são prováveis para armazenar água rio acima, teria das esperanças dos que ainda vivem sem luz. A pre- um impacto negativo sobre o aquecimento global sunção subjacente, que não está sendo repassada pela durante 41 anos, com a magnitude do impacto sendo mídia, é de que se continue exportando boa parte da maior que a Grande São Paulo durante os primeiros energia na forma de lingotes de alumínio e de outros dez anos. Este impacto negativo se baseia em com- metais eletrointensivos. A primeira pergunta tem paração com geração da mesma energia com com- que ser “O que será feito com a energia?” Só depois bustíveis fósseis. Evidentemente, o impacto relativo disso vem as perguntas sobre os impactos de cada da hidrelétrica seria pior se comparado com medidas obra. No caso de Belo Monte, os proponentes exclu- para aumentar a eficiência de uso de eletricidade ou íram da discussão dos impactos das outras barragens para gerar com fontes como eólica e solar. A opção acima de Belo Monte, e isto foi, em grande parte, de simplesmente não gerar essa energia, que seria simplesmente aceito pela imprensa e não discutido. em grande parte exportado para outros países em Em todos os casos, a questão das emissões de gases forma de lingotes de alumínio, daria o melhor resul- de efeito estufa pelas hidrelétricas tem sido ausente, tado. A idéia de que hidrelétricas produzem “ener- muitas vezes simplesmente repetindo a afirmação de gia limpa”, repetida constantemente pelo governo e que se trata de energia “limpa”. pela indústria hidrelétrica, é o que domina na visão Quase sempre que surge o assunto de hidrelétri- do público. Este exemplo representa um conjunto cas, inclusive com relação às suas emissões de gases de mais geral de problemas na midiatização da ciência, feito estufa, a presunção é de que “precisamos” de mais e esses desafios precisam ser enfrentados tanto por energia, e, portanto, é sempre uma escolha entre a bar- jornalistas como por cientistas. ragem ou outra fonte, geralmente combustível fóssil. Palavras-Chave: Amazônia, Água, Alumínio, O que está para fazer com a energia raramente fica Aquecimento global, Carbono, Hidrelétricas, Barragens, questionado. No entanto, isto é a questão mais básica, Efeito estufa, Metano e tem que ser respondida antes de poder dizer qual A “midiatização” da ciência, ou seja, a trans- é o impacto líquido da hidrelétrica. No caso de Belo missão e explicação de informação científica pe- Monte, por exemplo, boa parte da energia é para fazer los meios de comunicação, enfrenta sérios desafios alumina e alumínio para exportação, o que representa no mundo inteiro, e esses desafios são evidentes quase o pior de todas as possíveis opções em termos de na dificuldade de comunicar a essência de diver- gerar emprego no Brasil. Beneficiamento de alumínio sos problemas ambientais na Amazônia hoje. Os gera apenas 2,7 empregos por cada gigawatt-hora de “desafios”, que também poderiam ser chamados de eletricidade consumida, o único uso pior sendo fer- “fracassos”, se aplicam a todas as partes: jornalis- ro-liga, que também está sendo exportada (Bermann tas, cientistas e o público. Há um fracasso da mídia & Martins, 2000, p. 90). Deixar de exportar alumí- para apresentar, dos cientistas para explicar, e do nio e outros eletrointensivos seria a primeira medida. público para exigir informações. Depois, há muitas maneiras em que o uso da energia poderia ser mais eficiente (Bermann, 2003). O item Um dos desafios diz respeito a problemas vistos mais evidente é o chuveiro elétrico, que é uma ma- como difíceis de explicar, levando muitos a simples- neira extremamente ineficiente de obter água quente. mente deixar assuntos mais complicados de lado. Segundo o Plano Nacional de Mudanças Climáticas, Decisões a sobre muitas grandes questões de polí- 5% de todo o consumo de eletricidade no Brasil é tica de desenvolvimento dependem de entender a para esquentar água (Comitê Interministerial sobre probabilidade de diferentes acontecimentos, o trata- Mudança do Clima, 2008). Isto é muito mais que mento de incerteza e risco, e o valor do tempo — to- Belo Monte o qualquer outra hidrelétrica planejada. dos assuntos que não fazem parte do conhecimento Grande parte do aquecimento de água pode ser feito A Hidrelétrica de Belo Monte como 289 Fonte de Gases de Efeito Estufa:Desafios para Midiatização da Ciência na Amazônia com aquecimento solar, e o que não pode seria mais A matéria orgânica que é convertida em metano eficientemente esquentado a gás. O Brasil é um dos vem de fontes em dois grupos: os estoques iniciais, únicos países do mundo que usa o chuveiro elétrico. A tais como as folhas das árvores na área inundada e o falta de lógica do ponto de vista do País fica evidente carbono no solo inundado, e os estoques renováveis, do fato que um chuveiro que custa aproximadamente tais como as macrófitas que crescem na água e as R$30 ao indivíduo para instalar custa R$2-3 mil ao ervas que crescem na zona de deplecionamento, ou País para instalar a capacidade de gerar a eletricida- seja, o grande lamaçal que forma anualmente quan- de para suprir o chuveiro (Cidades Solares, 2006). Só do o nível da água é rebaixado no reservatório. A depois de avançar na eficiência viriam as outras fontes vegetação que cresce nesta zona é mole, principal- de geração de energia (solar, eólica etc.) e, finalmente, mente composto de gramíneas, que apodrecem ra- as hidrelétricas – sempre pensando em priorizar as pidamente abaixo d’água (bem diferente de madeira, ações de menor impacto e maior benefício. que decompõe de forma muito lenta). A vegetação na zona de deplecionamento é enraizada no fundo, As hidrelétricas têm uma emissão de gases que onde, na hora que o nível da água sobe, ela decom- pode ser entendido do desenho do vertedouro, por põe na zona sem oxigênio e gera metano. Quando exemplo, em Tucuruí (Fearnside, 2004a). A água era crescem as plantas tiram carbono do ar em forma de tirada a uma profundidade de 20 m em Tucuruí-I, CO2 pela fotossíntese, e quando morrem inundadas o que aumentou para 24 m desde 2002 com o elas devolvendo este carbono em forma de CH4. Por Tucuruí-II. A comporta de aço é levantada, abrindo ser uma emissão que se repete todo ano de forma uma fenda, e a água desce um “pulo de esqui” e é sustentável, a hidrelétrica funciona como uma “fá- jogada para cima, sendo pulverizada em bilhões de brica de metano” (Fearnside, 2008). gotículas. Isto faz parte do desenho da barragem, in- tencionado a oxigenar a água para diminuir a mor- A Eletronorte reagiu ao meu uso da expressão tandade de peixes no rio a jusante. No entanto, o “fábrica de metano” da seguinte forma em um texto outro lado da moeda é que todo o metano dissolvido intitulado “Eletronorte responde ao New York Times”: na água é lançado para o ar imediatamente. O me- Finalmente, a Eletronorte não aceita mais, tano (CH4) é um gás de efeito estufa muito mais após 20 anos de exaustivas e repetidas explicações poderoso que o gás-carbónico (CO2). O metano é como esta, que “cientistas” continuem afirmando formado quando matéria orgânica decompõe em sem qualquer comprovação que “Tucuruí é virtual- ambientes sem oxigênio, como é o caso no fundo de mente uma fábrica de metano”. Virtuais têm sido um reservatório. A água no reservatório separa em essas previsões catastróficas que apenas corroboram duas camadas: uma na superfície com aproximada- a opinião de quem, quer esteja bem informado ou mente 2-8 m de espessura onde a água é mais morna não, deseja nada mais do que falar mal do Brasil. e fica em contato com o ar, e outra com água mais (ELETRONORTE, 2004) fria nas partes mais profundas do perfil. A água nas Outra contribuição das barragens ao aque- duas camadas normalmente não se mistura, e o me- cimento global vem da madeira da floresta que é tano fica preso na camada do fundo. A saída para os inundada. Isto representa um estoque substancial de vertedouros é abaixo da divisória que separa as duas carbono que leva a uma emissão de CO pela de- camadas, e a tomada de água para as turbinas é ain- 2composição das árvores mortas que ficam esticando da mais funda. A concentração de metano medido fora da água. Esta emissão de CO se soma ao gran- em Tucuruí aumenta com profundidade, e chega a 2 de pulso de produção de metano pela decomposição níveis bem altos nos níveis onde a água é retirada do abaixo da água das folhas que caiem dessas árvores. lago (Fearnside, 2002, 2004b). Esta água sai sob alta A Hidrelétrica de Balbina é o pior exemplo, com um pressão, e imediatamente fica a uma pressão de ape- grande reservatório raso que gera pouca energia. Há nas uma atmosfera na saída das turbinas. Pela lei de mais de 3.000 ilhas, aumentando o impacto na flores- Henry, na química, a solubilidade de gases na água é ta e também formando milhares de baías com água proporcional à pressão, e, portanto, a maior parte do parada. Balbina tem mais impacto que a geração da metano dissolvido na água sairá em bolhas na saída mesma energia com combustível fóssil (Fearnside, das turbinas. É a mesma coisa que acontece quando 1995). Embora um grupo do Canadá já havia iden- abre uma garrafa de Coca Cola e as bolhas de CO2 tificado hidrelétricas naquele país como fontes de começam a sair assim que a pressão é liberada. gases de efeito estufa dois anos antes (Rudd et al., 290 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras 1993), foi a minha publicação de 1995 que provo- Inventário Nacional] foi a ELETROBRÁS exata- cou uma reação ferrenha da indústria hidrelétrica mente por causa disso, porque esse assunto estava no mundo inteiro, inclusive no Brasil. A associação virando político. Ele tem um impacto muito grande de hidrelétricas dos E.U.A. chamou a idéia de um no nível mundial, nós vamos sofrer pressão dos pa- “asneira” (ver IRN, 2002). Mas as outras barragens íses desenvolvidos por causa desse assunto. E esse amazônicas também permanecem piores que com- assunto era pouco conhecido. É maltratado. Ele é bustíveis fósseis durante muitos anos, como no caso maltratado e continua sendo maltratado pelo pró- de Tucuruí, Samuel e Curuá-Una (Fearnside, 2002, prio Philip Fearnside e nós temos que tomar muito 2005a,b). O então presidente de ELETROBRÁS cuidado. Esse debate que esta acontecendo agora na me atacou como sujeito às “tentações” dos lobbies imprensa mostra claramente isso, quer dizer, você nucleares e de termoelétricas (Rosa et al., 2004), e de pega qualquer declaração e leva para um lado para estar apenas fazendo “reivindicações políticas” (Rosa mostrar que o Brasil não é limpo, que o Brasil está et al., 2006; ver respostas: Fearnside, 2004a, 2006a). se omitindo muito, que o Brasil, implicitamente, no Lançou a seguinte explanação do fenômeno: futuro tem que ter compromisso [para reduzir as “Embora ele [Fearnside] selecionou a Coca- emissões]. Esse que é o grande debate político e nós Cola como exemplo, que é altamente simbólico de estamos nos preparando para isso.” (MCT, 2002). sua maneira de pensar, pois ele podia igualmente De fato, o primeiro Inventário Nacional calcu- bem ter escolhido o guaraná – um refrigerante que lou emissões mínimas das hidrelétricas, omitindo é muito popular no Brasil, aromatizado com bagas completamente as emissões da água que passa pelas amazônicas. É mais fácil ver as bolhas, pois o gua- turbinas e vertedouros (MCT, 2004, p. 152). [Obs.: raná é transparente, enquanto a Coca-Cola é escu- O segundo Inventário Nacional, de 2010, omitiu as ro. As pessoas no Brasil muitas vezes se sentam em hidrelétricas completamente.] A emissão dada para torno de uma mesa para conversar enquanto bebem, a hidrelétrica de Tucuruí no Inventário Nacional com as garrafas abertas e os copos cheio durante foi de apenas 0,56 milhões de toneladas de carbo- meia hora ou mais, sem perder completamente as no equivalente a CO2 por ano (para 1998-1999), bolhas. Em vez de fast food, o costume brasileiro é uma discrepância de 1.437% comparado com meu uma bebida relaxante.” (Rosa et al., 2006). valor de 8,55 ± 1,55 milhões de toneladas de carbo- Isto é a origem do termo “fizzy science”, com no equivalente a CO2 por ano para 1990 (Fearnside, referência ao barulho que as bolhas fazem quando 2002). Para a hidrelétrica de Samuel o Inventário saem de um refrigerante, na publicação da ONG Nacional calculou 0,12 milhões de toneladas de car- International Rivers sobre o papel de conflitos de bono equivalente a CO2 por ano (para 1998-1999), interesse da indústria hidrelétrica em pesquisa sobre uma discrepância de 1.150% comparado com meu as emissões das barragens (McCully, 2006). valor de 1,5 para 1990 ou 146% comparado com meu valor de 0,29 para 2000 (Fearnside, 2005a,b). O chefe do setor de clima do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), que também era res- O mesmo grupo persiste em alegar que: ponsável pelo inventário nacional de gases de efeito “Muita polêmica tem sido estabelecida recente- estufa, que foi entregue a Convenção de Clima em mente a partir de estudos realizados em reservató- 2004, convocou uma reunião sobre as emissões das rios amazônicos, especialmente a partir de estudos hidrelétricas, e depois colocou o transcrito do evento teóricos e baseados em extrapolações desprovidas de no site de MCT. Nisto ele deixo explícito que o gru- critérios científicos estabelecidos. Estes estudos têm po de ELETROBRÁS foi chamado para elaborar forte viés contra qualquer tipo de aproveitamento este parte do relatório justamente para evitar conse- hidrelétrico na Amazônia e colocam em dúvida a quências políticas indesejáveis se grandes emissões viabilidade destes empreendimentos no que se re- de hidrelétricas fossem admitidas: fere às emissões de gases de efeito estufa e foram “Nós [o setor de clima do MCT] conversa- realizados para as hidrelétricas de Tucuruí, Samuel e mos com o Prof. Pinguelli [Rosa] e eu pedi ajuda Balbina (Fearnside 1995, Fearnside, 1996, Kemenes da ELETROBRÁS [sobre o assunto de emis- et al., 2007).” (dos Santos et al., 2008). sões de gás de efeito estufa de hidrelétricas]; aliás Infelizmente, quem ler os trabalhos que eles ci- quem coordenou esse trabalho [i.e., as estimativas tam vai encontrar um mundo diferente. As medidas das emissões por hidrelétricas, apresentadas no de Kemenes et al. (2007) em Balbina comprovam A Hidrelétrica de Belo Monte como 291 Fonte de Gases de Efeito Estufa:Desafios para Midiatização da Ciência na Amazônia grande emissões, e os cálculos para outras barragens diminuem, mas, nos anos que seguem, a concentra- amazônicas indicam todas como sendo piores que ção de CH4 oscila, com um pico cada ano quando a combustíveis fósseis (Kemenes et al., 2008). Erros área de deplecionamento é inundada. Isto represen- adicionais nos cálculos do grupo de ELETROBRÁS, ta uma emissão que seria sustentada durante toda recentemente descobertos, pioram ainda mais o qua- a vida da barragem. Uma forma de validação deste dro para hidrelétricas, aproximadamente triplicando resultado vem das medidas de metano na água na a parte da emissão por bolhas e difusão pelas super- hidrelétrica de Petit Saut, na Guiana Francesa, onde fícies dos reservatórios (Pueyo & Fearnside, 2011). uma oscilação sustentada deste tipo tem se instalado No EIA-RIMA de Belo Monte o mesmo grupo (Abril et al., 2005). foi responsável pela parte sobre emissões de gases de A grande emissão inicial, combinado com uma efeito estufa. A estimativa da emissão de metano do sustentação de um nível razoável de emissão ao futuro reservatório de Belo Monte longo dos anos, resulta em um tempo de 41 anos “.....Se a emissão de metano for similar ao re- para o complexo de Belo Monte mais Babaquara servatório de Xingó, a área projetada do reservatório (Altamira) começar a ter algum benefício líquido em (400 km2) de Belo Monte emitirá em torno de 29 termos de emissões. Este é um prazo muito longo, mg CH4 m-2 d-1. Mas se for similar ao reservatório e, dado as ameaças climáticas que a floresta amazô- de Tucuruí emitirá 112 mg CH m-2 d-1. Em face nica enfrenta, não há tanto tempo para esperar para 4 da incerteza tomamos que emitirá na média destes começar a mitigar o aquecimento global. Ademais, o dois valores, ou seja, 70,7 mg CH m-2d-14 . Antes da prazo de 41 anos se refere a um cálculo sem nenhum inundação .... chega-se a um valor de emissão de 48 valor sendo dado ao tempo. Se algum valor for dado mg CH4 m-2 d-1, para a presente emissão da área a com mais de 1,5% ao ano de taxa de desconto, a hi- ser transformada em reservatório de Belo Monte.” drelétrica permanece pior que combustível fóssil por (ELETROBRÁS, 2009, Vol. 8, p. 72). mais de um século. O tempo considerado é um fator essencial. Se for considerado apenas os primeiros 10 Novamente, a emissão imaginada é mínima anos, a emissão líquida média totaliza 11,2 milhões devido à omissão das principais fontes de emissão de toneladas de carbono equivalente a carbono de (as turbinas e vertedouros, além das árvores mortas CO2 por ano, ou mais que a emissão da grande São que apodrecem acima da água (Fearnside, 2009a). Paulo (Fearnside, 2009b). Isto é sem desconto pelo No caso de Belo Monte, há um outro grande fator valor do tempo, que ia piorar ainda mais o quadro. que eleva as emissões reais para níveis ainda mais Também considera o impacto de cada tonelada de altos. Isto é o efeito de enormes barragens rio aci- metano ser apenas 21 vezes o impacto de uma to- ma para controlar a vazão do rio Xingu na altura nelada de CO2, embora estudos recentes indicam de Belo Monte. O EIA-RIMA está toda feita sob um impacto 34 vezes o de CO2, ou 62% mais alto a hipótese de que essas barragens não vão existir, e (Shindell et al., 2009). esse documento de quase 20 mil páginas se tornaria essencialmente uma obra de ficção se outras barra- Uma questão chave é a credibilidade do cenário gens fossem construídas. O impacto delas é evidente oficial de ter apenas o Belo Monte como a única a partir dos dados técnicos. A primeira seria a hi- barragem no rio Xingu. Este cenário se baseia na de- drelétrica de Babaquara (hoje com o nome mudado cisão do Conselho Nacional de Política Energética para “Altamira”). Pelo plano original, esta barragem (CNPE), em julho de 2008, de que teria apenas o teria um reservatório de 6.140 km2, mais do dobro Belo Monte. No entanto, há fortes indicações de da notória barragem de Balbina. A variação vertical que este cenário oficial esteja apenas “para o inglês do nível da água no reservatório seria 23 m, assim ver”, e não corresponde à sequência de eventos que abrindo um lamaçal de 3.580 km2 todo ano como seria iniciada com a construção de Belo Monte. O área de deplecionamento. Isto seria uma “fábrica de CNPE é principalmente composto de ministros, e metano” sem paralelo. estes mudam com cada governo e podem mudar de ideia a qualquer momento. As altas autoridades no Meus cálculos indicam um enorme pico de setor elétrico nunca se conformaram a resolução do concentração de metano na água de Babaquara CNPE: o diretor-presidente da Agência Nacional (Altamira) nos primeiros anos oriundo da parte de Energia Elétrica (ANEEL) chamou a decisão de mole da vegetação original e do estoque de carbo- “o típico caso de dar os anéis para ficar com os de- no no solo (Fearnside, 2009b). Estas fontes depois dos” (Pamplona, 2008). Na cúpula do poder não há 292 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras a menor intenção de seguir o cenário oficial: quan- turbina sequer na casa de força principal. Uma aná- do a então Ministra do Meio Ambiente Marina lise econômica, feita pelo Fundo de Conservação Silva propus uma reserva extrativista em parte da Estratégica, em Minas Gerais, demonstra a com- área a ser inundada pelas barragens a montante de pleta inviabilidade de Belo Monte sem o armaze- Belo Monte, a então Ministra da Casa Civil Dilma namento de água nas grandes barragens a montan- Rousseff vetou a reserva “porque poderia atrapalhar te (Sousa Júnior et al., 2006). A tentação financeira a construção de barragens adicionais à usina de Belo seria grande de construir Bababaquara (Altamira) Monte” (Angelo, 2010). após a “crise planejada” de ficar sem água suficiente Infelizmente, há também uma história de em Belo Monte, com um acréscimo de US$ 1,4- casos paralelos nas barragens já construídas na 2,3 milhões por ano ao valor da energia gerada em Amazônia, onde as autoridades elétricas anun- Belo Monte (Sousa Júnior et al., 2006, p. 76). ciaram que não iam fazer algo e depois fizeram A reação contra críticas a Belo Monte tem sido exatamente aquilo que haviam prometidos a não ferrenha. O Rogério César Cerqueira Leite classifi- fazer. No caso de Balbina, um “esclarecimento pu- cou os que criticam a obra de “ecopalermas”, “igno- blico”, divulgado dias antes de fechar a barragem, centes”, “verdolengos”, “malabaristas”, “fanfarrões”, prometeu encher apenas até o nível de 46 m aci- “pseudointelectuais”, “exército extemporâneo de ma do nível do mar, criando um reservatório de Brancaleone” (Leite, 2010; ver respostas de Fearnside, 1.580 km2 (ELETRONORTE, 1987). O enchi- 2010; Hernández, 2010). Infelizmente, o fato bá- mento até 50 m seria apenas após anos de estu- sico que o Belo Monte teria um enorme impacto, dos da qualidade da água. De fato, o reservatório muito além do que é admitido oficialmente, conti- foi enchido diretamente até um nível acima dos nua valendo independentemente do discurso. Entre 50 m. Hoje o lago de Balbina tem 2.996 km2 se- estes impactos é a emissão de gases de efeito estufa. gundo nossas mensurações em imagens de satélite A ilustração melhor de como estes impactos ainda (Feitosa et al., 2007). Outro caso é o Tucuruí-II, não conseguiram penetrar a cortina do discurso sur- que acrescentou 4.000 MW de capacidade à usina giu na Conferência das Partes (COP) da Convenção de Tucuruí. Pela legislação, qualquer obra hidrelé- do Clima em Copenhague no final de 2009, quando trica com mais de 10 MW precisa de um EIA- uma reporter do site Amazonia.org.br entrevistou o RIMA, e a ELETRONORTE estava preparando Embaixador Extraordinário de Mudanças Climáticas isto quando o Presidente da República simples- do Itamaraty, responsável pela negociação do lado mente voou para Pará e liberou o dinheiro da Brasileiro. A Amazonia.org.br perguntou: “Mas, Belo obra. A racionalização era de que não ia aumentar Monte não é um dos projetos de hidrelétrica que o o nível da água no reservatório acima da cota de governo considera fontes de energia renovável e lim- 70 m de Tucuruí-I, e, portanto, não teria nenhum pa?”. A resposta foi: “É sim. Mas, o que estou dizendo impacto e não precisava do estudo (Indriunas, é que eu acho que ela [a usina de Belo Monte] não 1998). Após a obra, o nível da água foi levanta- se situa na Amazônia, né? Então é outro esquema” do, e a usina de Tucuruí vem operando na cota de (Munhoz, 2009). Evidentemente, se as pessoas cha- 74 m desde 2002 (Fearnside, 2006b,c). Da mesma ves nem sabem que Belo Monte fica na Amazônia, forma, após a construção de Belo Monte é pro- é muito difícil imaginar que saibam os detalhes dos vável que a construção de Babaquara (Altamira) impactos, inclusive as suas emissões de gases de efeito simplesmente prossegue quando chegar a hora estufa. A midiatização da ciência é mesmo um grande no cronograma. O cronograma antes de lançar a desafio na Amazônia. atual cenário oficial previa essa barragem enorme entrar em operação sete anos após o Belo Monte (ELETROBRÁS, 1998, p. 145). Nunca foi tão AGRADECIMENTOS relevante a famosa frase de George Santayana As minhas pesquisas são financiadas pelo (1905) de que “Aqueles que não conseguem lem- Conselho Nacional de Desenvolvimento brar do passado são condenados a repeti-lo.” Científico e Tecnológico (CNPq 305880/2007-1, A lógica das barragens a montante vem do hi- 610042/2009-2, 575853/2008-5, 563315/2008-3) e drograma do rio Xingu, ou seja, o fato que durante pelo e Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. 3-4 meses não teria água suficiente para tornar uma Esta é uma republicação de Fearnside (2012). A Hidrelétrica de Belo Monte como 293 Fonte de Gases de Efeito Estufa:Desafios para Midiatização da Ciência na Amazônia LITERATURA CITADA Fearnside, P.M. 1995. Hydroelectric dams in the Brazilian Amazon as sources of ‘greenhouse’ gases. Environmental Abril, G., F. Guérin, S. Richard, R. Delmas, C. Galy-Lacaux, Conservation 22(1): 7-19. P. Gosse, A. Tremblay, L. Varfalvy, M.A. dos Santos & B. Fearnside, P.M. 1996. 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Site Globoamazonia 07/06/10 http://colunas.globoamazonia.com/philipfearnside/ 296 Hidrelétricas na Amazônia Impactos Ambientais e Sociais na Tomada de Decisões sobre Grandes Obras O físico Rogério Cezar de Cerqueira Leite hidrelétricas, especialmente dessas hidrelétricas em (2010), escrevendo na Folha de São Paulo, taxa os particular. O “Complexo Altamira” (Belo Monte + críticos da hidrelétrica de Belo Monte como “eco- Babaquara/Altamira) emitiria tanto metano que le- palermas”, “ignocentes”, “verdolengos”, “malabaris- varia 41 anos para ser compensado pelo combustível tas”, “fanfarrões”, “pseudointelectuais” e um “exér- fóssil evitado, e seria mais demorado ainda se não cito extemporâneo de Brancaleone”. Ele repete os fosse calculado sob a hipótese do tempo ter valor argumentos dos proponentes, já repetidamente re- zero (ver Fearnside, 2009- 2010). Considerando as futados, e até acrescenta algumas pérolas próprias, ameaças climáticas na Amazônia, o tempo tem valor tais como a noção de que os índios não vão nem se mesmo quando se fala do efeito estufa nessa região. importar, pois são “seminômades” e, portanto, não Entre as afirmações mal-informadas do Dr. Leite é devem ter nenhum problema em andar até novos a de que a construção de Belo Monte significa que locais. Parece que o Dr. Leite não sabe que a pesca “20 milhões de brasileiros poderão ter luz em suas é o sustento principal destes grupos, e que os peixes casas”. Infelizmente, grande parte da energia seria essencialmente sumirão de um trecho de 100 km exportada para outros países na forma de alumí- abaixo da barragem principal, inclusive em duas áre- nio e outros produtos eletro-intensivos que criam as indígenas. O Dr. Leite ridiculariza os “500 km2” pouquíssimo emprego no Brasil por Megawatt de do lago de Belo Monte como insignificante na es- eletricidade consumido. A energia que sobraria para cala amazônica. Evidentemente, o Dr. Leite engoliu uso doméstico não chegaria aos 20 milhões de bra- as afirmações dos proponentes de que haverá ape- nas uma barragem no rio Xingu, sendo esta Belo sileiros mencionados, pois eletrificação rural nessa Monte. Este cenário oficial, necessário para obter escala não faz parte do projeto. Informações sobre os a aprovação ambiental da primeira barragem (Belo muitos impactos sociais e ambientais do projeto são Monte), é considerado como uma mera ficção por apresentados no relatório do Painel de Especialistas muitos que estudam essa hidrelétrica, inclusive este sobre Belo Monte, grupo ao qual eu tenho o orgulho autor. Sugiro a leitura de alguns dos trabalhos dispo- de pertencer (Santos & Hernandez, 2009). níveis em http://philip.inpa.gov.br. A inviabilidade financeira na hipótese de ter apenas uma barragem REFERÊNCIAS tem sido demonstrada em uma análise econômica detalhada publicada pelo Fundo de Estratégia de Fearnside, P.M. 2009-2010. A Triste História da Hidrelétrica Conservação, de Belo Horizonte (Sousa Júnior et de Belo Monte & Belo Monte e os gases de efeito al., 2006). O fato de algumas empresas ainda esta- estufa. Séries de textos da coluna philipfearnside em rem dispostas a investir seu dinheiro na obra nessas globoamazonia.com http://colunas.globoamazonia.com/philipfearnside/. Também disponível em: http://philip. circunstâncias é uma forte indicação de que essas inpa.gov.br/publ_livres/2010/Belo%20Monte-Globo%20 empresas estão contando com um cenário diferen- Amazonia-S%C3%A9rie%20completa.pdf te daquele oficialmente divulgado de uma só bar- ragem. As demais barragens seriam catastróficas. Leite, R.C.C. 2010. Belo Monte, a floresta e a árvore. Folha de São Paulo 19 de maio de 2010, p. A-3. Disponível em: http:// Originalmente foram planejadas cinco barragens a philip.inpa.gov.br/publ_livres//Other%20side-outro%20 montante de Belo Monte, o que foi reduzido para lado/Rogerio%20Cezar%20Cequeira%20Leite-Belo%20 três no último plano, que valeu até 2008. A pri- Monte/Rogerio%20Cezar%20de%20Cerqueira%20Leite- meira seria a barragem de Babaquara, renomeada Belo%20Monte-FSP%2019-05-10.pdf “Altamira”, que, pelo plano original, inundaria so- Santos, S.M.S.B.M. & Hernandez, F.M. (eds.) 2009. Painel zinha 6.140 km2. Isto é o dobro da área da notória de Especialistas: Análise Crítica do Estudo de Impacto hidrelétrica de Balbina, e quase toda a inundação Ambiental do Aproveitamento Hidrelétrico de Belo Monte. seria de floresta tropical em área indígena. O anún- , Belém, Pará: Painel de Especialistas sobre a Hidrelétrica de cio em 2008 pelo Conselho Nacional de Política Belo Monte. 230 p. Disponível em: http://www.xinguvivo. Energética (CNPE) de que teria apenas uma bar- org.br/wp-content/uploads/2010/10/Belo_Monte_Painel_ ragem no Xingu oferece apenas uma proteção ilu- especialistas_EIA.pdf sória, pois qualquer governo futuro (que indica os Sousa Júnior, W.C. de, J. Reid & N.C.S. Leitão. 2006. Custos Ministros membros do CNPE) pode revogar essa e Benefícios do Complexo Hidrelétrico Belo Monte: Uma decisão na hora que quiser. Abordagem Econômico-Ambiental. Conservation Strategy Fund (CSF), Lagoa Santa, MG. 90 p. Disponível em: O Dr. Leite também parece ter perdido as dis- http://conservation-strategy.org/sites/default/files/field- cussões sobre as emissões de gases de efeito estufa de file/4_Belo_Monte_Dam_Report_mar2006.pdf.